Mantendo O Equilíbrio - Finale escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 169
Capítulo 168


Notas iniciais do capítulo

RESPOSTAS!
Um minuto para o fim do mundo... Brinks!
O capítulo de hoje não tem CMP 22, mas tá bem recheadinho de RESPOSTAS pra dissecar, teorizar, comprovar e compreender. Juntar peças e pessoas.

ENJOY!



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Se eles estivessem esperado mais um pouco, eles estariam aqui, neste cenário improvável, mas confiável.

Antes de dizer qualquer coisa sobre a cadeia complexa da investigação e seus desdobramentos, levanto para levar os copos para a pia. Mas consternados como meus amigos estavam, eles me impedem. Não para me interromper, pelo que entendo ao vê-los se levantarem junto e se moverem para levar seus copos e utensílios à pia. Bruno pega os de Dani e passa, com Iara e Sávio, por mim.

Nesse meio segundo que me apercebo do que estão fazendo, Daniela vem até mim para me abraçar. Inevitavelmente, lembro do que Max uma vez me disse: seus amigos são os melhores quando se trata de você.

Abraço a Dani de volta mais em sinal de agradecimento do que de conforto. Aproveito para tranquilizá-la que tô bem, agora eu tô e que todos vamos ficar bem, mas sei que é complicado internalizar isso diante de algo tão grande e perigoso.

— Eu nunca poderia imaginar algo assim.

— Eu também não. No começo, até não levei tão a sério, mas... coisas foram acontecendo e foi ficando difícil não acreditar.

Minha amiga se desvencilha de mim, seu rosto franzido em preocupação.

— Mas como foi tudo isso? Como tudo isso tá interligado?

— Acho melhor a gente ir para sala se sent...

Me detenho tanto a ela que nem noto o que os outros estão fazendo até o Sávio voltar para a mesa para retirar as migalhas do lanche e passar o pano para limpar. Assim, olho para trás e encontro Bruno e Iara lavando a louça. Ela passando sabão e ele enxaguando. Fico estática... porque era pra colocar as coisas na pia e só.

Ao ver meu espanto com a cena, o Bruno, que estava mais de lado de Iara, ela totalmente de costas para mim, diz:

— Só mais um minuto.

— Gente, não precisava.

Iara, sem se virar de volta, conclui:

— Não precisa precisar.

— Desse jeito, eu choro antes de começar. Vocês...

Sávio ajusta os itens lavados no escorredor ao lado e responde dessa vez:

— Só estamos fazendo o que podemos fazer neste momento.

Num movimento rápido, Iara fecha a torneira, enxuga as mãos e vem para meu lado, para envolver seu braço no meu, o que Daniela também faz, e me levam a passos lentos até de volta ao sofá. Elas se sentam junto a mim no móvel grande, comigo bem ao meio toda comovida, e em poucos segundos os meninos se sentam na mesinha de centro, de frente pra mim.

Acho que só estou estranhando toda essa atenção. Ainda mais quando várias vezes tive que escolher apenas me recolher.

— Vocês podem sentar no outro sofá, vocês sabem, né?

Com essa, o Sávio vai para o braço do sofá, ao lado de Iara, a minha direita. Já Bruno tenta não parecer sério ou preocupado, só responde.

— Estamos bem acomodados e... prontos para te ouvir.

Retiro a almofada de minhas costas para me ajustar melhor no meu espaço. Também deixo a perna em cima da mesinha ao lado de meu amigo. Uso esse tempo para pensar em como começar. De qualquer forma, hesito.

— Acho que... Eu só peço que o que dissermos aqui fique entre nós. Confio em vocês para isso.

Ao assentirem, complemento:

— E por favor, por favor, não... Não procurem a Flávia ou o... Não por isso.

Bruno olha de mim para o Sávio, os dois sem uma expressão clara. Iara intervém:

— Não pensa nisso agora, Mi.

Bruno acaba por reverberar isso, sem me olhar diretamente.

— É, não pensa nisso não.

Amasso um lábio no outro e assinto, mais pronta para iniciar.

— Tá. Acho que... para a gente entender melhor as conexões entre os acontecimentos, precisamos voltar ao começo... De tudo. Até mesmo para ficar todo mundo na mesma página. Isso significa que... Sávio, essa parte é com você. Quer dizer, a sua história com o André.

Fica claro o estado vacilante de meu amigo de tocar nesse ponto, principalmente quando pende sua cabeça e inspira devagar, mas ele me surpreende ao levantar o rosto e se mostrar disposto a falar.

 - Tudo bem. A-acho que... Vai ser bom falar sobre isso.

Bruno já sabia em parte o que o Sávio viveu nas mãos do Hermani, vez que eu e ele já tínhamos tentado intervir um tempo atrás quando André voltou à cidade para buscar uns documentos. Da nossa roda, apenas a Daniela estava por fora. Ou não tanto, vez que ela descobriu através do Yuri alguns desses fatos recentemente.

Então Sávio conta o que nunca teve oportunidade, não dessa forma aberta e segura, de como foi chegar na cidade, o porquê de sua mudança (a morte do pai) e que usou a transferência de trabalho para vir morar com o tio e terminar os estudos. Conta dessa relação, dos poucos familiares que ainda dispõe, de como seu tio o acolheu e que por isso se meteu em uma briga dele com outro mecânico. Que o tio teve equipamentos roubados. Só que quando o Sávio tentou recuperar, se meteu em uma encrenca maior. Estava no lugar errado, na hora errada e fazendo a coisa errada.

Porque houve uma confusão na oficina desse tal mecânico com o André, que, é claro, estava acompanhado de outros caras. Alguém chamou a polícia e o Sávio foi levado junto. Na delegacia, enquanto tentava ligar para o tio, André viu a oportunidade de levar mais um cidadão para seus esquemas. Sem dinheiro para a fiança, Sávio aceitou a proposta de André, sem saber também onde estava se metendo.

Não muito tempo depois e totalmente ao acaso, eles se reencontraram na faculdade no primeiro dia de aula e no primeiro dia de verdadeiro tormento, como diz. Sávio até menciona um problema que André teve em sala com a professora Silvana, obrigando-o a fazer um trabalho extra. Meu amigo fez vários trabalhos acadêmicos para o Hermani, sempre se preocupando em não cometer plágio com seus próprios exercícios e se desdobrando pra cumprir, se não ia perder o auxílio jurídico no caso da invasão à oficina.

Conforme o semestre foi passando, as coisas só vieram a piorar, com mais exigências e mais punições também, como aquele seu suposto assalto.

Ainda que essa seja uma parte bem pesada de se falar e de se assumir, admiro o Sávio em cada coisa que diz, porque agora ele também diz. É claro que seus modos inquietantes se apresentam junto, com ele agitado ao se expressar, mudando de posição o tempo todo e às vezes se atropelando nas palavras, com a Iara apertando suas mãos em apoio, mas determinado, confiante.

Talvez parte de suas reservas com nosso grupo de amigos se tratasse disso, os receios por sua relação complexa com André, fato impeditivo para se conectar de verdade conosco. Pondo todas as cartas na mesa, a coisa toda muda de figura.

Dani, por exemplo, embora seja uma nova ouvinte, fica quieta, quase imóvel, mas a sinto apreensiva ao meu lado pelo que vai se sucedendo. Sei também que isso lhe toca num ponto sensível, por tudo o que viveu nos últimos meses e como se comportou, pro bem e pro mal.

Estar ao meio deles, e tendo visto vários de seus extremos, me faz lembrar de imediato de minha avó e de nossa despedida, de quando se referenciou às pessoas bem acolhedoras que eu e o Murilo havíamos achado, um grupo de muita abertura e que se é difícil de achar. Tenho certeza que ela diria o mesmo desta roda improvisada e do motivo dela. Nas palavras da própria: senti que o grupo de pessoas que reunimos tinha uma conexão forte para isso.

Nós temos mesmo essa conexão forte.

Do que o Sávio relata, ora e outra complemento alguma coisa. É assim que relembro o caso da viagem, agora tão distante e com mais sentido, embora confusa do mesmo jeito. Tudo é muito confuso, isso sim. Mas já conseguimos articular algo a respeito e como isso nos atingiu em cheio.

Perpassamos rapidamente ainda pelo término da Flávia com o Gui só para situar a fase em que o Sávio se aproximou da Iara e foram cultivando algo mais. Não queria que a história deles tivesse que ser contada assim, mas acho que posso dizer que foi uma das poucas coisas boas que surgiu nessa bagunça infinita.

A Iara também se manifesta de maneira breve sobre um caso de sua vida pessoal, quando recebeu uma notícia ruim e deu uma fugida do apartamento. Nesse ponto, explico que Filipe pediu minha ajuda, preocupado. No final das contas, ela foi procurar pelo Sávio na faculdade e foi lá que, em meio aos seus conflitos, eles se beijaram pela primeira vez.

Que foi isso que o Gui viu e se o seu desafeto por Sávio já era algo considerável, ali mesmo declarou ódio. Isso porque Aguinaldo já tinha descoberto com o próprio sobre o beijo que me roubou na viagem. Se já tinha partido para a violência com essa, nossa preocupação era de acontecer de novo. Com a Iara então no fogo cruzado, o Sávio pediu um encontro comigo para esclarecer as respostas que tanto guardava, só para não perder ela.

Foi decepcionante, claro, mas se tratando da I, me envolvi outra vez na confusão. Que foi também quando revelei para os outros sobre a viagem e nosso grupo ter se partido porque resolvi dar uma chance ao Sávio.

Só que não fui só eu. O Bruno também deu uma chance.

Não foi muito depois que encontramos o Sávio nervoso na porta da faculdade. O Bruno já tinha compartilhado umas coisas comigo, o que me fez sentir menos sozinha ao grupo – que não me compreendia e me taxava de louca – e por essa ocasião no estacionamento, matamos aula para podermos fazer algo. Fomos parar na oficina do tio de Sávio e ouvir mais de sua desgraça, que envolvia algum tipo de crime organizado do André e ameaças constantes de ferir aos nossos amigos, nos abateu num lugar delicado. Mas foi algo determinante para eu o perdoar.

Parece até que eu estava lá naquela oficina de novo, abraçando ele e chorando, horrorizada, dizendo-lhe que enfim o entendia e perdoava. Acho que o Bruno sente o mesmo, pois se exalta:

— Cara, você devia ter denunciado isso. De alguma maneira, sei lá.

E Sávio entrega outro ponto importante, que deixa o Bruno boquiaberto:

— Acontece que... eu falei com a polícia.

Eu, por outro lado, emendo:

— Eu nunca soube como você chegou no... você-sabe-quem.

Em algum momento teríamos que falar de Max, mas como esse pedaço da história é do Sávio, fico incerta de tomar sua vez e voz. Só que o Bruno, ainda estarrecido, pergunta:

— QUEM?

Eu me calo e sinto que o Sávio fica um pouco vacilante, também muito inerte. Sei que nem o Bruno, nem a Dani compreenderam mesmo de quem se tratava, mas aí lembro que me propus a isso e que tá tudo bem. Vamos ficar bem. Vamos ficar melhor ainda ao estarmos na mesma página. Esse era o objetivo, certo?

Vez que o Sávio se abstém mesmo, eu digo:

— Vocês vão entender, porque ainda temos mais coisas para falar.

Se falar de Max era complicado, imagina ter que resgatar o fato da Daniela maltratar o Sávio. Nesta roda, ela é a mais quieta, mais do que o Sávio em todos o tempo que o conheci. Em muitos momentos dessa conversa, ela se moveu desconfortável no sofá. Logo que menciono o fato, Dani se encolhe abraçando as pernas ao corpo, a cabeça virada para a televisão desligada e a expressão vaga.

Bruno também parece se desconectar quando trago a parte de ele ter ficado mal com esses comportamentos da namorada, de como passou a julgar a si mesmo pelo que havia feito, besteiras tão grandes quanto as de Sávio. Ele ficou tão mexido com isso que resolveu revelar a todos sobre a merda que fez na viagem, o que terminou por partir nosso grupo de vez. Tempos complicados.

No entanto, havia um motivo para trazer isso à tona, assim como o pé de guerra que vivi com Aguinaldo, de brigas intensas a reconciliações que não duravam quase nada.

Assim finalmente chego a ele, Max.

Com cautela, explico que o “professor” Max passou a se aproximar de mim fora das aulas e a provocar o Gui de maneira declarada em classe. Aos outros, isso não passava de uma brincadeira, porque o Max era esse tipinho gentil que disfarçava. Só que isso começou a me incomodar de verdade e eu quase fui na diretoria reclamar. Meu conflito era de que, como se tratava do Gui, quem deveria fazer isso era ele.

Não muito tempo depois, percebi umas investidas estranhas desse “professor”. Uma inclusive me deixou tão desconfortável que fui bater na porta de Fabiano. E o diretor me pediu 24h para não falar com ninguém sobre isso porque ele iria resolver. A resolução, no caso, foi conversada entre ele, Djane e o dito cujo, e se revelou no dia seguinte, com os três me incluindo como testemunha na investigação desde que eu mantivesse o bico calado e fosse colaborativa.

Achei eu que estivesse sendo bem explicativa até que Bruno me interrompe:

— Pera, peraí. O que o professor Max...? O que ele tava fazendo?

Assim, esclareço enfim outra grande peça desse quebra-cabeça:

— O Max... Ele é um dos investigadores e se passou por professor para ter mais contato com os alunos.

Enquanto Bruno puxa os próprios cabelos pra cima, desacreditado, Daniela se expressa pela primeira vez nesta longa conversa:

— Investigação... de drogas?!

Mordo o lábio, hesitante, porque sobre isso eu não tenho muito o que dizer.

— Eu não sei. Até hoje eu não sei. Mas acho que não se trata disso, principalmente pelas coisas que o Sávio chegou a ver com o André. Só não tenho mesmo como afirmar.

A ficha cai para o Bruno nesse segundo, aterrorado, que deixa Daniela mais apavorada:

— Cara. A blitz... As drogas que procuraram no bolo. CARA!

— Como assim procuraram drogas no bolo? QUE BOLO, GENTE?

Coço a cabeça, atarantada.

— É que no aniversário do Sávio, a gente preparou uma festinha surpresa. Na avenida, saindo da faculdade, fomos parados numa blitz e pediram para a gente descer do carro. Acontece que, por conta de uma brincadeira infeliz que fizemos, fomos todos pra delegacia. Quer dizer, eu, o Bruno e o Sávio, porque só nós fomos parados.

Quando dou por mim, explicando toda a treta, o Sávio aparece com copos de água para a Dani e o Bruno, que aceitam de pronto. Ao trazer um pra mim também, vejo como está inquieto, agitado, e acho que ficar de pé era seu modo de dispersar a tensão. Agradeço a gentileza e beberico um pouco, assim como os outros dois. Já Iara, ela levanta para ficar perto do namorado.

E eu continuo.

— Na hora de falar com o delegado.... e explicar sobre a festa, os presentes, o plano, tudo... mostrei também os cupcakes que eu tinha feito e tinha outro bolo no carro. Enfim, o delegado mandou analisar, verificar se tinha drogas. E sim, foi horrível. Tivemos que esperar um tempão para nos liberarem. E é claro que também fiquei com isso em mente, drogas e a operação, pensar em conexões. O Max até me falou que não tinha a ver, mas eu não sei se ele tava tentando tapar o sol com a peneira.

Você tratava da operação diretamente com ele?!

Bruno quase cospe a água que bebia ao se expressar assim, alarmado.

Me desencosto do sofá para ficar mais próxima dele e poder falar com mais liberdade. Ainda assim, é uma sensação estranha despejar tudo isso, toda essa loucura, que ora me encolho demais, ora só sobra meus ombros arriados, quase derrotados. Tento ao menos me concentrar na água ao meu copo, se movendo junto comigo, porque olhar para qualquer outro nesta sala está ficando uma coisa difícil de se fazer.

— Muitas vezes... sim. No começo nem tanto, porque eu tive dificuldades de acreditar... e também de colaborar. Porque me pedir isso, de deliberadamente mentir pra vocês, meus amigos, e pra minha família, isso se tornou algo pesado. Ainda mais que eu vinha de um processo de quebra de mentiras, como vocês sabem.

Tomo um novo gole pra me ajudar a contar mais essa parte difícil. A ironia é que agora forço a água de entrar enquanto me retenho ao máximo não deixar meus olhos liberarem qualquer líquido salgado.

— Isso acabou sendo tão tão complicado que até discuti com o Murilo. Vê-lo machucado por algo que ele sabia que eu tava escondendo foi, tipo, a gota d’água para TUDO transbordar. Eu tive que contar. E tive que contar o porquê de o Max estar me rondando: havia pessoas amigas envolvidas. Como... o Aguinaldo.

Nesse ponto, Bruno levanta num átimo, transtornado.

— CA-RAM-BA. E o professor... quer dizer, Max, MAX pegando no pé dele. Ele vivia reclamando disso entre a gente.

— Ele quase foi bater na porta de Fabiano por isso. De verdade. Eu fazia o que dava, até mesmo perturbar o próprio Max pra defender o Gui. Foram inúmeros embates nossos. Muitos mesmo. Mas então... teve uma situação que me fez parar.

— Que situação?

Bruno e Sávio perguntam isso tão juntos que até fico desconcertada, embora não devesse. Foca no objetivo, Milena, foca no objetivo e só!

— Eu presenciei uma conversa estranha no banheiro feminino, ali no pavimento das nossas salas, e tive que fingir um mal-estar para poder alertar tanto Djane quanto Max.

Daniela demostra que distante não está, pois lembra do dia.

— O dia do enjoo.

— É, o dia do enjoo. Apesar de estar fingindo, no fundo fiquei tão surtada, que nem conseguia pensar direito. Ainda assim, tive que agir e com cuidado, muito cuidado.

— Mas o que foi que falaram lá no banheiro?

É Iara quem puxa essa e tenho a impressão que ela se lembra de um dia no trabalho que o Gui fofocou que eu tinha passado mal e tava “verde”. Os dois não sossegaram até que eu fosse pra casa.

— Falaram que tinham que se reunir em outro local porque o diretor havia instalado novas câmeras, algo assim. Daí foi um pulo pra esse ser meu primeiro depoimento. Só que ao mesmo tempo que essa realidade bateu, me veio essa coisa toda de mentir, que tava pesando real pra mim e tive que fazer algo a respeito com o que tinha.

Dessa vez, é o Sávio quem questiona, assustado:

— O que você fez?

Meio que dou de ombros, porque foi algo arriscado de se fazer, porém, foi o que tive de fazer ao momento.

— Eu tinha informações e tinha um pedido, usei isso para barganhar. Porque de repente o Max tava aqui na minha casa para colher o que eu ouvi e o Vinícius apareceu também e eu não tive condições em mim para mentir pra ele... ou pro Murilo. Que eram pessoas que sequer pisavam na faculdade. Mas eu precisava da ciência e da autorização do Max; ou isso, ou sem depoimento.

De pé, Sávio fica um tanto perplexo com essa. Por alguma razão, eu achava que ele sabia mais ou menos disso por conta de Iara; ao que parece, não. Já nem sei o que dizer sobre o Bruno ou a Daniela também, recebendo tudo isso de uma vez.

Quero aproveitar esse tópico pra perguntar como foi que o Sávio descobriu de Max, porém, quando vem um incômodo abaixo do ventre, seguido de um fio de dor que se torna intensa em segundos, deixo isso para logo mais. Até mesmo para cada um digerir ou arejar depois de tanto vômito trágico.

— Gente, podemos fazer uma pausa rápida? Tenho que tomar um remédio.

Novamente puxando os cabelos e de vistas vagas, Bruno me dá espaço para passar.

— Vai lá que... Acho que também vou... tomar um pouco mais de água.

Ele passa batido pelo Sávio que é outro que aparenta estar um pouco distante, pensativo, e é sondado pela Iara. Ouço um pouco da conversa baixa deles, em que diz estar bem, só foi mesmo uma surpresa, mais uma no meio de tantas.

Sigo para meu quarto pra pegar o remédio de cólica e antes que eu volte, a Iara se materializa na minha porta com o meu copo cheio. Tomo o comprimido e agradeço a gentileza. Pra todo caso, vou no banheiro, só pra checar se precisava de uma nova troca e jogar uma água no rosto, que, por mais que eu esteja lidando com calma, sinto-o um pouco quente. Foram, afinal, tantos meses queimando o cérebro com isso.

Ao me olhar no espelho e molhar de fato a face que percebo outra coisa mais. Realmente, neste cenário insano, estou forte. Ao contrário de tudo o que pensei esse tempo todo, tenho força nas pernas e força no espírito. Tenho grande suporte das famílias e amigos. É por eles também que tenho que seguir em frente nesta louca jornada. Que, graças, GRAÇAS, graças, está acabando.

 

~;~

 

De volta à sala, e independente da cólica, me sinto mais disposta para continuar. A dor incomoda um pouco, porém, não é nada perto disso que tenho na minha frente. Bruno está no sofá grande, no espaço que eu estava sentada, em uma bolha de conversa baixa com Daniela. Assim que Iara me vê, acena pro Sávio na cozinha.

Me bate outra lembrança, dessa vez de uma conversa com o Murilo sobre minha agonia de querer falar e não poder.

— Sinto como se estivesse num teste e falhando miseravelmente, porque por mais que eu opte não mentir, isso é tão grande que eu nem tenho chance de escolha, eu só tenho que... mentir. E tudo pelo que batalhei pode ou vai vazar no ralo. Quer dizer, quem vai acreditar em mim depois dessa?

— Eu. Eu vou acreditar.

— É sério, Mu.

— Eu sou tapado desde sempre, caio fácil.

— Não tá me fazendo sentir melhor.

— Lena, é diferente agora.

Fecho os olhos, intuindo isso. Que é diferente agora.

— E você tá deixando bem claro que não tá mentindo porque é de alguma vontade sua, mas por esse “rolo todo” que tem te feito mentir. Se eles são seus amigos mesmo, eles vão entender. Além disso, se fosse possível, você faria um acordo com o tal Max pra abrir o jogo com eles. Eu sei que sim. Até tentou pelo Aguinaldo não foi? Mas conseguiu um pra abrir pra mim, pra Djane e pro Vini. Lena, é isso que é importante.

Até o Murilo, que é o Murilo, estava tranquilo de me dizer isso.

— Lena, vai por mim. Você não vai perder ninguém.

— Tudo bem, Mi?

Abro os olhos de imediato com o chamado de Iara e faço que sim com a cabeça. Porque eles vão entender. Por mais que seja uma teia cansativa e perturbadora de histórias, estamos aqui para entender e nos reencontrar. Batalhei por isso e não vou largar de mão até chegar todo mundo no mesmo ponto.

 Com um novo fôlego, me sento ao lado de Bruno, que agora está no centro do grande sofá, com Daniela no seu mesmo espaço. Iara se senta numa cadeira que alcança da mesa de estudos ao lado e Sávio pega outra para si. Eram suas maneiras de não sair de perto, por mais que o outro sofá não estivesse tão longe assim.

— Onde a gente tava?

Sávio responde essa:

— Você barganhando com o Max.

— Ah, verdade. Tem hora que não me orgulho disso e tem hora que me orgulho demais disso. Mas pensando bem agora... valeu a pena. Se eu pudesse, teria pedido um acordo para deixar vocês a par também. Só que o Max tava bem limitado e eu não tava facilitando pra ele.

— Tendo conseguido ou não, você fez algo grande, pode ter certeza. Eu mesmo não tive essa audácia. Não sei se conseguiria aguentar a pressão.

— Como foi que você descobriu sobre Max, afinal?

— Eu tava num evento com o ex-advogado do André, que era um dos poucos caras legais daquele antro de dívidas e horrores, e ele reconheceu o Max. Inclusive, cumprimentou Max bem na minha frente, chamando-o de oficial e comentou sobre alguns casos que eles já tiveram que lidar. Se eu não sabia o que dizer, imagina o próprio.

— Espera, foi um evento que reuniu oficiais da polícia, marinha e afins?

— Não, foi um bem aleatório mesmo.

— Ah. Meio que aconteceu comigo também. Fui num evento dos oficiais, do amigo do Vinícius, e encontrei Max por lá. Foi bem esquisito. Não achei que ele era um dos oficiais, só um acompanhante para prestigiar e tal, como eu estava. Teve até uma brincadeira de encher os carros dos policiais com papel higiênico e...

— Esperaí, eu lembro disso. Do Max puxar rolos e rolos do carro dele no estacionamento da faculdade.

Bruno soa um pouco desorientado e assinto para ele.

— É, liguei os pontos depois.

Com um suspiro cansado, ele resmunga:

— Tava tão na nossa cara pelo jeito.

— E não tinha como saber. Porque na verdade não era pra ninguém saber. Não além de Fabiano e Djane e... os outros.

— Que outros?

— Não só Max estava trabalhando disfarçado. Desses a gente nunca fui atrás de saber e acho até melhor. Já tínhamos muita coisa na cabeça.

Num novo suspiro cansado, eu dou de ombro com ele.

— Tá tudo bem, cara. Agora tá. Ou pelo menos se encaminhando pra isso.

— É, acho que sim. Eu só não acredito que você passou por tudo isso, carregou tanto, e muitas vezes teve que lidar com essa loucura toda sozinha.

Sávio irrompe com seriedade:

— Ei, ela não tava. Eu tava cuidando dela também.

Chateado com tudo isso, Bruno explica mais do que quer dizer:

— Você entendeu. Eu só queria ter feito algo junto. Algo algo, sabe?

Sávio o complementa:

— E você fez. Só não sabia que fazia.

— É... Mas a impotência... A impotência é apenas uma merda.

Assinto, concordando tanto com Sávio quanto com o Bruno.

— É uma grande merda mesmo. Não poder dividir isso... Matava a gente, sério. A gente descobriu que o outro sabia dessa operação bem por acaso. Inclusive, foi numa conversa minha com a Iara, bem ao aleatório no trabalho, e isso... Acho que isso deu uma força bem grande pra gente. Quer dizer, foi muito bom por estar pelo Sávio e ele por mim. Mas também não descartamos o seu suporte, mesmo que de nada soubesse. A situação fez acontecer assim.

— É, só nos restava fazer o que dava mesmo, dentro de nossos limites.

Para surpresa de nossa roda, Daniela levanta a cabeça e diz, com bastante calma:

— Na verdade, vocês fizeram muito, muito mais do que qualquer um de nós poderia imaginar. E você, Sávio, fez muito mais do que podia. Você cuidou de todos nós. Bem antes de nosso mundo desabar. Você escolheu isso sem hesitar.

Desconsertado, Sávio anui:

— É, a-acho que sim.

E a Daniela continua, enquanto solta as pernas e o próprio corpo, e se ajusta no seu lugar como quem vai levantar.

— Eu tenho a certeza disso agora, e infelizmente só agora. Eu não tenho como te agradecer por tanto, mas tenho que dizer sim obrigada.

Dani calça as chinelas, se põe de pé e, para que eu não tivesse que puxar minha perna da mesinha, dá a volta para se colocar frente a frente com o Sávio, que mal consegue se mexer quando ela pega em sua mão.

Piscando de maneira intensa, ela toma um fôlego.

 - Obrigada por t-tudo isso, Sávio. Muito muito muito obrigada mesmo. E... E m-me... Me desculpe por todas as merdas que fiz com você.

Igualmente afetado, Sávio quase não fala, só sai um fio de voz:

— T-tudo bem, você não sabia.

Daniela então puxa a mão dele que segurava para que levante. Sem jeito, Sávio fica de pé. Sem soltar-lhe, ela suspende o rosto, pela diferença de altura entre eles, e, com mais determinação, diz:

— Não tá tudo bem não, porque eu sei o quanto extrapolei com você. Não foi uma... ou duas vezes. Foram várias. Me desculpa de verdade... Me perdoa. Eu não fui nem gente com você. Gritei, empurrei, eu... Meu Deus, nem eu entendo como pude fazer tanta coisa ruim... Ou ser tão ruim.

Antes que o Sávio possa dizer algo, Daniela o abraça.

— Me perdoa, Sávio. Me perdoa.

Se antes eu fazia esforço de segurar as lágrimas, agora deixo-as livres. Ver o abraço emocionado desses dois me dá um alívio e uma grande alegria que não sei como expressar se não deixando a água descer pelo rosto. Nem tento tapar ou enxugar. Só aceito o braço do Bruno, também comovido, e fico quieta, só assistindo essa reconciliação que por tanto tempo esperei. Que também era um dos objetivos desse encontro, afinal. Ver a Daniela e o Sávio sem mais agressividades envolvidas. Que a compreensão batesse. Que a verdade chegasse a todos.

Iara também cola em mim e sei que está sentindo algo parecido. Ela foi a primeira de todos nós a acolher o Sávio em todos os seus segredos e viveu a dor junto dele. Como uma vez me disse, Sávio nos preza demais. E como Daniela acabou de dizer, ele cuidou de nós e sem hesitar.

— Obrigado por isso, o-obrigado por dizer isso. Eu sempre só quis... Não podia deixar que ele machucasse vocês. Não vocês.

— E eu te machuquei por isso.

Uma coisa é ver o quanto um aperta ao outro, outra coisa é ouvir o choro de cada um. Meio que nos quebra e nos junta de novo.

— Você não sabia. N-ninguém sabia.

Daniela então se desvencilha dele, só o bastante para poder esticar a cabeça em sua direção:

— Me perdoa?

Sávio assente, mas Daniela quer algo mais.

— De verdade?

— Sim.

Abraço eu a Iara e o Bruno por essa conquista que antes parecia impossível e agora não só era possível como se realizou perante nossas embaçadas vistas. Assim que Dani olha para trás, para como nós três estávamos, ela se dirige à Iara, a puxa pela mão e a abraça. Ouço baixinho Dani se desculpar pelas besteiras que fez. Quando dou por mim, o Bruno também tá lá dividindo um abraço com o Sávio. Em meio a todas essas demonstrações, me levanto e fico entre eles, muito grata por eles também não terem perdido uns aos outros.

— Gente, eu amo vocês.

Com isso fui engolida por eles. Dani me puxou para o abraço junto de Iara, e logo mais senti os braços dos meninos, todo mundo rindo e chorando ao mesmo tempo.

Porque era isso: ninguém ia perder ninguém.


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Notas finais do capítulo

"Seus amigos são os melhores quando se trata de você."
"Um grupo de pessoas com uma conexão forte para isso".
O PERDÃO E A RECONCILIAÇÃO DA DANIELA COM O SÁVIO!
E o quebra-cabeças sendo remontado.
Foi bem como o Murilo disse: é diferente agora *assoa o nariz, emocionada*

Trechinho do próximo?
"- Os detalhes são importantes. Cada um tem um detalhe válido para acrescentar, mesmo que não saiba. "




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