Desventuras de Peeta Mellark escrita por maribaptista


Capítulo 2
Começos




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Peeta Mellark acreditava conhecer bem o Distrito 12. Ele cresceu entre as ruas estreitas da cidade. Conhecia caminhos escondidos através dos quais escapava dos ataques de fúria de sua mãe. Também sabia identificar a residência de todos os comerciantes com quem havia convivido. Ele havia brincado com seus filhos durante a infância, e mais tarde, quando herdasse a padaria, seria com eles que faria negócios.

Mas, Peeta tinha que admitir, existia um lugar que ele nunca havia explorado. Não era como a cidade, com suas casas coloridas de telhado vermelho, pequenas praças movimentadas e comércio abundante. Não. A Costura era muito diferente disso: escura, poluída e miserável.
Ou pelo menos, assim era retratada por sua mãe. Peeta e seus irmãos, quando pequenos, costumavam ter terríveis pesadelos sobre monstros cobertos em fuligem e minas desmoronando. É claro que, com o passar do tempo, ele aprendeu sobre como era de fato a vida na Costura. Ainda assim, continuava proibido atravessar a nítida fronteira que separava os dois lados do distrito. Classes sociais não se misturavam. Isso não o impedia de sonhar.

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Era um dia calmo na padaria. Eles não recebiam muitos clientes durante a tarde, portanto podiam relaxar e comer um pouco do pão que não havia sido vendido (claro, sem a senhora Mellark por perto).

Theo Mellark gostava desses momentos. Ele conversava com dois de seus filhos, enquanto Peeta terminava de limpar a cozinha. O rapaz podia ter apenas 14 anos, mas gostava de trabalhar para seu pai. Por essa mesma razão Theo sentia que seu filho mais novo poderia herdar o negócio da família quando fosse mais velho. Rye e Lucca não tinham o mesmo entusiasmo que seu irmão.

Tão envolvido na conversa, levou um grande susto ao escutar um barulho alto atrás dele. Não precisava se virar para saber que algum estrago tinha ocorrido. A expressão de Lucca já dizia o suficiente.

– Peeta, o que você- ah, cara...

O garoto estava estatelado no chão, com a louça recém lavada ao seu redor, quebrada em vários pequenos pedaços. O que preocupou Theo, porém, foi o sangue que saía dos cortes nos braços e pernas de Peeta.

– Droga. Meninos, limpem isso. Se a sua mãe chegar e ver essa bagunça eu não sei o que ela pode fazer. – ele disse, sentindo um calafrio ao pensar na reação de sua esposa caso ela soubesse sobre o incidente – Peeta, filho, você consegue se levantar? Aqui. Ótimo, bom garoto. E andar? Venha, eu te ajudo.

– Pai, o que vamos fazer? – perguntou Rye, enquanto ajudava seu irmão mais velho – O boticário vai cobrar uma fortuna, nós não temos dinheiro. E se a mamãe ver ele assim, ela vai surtar!

– Eu sei, eu sei. Me dê um minuto pra pensar, certo? – a senhora Mellark controlava as despesas da família pessoalmente, e saberia se eles pegassem algum dinheiro. Na melhor das hipóteses, ela espancaria Peeta por sua “incompetência”. Theo não podia deixar o menino se machucar ainda mais. Alguma coisa certamente poderia ajudá-los, ou alguém...

Uma ideia louca veio em sua mente. Ela certamente tinha como curar Peeta. Claro, se ele aparecesse por lá, ela poderia muito bem bater a porta em sua cara. Mas, não, se ele conhecia bem Eva (e ele conhecia) ela jamais recusaria ajudar alguém em necessidade. E eles tinham sido amigos, certo? Mais que isso, durante algum tempo. Ele teria que arriscar.

– Rye. Pegue o meu casaco e o do seu irmão. Eu sei onde levá-lo.

– Pai? – disse Peeta, e a dor era evidente em sua voz – Onde nós vamos?

– Costura.

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Parte do que contaram a Peeta quando criança era verdade. A fuligem era real. Estava em todos os lados, cobrindo a paisagem como um manto escurecido. Misturada com a neve no chão, dava um aspecto sujo ao local. As pessoas o olhavam com surpresa, como se fosse a primeira vez que alguém da cidade tivesse pisado ali. Ou talvez fosse o sangue manchando suas roupas. Vai saber.

– Quase lá, filho. – repetia Theo, pela terceira vez. Peeta não entendia como seu pai, descendendo de uma família inteira de mercadores, que nunca havia saído da cidade, parecia estar tão certo do caminho que seguia pela Costura. – Pronto. Chegamos.

Não era grande coisa, mas comparada às outras casas que ele tinha visto desde que eles atravessaram a fronteira, ele não podia reclamar. Era pequena e parecia antiga, com pintura muito desgastada, mas não possuía buracos no telhado ou paredes. Ele podia ver a Colina bem atrás, e ouvir os barulhos de um animal (um bode?) em algum lugar perto. Ele percebeu a hesitação de seu pai ao bater na porta.

Algum tempo passou, e, por um segundo, ele teve certeza de que a casa estava vazia. Até a porta se abriu e uma criança apareceu em sua frente. Era uma menina pequena e magra, que os olhava com desconfiança. O que chamou sua atenção foram os longos cabelos loiros e trançados que caíam em seus ombros. O que uma menina mercante estava fazendo nesse lugar? Não fazia sentido algum. Mas antes que ele pudesse expressar sua surpresa, seu pai começou a falar:

– Primrose, certo? – disse, sorrindo quando ela acenou com a cabeça – Eu sou um velho amigo de sua mãe. Meu nome é Theo Mellark. Esse é meu filho, Peeta. Veja, bem, ele sofreu um pequeno acidente e... Bom, eu realmente preciso de ajuda. Será que sua mãe poderia fazer algo por nós?

– Mamãe está descansando. – ela disse, como se aquela frase explicasse tudo.

– Bom, você poderia chamá-la? É uma emergência, você entende.

– Minha irmã fala que não podemos perturbar a mamãe quando ela está descansando. Ela está doente desde que o papai morreu, então ela descansa bastante.

Aquilo pareceu fazer efeito em Theo. Peeta nunca havia visto seu pai com uma expressão tão triste. O que estava acontecendo?

– Mas eu posso ajudar vocês. Entra.

Peeta duvidava muito que aquela garotinha, que não podia ter mais do que dez anos, pudesse fazer alguma coisa por eles. Mas Primrose parecia falar muito sério, e os conduziu até a cozinha, onde pediu que ele sentasse em um banco de madeira enquanto ela o examinava. Era quase uma cena cômica, uma criança brincando de médico com um paciente de verdade. O mais curioso: ela parecia saber o que estava fazendo.

– Não parece muito infeccionado. Eu vou colocar neve em cima. Vai doer menos quando eu der os pontos nesses dois cortes. – ela disse, levantando-se. Antes que ela pudesse dar um passo em direção à porta, porém, uma voz vinda da sala a chamou. Uma voz um tanto familiar, Peeta concluiu, sentindo seu sangue gelar.

– Prim? Com quem você está falando?

E tudo fez sentido. É claro que o seu pai pediria ajuda para os Everdeen. Isso explicava o porquê de Primrose parecer uma das meninas da cidade. Mas não significava que Peeta estivesse mentalmente e fisicamente pronto para conhecer a casa e a família da garota por quem era apaixonado desde os cinco anos. Por isso ele provavelmente deve ter parecido um completo idiota quando sua boca se abriu ao ver Katniss entrando na cozinha.

Ela estava diferente. Confortável. Ele nunca tinha a visto com os cabelos soltos e pés descalços. Ele queria vê-la assim relaxada mais vezes. E mesmo que isso nunca acontecesse, pelo menos agora ele tinha uma bela imagem para guardar consigo.

– Oh, olá senhor Mellark. – ela disse, como se fosse algo absolutamente normal encontrar sua irmã cuidando de estranhos. – Prim, pegue gelo. Eu cuido disso.

Certo, Katniss estava analisando seus machucados agora. Como isso tinha acontecido mesmo? Calma, não era nada pessoal. Ela estava apenas cuidando de um paciente, está sendo profissional. Então porque Peeta sentia seu rosto queimar com o toque dela? Ela estava falando alguma coisa, mas para seu pai. Ela nunca olha pra mim, nunca nos meus olhos, ele pensou.

Prim voltou com um balde cheio de neve. Por algum tempo, ele apenas observou a garota de seus sonhos cuidando de seus machucados. Era tudo tão surreal que, se não fosse pela dor que ele sentia, poderia ter sido apenas um sonho.

– Eu vou precisar dar pontos nesse aqui. – dessa vez, ela olhou pra ele, tão intensamente que ele não soube como agir – Não é muito, mas vai doer um pouco. E pode deixar uma cicatriz mais tarde.

Diga algo inteligente, qualquer coisa, mas não seja o completo idiota que você realmente é.

Ahn. OK.

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Eles foram embora um pouco depois. A dor diminuíra consideravelmente e agora ele conseguia andar sozinho, mesmo que mancando um pouco. E ele não conseguia tirar da cara o sorriso bobo por saber agora um pouco mais sobre Katniss Everdeen, e como ela ficava ainda mais linda sem aquela trança.

– Você ainda tem uma chance, sabe.

Peeta virou-se, com um susto, para ver seu pai sorrindo carinhosamente.

– Você gosta dela, dá pra ver. E ela não hesitou nem por um segundo em te ajudar. E ainda disse que não devíamos nada pelo serviço! – ele continuou – Eu não a conheço direito, claro. Mas acho que ela não teria feito isso por qualquer garoto, principalmente um da cidade.

O rapaz processou aquilo por algum tempo. Se aquilo era verdade, por que ela era tão fria com ele em público?

– Pai, eu queria acreditar nisso. Sério. Mas eu não acho que eu tenho uma chance com a Katniss. Nós somos de mundos diferentes. Ninguém ia aceitar. E ela já tem o Hawthorne, de qualquer jeito. – ele confessou, chutando um pouco de neve para o lado.

– Onde será que eu já vi isso? – Theo disse, com um ar irônico – Filho, Eva e eu éramos da mesma classe, nossos pais eram amigos. Nós crescemos juntos. E ainda assim, ela escolheu o pai de Katniss. Eles são o exemplo perfeito de que o destino é imprevisível. A história deles pode não ter tido um “felizes para sempre”, mas todos sabiam que eles se amavam de verdade. Quem sabe, Peeta, algum dia você e essa garota podem provar ao distrito que o amor pode quebrar até mesmo esses preconceitos estúpidos do distrito. Só depende de você estar disposto a batalhar por ela, e fazer isso acontecer.

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Katniss observou pai e filho se afastarem lentamente. Um pequeno sorriso apareceu em seu rosto. Ela não havia feito muito, mas isso não impediu o sentimento de satisfação em seu peito. Ela conseguiu ajudar o garoto com o pão.

Minha dívida ainda não está paga, Mellark. Mas isso... Isso é um começo.


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Notas finais do capítulo

Apenas algo que eu tinha em mente. Espero que tenham gostado. Feliz 2014 :)



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