Facção. Dos. Perdedores escrita por jonny gat


Capítulo 55
Quando o mundo parou de fazer sentido e Mario morreu.




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E Frota decidiu então rever os seus passos para que tivesse algo a fazer. Normalmente seguia o que seu amigo Robin fazia, mas dessa vez esse estava distante demais: teria que escolher uma ocupação por si mesmo. Nada melhor do que rever as coisas que esteve fazendo nos últimos tempos e ver se não havia se esquecido de algum problema que deixara para resolver mais tarde e acabara por se esquecendo. Apesar de apenas fazê-lo por ter chegado ao cúmulo do tédio onde tudo é melhor do que prosseguir entediado, o jovem já sabia que não existiam problemas em situações como as descritas anteriormente. Andou um pouco mais pelas ruas e percebeu que havia realmente um: Mario, o seu velho amigo. Antes que o mesmo partisse, após uma árdua batalha enquanto a Okami Kenon era confeccionada por um dos maiores gênios da humanidade, pediu para que Frota usasse a luva para derrotar seu pai.

Mas quem era o pai de Mario? Havia milhares de pessoas no mundo. Era como procurar uma agulha em um palheiro, e tinha certeza que essa perseguição seria muito difícil. Não poderia sair por aí sem sequer ter uma ideia de por onde começar. Pela descrição do viajante do tempo, o homem era de certo bastante mal a ponto de acabar com a humanidade. Mas então Frota pensou: Será que é mesmo o objetivo de Mario? Restaurar a paz da humanidade futura? Uma pessoa que tem em mãos o poder de intervir no tempo e no espaço provavelmente pensaria em poder mexer as pecinhas e criar do mundo futuro o seu próprio reino. Frota negou. Claro que Mario não era assim, e se enganou.

Mario era sim um homem mau, que enganava os amigos que fazia durante suas jornadas dizendo que viajava no tempo e estava quando estava para restaurar uma paz falsa. Frota não fora o primeiro a cair no papo do viajante do tempo, e provavelmente foram já muitos. Mario vivera sozinho e aprendera a comunicar-se apenas consigo mesmo, muito pouco com os seus vizinhos de casa que mais tarde descobriu serem apenas parte de uma programação. Consigo Mario não havia necessidade de mentir e era completamente sincero. Foi quando veio à tona a notícia de que seu mundo durante toda a sua infância e grande parte da adolescência era uma completa mentira, o viajante no tempo percebeu uma grande verdade: Não existem mentiras. No contexto em que vivia, poderia muito bem viver setenta anos naquela simulação e nunca perceberia que estava sendo enganado. Porque seus olhos estavam vendados, e não sabia disso: já nascera vendado.

Nos filmes de ficção científica é muito comum ver o viajante no tempo como um salvador da humanidade que busca pela prosperidade de seu “tempo natal”, e para isso junta as peças para que o regime autoritário de seu tempo nunca exista e nunca tenha existido. Todos já viram esse filme, e Frota estava exatamente nele.

Mario descobriu que não havia mentira e nem verdade. A realidade poderia ser vista de várias formas, e se alguém aceitasse um ponto de vista diferente do seu, isso não dizia que aquela pessoa de olhar diferenciado estava vendo um mundo mentiroso. Muito menos era um alienado. Para Mario, tudo dependia de como eram os óculos que filtravam a realidade para os olhos do ser humano. E não havia homem com melhor perspicácia antropológica do que o próprio Mario. Durante suas experiências, viajando durante seis anos de sua vida alheiamente à história do universo, entendeu diversos processos históricos a partir de seu próprio ponto de vista. E isso queria dizer que seu ponto de vista, por ter vivenciado todos esses fatos, eram verdadeiros ou mentirosos? Não necessariamente. Frota caíra exatamente no papo furado de Mario porque esse não mostrava nenhuma pista de que era mentiroso.

Melhor, Mario não estava mentindo, e sabia disso. Apenas estava mexendo novamente as pecinhas do quebra-cabeça para que no final conseguisse a figura que necessitava para fazer do mundo o seu local de verdade. Mario apenas teve certeza que estava ali para dominar a humanidade quando descobriu que havia realmente um local no mundo que era idêntico a sua casa. E então pensou: Talvez lá esteja meu pai.

Pinball Wizard realmente existia, e suas lembranças da simulação batiam exatamente como era na realidade. Pequenas casas, alguns esquimós, um vento que esfriava até o mais bravio dos homens e um deserto de água congelada. Não precisou caminhar muito para perceber que os tuglianos não o tinham inserido numa encenação de uma realidade sem outras intenções. Estava tudo ligado ao contexto, e foi esse contexto que pesquisou nos três meses que prosseguiu por ali. Vivendo uma vida pacata em meio aos esquimós em uma sociedade morta politicamente por conta do frio que arrebentava qualquer necessidade do ser humano se expressar. Revoluções não estouravam e nada se alterou. Era tempo de grande urbanização e comercialização nas nações, e percebeu: isso não é uma nação. É apenas um grande aglomerado de pessoas que vivem o mais simplesmente possível. Dir-lhe-ei o que é sociedade e provavelmente muitos se assustarão, citarei a cidadania e terão seus olhos um brilho de esperança. Mas tudo isso morrerá com o frio, não há homem que possa se expandir com um clima tão extremo como esse.

O jovem enfim percebeu: não vivera naquela encenação de realidade à toa. Os alienígenas já contavam com a falha na segurança interna na simulação e já pensavam que um dia Mario poderia pressioná-los para que fosse dada tecnologia para que se vingasse das mentiras que teve que passar, colocando em risco toda a pesquisa por julgar-se valioso com certeza e blefando que se mataria caso não o desse o que fora requestado. Se Mario seguisse a lógica de que Pinball Wizard tinha tudo a ver com o seu pai segundo o pretexto de que a simulação era a encenação desse ambiente, morreria sem que nenhum de seus objetivos fosse completado com êxito. Foi então que percebeu: perdera cinco meses, e logo em seguida voltou para a ativa.

Foi então que percebeu que procurar seu pai era o mesmo que Frota acabou de pensar: impossível. Existem, existiram e existirão muitas pessoas no mundo. Mario não tinha nenhuma informação que diferenciasse seu pai dos outros. E foi quando começou a ter as loucas ideias de que o mundo devia ser o local, que devia ser o grande líder da humanidade. Óbvio que esse novo ideal fugia completamente do conceito inicial, mas julgar um viajante do tempo por sua sanidade não é o mais ideal. Mesmo ainda recente no ramo, Mario já havia visto muitas coisas. E foi quando começou a lidar com o planejamento das linhas do tempo para que se tornasse o grande dominador que realmente enlouqueceu. Se nem mesmo grandes sábios acadêmicos da Academia dos Sapos da Ilha do Norte conseguiam lidar com a questão das linhas temporais sem que fugissem da sanidade, o que diria um mero ser humano? Apesar disso, quando encontrou Frota, Mario ainda falava como um homem com consciência sã. Não que isso fosse uma máscara por trás de seu ideal maléfico. O que se espera de um louco? Que haja como um louco obviamente. Quando um louco não age como um louco, é sinônimo que sua insanidade é tão profunda que consegue utilizar de conceitos insanos para justificar sua “falsa” sanidade. Mas Mario era são de si? De certa forma sim. Mario apenas via o mundo de uma forma diferente demais para um ser humano, seu pensamento era muito evoluído e via tudo relativamente, era uma mente genial que se perdera anos e anos em sua busca pela dominação do mundo.

Foi então que começou a surgir os perseguidores. De alguma forma, não tinha ideia de como, sua atividade interdimensional fora notada por alguém. Quando não estava sendo perseguido e podia pensar um pouco, percebeu que só poderia ser alguém que está observando tudo de cima. Não havia ser humano que pudesse perceber atividades interdimensionais nos tempos e nos espaços que havia viajado, e julgou... Bem, voltou a ser perseguido. Isso era nada mais nada menos do que Shepard enraivecido. Mario já havia modificado tanto as raízes do plano que estavam imersas na sociedade desde o princípio da civilização que o prosseguimento de suas atividades resultaria no fracasso do ideal de Mormada, melhor representado pelo leitor por Shepard, de aniquilar as raças humanas inferiores. O plano estava para fracassar quando Shepard não precisava mais destruir aquele planeta Terra em especial, havia assumido a liderança e naquele posto poderia fazer tudo o que bem lhe desse a cabeça – porque agora Mormada-mor estava fora de questão por estar fingindo ser um Mormada que nunca fora –, desde que aniquilasse essa raça humana inferior. Foi por isso que durante um grande período Mario parou de ser perseguido. Mais ou menos desde que se despediu de Frota após a confecção da Okami Kenon até quando Molly há alguns capítulos decidiu questionar Mario furiosamente, o viajante no tempo sentiu-se livre para fazer o que quisesse.

Mas quando Molly apareceu, Mario teve que apertar o botão. Para que o Imperador Solar e por se tratar exatamente de um não era possível que saísse ileso de um confronto. Nem poderia arriscar. O destino não faz milagres, só faz com que o imprevisível aceitável torne-se fato. Mas o que o viajante do tempo não esperava era que Molly estava ali para que batessem um papo de boa, como velhos amigos. Era esse o propósito, mas a maluquice do caolho disse mais alto, levando mais tarde a destruição para um grande centro comercial.

Jonata, como um personagem coadjuvante qualquer, foi simplesmente decepado por uma multidão revolucionária. Como assim? Mas ele não era um Hitman? Sim, mas eles não são imperadores solares. Ainda mais um Hitman Radar, como era chamado pelos cientistas que desenvolveram a base teórica do projeto. Poderia ser facilmente derrotado por um descuido, ainda mais porque não era focado em combate. Mas que multidão revolucionária era essa?

Mario também estranhava. Que mundo fora parar? Quando estava? Eram sempre essas as perguntas que vinham a cabeça quando apertava aleatoriamente o dispositivo sem utilizar de nenhuma coordenada, da mesma forma que se sentia quando começara a viajar no tempo ainda sem saber como utilizar da máquina, e não conseguiu reconhecer aquele mundo. Era um mundo bem diferente, onde todas as sociedades eram baseadas em ditaduras militares. Foram baseadas. Porque aparentemente uma verdadeira revolução sangrenta estava acontecendo por ali, e os manifestantes populares que manifestavam pela democracia simplesmente estavam acabando completamente com a oposição. Que interessante, nunca pensei que um mundo assim poderia existir. Em minha ditadura, não existirá democracia nem mesmo no dicionário, nem liberdade, nascerão obedecendo a mim, um ser espiritual que comandará a todos com as palavras. Simplesmente palavras. Porque inocente é bastante primitiva, não é? Bem...

A revolução prosseguia e Mario apenas observava. A paisagem era caótica, sem lugar para paz ou harmonia. Mortos se espalhavam pelo chão com suas almas indignadas pela revolta popular ou ainda gritando os ideais da revolução. Os ativistas corriam como loucos até um grande prédio. Era a câmara dos vereadores, que sofreria o mesmo que os outros que eram opostos aos ideais populares em questão de segundos. Mas não aconteceu.

O leitor teve um de já vu, não teve? O resto do que aconteceu não necessita de ser mencionado. O que se seguiu: a morte de vários manifestantes por diversos feixes de energia lisoatômicas. A energia não era dissipada e nem absorvida, atravessava todos os corpos que encontrava até que fosse neutralizada pela pressão atmosférica e isso geralmente demorava bastante tempo. Várias pessoas morriam durante esse processo de neutralização obviamente, prédios caiam, e coisas bem assim mesmo.

Quero chamar a atenção para um cidadão em especial. Não que ele fosse realmente especial: era um homem comum. Um trabalhador, um funcionário público que, ironicamente, ia contra o governo a qual trabalhava. O que esse tinha contra esse governo? Tudo. Não que buscasse a democracia ao certo, mas buscava que seus filhos pudessem viver com mais liberdade. Porque por mais que tente, o ser humano não consegue desenvolver-se ao máximo sem que esteja livre. Livre quer dizer: sem regras, sem métricas para a vida, sem exceções, sem limites. Se ele era um anarco-comunista? Não. Apenas pregava para uma sociedade muito mais justa. Sabia que o homem livre, sem impor nenhuma forma de governo ao restante dos outros homens – uma vez que uma junção de seres humanos vivendo alheio aos outros não pode ser fundamentalmente considerado uma sociedade –, chegará o momento em que enxergarão a oportunidade. Mas que oportunidade você está dizendo, meu caro narrador?

Pois muito bem, nesse momento não digo como narrador e sim como o próprio manifestante. Sabe aquele momento em que passa nos filmes que o protagonista vê sua vida inteira antes de morrer? Então, isso não acontece de verdade. Pelo menos o que eu estou pensando agora, e sei que estou bem perto de morrer, é que é impossível que o ser humano conviva naturalmente sem que tente dominar o outro. Mas não é mesmo? Não preciso de nenhum diploma para dizer isso, não são as disparidades entre dois indivíduos que faz com que isso aconteça. E sim a igualdade. Como assim? Como assim? Como você ousa perguntar como assim? Eu sou igual a você. Ninguém quer ser igual a alguém. Todos queremos nos tornar melhores que os outros. Não os melhores do universo, até porque isso é uma tarefa muito capciosa para seres humanos comuns, mas queremos estar acima de alguém mesmo que para isso tenhamos que passar por cima dessa pessoa.

Eu não me formei em geografia, nem em filosofia, nem em sociologia e sempre adorei história. E não precisei de um diploma nesses cursos para poder afirmar o que digo. Formei-me em direito e foi interpretando a constituição fajuta do XXXil que descobri a babaquice que é a democracia. O que é democracia?, pergunto para o meu caro amigo que talvez não conheça e não há segundos para que eu possa citá-lo – estou para morrer. E o meu amigo, matemático, me responde: Não existe.

O que? Como assim?, eu fiquei abismado, como juiz. É óbvio que não existe, respondeu-me o matemático, os algarismos dizem muito bem disso. E lembrei um texto de um grande mestre literário que se tratava disso. E ironicamente, um matemático estava citando para mim um trecho de literatura! O que isso quer dizer? Nada. Mas os algarismos falam muito bem. São apenas trinta por cento, trinta por cento. Nunca haverá cem por cento. Mais que isso, o homem nunca votará por ideais, e sim para a manutenção de quesitos que são essenciais para a sua sobrevivência. E o que isso tem a ver com o que comecei dizendo? Nada! É sensacional.

Sou um homem que desde criança teve uma grande afeição em se tornar militar, mas quando cresci foi quando abri meus olhos: são os militares que estragam o mundo. O quê? Você sabia que podia ser preso dizendo isso? Não, e nem serei. Porque já estou para morrer, e, mais disso, estou dizendo a verdade. São homens que são manipulados e nem para isso servem, porque veem em suas mãos o poder – a arma – e tomam tudo o que é necessário para impor esse poder em cima dos outros. Estão vendo? É exatamente isso, passou pela população para que conseguisse estar acima dos outros, se já não bastasse o respeito que a sociedade dá a esses “heróis”. Então eu decidi me tornar um juiz. Por que um juiz? Porque eu decidi: farei a justiça. Mas foi quando percebi, a justiça não existe. Não existe bem e mal. E os descobrimentos da minha vida não terminaram por aí: descobri ser homossexual e que estava grávido do Rafael.

Foi um prazer te conhecer, Zezé Tutu Bello.


A orelha de Zezé foi atravessada pelo feixe de energia e era óbvio que ainda faltava muito para que fosse neutralizada pela atmosfera. Foi então que num momento bem breve também atravessou a cabeça de outra pessoa. Essa pessoa não é uma pessoa muito importante na história. Não porque era um personagem coadjuvante, mas porque morreu aqui. Como assim? Sim, você conhece essa pessoa. Mario? Não o conhece? Simplesmente o homem que viajou pelos planetas e falhou porque ficou divagando pela humanidade? Essa é uma situação bem triste.

Um mundo muito mais conhecido para o leitor. Esse mundo é cheio de pessoas e já tratamos de muitas dessas pessoas. Mas há muitas que também não tratamos que, na realidade, é o maior número. Para dar uma moral para algumas pessoas que merecem ser citadas citaremos Agustinho. Um operário que trabalhava em uma empresa, mais popularmente chamada de firma, que produzia tintas. Não eram tintas especiais e nem as melhores do mercado, mas tinha algo que fazia de Agustinho ser aquela pessoa sensacional. Lembre-se da época em que frequentava os bares sem temor de encontrar algum conhecido ou de estar perdendo seu tempo. Você muito provavelmente já viu um Agustinho.

Era aquele cara que estava sentado largado próximo ao balcão. Começava o dia bebendo com uma cara triste, pedindo um pouco de cerveja, e logo começava o papo furado com o próprio balconista. A conversa se estendia quando outros cachaceiros de balcão chegavam, e logo a conversa rodeava o bar inteiro. Quem era o homem que regia essa conversa? Agustinho, o grande orador. Zoava todos do bar e todos riam, falava de seus problemas da vida e todos xingavam os que prejudicavam Agustinho. Ele tinha essa habilidade sensacional de ir pouco a pouco tornando-se cada vez mais amigável aos desconhecidos sem que precisasse forçar muito. Chegando ao bar e se sentando perto dele muito provavelmente ele viraria o rosto para você e diria "É, estou com alguns problemas, fui ontem renovar minha carteira de motorista e...". Pronto. Não havia mais retorno. Não tinha como a conversa morrer: Agustinho sempre renovava a conversa mesmo se você for uma pessoa completamente antissocial ou empática.

Citaremos por outro lado um homem que caminhava em frente a Agustinho na rua. Será o último da série dos não citados antes que será citado agora, mas não será o menos importante. Seu papel no enredo é praticamente o mesmo que Agustinho. Os dois eram amigos na verdade, mas amigos de bar. Agustinho não queria passar por ele porque temia ser ignorado ou que Claudio nem se lembrasse mais. Foi um daqueles amigos que Agustinho fez no bar e de fato Claudio não diria nada porque pensava que Agustinho não lembrava esse fim de noite feliz que foi o ponto de interseção no gráfico de suas vidas - estava enganado, ambos lembravam muito bem um o outro, mas também tinham medo de não serem lembrados. Mas chegou o momento em que tiveram que conversar. Por quê? Não se cumprimentaram, mas os dois iam ao mesmo local e o local estava fechado para o público por um suposto assassinato ter acontecido no sítio.

Agustinho se lembrava de Claudio e Claudio se lembrava de Augustinho. Mas não foi por isso que conversaram, Agustinho ao descobrir que a rua estava fechada subitamente virou para lado e disse, como se estivesse falando com um estranho qualquer: É, essa vida está demais. Claudio não sabia se Agustinho o havia dito porque reconhecera de vez o amigo de mesa de bar, mas decidiu concordar com a cabeça e dizer, meio que aleatoriamente: Cada passo é uma dor e cada dor é um problema. Essa frase é muito importante para o desenvolver de nossa história.

Cada passo é uma dor. Cada dor é um problema. Essas duas orações podem ser ligadas pelo pronome conectivo e, mas, nesse caso, o autor preferiu separá-las. Por que? Simples: são duas frases diferentes. Um filósofo cesariano disse a segunda e a primeira foi dita por um poeta tungliano há mais de 600 anos. Como essas duas frases chegaram a mente de Claudio é um mistério para vossa mente, enquanto o narrador não explica, é claro. Não que seja de muita importância, mas Agustinho não havia se comunicado com Claudio por nada. Esperava que o rapaz dissesse "nossa, é você daquele dia do bar", mas isso é uma coisa muito estranha e que pessoas muito escancaradas fariam, apenas.

O universo é uma rede de informações. Não podemos dizer que essas informações são como livros escritos porque é algo muito mais abstrato do que isso. A escrita é bela. O universo é ainda mais - disse Prouston, poeta neoliberal de Godã do Sul. Muita coisa que Prouston disse era verdade, era um poeta com um grande engajamento social - característica típica de sua escola literária - só que sempre quando tentava dar uma de poeta ele falava alguma merda e esse foi o caso aqui. O universo é algo como a mente humana. A mente humana é horrorosa, enquanto a escrita pega o melhor da mente de cada um. Até mesmo a mente de um macaco ou de uma capivara, dê-los um lápis e pela falta de um papel se revoltarão e simplesmente quebrarão o instrumento do escritor! Mas dê-lhes um lápis e uma folha da papel. Ficarão confusos, não têm a malícia que o ser humano abraçou como dádiva de perceber que até mesmo em uma folha de papel - objeto mais inocente do universo - algo horroroso pode ser escrito. Ou algo lindo. O poeta tira do nada a sua essência. Mentira! Verdade. Não existe inspiração maior para o poeta do que a própria essência humana. São tolos os naturalistas - não há nada mais belo do que o comportamento humano. E, Claudio, após pensar sobre isso profundamente, concordou.

É estranho que o leitor pense, e inclusive algo completamente incoerente, que um homem de mesa de bar e operário das fábricas da vida consiga pensar em algo tão profundo. É realmente incoerente levando em consideração a realidade que o leitor mundano habita! Mas há no mundo diversas realidades e, assim como a junção do pensamento de dois pensadores de planetas e sociedades muito diferentes terem chegado a boca de um ser plebeu qualquer, a causa disso tudo é simples: O narrador que manda nesse mundo.

O leitor se recusa a aceitar isso? Lá vem a bomba e simplesmente destrói esse universo. Assim como a morte de Mario, incoveniente, é claro, o que for narrado aqui terá de ser aceitado. Óbvio que a polissemia das palavras ajuda para que o leitor possa criar seu próprio universo e conspirar em suas próprias teorias e ainda mais numa obra tão subjetiva quanto essa em que há uma interlocucação, como entre velhos colegas de trabalho, belíssima entre autor e leitor.

Mas também tem outra coisa a ser descoberta: o autor, o narrador e o leitor; estamos todos sujeitos ao destino. Ao escrever essa história não é diferente: o único fator determinante presente em todos os universos é o destino. O destino dos meus dedos e da caneta no papel já foram traçados - consequências das leis do universo. Um poeta muito antigo decidiu numerar o destino por um número muito incomum. Não conhecia esse número, então decidiu criar um: surgiu o pior número da história da humanidade. O número três. Com o número três podemos calcular hipoteticamente como dividir dez pedaços de bolo para três crianças ou quantos anos Maria tem se Carol tem trinta sendo que a idade de Carol é o triplo da de Maria. Como calcular? Dízimas periódicas? Pior que dízimas aperiódicas. Apenas aceitamos que temos 0,33333333% de chance de sermos feliz na vida ou que cada um receberá 3,3333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333333 pedaços de bolo. Então surge a matemática, sensacional.

O papo filosófico tem fim porque o narrador diz: que termine! E termina.

Para demonstrar ainda mais que esse livro é uma ditadura que priva o leitor dos seus direitos o narrador, tirano e autoritário, ainda diz: Vamos colocar Frota nesse esquema!, surge Frota, uma figura completamente alheia ao que acontecia caminhando em círculos por trás do cenário de Agustinho e Claudio que conversaram e teoricamente estavam se re-conhecendo. Frota chegou em momento certo para escutar a frase bela de Claudio e isso foi motivo para segui-lo pelos restantes quilômetros. Por que não seguiu ainda mais? Porque algo aconteceu. O destino foi contra a ideia do autor de transformar essa série em O Senhor dos Anéis e ganhar dinheiro escrevendo criaturas depressivas e subitamente alegoricas caminhando e tentando se suicidarem. Foi o destino! O número três.

Frota não se sentia mais no mesmo local de antes. Não havia percebido que foi deslocado de sua última posição - quando pensava sobre o que faria - porque o narrador não viu nenhuma coerência em um personagem de julgar sua posição no enredo. Frota caminhava como sempre. A figura de Agustinho e Claudio, a figura da cidade, todo o cenário foi modificado. Não mais por ação do narrador, agora perplexo pela mudança repentina de cenário, o mundo se torna completamente diferente. E não há mão humana no ocorrido, apenas os compostos universais se movendo. Como assim? Não estou entendendo, mas você entendeu. Entendi? Quando Xupa Cabrinha e Robin simplesmente aparataram para outra dimensão para que Xupa conversasse com o super herói não houve indagação, por que teria agora? Também obra do destino, para ser mais sincero não. Naquela vez foi obra de alguém que controla o universo. Dessa vez foi obra do próprio universo que incrivelmente não é uma existência inanimada.

O cenário melancólico. O sol estava presente mas o palco completamente antagônico com a ideia de noite. Um vermelho escuro reinava nos céus. Frota se indagou "O que?", e foi só isso que teve tempo de pensar. Frota não conseguiu fazer mais nada, nem reagir ao próximo fato que aconteceu: Era Molly. Estranho. Muito sem graça. Clichê. Sei, mas há linhas de destino que são traçadas e não devemos indagá-las porque sabemos muito bem que não fazem sentido. Pois parecia um Molly diferente. Estava muito mais velho e uma barba grisalha e mal feita prendia o queixo e havia sinal de que algum dia existira algum bigode ali. Não conhecia esse homem, pensou, mas o mesmo chamou Frota pelo nome.

– Alexander Frota!

Atendeu, ainda surpreso. Eram tantas as surpresas que mais uma não faria diferença. Nada mais fazia sentido e nada mais faria. Para que encaixasse o quebra cabeça necessário para entender a situação era preciso era uma inteligência anormal e fora de qualquer conceito ligado a matéria. Frota, sendo feito de matéria, não poderia entender o que estava acontecendo. Nem mesmo os grandes homens, homens-deuses, que regem o espaço através da viagem do tempo - Senhores do Universo -, entendem porque também são feitos de matéria. E as duvidas foram embora. Por que? Eram tantas que o jovem de franja simplesmente decidiu ignorá-las e aceitar cada fato como ele era. Não estava mais onde estivera há alguns segundos e aquele homem, seja lá quem fosse, conhecia-o.

Vale lembrar que eram poucas as diferenças entre esse Molly e o Molly mais casual. Mas era uma diferença brutal: o cabelo. Era impossível qualquer ser humano imaginar Molly com cabelo sem que isso caiba ao conjunto dos irreais - e isso é uma outra história. Nos cinco segundos que se passaram Frota teve que aceitar isso, por mais estranho que parecesse, e também aceitou que tinha que ajudar Molly. O inimigo estava vindo, disse Molly. Frota não via nenhum inimigo.

Surge o final do capítulo. Algumas concepções antes que o fim esteja explítico:

Existem situações que os cronólogos denominam como “Coisa que Vai Acontecer Independentemente da Sua Escolha”. Por mais hipotéticas e por mais que existam diversos universos que sejam criados para que um fator seja correlacionado com diferentes funções, esse fator, de uma forma ou de outra, terá o mesmo resultado. Cabe ao leitor a seguinte função:

F(x) = 0/x

Independentemente do valor de x, f(x) será zero. A linguagem matemática é linda e maravilhosa e nesse momento ajudou o leitor a entender completamente a ideia. Se não entendeu, vá pra puta que o pariu e simplesmente aceite esse conceito que os cronólogos descobriram. Isso ocorre porque a situação-independente tende sempre à zero. Ou seja, as influências externas ou a disparidade dos fatores que relacionam o tempo com as possibilidades, é zero. Porque qualquer número que divida zero dá zero e ponto final.

Entretanto é necessário citar também que a morte de Mario não é uma Coisa que Vai Acontecer Independentemente da Sua Escolha. Com Mario apertando o botãozinho do dispositivo e indo parar noutra dimensão, ou noutro período temporal, as possibilidades se multiplicam e a função passa a ter diversos resultados. Mas o resultado mais interessante para o leitor, e também para o desenvolvimento da história, é quando f(x) = 2,5. Algum problema com isso? Nenhum. Mas f(x) pertence aos naturais. E 2,5 claramente não é um número natural. Devemos ressaltar que quando isso acontecer, quer dizer que a influência externa tende ao infinito.

Você, matemático, se não entendeu, entenda: Isso não é Matemática. Isso é Cronologia Analítica.

2,5.

O que tem de mais nesse número? Nada demais. Mas Mario estava de volta ao mundo em que esteve antes de apertar no botão por ter mijado nas calças quando o caolho surgiu feroz. Sem grande felicidade, ainda não sabia onde estava, mas o destino sempre é feliz em causar do mundo uma grande locomotiva a vapor com destino à inconveniência. E, sendo o caminho da inconveniência, nada mais inconveniente do que deixá-lo conveniente. E foi exatamente o que aconteceu.


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