Entre Segredos e Bonecas escrita por Lize Parili


Capítulo 134
Mais um dia no corredor da S.A.




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O sinal anunciando o final do horário de almoço tocou. Por sorte Lysandre já havia passado pela recepção e Castiel não precisava mais enrolar a recepcionista, que assim que ouviu a sirene que mais parecia de bombeiros, o mandou para a sala.

Em segundos os banheiros e bebedouros ganharam filas. Como sempre os alunos resolveram beber água e fazer xixi na hora de entrar na sala. Tinha dias, como aquele, que Leonel ficava enlouquecido. Embora eles fossem em quatro, ele e o Abelardo no Ensino Médio, e os outros dois no Fundamental, cada um tinha seu setor, sendo. No fim, ele era um só para dar conta de todos os alunos daquele Bloco. Quando ele aceitou o emprego de inspetor de alunos daquela conceituada escola não imaginou que seria tão difícil lidar com adolescentes ricos. Ele pensou que seria mais fácil que lidar com adolescentes da periferia, mas era igual, pois adolescente são iguais; sejam pobres ou ricos, se comportam da mesma forma e se dividem nas mesmas tribos: nerd, cdf, patricinhas, bad boys, esportistas, preguiçosos, artísticos, etc. No fim, a diferença estava na educação que cada jovem recebia de suas famílias, fossem pobres ou ricos. O mal educado, arrogante e esnobe não o era por ser rico, mas por ter tido uma educação falha em casa.

— VAMOS, VAMOS! NÃO OUVIRAM O SINAL TOCAR? JÁ PRA AULA! — dizia ele com sua voz, naturalmente alta e firme, todos os dias pelos corredores, no horário de entrada pela manhã e no horário da volta do almoço. — OS PROFESSORES JÁ ESTÃO NA SALA! — E os alunos corriam cada um para sua sala, mas não por medo daquele inspetor de 40 anos de idade e que era menor que muitos dos garotos do Lycée. Com seus 1.65m, 70 kg e sua experiência com adolescentes conseguida com os anos trabalhando como voluntário numa ONG de apoio a jovens “estereotipados” da periferia, ele conseguiu o respeito dos alunos, pois sabia lidar com eles.

— Ei, mocinha. Onde pensa que vai? Sua sala é lá em cima. — claro que sempre tinham aqueles alunos que tentavam dar um perdido nele, querendo passar mais tempo fora da sala de aula. Um ou outro até conseguia, pela escola ser grande.

— Eu sei, inspetor. É rapidinho. Eu só preciso levar isso na redação do jornal. — justificou a jovem fofoqueira de plantão com seu pendrive na mão, vinda do corredor A.

— Sem essa, dona Peggy. Você teve o horário de almoço todinho para fazer isso. Agora é sala de aula. — mas ele conhecia bem quase todos os alunos, principalmente aqueles que lhe davam mais trabalho.

— Mas essa matéria tem que sair na próxima edição. Por favor! — implorou com sua cara de cachorro pidão.

— Já pra cima! Ou eu confisco este pendrive e só te devolvo no final do período. Eu preciso mesmo conhecer os detalhes de algumas coisas que andam acontecendo pela escola e que na certa você deve saber. — disse ele, parado de frete a porta de acesso ao bloco B, onde ficava a sala do jornal, ameaçando tomar o pequeno objeto da mão dela, que subiu a escada correndo.

— EI. OLHA POR ONDE ANDA, SUA LOUCA! — berrou Castiel ao ser quase atropelado pela colega de turma enquanto descia a escada. — QUER DERRUBAR ALGUÉM, DERRUBA A MÃE!

— Foi mal, Cast. É que o Leonel está ai embaixo. — disse ela enquanto respirava um pouco, apontando para a escada, com a mão na porta que separava o corredor C, onde ficava a sala deles, do D, onde ficavam as escadas, biblioteca e algumas salas ambientes, como a de Artes e a cozinha experimental

O mesmo passo que Castiel deu para baixo, virou e subiu o degrau. Aquela não era uma boa hora para ele enrolar pelos corredores, tentando fugir da aula de Matemática. Se Leonel o pegasse fora da sala de aula de novo naquela 3ª feira, não ia devolver sua pasta de partituras no final do dia como prometido, confiscada na primeira aula daquela manhã quando ao invés de entrar na sala, ficou enrolando no pátio, estudando uma música do Rolling Stones - para agradar uma certa amiga -. Por sorte o inspetor não confiscou seu violão, ainda assim porque ele jurou que não fugiria de mais nenhuma aula naquele dia. Se ele quebrasse sua palavra entraria para a listinha negra daquele inspetor e nunca mais haveria acordinhos entre eles.

— Castiel! — ele a ouviu chamá-lo, mas ignorou. — Castiel! — e ela insistiu, correndo para alcançá-lo, mas este não deu atenção e subiu a escada, como se não a estivesse ouvindo. — CASTIEL! — gritou Emília do pé da escada. — POR FAVOR, ESPERA!

— O que você quer? — com sua grosseria típica, ele parou no alto da escada, virou de lado e a olhou com indiferença.

Emília percebeu que ele estava diferente e ela sabia que era por causa do domingo. Ela queria se desculpar, mas não sabia como. Ela não queria contar do Nathaniel a ele, ainda mais depois de ter decidido desistir daquele amor que ela passou a ver como impossível.

— C-Como você está? Chato o que aconteceu no refeitório não é? — perguntou tentando iniciar uma conversa, mas o resultado não foi bem o que ela esperava.

— Você é lesada assim mesmo ou se faz? Não acha que está fazendo esta pergunta a pessoa errada? — questionou. Sol já estava acostumada com a falta de educação do ruivo, mas nem antes, quando ainda não eram amigos seu tom de voz foi tão grosseiro. Antes ele era grosseiro, mas havia um ar de pentelhice, ou de teimosia, mas daquela vez não havia nada, só grosseria. Ela sentiu a indiferença dele e isso a magoou. Ela gostava dele.

— M-Mas você estava com eles e é amigo do Lys, e-então pensei que pudesse estar chateado por ele. — comentou, subindo um dos degraus. Ela queria ir até ele, mas ficou com medo do olhar que o ruivo lhe lançou, como se quisesse lhe dizer: “É bom você ficar aonde está se quiser se manter viva!”, e parou, apoiando uma das mãos sobre o corrimão, ficando por ali mesmo, onde estava, com cara de cordeirinho. Mal sabia ela que o pensamento dele foi muito parecido com aquele.

— Se está realmente tão preocupada comigo, — ironizou — fique você sabendo que eu estou ótimo! — afirmou com certa satisfação — Eu tive uma noite de domingo perfeita, tão perfeita que vai demorar muito para alguma coisa me tirar do sério. — e um sorriso largo que até mesmo Emília, com toda a sua ingenuidade, percebeu que ele estava sendo debochado e verdadeiro ao mesmo tempo. — E de certa forma eu tenho até que te agradecer por isso. — comentou, descendo os degraus na direção dela, que apertou o bolerinho amarrado na cintura e voltou o olhar para baixo, receosa. — Sair com a sua tia foi infinitamente mais divertido do que teria sido sair com você. — completou, parando um degrau acima dela. Ele queria ouvi-la se desculpar de pertinho. Ele queria ter o prazer de olhar nos olhos dela ao dizer que não aceitava suas desculpas, tampouco se importava com seu "arrependimento".

— C-Cast... e-eu... — ela nunca imaginou que fosse tão difícil se desculpar, ainda mais com o Castiel, tão debochado, irônico, sarcástico e até cruel às vezes. E aquele olhar dele para ela não estava ajudando em nada, muito pelo contrário, a estava deixando nervosa, sem saber como agir. — E-Eu...

— Uhn... — deu seu típico sorrisinho de lado, ao ver que ela não conseguia nem mesmo formular uma frase tão curta: Me desculpe! – como se ele tivesse essa habilidade.

— Sabe qual a diferença entre sua tia e você, Emília? — indagou, olhando-a de cima. Sol apenas levantou os olhos. Outros achariam o olhar de filhotinho sem dono dela fofo, mas ele, com todo o seu rancor, achou patético. — Ela não é uma falsa mentirosa! — disse, dando-lhe as costas, subindo novamente a escada.

Sol não imaginou que ele pudesse ser tão cruel. Tudo bem que ela havia mentido, mas falsa ela não era. Aquilo a magoou e a feriu profundamente, principalmente por ter sido comparada a sua tia.

— E-E o que você sabe de mim? — disse ela, movida pelas palavras dele. — Diz Castiel? O que você sabe de mim pra me chamar de falsa? — questionou elevando mais a voz, olhando para ele, que parou novamente, mas nem se deu ao trabalho de virar para responder.

— O suficiente para saber que você é só mais uma garota dissimulada.

Falsa e dissimulada são palavras fortes para se dizer a uma garota como Emília, cujas emoções vivem sempre a flor da pele e a sensibilidade sempre tão frágil.

— NADA! É ISSO QUE VOCÊ SABE SOBRE MIM! NADA! — gritou, chorando. — E NÃO DÁ AS COSTAS PRA MIM! — ordenou, mas ele a ignorou, deixando-a sozinha com seu arrependimento e sua indignação, perguntando-se como ele soube que ela havia mentido e se ele sabia o motivo daquela mentira.

— Q-Que droga, C-Cast... Eu s-só queria pedir d-desculpas... — murmurou, baixando o rosto. Ela teria sentado na escada para chorar até os olhos incharem se não fosse a gargalhada que ouviu às suas costas. Ela engoliu o choro e se manteve de costas.

— O que foi, coisinha? O Castiel foi cruel com você? O que será que você fez pra ele, em? Aposto que ele descobriu que você é uma salope e que fica arrastando asas para o meu irmão e para o melhor amigo dele. Estou certa? — Ambre sentiu uma satisfação gigantesca ao dizer aquilo. Sol não falou nada, pois qualquer palavra a faria chorar novamente. — Finalmente os garotos desta escola estão abrindo os olhos. Primeiro o Lys diz umas verdades para aquelazinha da Rosa e agora o Cast dá um chega pra lá nessazinha ai. Olha só, Li, dá até pena. — ironizou para a amiga, passando por Emília, subindo os degraus. Elas estavam à procura de Charlotte.

— Agora só falta o seu irmão descobrir que tipo de garota é essa ai. — comentou Li e Ambre, num tom recheado de malícia, aproveitou para aumentar a ferida de Emília.

— Verdade. Eu até iria ao grêmio contar tudo a ele, mas você sabe como ele fica irritado quando alguém vai lá atrapalhar o trabalho dele, ainda mais quando ele esta com a Melody. Você sabe, aqueles dois estão sempre juntos, enfiados naquele grêmio. Tem oras que eu me pergunto se eles ficam mesmo o tempo todo trabalhando. — ela nem mesmo sabia onde e com quem o irmão estava, tampouco que havia ido para casa por não ter se sentido bem durante a manhã, mas nada disso era importante, ela só queria ferir a rival e conseguiu. Sol não aguentou e saiu dali, correndo, trombando com Leonel que tendo ouvido vozes estava indo até a escadaria para ver quem estava fora da sala de aula.

— Nossa. Por que tanta pressa, mocinha? — perguntou, segurando-a, e ao perceber que estava chorando olhou para Ambre e Li. — Por acaso aconteceu algo aqui que eu deva saber? Ambre, Li?

— Nós não fizemos nada, inspetor. Ela já estava assim quando chegamos aqui. Pergunte a ela. — respondeu Ambre, dissimulada como sempre.

— Isso é verdade, Emília? — perguntou e esta meneou três vezes com a cabeça. Elas podiam até ter rido dela por causa do que ouviram o Castiel lhe dizer, mas não tinham o direito de feri-la onde mais doía, no seu amor pelo Nathaniel. Li arregalou os olhos e Ambre olhou para ela querendo dizer “filha da puta, dedo-duro”, engolindo o xingo.

— O que foi que vocês aprontaram desta vez, meninas? — questionou Leonel, firme. — Quantas vezes eu já pedi para deixarem as colegas em paz?

— E-Eu não fiz nada, inspetor. Essa fingida está querendo me ferrar. Todo mundo sabe que ela não gosta de mim! — Ambre estava assustada. Ela não podia ir para a inspetoria justo naquela aula. O professor de Matemática fazia marcação cerrada com ela, que já estava com as notas super baixas e corria o risco de ficar de recuperação, o que significava adeus ao presente especial de formatura.

— É v-verdade, inspetor. Não fizemos nada. Ela já estava chorando quando chegamos aqui. — endossou Li, mas tanto ela quanto Ambre já eram manjadas e a palavra delas não valia muita coisa, mas ele sempre dava o critério da dúvida, mesmo que esta fosse quase nula.

— Isso é verdade, Emília?

— Vamos, Emília. Diga a verdade! Pare de mentir! — bradou Ambre, ouvindo um

— Fica quieta Ambre! Deixe a colega falar! — do inspetor, calando-se.

Emília respirou fundo para não gaguejar ou engasgar e rasgou o verbo, suspirando em meio ao seu desabafo, para controlar o choro.

— Como todos os dias, desde que eu vim para esta escola essas duas se aproximam de mim, me provocam, me ofendem e fazem insinuações maldosas a meu respeito. Eu estou cansada delas ficaram me maltratando só por diversão. Eu não fiz nada pra elas.

— Sua magricela, eu vou... — disse Ambre, perdendo a linha, indo para cima de Emília, mas Leonel a conteve só com o grito, que a fez gelar inteira.

— JÁ CHEGA, AMBRE!

Li já estava com os olhos marejados, se imaginando na detenção por causa “daquelazinha”. Seus pais foram bem claros que se ela não melhorasse o comportamento não participaria do baile de formatura.

— Para a inspetoria, as duas. Agora! — ordenou.

— M-Mas, insp...

— AGORA!

Quando Leonel se zangava era melhor não questionar ou o problema ficava bem maior. As duas saíram pisando duro, uma segurando para não chorar e a outra para não gritar de raiva naquele corredor.

— E-Eu também preciso ir, Sr. Leonel? — perguntou Sol, ainda chorosa, fungando, limpando os olhos com a mão. — É q-que eu não queria mais f-ficar perto delas hoje. — disse, querendo ser dispensada daquela ocorrência.

Leonel olhou bem para ela e vendo o quão triste estava a deixou de fora, pelo menos por aquele momento.

— Tudo bem, Emília. Por enquanto não tem a necessidade de você vir comigo. Elas vão ter uma conversinha com o prof. Sartre sobre o comportamento inadequado delas. Caso ele ache necessário conversar com você eu mesmo vou chamá-la na sala. Agora vá ao banheiro, lave este rosto e vá para a sua aula. Não quero ter que te levar para a inspetoria por cabular aula.

— S-Sim, senhor. O-Obrigada, Sr. Leonel. — agradeceu-lhe.

Leonel a deixou e foi atrás daquelas duas “pestes”, que estavam paradas na frente da inspetoria, esperando por ele. Ao olharem para Emília esta, mesmo com cara de choro, deu um sorrisinho e mostrou-lhes o dedo do meio, fazendo Ambre travar os dentes e abafar seu urro, pois gritar naquele momento só pioraria sua situação.

Enquanto Ambre e Li observavam, sentadinhas e comportadas, o inspetor registrar a ocorrência no livro de ocorrência da turma delas e que depois seria entregue ao prof. Sartre, para que este resolvesse aquele problema, Emília lavava o rosto no banheiro, engolindo o choro, forçando-se a se acalmar. Já havia passado 15 minutos do início da aula e ela precisava ir para a sala, apesar de não querer compartilhar o mesmo espaço que Melody naquele resto de dia. Mas ao mesmo tempo, tudo o que ela mais queria era que a garota estivesse na sala de aula, pois desta forma não estaria com o Nathaniel.

— Nossa, que micão das meninas do 2º ano. Eu não teria coragem de fazer aquilo. — comentou uma das garotas do penúltimo ano do Collège ao entrar no banheiro com sua amiga inseparável.

— Pois eu teria. Já faço cosplay mesmo, não tem muita diferença. — respondeu a outra.

— Ah, é diferente sim. Elas estavam sendo puxadas por coleiras. É humilhante.

— Pois eu ia adorar estar com aquela coleirinha do Lysandre no meu pescoço. — riu-se, toda assanhada.

— Falando no Lysandre. Gente, o que foi aquilo? Ele destratou a cunhada na frente de todo mundo. — apesar de não terem ouvido o que o ele disse a ela, a linguagem corporal deles disse tudo. — O que será que deu nele?

— Sei lá. Só sei que ele ficou muito sexy naquela hora. — falou com certa malícia maldosa. — Pena que o que o negócio dele é o cabo da guitarra daquele ruivo. — rindo das suas insinuações. Emília respirou fundo e saiu dali antes de se irritar com aquelas fofoqueiras. Porém aquela conversa a fez se lembrar da amiga.

— O que será que deu no Lys para destratar a Rosa? Ela gosta tanto dele.... — intrigou-se. — Tadinha da Rosa. Deve estar super triste. Será que ela já voltou pra sala? — preocupada, pensando no que ela faria no lugar da amiga. — Não. Eu não teria voltado, de tanta vergonha. — tentando imaginar onde a albina poderia estar caso resolvesse se isolar. — Bom, ela precisa trocar de roupa, então só pode ter ido ao vestiário. — deduziu, passando direto pela porta da sua sala de aula, agachando para que o professor não a visse pela janelinha da porta, voltando ao corredor B, seguindo para a porta que dava acesso aos fundos, onde ficavam as salas externas, ginásio, vestiário e piscina. Ela queria dar apoio a sua melhor amiga naquela escola.

 

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Notas finais do capítulo

Acho que a Sol esta começando a aprender a sobreviver a Ambrega e suas amigas....rs