Mantendo O Equilíbrio - Finale escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 23
Capítulo 22


Notas iniciais do capítulo

Post tarda, mas não falha!
Dpois de umas mil bombas, acho que todo mundo aqui merece um descanso =)
Agora digam isso pra certa peça...

Enjoy.



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Dizem que fazer compras é altamente terapêutico. E como era. Já havia feito meus testes e comprovado isso. Mas uma coisa é sair para umas comprinhas, independente de estar sozinha ou acompanhada, de coisas supérfluas, e outra coisa é sair para comprar as coisas necessárias, acompanhada de um ser que não está muito são para uma conversa civilizada.

Devia ter dispensado meu irmão, me arrependi de ter o levado para o supermercado naquele estado. Fora essa história toda de turbulência em nossas vidas, ainda havia seu trabalho no centro meteorológico. Desde nossa última conversa, na terça-feira, após as confusões e rounds (como passei a chamar), sinto que vem me evitando. Anda estressado também, ouvi várias discussões dele no telefone com os colegas de trabalho, não sei de quem foi o erro.

Me preocupei por sobre quem mais eu poderia ter prejudicado com aquele meu surto. Nada que Vini ou Djane me assumiriam. Mas Vini também estava atolado esses dias, eu tentava não o atrapalhar, era melhor ficar na minha mesmo... Por isso me dedicava a outras coisas pra evitar ficar de bobeira.

Estaria de boa se estivesse sozinha...

Sabe quando a pessoa está de cara amarrada?

Só havia aceitado que Murilo fosse comigo por ter insistido, disse ele que queria ver uns produtos de barbear e isso não era coisa de se colocar na lista de compras para dona Bia, que, aliás, permanecia afastada essa semana, devido a uma gripe forte que contraíra. A gente se virava no que era as responsabilidades de casa, o que descobri ser muito bom para me distrair e me afastar de muitos feels ruins. Só que aí percebi essa manhã que o estoque de nossas coisas estava muito baixo, teria de ir ao supermercado.

Eu quem fiz o almoço, Murilo só lavou e guardou os utensílios após chegar do trabalho. Decerto notei que havia algo de errado com ele, e como não estava para muitas palavras, preferi deixar as coisas como estavam, ele no canto dele, eu no meu. Até que não parecia tão ruim, só talvez bagunçado. Mais ligações ele atendeu, brigou com alguém sobre uns detalhes lá que eu não compreendia. Quando eu fui me saindo, ele me interceptou na sala, perguntando para onde eu ia.

Agora ele tá simplesmente bufando enquanto empurra o carrinho pelas seções de produtos. Se não queria vir, se tinha o que fazer, que tivesse me deixado ali, oras, eu pediria entrega em casa, como dona Bia sempre faz. Mas Murilo dava o braço a torcer? Nãaaao.

Ao chegarmos ao caixa, quase pude dar graças a Deus por estar terminando aquilo. Murilo passava os produtos para a moça que registrava tudo quando me pediu para pegar o detergente que havia ficado para trás no carrinho, ele devia ser empacotado com os outros da parte de limpeza, pois logo mais viriam as frutas e outros alimentos perecíveis, era melhor não misturar. Só que para isso eu tive que me abaixar, e, ok, talvez não do melhor modo eu o fiz, o detergente estava num canto não muito bem acessível para mim. E aí o Murilo pirou.

Não comigo, foi com o carinha bem atrás de mim.

– Hey, para de olhar.

Mal me voltei com o detergente resgatado em mãos, meu mano parecia um bicho querendo passar por cima de mim e chegar no tal cara. Antes de me atentar para o que acontecia ali, só observei a atendente piscar para o empacotador, e este sinalizar para um segurança à porta ali próxima.

– Tu olha mais uma vez e fica cego, tá me ouvindo?

Se eu não tivesse o barrado, seria mais que um dedo na cara do cidadão atrás de mim. Logo dois seguranças apareceram para tomar controle da situação. Um deles direcionou o carinha para outra fila e o outro permaneceu para se certificar que Murilo não tentaria algo mais. Tive que pedir desculpas pelo acontecido aos presentes, tava todo mundo olhando, o supermercado parecia ter parado suas atividades para ver a confusão. Tava me segurando pra não brigar com ele ali!

Fiquei envergonhada, claro.

Que queria com aquilo afinal?

Após pagarmos, tomei o carrinho de volta e o conduzi, calada, assim como ele, até o carro, onde ele tomou as compras e foi colocando no porta-malas. A fúria que tinha consigo era notável por quilômetros, como se pudesse quebrar as coisas. Me revoltei com aquilo. Ralhei.

– Para com isso, coisa. O segurança ainda tá olhando pra cá.

– Se você não tivesse vindo com esse shortinho, quem sabe ele não estaria.

Estava com meu short-saia, e nem era curto assim. Tava o maior calor, ele queria que eu usasse o quê? Ele nem devia estar lá!

– O que isso quer dizer? Que tem a ver?

– Tem a ver que não se abaixa daquele jeito na frente de um cara. Ele te deu uma tamanha checada e você nem percebeu.

Mas que porra era aquela dele furioso comigo? Na terça-feira ele mesmo disse que não queria discutir, agora, após dois poucos dias, ele quer mover mundos e terras por causa de meu short? Não fazia sentido. Tinha algo muito errado, isso era certo.

– E daí que ele olhou?

– E daí nada! Não se olha uma mulher assim na minha presença. Principalmente minha irmã, oras.

– Você tá cuspindo fogo por nada, tu sabe, né?

Ele bate o porta-malas para fechar com certa brusquidão. Aquilo não era comum de meu irmão, eu nem sabia por onde começar de que aquilo não era típico seu. Enérgico tudo bem, mas grosso?

– Só entra no carro, ok?

– Não.

Mantenho-me do outro lado do carro enquanto ele abre a porta do motorista, e, logo que não tem uma resposta “satisfatória”, volta-se para mim com uma raiva maior. Eu podia ver que o segurança que nos acompanhara e permanecia à porta nos observava descaradamente. Enquanto ele devia temer por minha segurança com o bruto do Murilo, eu temia pela sanidade de meu irmão.

– Não vou voltar com você. Não nesse estado.

– Entra no carro, Milena. Agora.

Quase pude rir com ele me dando ordens. Murilo. Me dando ordens.

Até parece que eu ia voltar com ele daquele jeito.

– Pois que fique esperando.

Ele ainda gritou por mais uns minutos, chamava meu nome, enquanto eu caminhava pelo estacionamento e tomava a ala dos pedestres, a caminho da avenida. Se era pra ficar emburrado, que ficasse e se desemburrasse sozinho, oras.

~;~

– Vocês não vão acreditar no que aconteceu comigo!

– Olha, a última vez que me disseram isso ou eu mesma disse, não eram sobre coisas boas. Me DIZ que é coisa boa.

– Ah, bom, acho que é coisa boa sim. Inesperado e coincidente talvez, mas sim... bom.

– Você nunca foi muita boa com suspenses, Dani. Desembucha.

Dani não parava de me convidar de ir a sua casa, até que eu disse que sim, eu iria. Agora de férias, ela oficialmente, para minha “invejinha” – já que professora Silvana só revelaria o resultado de sua prova na terça-feira; apesar de ter ideia que eu passei, quando se trata de Silvana, é melhor ter certeza – Dani me chamava para fazer qualquer coisa, contanto que estivéssemos juntas. Eu havia dispensado o convite de hoje quando me programei de ir ao supermercado e de arrumar umas coisas em casa, mas depois daquela cena embaraçosa com meu irmão, mandei uma mensagem perguntando a ela se o antes combinado estava de pé. Peguei um ônibus, foi bem rápido, era meio da tarde ainda quando toquei a campainha de sua casa.

Sozinhas, passávamos canal e conversávamos, com sorvete e caldas de chocolate, caramelo e pipoca. A primeira coisa, obviamente, em que tocou foi sobre a segunda-feira.

Me repreendeu como devia. Recebi até tapa no ombro.

– Você está melhor? O que foi aquilo tudo, Mi? Nunca pensei que poderia ver aquela cena do Murilo detonando tudo que via pela frente. Você nos assustou, sua chata!

– Eu sei... é que estourou uma história antiga minha e do Murilo. Te contaria se não fosse tão... íntimo e... complicado

Já bastava todos que sabiam, eu procurava nem pensar mais nisso pra evitar algum pânico. A exposição da história de Denise e o maldito caderninho me fazia sentir como uma pessoa nua na rua sem chance nem de um poste me cobrir. Mas, mais que uma vergonha, era uma dor não sarada e que estava tendo de lidar. Isso eu já tinha aceitado.

– Tudo bem, contanto que você não faça aquilo de novo, pra mim tá de boa, garota.

Ainda assim, não queria deixar Daniela tão no escuro sobre o que aconteceu, ela merecia uma mínima explicação. Assim emendei uma parte que posso dizer que era... divulgável. Não era preciso todos os detalhes.

– Acredite, aquilo eu não farei mais... mas, sabe o Eric? O ator?

Ela apontou a colher lambida para mim, atenta ao que eu dizia.

– Aham, o que virou produtor no workshop.

– Lembra que uma vez comentei que ele estudou comigo?

De boca cheia de sorvete, ela tenta amenizar a “gafe” colocando a mão na boca. Se não fosse toda aquela iguaria a gelando, juro que teria um sorrisão estampado ao rosto. Sentadas de qualquer jeito no sofá, estávamos viradas uma para a outra, a tv ligada na nossa frente sem que olhássemos para a programação.

– Ô se lembro, Vinícius quase deu aloca de ciúmes naquele dia em que fomos para o salão de dança!

Rio junto com ela pela lembrança. Aquilo ainda esquentava meu coração.

Antes que suspirasse junto com ela, continuei:

– Você percebeu que, quando Eric subiu ao palco para uma apresentação breve da peça, ele estava mancando?

– Vi! Ele puxava um pouco da perna e o palco era tão grande. Parecia fazer um esforço enorme.

– Então... Murilo fez... aquilo.

Dani para de repente, coloca a colher de volta a taça que serve o sorvete e apenas a segura à altura do peito, chocada pela informação. Era digno de choque mesmo.

– Murilo... o quê? Como assim?

– Ele tinha... como posso dizer? Uma “impressão errada” de Eric. Sempre teve, desde a época da escola. Eu o refreava como dava, sabe como meu irmão pegava absurdamente no meu pé. Não via Eric desde a formatura quando o reencontrei naquele dia, no salão.

Com um ar nostálgico e espivitado, a la ela, não deixa de comentar a respeito. Apesar do clima tenso da conversa, era bom ver que ela me entendia quando não queria permanecer só nesse tom sério. Daniela dava seu jeito de dinamizar a coisa toda.

– Vocês pareciam mesmo que estavam se reencontrando. E uma veia saltou na testa de Vinícius... Como o ciúme pode ser lindo, né? Quando são eles, claro, que estão sentindo. Mas continue...

– Aí que Vini acho que comentou por alto com meu irmão sobre eu ter encontrado Eric. Não demorou muito e eles se encontraram. Murilo e Eric, quer dizer. Lembra que na festa do aniversário da Natália, me ligaram para avisar que meu irmão estava mal? Que os meninos se arranjaram pra me ajudar com Murilo todo quebrado? Pois é, ele se machucou numa briga na confraternização de seu trabalho.

– É, lembro de você ter mencionado a confraternização.

– Eric estava lá, fazia parte de um grupo de artistas que se apresentavam naquela noite. Foi com Murilo que brigou.

Wow.

É, wow mesmo. Um feel ruim quis me pegar por perpassar nesse trecho de minha história, mas tratei de logo esfumá-lo. Uma colherada de sorvete se dissolveu na boca, garantindo-me a glicose necessária para aquilo.

– Meu irmão não teve ferimentos, sofreu só uma distensão muscular basicamente. Mas Eric... ele caiu de mal jeito numa escada.

Dani dá um gritinho surpreso, o que era engraçado. Parecia que eu contava uma história de novela ou filme, surpreendo-a a cada ponto.

– E aí?

– Até eu descobrir isso demorou um pouco. Murilo tentou esconder, só que ele não é nada bom no quesito saber esconder as coisas, sempre deixa algo evidente. Saí fuçando a história, mas as coisas me pareciam sem sentido. Aí um dia eu encontrei Eric numa farmácia, estava tão... debilitado.

– Ele ficou tão horrível assim?

– Não é nem que ele tivesse se machucado tão feio, é que isso o prejudicou bastante. Além de cursar para ser ator, ele é dançarino, lembra? Dançarino quebrado não dança. Ele tava enfaixado e tudo. Mas o que o debilitou mesmo foi a frustação de aquilo ter acabado com vários planos dele, afinal, tinha seus trabalhos. Foi deixando de cuidar de si até que pegou uma gripe forte. O caso é que quando fui cumprimentá-lo... além de ter me tratado um pouco mal, me afastando dele, vazou a informação de que tinha brigado com Murilo e que era melhor não sermos vistos.

– Aaaaah, aí tudo fez sentido! É, realmente... complexo.

– Mais que isso, descobri que Vinícius tava encobrindo meu irmão. E aí foi outro rolo. Por esse tempo todo Eric ficou se recuperando desse machucado. Só que não se cuidava direito, fazia esforço e se machucava de novo no processo, pela ânsia de voltar novamente a pegar o ritmo da dança. Por isso até hoje puxa da perna, não está por completo recuperado.

Negando com a cabeça, minha amiga, mesmo com o que conhecia de mim ou de meu irmão pelas histórias que contava de vez em quando, não consegue reconhecer-nos pelas atitudes. De fato, também demorei a acreditar que isso aconteceu.

– Mal posso acreditar nisso... Não sabia que Murilo poderia ser tão...

– Brutal? É, felizmente ele tem consciência agora e tá melhorando. Eric foi lá em casa na terça e eles se resolveram. Depois de muita briga, claro. Murilo entendeu que a culpa que sempre atribuiu a Eric... bom, não era de Eric. Tinha outros rolos mais, explodiu tanta coisa que todo mundo surtou ao mesmo tempo. Na verdade, a confusão começou mesmo no sábado, no workshop.

– Mas o Murilo nem tava lá!

– É, só que, como eu disse, tinha outras coisas rolando de paralelo. Bombas maiores e mais poderosas. Aquela hora que sumi... foi porque eu tava resolvendo – ou tentando resolver – parte delas.

– Bem que você parecia abatida, achei que você tava se envolvendo demais com aquele rolo de Gui e Flávia até. Foi tudo muito estranho. Mas já tá tudo ok, não tá?

Hesito com um sorrisinho amarelo, me entregando. O que devia ser afirmação sai como uma pergunta. Dani ralha comigo.

– Er.... Não... exatamente?

– Milena!

– Não tá por todo resolvido, digamos assim. Briguei com Murilo na terça, evitei ele, assim como me evitou. Brigamos de novo hoje. Não sei quanto mais iremos brigar. Ambos estamos muito chateados.

Dani deita a cabeça no encosto do sofá com uma carinha fofa para me reanimar.

– Awn, fica assim não... Bota mais calda que resolve.

– Tô quase botando! Mas é assim mesmo, eu tenho minha consciência de que não é das coisas mais fáceis, e me disponho a fazer dar certo agora.

Daí, conversando outras besteira mais, finalmente achamos um filme legal para assistir, estava pela metade, a gente não ligava. Era um de comédia muito sem noção sobre um cara que ia casar e se envolveu sem querer com a prima da noiva. O que tinha de desventuras desenfreadas naquele filme se perdia nas contas, as improbabilidades das situações nos ganham fácil. Já tinha assistido “Louco por Elas” uma vez, só não completo. Acho que não foi dessa vez também que o vi por todo.

Já quase lá pelo final que a tia de Dani chegou e entrou com Bruno. Ele não sacou nada do pulo e das altas risadas que demos na última cena, e eu o acusei de imitar o Gui, que era por sempre o perdido da história e/ou conversas. Nisso, ele se jogou do lado da namorada e veio com essa:

– Ah, Mi, que bom que você tá aqui, tenho uma pra contar que vocês não vão acreditar.

Até parece que ele não gostava de um rolo!

Ele cata umas últimas pipocas que sobraram na bacia e balança as sobrancelhas sugestivamente ao passo que eu e Dani perguntamos juntas “o quê?”.

– Bom, estava eu de boa saindo da loja de um amigo meu quando...

Bruno queria era fazer graça, com grandes pausas. Mas devia saber ele que com Dani isso não funciona muito bem, ela falta te arrancar a história na força bruta. Delicada dessa vez, ela só puxa a bacia de pipoca dele.

– Para de suspense, diz logo!

Ele se delicia, safado.

– Vocês não podem imaginar quem tava se pegando no maior love...

Mais uma vez, eu e Dani nos juntamos para perguntar, animadas:

– Quem-quem-quem?

Bruno me olha enquanto diz e... saca, quando entendo do que se trata, para o descontento de Daniela.

– Djane e... Ah, merda, Lena, tu já sabe, né?

– Ô se sei! Agora tá liberado contar, mas... um segredinho entre nós? Eu e Gui os pegamos algumas vezes... Era muito fofo!

– Quem, gente? Vocês tão de sacanagem comigo!

Me viro para minha amiga e entro no jogo de suspense para atazanar a curiosidade dela só de sacanagem mesmo.

– Digamos que Bart previu errado...

Dani arrisca:

– Não era o Fabiano?

– Nada, eles só são amigos.

– Então QUEM gente?

Bruno olha enviesado para mim e eu para ele. Assinto, e ele revela.

– Professor Carvalho.

Com um brilho nos olhos e uma surpresa-mor, Daniela quase salta, batendo as mãos às bochechas, para nosso riso.

– Nooooo! Mentira! Djane-we-found-love e Renato? Adoro!

E eu adorei que aquele apelido havia pegado!

Aí uma ficha caiu na cabeça dela:

– Espera... Mas pode?

Esclareço:

– Ao que parece não, por isso ele se transferiu. Vai ficar no departamento de Economia a partir de agora.

Bruno, exímio resmungão, não perde a deixa:

– Ah poxa, a Milena já sabe o bafafá todo. Sua sem graça!

E aí Dani que se aproveitou da situação:

– Mas não sabe o meu! Vocês não vão acreditar no que aconteceu terça comigo!

Para seu descontento novamente, um segundo depois a tia dela apareceu na sala, interrompendo-a. Acenou para mim.

– Vai ficar para o jantar, querida?

Já eu, mandei um recado sugestivo para meu amigo.

– Se alguém aqui me deixar em casa mais tarde...

Bruno responde um “tudo bem” com um dar de ombros e a tia de Dani avisa que logo estaria pronto. Assim ficamos jazendo no sofá os três, as caras da preguiça.

– Pediria ao Vini se ele não tivesse tão ocupado... E ao Murilo se a gente não tivesse brigado.

Pra me provocar, Bruno, vulgo perdendo-a-noção-do-perigo, inventa de jogar umas bolinhas de milho não espocado em mim. Relevei pela descontração. Eu precisava dessa dose de malandragem.

– Vocês e suas confusões, Milena.

– Acredita que Renato disse isso na minha cara?

Bruno riu:

– Que você vive em confusão?

– Aham. E que eu sou trambiqueira. Quer dizer, tenho maior cara de uma.

Aí tenta bagunçar comigo e quem toma as dores é a Dani, mas é mais por ela ter sido interrompida quanto a sua história. Ela dá uma tapa na testa dele.

– Você tem mesmo, oras... Ai, Dani... Foi força de expressão.

– Pois é, o tapa também. Vocês não me deixam contar.

Se eu não conhecesse bem a peça e que não andava com meu irmão, poderia dizer que Daniela estava pegando as manias dele. De cruzar os braços e ficar de bico, revoltada. Rio mais e revido jogando milho de volta:

– Pois conte.

~;~

Era uma peripécia daquelas! Ainda sorria do bico de Bruno, ele me levando para casa, todo chateado por saber de umas “encoxadas” que Dani (e eu!) já combateu no ônibus. Mas a história dela não se tratava bem disso.

No dia em que saiu as nossas notas no mural da faculdade, Dani comemorou por ter passado na disciplina que julgava estar pendente. Só que houve um erro na hora de sair as notas e outro listão foi reenviado para os alunos, com um aviso de última que a prova seria na terça-feira. Por isso ela se organizou com os amigos da turma para um grupo de estudos, revisando a matéria um dia antes, que foi o dia da retificação no e-mail da galera.

Nisso que ela me explicou a ligação de Vinícius sobre meu desaparecimento e comentou sobre o que Yuri tinha visto. Seu colega de turma estava a caminho da casa dela, mas teve de passar numa clínica para pegar uns exames que a tia havia lhe pedido, clínica essa que ficava no mesmo local em que eu estava. Embora tenha me visto apenas de longe, desconfiou que era eu e todos ficaram apreensivos pelo detalhe de eu ter entrado num carro estranho. Quando eu disse que era o carro de André, tanto Dani quanto Bruno se espantaram. Dani que não conseguiu ficar quieta, emendou logo suas perguntas:

– Do André? Que você tava fazendo com ELE?

– Era o carro dele, mas quem tava lá era o Sávio. Também não me pergunte qual era de ele estar com o carro daquele idiota, só sei que estava e foi Sávio que me ajudou a escapar para o apê de Iara.

Bruno se indignou um pouco por isso.

– Por que não nos ligou?

Ele já tinha me ajudado em outras ocasiões.

– Porque Gui e Flávia estavam, de certa forma, “corrompidos”. Pelo menos ao meu ver na hora. Achei que Vini ou Murilo podiam ter chegado a vocês. Já Sávio, ele não tinha ideia do que acontecia.

– Tá, acho que posso perdoar por essa.

Revirei os olhos e tornei a jogar pipoca nele.

– Seu bobo.

O que houve de incrível foi no dia da prova mesmo. Como Bruno passou de boa nas suas disciplinas e se ocupou de outras coisas, não iria para a faculdade, Dani não teria carona. Iria com Yuri, mas ele também teve uns imprevistos, chegou atrasado. Assim, de acordo com ela, “uma vez de busão, sempre voltando ao busão”, que ela foi para faculdade.

Foi só no ponto de ônibus que ela notou que tinha esquecido o fone de ouvido. Esperou de boa o transporte, era começo de noite, ela havia aceitado sua realidade. Foi quando fez parada e subiu os degraus que...

– Vocês sabem como eu adoro essas coisas pequenas do dia a dia, né? Coisas que dão aquele ar de surpresa e mimo. De primeira foi isso. Eu entrei no ônibus e o motorista me cumprimentou com o mais lindo sorriso e disse “tá sumiiiiiiiida, hein?”!

– Ele o quê?

A cara de Bruno foi a mais hilária possível, até a tia de Dani gargalhou enquanto a ajudávamos a por a mesa para o jantar. Porque ele simplesmente parou com os pratos ao braço e um ao ar.

– Calma, ele só era um tiozão gente boa.

– Poxa, ainda assim.

Nem preciso indicar que foi ele quem resmungou, indignado, né?

– Isso porque ainda nem cheguei na melhor parte.

Fato. A melhor parte é que, depois de ter agradecido ao cumprimento e lembrança do tio, enquanto Dani se arranjava para se equilibrar dentro do transporte lotado (claro, àquela hora sempre tá lotado), percebeu que a rádio estava tocando. Às vezes a gente consegue pegar uns ônibus com rádio, alguns até com ventilador de teto. Mas garantia de que esse ventilador ventila ou de que a rádio passa umas músicas legais, é outra história.

Só que calhou de Dani identificar a música. Estava um pouco baixa por sempre essas rádios de ônibus terem um grande espaço pra se propagar, então o som nunca se centra, ele espalha. E, bom, conhecemos bem a peça que era essa garota quando se trata de música. Não importa se é chuveiro, se é um ônibus lotado, logo ela tava se mexendo conforme a música e não demorou a cantar.

– Pra vocês não dizerem que eu fico cantando que nem louca por aí, eu comecei baixo, porque né, nunca se sabe quem você encontra num coletivo, mas tava lá, na minha, peguei pelo segundo refrão e...

Trilha indicada/citada: Matchbox Twenty – How Far We’ve Become

(1:30)

Sim, ela mandou brasa! A cobradora logo sorriu quando a viu balançar a cabeça, estavam quase lado a lado, Dani se segurando ao ferro logo acima dela e não se importou com quem mais foi pouco a pouco observando-a. Colhendo mais sorrisos, ela foi se empolgando até chegar ao cume da música do Matchbox Twenty, How Far We’ve Become, com direito a passinhos e pulinhos lá no aperto mesmo. Dali pra frente, no engarrafamento básico de cada dia daquele horário, ela era simplesmente Daniela, animando o coletivo.

– Mi, quis tanto que você estivesse lá! Seria o máximo do máximo!

Ao menos alguém estava feliz enquanto eu enfrentava um dos meus maiores tremores.

Trilha indicadas/citadas: 3 Doors Down – Here Without You

Adele – Rolling In The Deep

Cachorro Grande – Sinceramente

Christina Aguilera – Ain’t No Other Man

Shakira – Rabiosa

De acordo com a figura, ela conseguiu fazer algumas pessoas cantarem a próxima, que foi do 3 Doors Down, aquela romântica, cara de “tem gente com dor de cotovelo aqui” que todo mundo costuma apontar também como a que “o radialista tá apaixonado pela pessoa errada”, “Here Without You”. O clima melhorou foi com “Rolling In The Deep” da Adele e Daniela ainda brincou com o cara ao lado enquanto cantava “Sinceramente”, do Cachorro Grande.

– Sinceramente, você pode se abrir comigo... Honestamente, eu só quero lhe dizer...

Adivinha quem sinceramente não gostou dessa intimidade toda com o moço?

Mas foi com “Ain’t No Other Man” que ela provou sua tamanha voz. Não é pra qualquer um chegar ao tom da Christina Aguilera fácil desse jeito. Ela quase saltou numa parada depois só pra finalizar essa música, mas deu tempo de findar.

– Geeeeeeente, foi tão legal. Saí mandando beijo e tudo!

Um Bruno ciumento tentava não demonstrar.

Pra provocar, soltei essa enquanto o empurrava com graça na mesa antes de nos servirmos:

– Pior se fosse Rabiosa!

Aí que Dani cantarolou aquele iniciozinho “malandreiro” de Rabiosa, da Shakira, emendando com o refrão e, com charme, dançava na cadeira batendo gafo e faca. Se estivéssemos em algum lugar público, como um restaurante, iria apontar para ela e dizer que não conhecia essa louca, mas era bem provável ela me puxar para a bagaça e aí não adiantaria muita coisa. Para a felicidade de Bruno, a tia de Dani disse para ela se comportar perante a mesa e as visitas.

– Ai, tia, até parece que a senhora não sabe que a Milena é das quebradas.

Tá, eu fiquei um pouquinho embaraçada a ponto de querer me esconder atrás do guardanapo de mesa, mas foi mais por Bruno ter me dado uma encarada como que dissesse “viu, olha com quem você foi se meter”. Dani tinha comentado algo com ele essa semana sobre cantar no ônibus, só não havia entrado em detalhes, assim ele se dizia chateado para disfarçar seus ciúmes.

Ele que bem sabia com quem tinha se metido!

Na hora de se despedir, Bruno permanecia em sua postura e aí Dani cantarolou “Sinceramente” de novo, só que misturado com Aguilera, ao que saiu uma coisa estranha que só:

Sinceramente, você pode se abrir comigo... Honestamente, eu só quero te dizer... Ain't no other man, that can stand, up next to you, ain't no other man, on the planet, does what you do (what you do). You're the kinda guy a girl finds, in a blue moon, you got soul, you got class, you got style with your badass, ain't no other man, it's truuuuue. Ain't no other man but you…

Aí ele se sentiu um pouquinho, né? Encheu a bola dele que se eles começaram a se beijar e eu escapuli de entrar no carro, isso claro depois de soltar um “arrumem um quarto”, ao que eles só riram mais e riram foi da minha cara.

Só sei que sem querer eu comentei das “encoxadas” que a gente já tinha levado em situações mais complicadas de transporte público e que aquilo, o fato de ela ainda cantar por aí, deveria ser fichinha para ele. Aí mesmo que ele não gostou de saber.

Tentava me arrancar mais dessa história quando meu celular começou a tocar na bolsa, ouvi meu Ryan ao longe e me aproveitei desse gongo para fugir da conversa. Imaginei que seria Vinícius, e me surpreendi quando vi o nome que piscava na tela. Por um momento quis ignorar, mas se até Bruno parou de falar para não me interromper, o jeito era atender de fato.

– Oi... Não, estou a caminho. Hum... Ok, pode ser naquela lanchonete? Ok.

– Vinícius deu sinal de vida inteligente?

– Não, não era ele. Pode me deixar na...?

– Claro, trambiqueira. E não pense que já esqueci essa história do ônibus!

É, talvez não tivesse tão salva assim.


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Notas finais do capítulo

Gosto de umas partes desse cap, mas esse entusiasmo da Dani (- Nooooo! Mentira! Djane-we-found-love e Renato? Adoro!) é um dos que mais gosto *------*

P.S.: revisava o cap. qnd passava uma matéria sobre polêmicas de encoxadores em transporte público. A coisa pode ser mais séria que mta brincadeira dentro de ônibus...

P.S.2: Maneco ainda me faz gritar pra Tv na hora da novela, principalmente em alguns diálogos.

P.S.3: Teorias, galera? Quem estava ligando? Perto do final, como andam as dúvidas de vcs? Como está a escrita? A história? A torcida? Esses dias dei uma "parida" de capítulos e tá ficando legal (acho, né). Estou me segurando para não soltar spooooooilers para vcs, só por estar doida para postar. Mas calmem, eles virão, aos poucos :)

P.S.4: Trechinho do próximo para animar o fim de post?

"- Você precisa se cuidar, é isso. E dos outros também. E de mim, claro.
Rio e reviro os olhos pelo estado mimoso de Flávia. Estava numa época difícil também, não tão complicada como a minha, mas a la difícil aos seus padrões, entendo como e por quê assim se sente. Ela tem seus direitos – assim como a vaca desgraceira da mãe do Gui tinha o dever de largar do pé dos dois.
Só que não deixo de aporrinhá-la, claro. Quem seria eu se não fizesse isso com as pessoas que gosto?
— Já disse que você tá parecendo o Murilo hoje? Sua boba, claro que cuido de ti. Eu realmente não sei o que faria se não fosse por você."

Bjos,
Alexis.



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