Mantendo O Equilíbrio - Finale escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 47
Capítulo 46


Notas iniciais do capítulo

OLAAAAAR!

Pense numa pessoa que, por um minuto, acreditou (e surtou um pouco) ter perdido o arquivo de capítulos? Murri e voltei. Com o capítulo, graças! Estão a salvo!

Mas tô de passagem, não se acanhem comigo. Tem notas lá no final :)

Enjoy.



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Ok, talvez os planetas tivessem se sincronizado melhor e preparado todo um bom dia – e um empadão de frango da dona Ana – para eu descansar a cabeça. Vini intimou-me a jantar em sua casa já prevendo que Murilo iria interromper toda e qualquer tentativa de namorar se tivéssemos na minha casa, principalmente com essa história agora de premiação.

Não era uma coisa grande, era só um reconhecimento pelo trabalho, coisa que a empresa incentiva muito e por sempre está envolvida em projetos com a comunidade. Esse que Murilo participou não era bem um desses, mas trazia umas melhorias pro sistema e aí vão fazer uma pequena entrevista com ele e Armando semana que vem para uma reportagem sobre esses tais projetos.

O universo aproveitou o encontro dos planetas e fez o Gui me ceder carona até a casa do Vinícius, já que era caminho para outro encontro com o primo pra avaliar apartamentos. Bem confiante, Gui seguia nessa saga e eu, claro, era a boa companheira que dava o ombro para lhe apoiar. Nunca se sabe, afinal, quando a mãe dele pode dar aloca de novo. Ela andava bem estranha, já o pai, o mesmo de sempre.

Jantamos eu e Vinícius com Djane e Renato. Aproveitei e desembuchei logo sobre a novidade, o que deixou a sogrinha com os brilhando de orgulhinho. Só não convidou a peste para um próximo jantar porque já tínhamos um marcado, dessa vez com a família de Aline. E aí também fui levando o papo sobre a namorada do meu mano e como os dois estão. Djane ficou mais exultante ainda, parecendo com mamãe. Quer dizer, mamãe espalhou pra meia cidade que seu filhinho querido ganhou uma premiação e que ia aparecer na TV. Papai me ligou no final da tarde só pra dizer que ela passou o dia falando isso para os clientes da loja.

Eu acreditava. Era tão a cara dela de fazer isso!

Após o jantar, Djane recebeu uma ligação de trabalho, mesmo com todo mundo manifestando-se sobre ela se sobrecarregar e ficar atendendo ligações àquela hora. Ela fez carinha de “por favor” e nós três molengas, caímos. Caramba, eu andava molenga mesmo. Eu nem tinha avançado no Gui no dia anterior por ter roubado meus docinhos. Precisava me policiar, isso sim. Se bem... Pelo menos eu não era molenga sozinha.

Renato acompanhou Djane para a varanda da casa, e antes de ir, palhaço, me fez ruborizar quando ele demandou para eu e Vini nos comportar enquanto eles se mantivessem lá fora. Achei que Vini iria implicar, mas não, ele ficou calado enquanto passava canal na TV. Meu Vini estava longe, isso estava claro.

Ele parou num canal de desenho animado do Bob Esponja. Com tanto filme na tv a cabo da casa, o que mais lhe agradou foi o desenho. Vi a lista de programação na tela e eram filmes de que ele gostava. O caso podia não ser sério, mas era algo que com certeza o incomodava.

Deito a cabeça no seu ombro, o braço dele passava por trás de mim no sofá.

– Tá chateado?

– Eu? Por que estaria?

– Não sei, me diga você.

Quando ele joga o controle remoto pro lado, eu ocupo sua mão, entrelaçando à minha. É uma coisa tão natural, uma se encaixando na outra, que logo ele está fazendo carinho na minha e volta-se para nossas mãos, não para a tv, onde o Bob Esponja caça águas-vivas.

– Não é o que está pensando.

– E o que estou pensando, hein, senhor adivinho?

– Não me incomodei pelo que Renato disse. Eu só... tava lembrando de hoje de manhã. Sobre a vaga que desisti e...

– E...

– Eu só queria que fosse eu.

– Hum?

– Eu quem tivesse uma surpresa pra deixar minha mãe feliz. Poderia ter sido eu.

– Vini, até de você apagado ela tem orgulho. Trabalha, estuda, tem uma namorada que te deixa maluco, um relacionamento muito bem abençoado por ela e ainda consegue ser um filho protetor. E ciumento.

Consigo arrancar um mero sorrisinho dele, principalmente quanto ao último apontamento, e acho que já é um começo.

– Eu sei, mas...

– Acho que tu anda carente demais. Esse intensivão estragou essa cabecinha. Tu tava com ciúme até do Gui!

O mero sorriso se abre mais e acanha meu namorado, que vai negar até o fim do mundo uma coisa dessas, eu podia prever.

– Não tava não.

– Tava sim.

– Não tava não.

– Tava sim.

– Acho que eu preciso mesmo descansar. Ainda sinto muito cansaço dessa loooonga jornada. Que tal irmos para o quarto?

– Tu sabe que vai me deixar em casa, né, bonitinho?

– Tu sabe que eu pretendo te convencer sobre isso, né, bonitinha? Mereço beijos e mais beijos, e cafuné, porque, você sabe, o intensivão estragou essa cabecinha.

Olha a pessoa querendo me dobrar com meu próprio argumento...

Olha a pessoa conseguindo.

– Bobo! Tua mãe ainda vai voltar.

– Ela tem companhia, vai saber se virar sem a gente.

Me surpreendo e até acho que é brincadeira. Mas não, Vini soa bastante sério. Ele não tá implicando com Renato. Ou sobre Renato com sua mãe. Ou Renato e aquele comentário. O que foi que eu perdi?

Melhor, o que colocaram na água desse treinamento do escritório?

Eu queria essa fórmula secreta!

~;~

Havia algo diferente no meu Vini, ele parecia pensativo demais. Não preocupado, só... longe mesmo. Teria sido tão exaustivo esse trabalho dele? Bom, deitado ao meu colo e recebendo todo um tratamento especial aos seus fios macios, ele quase dormia ao meu toque. Hora e outra, enquanto eu relatava sobre algumas coisas do expediente de hoje, e em como meu chefe tava todo animado e eu não tinha saído um picolé da sala dele, dava uns pequenos tapas na testa de Vini para testar se ele dormia mesmo. Era maldade, porém divertido.

Quando o assunto morreu e ambos ficamos calados por um tempinho, só apreciando a boa e velha preguiça, relaxando, lembrei de uma coisa que vinha faz um tempo esquecendo de perguntar.

– Vini?

– Hum? Tô acordado.

– Eu sei. É que... queria saber se você ainda tem aqueles planos.

Logo seus olhos se abriram, incertos do que eu queria dar a entender.

– Os planos de a gente ficar junto e comemorar datas que deixamos passar. Nosso aniversário, por exemplo.

Levando uma mão ao rosto ao perceber que cometeu uma falta, meu Vini lamenta:

– Eita. Eu meio que perdi a reserva. Desculpa. Perdi o prazo de renovar e...

– Tudo bem. Sem problema.

– Sério?

Arriscando ele uma olhadela por entre os dedos da mão ainda ao rosto, eu a retiro, esclarecendo mais sobre a questão.

– Sério. Eu só... acho que sinto falta de estarmos assim, sozinhos. Até pra conversar. E você tava atolado, é totalmente compreensível.

– Também sinto falta... Quando foi que a vida ficou tão séria?

Rio do franzir que sua testa faz quando ele quase soa filosófico.

– Acho que ela sempre foi?!

– Por que tudo tem que ser complicado?

– Acho que não há dedos dos pés e mãos suficientes pra quantificar respostas. Enquanto sociedade, a gente infere muito no espaço do outro. Você bem que matou as aulas de psicologia e sociologia, tô vendo.

Dou mais um tapinha na testa por isso, como se tivesse o repreendendo, mesmo tendo conhecimento de que eu também não era dessas tão compromissadas e fiéis aos horários de aula. Vinícius só faz cara de zangado e tenta se justificar.

– Meu professor de sociologia era meio maluco... Falava mais sobre antropologia que outra coisa. E meu curso é da área de exatas, não humanas, esqueceu?

– Tinha sociologia na escola, só por isso. Isso não impede a pessoa de compreender. Que é melhor quando a gente conquista algo, fazer valer o esforço. Tudo se trata de valores que se compartilha. Isso e tantas coisas mais complicam tudo.

Suspirando e se aconchegando mais a mim, ele vira um pouco o rosto no travesseiro nas minhas pernas e me observa de rabo de olho. Eu ainda brincava com os fios dele, puxava-os devagarinho, enrolava, atravessava-os com os dedos e...

– Você sempre vê o bom onde eu não consigo enxergar. Te admiro nisso, sabia?

– Imaginava que era o que mais te deixava maluco.

– Também. Mas, sei lá, acho que queria ser mais assim...

– Por que diz isso?

– Não sei. Ler melhor as pessoas, entender o que elas fazem. Por que fazem.

– E quem disse que você não faz isso?

– Eu?

Ele então revira, de novo ficando deitado de rosto pra cima e eu o encaro, de rosto para baixo, quase numa espécie de cena a la Homem-Aranha do filme, em que o beijo do casal se dava com o mocinho de ponta-cabeça. Bom, não estávamos nos beijando, mas poderíamos estar. Agora saber quem está de ponta-cabeça pra quem que é difícil de determinar.

– Mi, você é mais observadora do que eu.

– E nem isso me garante muito, lembra? Eu só... sou imaginativa demais. E conspiro. E vejo muito filme... Já falei que conspiro?

Ele ri, os olhos confirmando que sabia bem disso, de tantas provas que já dei sobre conspirar e pensar por vários caminhos, nem sempre os bons, nem sempre os certos. Mais que isso, ele também já tinha captado que eu procurava entender qual era os caminhos desses pensamentos dele.

– Já. E deve tá conspirando sobre o que desencadeou essa série de perguntas.

– Eu diria curto-circuito, mas né, você me conhece. Agora vai pro lado que acho que já não sinto minhas pernas.

Com dificuldade, ele sai de cima, como se fosse perder carinho só por sair do ponto em que estava deitado. Tava ficando mal acostumado antes mesmo de acostumar, um perigo só. Estico um pouco as pernas e aproveito pra me deitar um pouco também, ajeito travesseiros na cabeça enquanto ele torna a falar.

– Hoje teve uma reunião no escritório com direito a aqueles discursos motivacionais, sabe? Sobre procurar respostas, sobre ir além do que se vê. E aí uma e outra coisa foi se encaixando na minha cabeça, e mais perguntas vieram, acho que só fiquei mexido.

– Então ponto pro cara, ele te motivou mesmo.

– Acho que sim... Ah! Esqueci de perguntar! O Gui ainda tá procurando apartamentos pra alugar?

– Tá. Ele e um primo.

– Tem um cara que estudou comigo período passado, lembro que ele tava interessado em alugar. Posso ver com ele se ainda tá disponível. Eu ia ligar pro Gui, mas você viu como foi esses dias...

– Ele tá bem empenhado. As coisas em casa parecem cada vez mais estranhas.

– Entendo ele.

E então o assunto parece que morre num suspiro. Poderia muito bem esticar história sobre isso, sobre Vini o entender, por Aguinaldo querer conquistar não só distância dos pais, mas independência, mas eu sabia tão bem quanto ele o que foram as questões do passado nesse quesito e não era em algo que eu queria tocar. Vinícius está relaxado e sereno. Se fosse para perturbá-lo, que fosse com algo que valesse a pena.

E aí minha mente trabalha rápido.

Depois de ontem, acho que ele merecia mais do que eu guardava.

Num sussurro, eu mexo com a ponta do travesseiro em que estou deitada e sei, sinto, que ele me olha, que espera, que ouve o que tenho a trazer para nosso momento. Ele me cedeu confiança, eis então o que compartilho:

– Eu discuti de novo com o Gui, semana passada. E então com a Flávia. Ela puxou minha orelha. Ambos na verdade.

Vini está de frente para mim, deitado de lado. Está puxando a manga longa da sua camisa, ajeitando-a, sem por um minuto deixar de me fitar. Não aparenta preocupação ainda, ele só quer saber mesmo sobre o caso.

– Pelo mesmo motivo?

– Praticamente. O Gui... hum... ele descobriu aquela história sobre alguém ter me beijado... na viagem. Ele ficou muito zangado por eu não ter sequer mencionado alguma vez. E nem ter dito outras coisas, ainda magoado por aquela questão sobre André.

– Você devia mesmo ter contado.

Carinhoso, ele envolve um braço seu ao meu e aperta contra si, dividindo o calor do corpo. Estava um pouco frio o quarto dele, nada demais, porém, como sabe que posso ser frienta, ele gosta de ficar me esquentando de pouquinho em pouquinho.

Um pouco ansiosa pelo que estou prestes a mencionar, ainda que não tenha noção de como dizer, apenas concordo, assinto.

– Eu devia.

E aí a ficha dele cai sem eu nem precisar de muito.

– Mas espera... quem contou pra ele? Foi a Flávia?

– Não. Foi o próprio... cidadão.

~;~

Eu espero. Engulo seco. Acho que prendo a respiração. Eu não olho. Eu só... espero. Me concentro na ponta do travesseiro novamente. Até então eu não tinha percebido, era rosa. Vinícius costuma dizer que é salmão e eu gosto de implicar que é rosa. Mas agora isso não importa. Porque nada vem. Não mais que ouvir a respiração dele. Sei que não está mais serena. Sei que...

– Continue.

Sei que ele está se forçando a permanecer controlado. Não é um assunto do qual goste, e principalmente de que apoia. Meu silêncio sobre o assunto, digo. Eu era sua garota. Mexeram com sua garota. Ele nem pôde defender sua garota. Sua garota nunca quis esclarecer isso. Posso entender sua raiva, posso entender minha estupidez, mas já não posso omitir isso dele. Pior, mentir para ele.

Então eu finalmente fito-o, o que descubro não ser recíproco. Ele não está de todo travado, tampouco agraciado. Vini estuda de repente meu braço, a parte que fica entre nós e que não está coberta por ele. A outra parte ele ainda mantém coberta para si e não me encara, nem quando repete um “continua” ao perceber que estou em silêncio. Está tenso, retesado.

Assim faço isso que me pede finalmente, na esperança de que logo isso se dissipe, e que não só essa tensão, mas toda essa nuvem cinza que parece acompanhar o assunto. Que era difícil falar sobre isso era, só que nem por isso eu ou ele precisava complicar mais. Talvez seja nisso que ele pense. Talvez... talvez fosse salmão mesmo, repenso, novamente observando a ponta do travesseiro enquanto as palavras vão saindo e trazendo de volta as imagens daquela discussão.

– Ele disse... de livre e espontânea verdade para o Gui. Eles brigaram, e o Gui... o socou. Duas vezes. Ele levou dois dias pra me contar.

Pelas minhas referências, era fácil maquinar que eu demorei mais do que dois dias pra então contar também. Do meu canto, espio-o logo mais ao lado, ele que tem a cabeça mais baixa por não estar com o travesseiro dobrado como o meu. Vini apenas mexe a mandíbula e mexe mais a cabeça, de modo que já não posso ter acesso a sua expressão e sinto que aperta mais e mais a parte do meu braço para si e não sei o que pensar diante de seu silêncio.

Depois de umas respirações longas, ele volta, sem falar diretamente a mim. Seu tom não vacila:

– Onde foi isso?

Já eu... eu hesito. Mas termino por entregar logo tudo.

– Hum... Ele me contou na empresa um dia aí que ficamos presos por causa da chuva. Já sobre a briga... foi numa oficina, onde o primo do Gui estava sendo atendido. E a pessoa... Foi o Sávio.

Eu não digo que ele tinha razão, até porque Vinícius não tinha por exato. Sávio nunca me cantou, por exemplo. Quer dizer, nunca isso ficou claro. Havia muito dele para se suspeitar, contudo, algo direto assim, nada. Nada além daquele beijo. E talvez da discussão antes. E mesmo depois, o resto da viagem, a volta, a faculdade, as confusões, a fuga... não houve algo mais. Sávio realmente me respeitou, o que me deixava muito mais confusa, porém me importar em dar atenção a isso eu não me importei. Havia tanta coisa maior, poxa.

Havia Vinícius. Há Vinícius. E Murilo. Eric. Flavia. Anderson. Gui. Até Kevin.

O que era um único beijo roubado perto de tudo que Denise nos tomou?

Não era traição. Ok que Sávio atraía, e ele atraía muita gente, é só que... ele não passou disso. Um cara gentil, um amigo, um amigo bonito. Eu tenho vários amigos bonitos. Embora Sávio tivesse aquela atrativa personalidade, não era ela que me tocava o coração. Não foi por ele que me apaixonei, que cuidei, que me uni. Eu... amo o Vinícius.

Amo como ele sempre tenta me roubar atenção, sabendo que tem toda. Amo como ele se esforça em tudo, aplicado em fazer as coisas darem certo. Quando ele sabe que está errado e ainda assim fica bambo de aceitar o que é o certo, como titubeia antes de tomar uma decisão, e ela sendo o que ele goste ou não, ele pensa mesmo a respeito. Ele considera minhas opiniões, minhas mais transloucadas opiniões, e ainda me admira por isso.

Amo por ele sorrir quando digo uma coisa tão simples, às vezes tão besta e para ele significa tanto. Amo como isso me derrete, me faz ficar morrida – de um bom jeito – por um segundo ou três, e aí ele é gentil e carinhoso. Compreensivo. Ciumento sim, mas apenas por estar cuidando do que ele teve de esforçar para ter. Ele me dá esse grande valor e é recíproco.

Mas claro, eu o amo mais que isso tudo. Amo-o pelas coisas pequenas, pelas grandes, pelas médias, as que podem parecer insignificantes e ainda assim, importantes. Amo-o pelo jeito de ser, de pensar, de fazer as coisas. Pensar nele me traz aquela coisinha que remexe no coração, que traz um sorriso ao rosto e me deixa aérea sem razão aparente. Amo-o e quero muito fazer com que isso deslize de minha boca e desça pela sua.

Mas apenas não posso simplesmente atirar tal e depois beijá-lo quando esse mesmo tiro ainda queima dentro dele. E espero que isso, isso sim, seja insignificante, que não seja de fato uma bala de aço, mas tão somente uma de borracha, que não machuca tanto assim, ou, como um jato de água de arma de brinquedo, que só molha e escorre. Foi só um beijo. Um que pode ter derrubado minha amizade com Sávio, e nem por isso iria – ou deveria – derrubar um relacionamento como o que tenho com Vinícius.

Estou pronta pra gritar, se preciso, meus argumentos quando Vini me pega de surpresa. Ele se preserva calmo e continua a não me olhar diretamente.

– Obrigado por contar.

Obrigado por contar?

Oi?

Fazendo carinho ao meu braço que ele tem entremeado aos seus, ele se remexe um pouco ao seu travesseiro, leva uma mão ao meu rosto e, finalmente, me fitando olho no olho, tira uma mecha de meu cabelo que tende a cair e a leva para trás de minha orelha. Mais carinhoso, Vini descansa a mão ainda no meu rosto, o polegar fazendo círculos. Ele tem uma expressão um pouco dolorosa e séria que me dá ansiedade. Me dá mais ansiedade quando hesita.

– Sabe que eu já imaginava. Mas a questão, Mi, é que... bom, preciso confessar algo.

– V-você já sabia?

– Não, não, só desconfiava mesmo.

Vini balança a cabeça em negação para me tranquilizar, o que não adianta muito. Aquela expressão ruim ainda o toma por todo. Tinha comigo que não seria uma conversa agradável mesmo, só que quando a gente vê isso refletido no outro, dá vontade de não ter dito. E agora a questão, ao que parece, já não era bem essa. Estava tão ligada nisso, revirando motivos na cabeça, que nem vi a hora que ele retirou a mão.

– Então?

Agitado e inquieto, Vini se remexe mais no seu lugar e me solta, vira-se na cama e aperta o rosto enquanto de si ressoa múrmuros ansiosos e que vacilavam. Entre errrrs e haaaaãs, eu o chamo e ele não se volta para mim. Mas chega a responder.

– Naquela vez sobre o hacker... naquela vez eu não disse a verdade. Não por completo. Eu não... eu não consegui.

– O que quer dizer?

Baixando os braços dramaticamente e encarando o teto de seu quarto, ele suspira.

– Você tinha me magoado. Muito. Não só pela questão do hacker, mas por evitar de... enfim, você não falava. Pediu desculpas e eu entendi. Mas nunca entendi por que não sobre o André.

Sou eu agora quem quer apertar o rosto ou mesmo enfiá-lo no travesseiro e...

Ele agita-se novamente, como que pisando em ovos, testando território e fala, fala tudo. Passava as mãos nos cabelos em clara inquietude pelo que revelava.

– Eu não podia exigir nada, mas a verdade é que fiquei mexido. Chateado. E por muito tempo, Mi. Nem por um momento você cedeu e partilhou o que acontecia, a perseguição, as discussões... A origem, sempre esteve com você. Fiquei pensando se...

– Vini.

Ele vira de repente pra mim, inseguro.

– Eu sei que você tem dificuldades com confiança. Eu também tenho. Eu não quero te condenar ou algo do tipo.

Meus olhos começavam a se encher d’água. Funguei pra ver se dispersava. Isso chamou a atenção dele, que aí me toca de novo ao rosto. Quando nos olhamos, eu vejo... há algo diferente em seus olhos então, não sei dizer o quê.

– Eu entenderia se assim fosse.

– Eu fiquei muito chateado, mas também me calei. E ao longo desse tempo eu enxerguei algumas coisas.

– Tipo o quê?

– Aquela era a Milena que se forçava a seguir em frente. Uma Milena que se escondia até de si. Eu conheci muitas Milenas nessas últimas transições. E as amei, mesmo em loucura. Minha ou sua. A Milena que guardava tudo, que queria dar seu jeito, que achava que podia tudo. Mas sabe qual eu amei mais?

Eu tinha medo de perguntar.

– Qual?

– A que chegou pra mim e foi sincera sobre Anderson ontem. Essa me mostrou confiança. Receio, mas doação. Não se fechou mais uma vez.

Fico sem saber se me odeio mais ou se... sei lá. Uma lágrima teima em descer, desliza por cima do nariz e, como estou deitada de lado, pende para cair. Mais que rápido, meu Vini passa o polegar, que estava perto, e me segura de modo a eu me centrar bem no que ele queria dizer.

– Lena, eu não fico feliz por saber disso agora, isso de Sávio. Também não fico feliz por não ter tido a chance de tê-lo socado também. Assim como a André e àquele professorzinho que te assediava. Você tirou todas as minhas chances de te defender. Quer dizer, ainda consegui socar o Anderson, mas ainda me restam umas vontades. Eu sei que não gosta de quando sou violento, mas eu te amo. Eu quero te defender. E se precisa ser punho, que seja.

– V...

Antes que eu possa dizer algo, ele passa dessa vez o polegar por meus lábios e os param. Intercepta ainda novas gotinhas que começavam a molhar pelo meu rosto. Eu reprimia a vontade de chorar apertando-os lábios e engolindo com força aqueles espasmos tão característicos.

– Eu não vou bater, pelo menos por agora. Porque quero que confie que não vou seguir o caminho mais fácil. Você também tá se esforçando muito por isso, não pense que eu não vejo. E, hey, não chore, ok?

– Mas você... eu te mag...

– Já passou, Mi. Isso tudo tá passando. Só... precisamos confiar mais um no outro. Mas sem pressa, ok? Te amo, apenas isso. Sou um cara melhor, um homem melhor, com você. Tem coisa que é realmente difícil, mas, ao seu lado, e com tempo, eu tô aprendendo.

Ainda quero chorar, embora por sentimentos diferentes. Quero chorar de agradecida. Não sei bem se Vini capta isso, só sei que ele se aproxima mais de mim, levantando-se um pouco de onde está e seu rosto fica bem rente ao meu. Também o seguro e presto atenção. De olhos fechados, ele torna a falar, tom baixo e sincero.

– Eu me sinto mais que bem... Me sinto equilibrado.

E aí sim que meu coração explode, minha respiração quase para e sem declaração alguma, opto por apenas trazer seu rosto a mim e beijá-lo. Ávido ele corresponde, ávida eu quero poder me declarar também. Mas ele não deixa eu escapar para dizer qualquer coisa. É com muito custo que eu consigo articular um “te” e um “amo”. Isso lhe dá um tamanho sorriso e energia que os beijos seguintes se tornam doces.

Em meu íntimo, eu via novas certezas. Estávamos mesmo passando por aquilo, deixando para trás. Estávamos dispostos a investir cada vez mais na base da confiança. E ele estava tentando me convencer a ficar essa noite que eu sei. Ri para mim mesma e vi que tinha grandes chances de eu aceitar. Enquanto isso, eu aproveitava.


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Notas finais do capítulo

Esses dois ♥

Já sobre a curiosidade sobre a trilha sonora, vou ficar devendo pro próximo capítulo.
Pra compensar a falta... Trechinho do próximo? Dessa vez tem!

"- Tá bom, fica sem bolo então. Amanhã eu parto.
Dez, nove, oito...
— QUE BOLO?
Meu irmão se vende por tão pouco, sorrio.
— O que eu fiz, oras. Dona Bia até confeitou. Já que você não quer, tem quem queira, NÉ, VINI?
Cinco, quatro, três...
— Tá perdoada. Cadê o bolo? Por que ninguém disse que tinha bolo?
Reviro os olhos e tiro o bolo do esconderijo. Estava escrito “Parabéns, coisa, pela conquista!”. De verdade, eu escrevi “coisa”. Foi a única parte do confeitado que dona Bia permitiu que eu fizesse e com muito custo! Ela queria me impedir de escrever “coisa”, insistia que era muito feio. Aí repliquei que o Murilo também era e por isso mesmo dava certo. A mulher só revirou os olhos e me deu as dicas de como não sair tudo torto. É só saber usar o argumento, viu."

Agora já sabem o que esperar :)



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