Blood On Blood escrita por RubyRuby


Capítulo 14
14 Evan- What is love?




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Eu não havia conseguido entrar no caixão sequer uma vez. Não havia descanso, nem beleza, nem racionalidade que compensavam tais palavras ditas por Tony. Sim, aquelas, que diziam para mim que meu maior pesadelo_ o próprio Tony_ era e sempre havia sido namorado do que eu julgava ser minha salvação: Sophie.

Não tinha palavras o suficiente para descrever o que eu sentia.

Fiquei umas boas horas na casa abandonada, acompanhado de ratos, gambás e baratas, sendo inundado pela tempestade e pelo infeliz fato que me acompanhava desde então. Sentia uma dor tão forte no coração que ela sequer deixava espaço para chorar. Uma dor tão inconsolável que nem mesmo boas doses de sangue em minhas veias poderiam amenizar. Uma dor tão real e pura que nenhum humano seria digno de sentir. Eu estava morrendo, mesmo que aos poucos.

Eu podia ver alguns vultos do lado de fora, como se fossem pessoas simplesmente passando pela rua. Minha cabeça estava tão confusa e delirante que eu nem mesmo pensei em me esconder. Foi quando uma menininha, que devia ter uns dez anos, entrou no grande pátio escuro. Ela cobria até então a única fresta de luz existente no ambiente, fazendo-me notá-la ainda mais.

_Olha, mamãe! Um homem está sentado ali.

Eu a olhava com os olhos bêbados. Ela tinha cabelos longos e loiros, bem como Sarah. Ninguém apareceu, somente sua mãe, que nem mesmo olhou para dentro do pátio, e simplesmente deu-lhe um puxão para que voltasse para a calçada, andando, falando algo e rindo alto com mais adultos.

De fato, eu poderia prever algo no meu caminho. Minha palidez sempre foi meu refúgio; minha morte era um constante conflito de mim comigo mesmo. Tony havia me dado aquele fardo, e eu não poderia deixá-lo até me assumir vampiro, mas de alguma forma sabia dizer com certeza que poderia sorrir somente no dia de minha verdadeira morte.

s.m.a

Sentado na sacada de meu apartamento, observando os trovões e raios, pensava sobre o que Sophie havia me feito ouvir: que era pra eu esperá-la de madrugada. Mesmo com toda a majestade da chuva ao redor, não conseguia ouvir mais que meu silêncio.

Eu estava em dúvida se a obedeceria. Quero dizer, eu ainda estava morrendo por dentro, com ela ou sem ela. Minha felicidade ficou no cabaré, momentos antes de ver Tony junto à Sophie.

Eram três da manhã quando resolvi sair de casa. Havia preparado uma pequena mala, com dinheiro e peças de roupa, chamei um táxi e então fui à estação de trem da cidade.

_Uma passagem, por favor.

_Pra qual lugar, senhor?

Havia esquecido esse pequeno detalhe. Poderia eu falar “qualquer lugar longe de Sophie e de Tony”?

Assim foi feito. Estava indo para Finlândia. Não era um lugar muito longe, mas o suficiente para que eles me perdessem de sua visão, e talvez até de seus pensamentos.

Entrei no trem, que sairia dentro de vinte minutos. Coloquei minha mala no pequeno compartimento, na parte de cima do vagão. Estava indo para um novo lugar, onde tudo era novo, mesmo depois de séculos de existência.

O trem estava com os vagões vazios, mesmo que já estivesse saindo da estação, mas achei estranho que o do meu lado também estivesse.

_Ah, Evan!

Sophie me deu talvez o abraço mais apertado que alguém já me dera. Suas vestes estavam molhadas, e eu podia sentir a água penetrando no tecido de minhas vestes, mas isso não me incomodava. Seus olhos negros finalmente faziam jus à cor: traziam em si o desespero e a profunda perturbação que Sophie carregava. Seu peito batia tão forte que seus batimentos podiam ser vistos pelo decote de seu vestido. Eu estava numa espécie de confusão boa, como se ela fosse a causa de minha insanidade, mas ao mesmo tempo, a única cura, e foi aí que eu percebi que mesmo tentando fugir dela, seria meu maior erro fugir da única forma de me sentir feliz.

_Por que você tentou fugir de mim?_ ela se encolheu ao meu lado, ainda olhando fixamente para meus olhos. Provavelmente estava com frio e dor.

_Até quando você vai ler meus pensamentos? Até quando você vai fazer o que eu não quero?_ eu disse, frio. Não queria me entregar tão rapidamente à ela, mesmo que isso já tivesse acontecido.

Ela então chegou ainda mais perto, deitando-se ainda mais em cima de mim, quase beijando meus lábios, quando disse:

_Até eu precisar fazer isso para te encontrar.

Ela me olhava fixamente, como se tê-la independesse da minha vontade. Não era uma opção me afastar de Sophie. Ela então começou a passar as mãos em meu cabelo, como se admirasse uma paisagem perdida, com todo o cuidado e ternura. Ela estava fraca e ainda mais pálida que um vampiro costuma ser.

_Você promete que nunca mais, por todos nossos séculos de vida, fugirá de novo de mim? Nossa, Evan, eu não sei o que seria de mim se não conseguisse entrar nesse trem à tempo de...

Puxei-a rapidamente para ainda mais perto de mim e a dei um beijo tão urgente quanto nenhum outro antes. Não sei como faria sem Sophie por perto, e nem sei se isso seria possível. Nossos lábios se envolveram tão apaixonadamente que nem mesmo sentimos o trem saindo da estação. Eram séculos perdidos naquele beijo; mais que a mera vida de qualquer ser humano: eu daria minha própria pra ficar com aquela menina de cabelos dourados.

Depois de nosso beijo, ela me abraçou novamente. Talvez não somente por sentir minha falta e por se lamentar, mas também para se aquecer do frio que a água lhe causara.

_Eu prometo.

_Eu poderia ficar assim para o resto de minha eternidade_ ela disse, ainda pressionando seu corpo contra o meu.

Eu também poderia. Porém ainda precisava de minhas respostas, e sabia que ela estava lendo minha mente naquele exato momento. Então sequer me dei ao trabalho de perguntar. Ela se recolheu, levantando seus pés para o pequeno banco de madeira em que estávamos, de modo a se aquecer mais rapidamente. Tirei meu casaco, e o coloquei em forma de cobertor sobre seu delicado vestido.

_Evan... as coisas aconteceram tão rápido... Bom, deixe-me explicar. Como Tony já disse, eu era uma humana. Eu não sentia medo de nada, nem de ninguém, nem mesmo de morrer. Eu já cantava naquela época, mesmo que por diversão. Então ele entrou em minha vida, e me deu seu beijo da morte..._ ela olhava para a janela, como se lembrasse desse dia_ para que fôssemos eternos juntos. Vampiros normalmente são viciados em sangue, mas eu era por ele. Ele havia me tornado imutável e perfeita para o resto dos séculos, e eu seria para sempre sua. Ele sempre ia ao cabaré ver minhas apresentações..._ suas feições mudam completamente, voltando seus olhos para mim_ até começar a sentir o seu cheiro rondando a cidade. Depois disso, pude perceber que havia uma perturbação naqueles olhos sarcásticos. Logo mais, ele sentiu sua presença no próprio cabaré, e também percebeu que suas intenções nada diziam respeito à ele. Suas visitas substituíram as idas dele. Evan, acredite: Tony ama você. Digo, nem quero pensar nessa hipótese_ ela segurou minha mão forte, como se não pudesse acreditar que eu era de verdade_, mas ele não poderia simplesmente planejar uma armadilha para te matar? Pois aí está. Ele não o fez. E jamais pensaria em fazer, porque eu li sua mente. Tudo o que ele queria era me afastar de você para que não nos conhecêssemos.

Ela deu uma pausa. Deitou-se em meu braço, colocando-o entre suas pernas.

_Meu modo de ver a vida mudou completamente quando li sua mente. Bem, como você sabe, eu não tinha muita escolha: é de minha natureza fazer isso, não falta de educação. Quando vi Tony por seus pensamentos, percebi que ele era ainda mais cruel que pensei que fosse, e você sim carregava a beleza de toda uma eternidade. A beleza que minha alma implorava para Tony.

Eu ainda estava travado. A dor era ainda maior porque amava Sophie.

_E por que você me enganou?

Ela se afastou de mim, porém mantendo meu braço entre suas pernas. Ela me olhava como se eu tivesse a dado um tiro.

_Essa não foi minha intenção..._ ela começou a chorar_ Eu sabia que você se afastaria de mim caso soubesse que eu estava relacionada ao Tony, e eu jamais queria que você fizesse isso. Eu preferi esconder, até que não pude mais. Eu até evitava pensar sobre você perto dele, para não despertar sua fúria, mas era impossível te tirar da minha cabeça._ ela me olhava, perdida_ Até que ele não suportou mais, e então me fez me demitir do cabaré para fugirmos juntos e nunca mais te ver.

Seus olhos embriagaram-se na própria escuridão. Era difícil até mesmo pensar nessa hipótese.

_E foi justamente por isso que eu bloqueei minha mente. Ele não poderia saber que eu não queria fazer isso, e nem meu plano de fugir contigo ao invés de fugir com ele.

_Plano?

_Sim, Evan. Mas agora, isso não é o que já estamos fazendo?

_E onde ele está agora?

_Eu tive que deixá-lo morto por algumas horas para poder sair. Eu nunca teria coragem para matá-lo de verdade... então o esfaqueei._ ela dizia, olhando para baixo, com muita culpa por ter feito isso.

_Você o esfaqueou...?!

_Sim... mas ainda hoje_ ela olhou para o relógio do trem, que marcava 04h05min_ ele estará são novamente. E nosso pesadelo continuará vivo_ ela me apertou, com medo de me deixar ir.

Eu a cheguei mais perto de mim, querendo sentir seu cheiro e sua respiração fria. Eu podia sentir que ela estava mais quente que quando entrara no trem, e isso de certa forma me conformou, afinal, estava fazendo um bom trabalho em tentar esquentá-la com meu casaco. Ela estava tão fraca que sequer conseguiu ficar com os olhos abertos: dormiu ali em meus braços, mesmo que o sono não fosse tão bem aproveitado quanto se ela estivesse em um caixão. Trataria de comprar um assim que chegássemos na Finlândia.

O relógio do trem não avisava nada mais que o amanhecer. Era o momento certo de tirar uma soneca, pelo menos até o amanhecer despontar no horizonte e eu então poder olhar novamente o dia formado, afinal, vampiros não podem ver a luz dos primeiros raios da manhã.

s.m.a

_Sophie?

Ela acordava lentamente. Nem de longe parecia aquela Sophie frágil e fraca que entrara no trem: estava totalmente nova e sã. Era 01h30min quando fizemos a primeira parada. Estávamos na Sérvia, provavelmente no limite com os países do sul.

_Bom_ finalmente uma pessoa de dentro do trem se pronuncia. Eu poderia crer que não havia funcionários desde a madrugada que nos seguira. Ela falava, sorridente_, vamos ter nossa primeira parada na estação de trem. Nos encontraremos novamente daqui a meia hora. Esperamos que dê tempo para o almoço, e então seguiremos adiante com nossa viagem.

Ela saiu discretamente do trem, o que fez com que os demais a seguissem.


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Notas finais do capítulo

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