O Último Uivar escrita por Vilefort


Capítulo 2
A Floresta




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A luz do sol no meu rosto me despertou. Abri os olhos lentamente e tive a visão familiar de meu quarto. O aposento sempre foi pequeno, não precisavamos de muito espaço em casa pois moravamos apenas eu e meu pai. Ele se chama Adam Aurich e estava beirando os 40 anos. Seus cabelos longos e negros iguais aos meus estavam sempre bagunçados por culpa de seu trabalho na plantação, que também mantinha seu corpo em boa forma. Aquela cicatriz na bochecha sempre ficava evidente cada vez que sorria. Não era dificil ver o porquê de minha mãe ter se apaixonado por ele.

Ao levantar, tirei meu pijama surrado e me vesti. Um top de couro ia por baixo de minha camisa de algodão, verde e com botões. Um colete marrom vinha por cima, completando o visual. Uma calça apertada e quente para resistir ao frio das montanhas. Por fim, uma bota forrada com pelo de urso. Ao olhar em volta, vi que meu quarto estava mais bagunçado que o normal, com roupas jogadas pelo chão, meu arco em cima do móvel, flechas espalhadas embaixo da cama. Resolvi arrumar assim que voltasse.

Saindo do cômodo, a simplicidade não era diferente. Nossa cabana era humilde, duas poltronas no canto da sala, um tapete simples e uma lareira pequena, o suficiente para vivermos aqui. Chegando na cozinha, vi que a mesa ja estava posta, algumas fatias de pão e queijo fresco. Meu pai não estava em casa, já havia partido para trabalhar.

Nossa convivência era limitada, sempre fui uma garota reclusa, sempre enterrada nos livros ou passeando pela floresta. Acho que isso tem a ver com meu Augúrio, nascer na lua crescente não era uma coisa para se orgulhar. Não na minha tribo. Principalmente quando se é filha da grande Freya, líder das Valquírias, as pessoas sempre me olham de lado, sempre desconfiando de mim. Fora os comentários desnecessários como: “Você nasceu numa tribo guerreira, não deveria estar lutando, caçando?” ou então “Sua mãe deveria ter vergonha de ter uma filha como você!” e coisas do tipo.

Mas minha convivência com minha mãe é ótima, e ela não tem vergonha de mim como os outros dizem. Quer dizer, pelo menos quando ela não está em alguma missão super importante, liderando as Valquírias para a glória de nossa tribo. Sempre gostei de seus cabelos loiros, adorava trançá-los quando era menor. Cada lua que passa, menos eu a vejo, cada vez mais suas missões são prolongadas, os riscos aumentam. Cada vez mais, eu temo por perdê-la.

Saí de casa empunhando meu arco e minhas flechas, hoje era dia de comer carne e eu precisava caçar algo para jantarmos. Nosso Caern era grande, diferente de minha casa. No centro, um grande altar cercado por pilastras antigas. Era o local onde a natureza era mais forte, muitas rosas e orquídeas nasciam em volta. É onde eu mais gosto de estar, a ligação com a natureza me acalma e quase é possível ouví-la. Em volta, a área comercial é bem movimentada, principalmente os ferreiros. É assim que funciona uma tribo guerreira, armas e mais armas sendo produzidas todo minuto.

Mas o centro não era meu destino, passei pela área mais carente do Caern, onde as casas tem menos brilho, geralmente germinadas ou pequenas comparadas às do centro. As ruas eram estreitas, e estavam sempre cheias de neve. Agradeci ter botas de pelo, caso contrário eu congelaria. A Cada lua que passava, menos espaço tinhamos nas ruas. O Distrito Baixo, como era chamado esta parte do Caern, crescia numa velocidade incrível, e isso não era uma coisa boa.

Finalmente cheguei à floresta. Um vento forte veio em minha direção e pude sentir como se a própria floresta estivesse me alertando de algo. Prossegui, andando na trilha em meio aos grandes pinheiros. Eles ficavam lindos nessa época onde a neve era mais intensa, mas em contra-partida, andar por aqui era difícil. Segui o caminho de costume, fazendo algumas curvas e finalmente chegando á lagoa Rose. Era um ótimo local para começar a caça, os animais vinham aqui para beber de sua água e eu vinha caçá-los, era uma equação simples.

O lago não era muito grande, tinha por volta de três metros de profundidade em seu centro, não possuia peixes e era na maior parte do tempo rodeado de animais silvestres. Sua água cristalina atraía qualquer tipo de animal que por ali passava, e isso tornava um ótimo local para se caçar. Vi pegadas que seguiam para o lado Oeste da floresta, aparentavam ser rastros de um cervo. Parece que achei o Jantar de hoje.

Segui as pistas me esgueirando pelas árvores para que não espantasse a presa, e alguns minutos depois a avistei. Um veado adulto pastava a dez metros de distância, o suficiente para um tiro certeiro. Puxei uma flecha do aljava em minhas costas, preparei o tiro. Soltei o ar e quando ia atirar, uma quietude me deixou em alerta. Recuei a flecha e senti um vento igual ao de quando entrei na floresta. Algo dentro de mim sussurrou: “Abaixe!”.

Instintivamente agachei, vendo passar um Lobo branco por cima de mim, onde segundos atrás estava minha garganta. O lobo caiu no chão, o barulho espantou minha presa mas isso não muito importava agora, pois a presa era eu.

O lobo se levantou, seu pelo branco o tornava dificil de se ver em meio a tanta neve. Neste momento, um calor envolveu meu corpo. Senti cada músculo de meu corpo se contrair e enrigecer. A dor era insuportável. Tudo em que conseguia pensar era que não podia morrer. Nunca havia sido atacada por uma criatura selvagem, não estava preparada para enfrentá-lo. A dor aumentava, o lobo me rodeava, esperando o momento mais propício para me atacar. Ou estava apenas se divertindo com meu desespero. O arco caiu de minha mão, minha visão ficou embaçada. Fui forçada a me ajoelhar, a dor aumentava e parecia que cada músculo de meu corpo se rompia. Não conseguia raciocinar, e via apenas algumas imagens borradas na mente, logo meu medo se tornou raiva. Era eu ou o Lobo, um cairia e um triunfaria.

Olhei para minhas mãos e tive vontade de gritar. Com a visão borrada e estranhamente vermelha, vi minhas falanges se alongarem e minhas unhas crescerem afiadas. Pelos começaram a crescer pelo meu corpo. Horrorizada, tentei gritar e tudo que ouvi foi um rosnado gutural. Olhei para o lobo e apaguei.


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