Pude escutar alguns murmúrios inquietos dos meninos de onde eu estava.

Fazia aproximadamente 20 minutos que já tinha saído do vestiário enrolada em uma toalha, a professora já havia começado a aula com os meninos quando eu cheguei. A piscina estava separada em seis raias, sendo assim, iam seis meninos por vez. Agora estava na vez das meninas, e eu fui logo no primeiro grupo, junto com Ashley, Marcie e mais três meninas que eu não conhecia, mas já tinha visto no grupo das líderes de torcida. Tive que abrir mão da minha toalha, que estava até então enrolada no meu corpo, assim que a professora chamou meu nome e me entregou uma touca e um par de óculos.

Nesse momento eu estava no bloco de largada de número 3 prendendo meu cabelo, enquanto a professora esperava as outras meninas subirem em seus blocos e também prenderem seus cabelos.

Eu não tinha prática alguma em nadar com meus cabelos presos, essa seria a primeira vez. Uma das partes que eu sempre gostei mais ao nadar na piscina de casa era poder sentir meu cabelo me rondando, sentir as ondulações que meus movimentos na água causavam a ele. Hoje, infelizmente, eu não teria isso. Pelo menos não por enquanto.

Ouvi a professora falar enquanto voltava do vestiário que quem quisesse ficar um pouco mais depois da aula, pra nadar por diversão, poderia ficar a vontade. Certamente eu ficaria um pouco. Não só hoje, como em outros dias que eu precisasse espairecer a mente. Já que eu ainda não tinha tido permissão de usar o piano do teatro. Nadar seria ótimo pra esquecer os problemas.

Tinha aproveitado o momento em que os meninos estavam nadando e mandei uma mensagem pra Will, avisando que ele não precisava vir me buscar na escola, já que Lipe se prontificou a me levar. Ao que parece ele iria fazer alguma coisa quando a aula acabasse, dessa forma ele iria embora na mesma hora que eu.

A professora mandou se preparar, e foi o que fiz. Assim que ela deu permissão pra entrar, eu pulei. No início meu cabelo certamente me fez falta, era como se eu tivesse perdido parte de mim, mas na volta eu consegui percorrer todo o caminho debaixo d'água, respirando apenas uma única vez, e ainda fui a primeira a chegar. Seguida por Ashley e Marcie que chegaram praticamente ao mesmo tempo. A professora mandou-nos dar mais duas voltas em nado livre, meu favorito, e uma em nado borboleta, que eu não fui por não saber como era. Eu nunca participara de aulas de natação, a única coisa que eu sabia era o nado livre, que Liam tinha me ensinado quando eu tinha 11 anos. Do contrário, até hoje não saberia nadar.

Ela mandou outras 6 garotas subirem aos seus blocos e eu e as meninas saímos da piscina. Assim que eu saí, soltei meu cabelo. Provavelmente ele estava totalmente bagunçado, mas não ligava, só queria tampar alguma parte do meu corpo que o maiô não cobria. Coloquei parte do cabelo em cima do pequeno decote frontal e deixei o restante pendendo até meu quadril, cobrindo minhas as costas.

Sentei-me ao lado de Ashley, me enrolando na toalha pra me secar e diminuir um pouco o frio que estava sentindo. Ash conversava com Phillipe e eu observava as meninas nadando. Lindsey entrou praticamente desfilando e exibindo seu corpo escultural, embora um pouco magro comparado ao meu, carma das brasileiras, e fez uma pequena confusão por ter que entrar na água, já que o cloro iria "estragar as unhas e a pele" dela. Suas palavras, não minhas.

Coloquei meus fones e fiquei escutando música enquanto observava os meninos praticamente comendo Lindsey com os olhos e ela se aproveitando disso e tentando aparecer o máximo possível. Eu conhecia esse tipo de gente, pessoas ricas que acham que só porque têm dinheiro podem mandar e se achar melhor do que qualquer outra pessoa. Lindsey chegava ao cúmulo, ela se achava a rainha do colégio. Não a culpava, mas também não a isentava. Com tantas pessoas paparicando e adulando ela, seria difícil não se achar dessa forma. Mas pisar nos outros como ela fazia não era certo. Só esperava que ela não viesse me tratar assim, costumo ter paciência com esse tipo de gente, mas ultimamente tenho estado fora do meu estado comum. Felizmente ainda conseguia camuflar meus sentimentos bem.

– Você fica muito bonita com esse maiô. - escutei alguém falando ao meu lado, tirei o fone e me virei. Era Erick, um dos amigos de Chris. Corei.

– O-obrigada. - gaguejei, nunca soube como lidar com elogios, principalmente quando estava com tão pouca roupa. Ele assentiu e se virou pra frente, coloquei o fone, mas não antes de escutar um último comentário sussurrado dele.

– Sei onde você ficaria bem mais bonita sem nada disso.

Revirei os olhos e aumentei o volume da música, embora fosse contra escutar música alta no fone de ouvido, isso era melhor do que ficar escutando certas comentários de pessoas sem noção como ele.

No Brasil já tinha sido cantada várias vezes, e uma vez quase que acontecia o pior. Desde então meu pai me proibira de sair de casa sozinha. Eu só poderia sair se alguém fosse ou me buscar ou me levar ao local que eu queria. Daí a ideia do "motorista particular" e das aulas de defesa pessoal, Muay Thai e Jiu-Jitsu.

Assim que a aula acabou e os alunos foram para os vestiários, desenrolei a toalha do meu corpo e subi novamente no bloco de largada de número 3. Dessa vez estava com meu cabelo solto e não precisei esperar ninguém autorizar minha entrada. Impulsionei-me e pulei. Cheguei até o outro lado e voltei até metade da piscina em apenas um fôlego. Sempre debaixo d'água. Dei umas dez voltas até que me cansei e comecei a boiar no meio da piscina. Infelizmente logo me lembrei que tinha compromisso agora a tarde e precisava sair.

Nadei até a borda e saí da piscina, indo direto às arquibancadas, onde minha toalha estava com meu celular. Meus cabelos pingavam, coloquei-os na frente e tirei o excesso de água.

– Você nada muito bem. - virei-me com o susto e vi a professora atrás de mim, me examinando com os olhos. - Infelizmente não sabe uma modalidade que não seja nado livre. - não sabia o que responder, então optei por permanecer calada. - Você poderia competir em nome da escola, nunca vi alguém ter tanto fôlego quanto você. Como consegue?

– Só consigo por causa da música. Sabe, extensão e controle vocal. Preciso de muito fôlego pra segurar notas altas por muito tempo. - respondi dando de ombros. Isso foi umas das coisas que minha avó me ensinara em alguns dos muitos finais de semana que passei com ela enquanto meus pais trabalhavam. Ela era a única da família que me escutava cantar frequentemente.

– Seja lá quem te ensinou fez um ótimo trabalho. Me diga... - ela parou, como se tentasse lembrar de algo. Meu nome.

– Amy. - disse e ela assentiu.

– Me diga Amy, você costuma aprender as coisas rápido?

– As vezes sim. - respondi dando de ombros e temendo seja lá o que ela estava tramando. Ela olhou na prancheta que estava em sua mão, só agora eu notei que ela a segurava.

– Você vai fazer os testes para líder de torcida e vôlei. Quer participar da equipe de natação também? Precisamos de pelo menos uma menina no time e até agora não temos nenhuma. Você me parece bem promissora. - ela começou a me analisar novamente. Eu ia negar, dizer que não sabia nadar direito e só nadava por diversão quando ela me cortou. - Vou arranjar um bom professor de natação pra você. Bem-vinda a equipe de natação.

Ela estendeu a mão e eu a peguei, mesmo que receosa. Eu mereço, pensei sarcástica. Suspirei assim que ela saiu. Peguei minha toalha e fui ao vestiário que já estava completamente vazio. Tomei meu banho calmamente, vesti a calça vermelha que usei pela manhã e uma blusa de malha leve que peguei antes de sair atrasada de casa. Calcei a mesma botinha bege, recoloquei todas as minhas joias que eu tive que tirar para a educação física, penteei meus cabelos molhados, passei o brilho labial que eu tinha na bolsa, coloquei meus óculos de sol, peguei minha bolsa e saí.

Já eram 16h 13min quando cheguei ao estacionamento praticamente vazio, Lipe não havia chegado, mas seu Audi A5 branco ainda estava parado perto do portão do colégio. Olhei se tinha alguma chamada perdida no meu celular e nada. Rosolvi me sentar e esperar por ele, aproveitei para ligar pra Isabelle e avisar que eu teria de passar a tarde na casa de Lindsey. Ela atendeu no quinto toque.

– Demorou hein. To atrapalhando alguma coisa? - perguntei brincando, aproveitando cada segundo daquela ligação pra voltar a falar em português.

– Não, é que eu terminei de jantar agora... Você sabe, "nada de usar celular à mesa" - ela disse com uma voz grossa, na tentativa de imitar a voz do pai. Eu ri.

– Iai, como tá por aí? Gostando da faculdade?

– É muito puxada, mas bem legal! - ela começou a falar sobre as aulas favoritas dela, e de como ela é Liam estavam gostando da faculdade.

Pela forma que ela falava pude perceber que eles estavam bem próximos agora que faziam faculdade juntos e que não tinham alguém entre eles. Suspirei, estava triste e feliz ao mesmo tempo. Triste por estar longe dos meus melhores amigos, mas também estava feliz porque agora eles poderiam finalmente ficar juntos.

Eu sabia que Liam afirmava gostar de mim, mas sempre percebi que Belle sentia uma certa atração por ele. Só que nunca quis contar pra ninguém, nem mesmo pra mim. Agora eu percebia que eles estavam se aproximando, e que mais cedo ou mais tarde ficariam juntos de uma vez.

– Fico muito feliz que esteja gostando tanto da faculdade. - falei realmente feliz.

– Seria melhor se você estivesse aqui... Você sabe, planejamos isso durante todo o ensino médio. - ela deu um suspiro triste, senti meus olhos marejados.

– Ei, está tudo bem. Até que aqui não é tão ruim. - falei, mesmo que aquilo não fosse 100% verdade, ela não precisava saber. Ela ficaria muito triste, e eu não queria isso pra ela.

– Vai fazer o que hoje? - ela perguntou, percebi que tentava se recompor, provavelmente tinha chorado, respirei fundo pra não fazer o mesmo.

– Vou pra casa da loira oxigenada. - falei demonstrando o quanto eu não gostava dela.

– Daquela vadia despeitada? - percebi que ela estava revoltada. Isabelle tinha apelidado carinhosamente Lindsey de “vadia despeitada” depois que eu contei como ela costumava tratar as pessoas na escola.

– Ela mesma. - sorri. - Lipe vai me levar pra casa dela. Estou na escola esperando ele ainda.

– O irmão gato gente boa que a Ashley diva está apaixonada e não o 3g que você está apaixonada? - ela enfatizou bem o "você", me fazendo revirar os olhos, mesmo sabendo que ela não veria. Me concentrei nos apelidos que ela dera a cada um.

– 3g? - perguntei confusa, esse era novo, eu sabia que ela se referia a Chris, mas não sabia quais as características dele dadas por ela.

– Isso. Gato, galinha e garanhão. Porque cá entre nós, ele é muuitoo gato! - ela prolongou bem a palavra muito. Tive que rir da facilidade que ela tinha de criar apelidos.

– Você é muito criativa. - falei sarcástica, ainda rindo. Ela riu também. - Pelo visto você e Ashley são bem amigas, né? - perguntei tentando mudar de assunto.

– Ela me adicionou em todas as redes sociais. Conversamos todos os dias. Diferente de certas pessoas, - ela fez uma pausa dramática, tive que rir. - ela não se esquece de mim, ok? - ela fez voz de birra. Não me contive, comecei a gargalhar.

– Também te amo, sua birrenta.

– Grande amor esse, vive se esquecendo da amiga. - não a via, mas sabia que ela tinha revirado os olhos. Antes que eu dissesse alguma coisa escutei alguém se aproximando.

– Amy? - virei-me e encontrei Lipe segurando alguns livros e sorrindo.

– Amiga, tenho que desligar. Lipe já chegou e vamos sair agora. - disse levantando e andando na direção dele.

– Ok. Vou dormir daqui a pouco, então nos falamos amanhã?

– Pode ser. Manda um beijão pro Liam, diz que estou com saudades e manda ele aparecer mais vezes no whats, já devo ter mandado umas cem mensagens só de ontem pra hoje e ele não respondeu nenhuma.

– Normal, ele parou de usar o whats pra estudar. Ele também não me responde. Mas não se preocupe, eu converso com ele. Agora vai logo pra não deixar Lipe esperando. Manda um beijo pra ele.

– Mando sim. Te amo, amiga. Tchau.

– Também te amo, sua chata. Tchau. - desligamos juntas, Lipe esperava eu encerrar a chamada pra falar comigo.

– Desculpe a demora, acabei perdendo a noção do tempo. - falou enquanto caminhávamos juntos em direção a seu carro, peguei dois dos quatro livros dele. Um era de geografia, outro de história, e os outros dois de espanhol. O que chamou minha atenção foram os livros que ele estava segundo, já que não me deixou pegá-los. Ambos eram sobre o Brasil.

– Tudo bem, estava conversando com Belle, aliás, ela te mandou um beijo.

– Já conversei algumas vezes com ela, acho que Ashley tem mais, como posso dizer... - ele pareceu pensar em qual palavra usar. - Intimidade? É, acho que é isso. Ela parece ter mais intimidade com Belle. Deve ser por isso que ela está tendo uma evolução tão grande nas aulas de espanhol. - deixamos os livros na traseira do carro e entramos, ele do lado do motorista e eu do carona.

– Pode ser, Belle sabe falar espanhol fluentemente. Já eu sou péssima. - ele riu e eu acompanhei. - Está querendo aprender mais sobre o Brasil?

– Mais ou menos isso. - ele respondeu dando de ombros.

– Se tiver alguma dúvida é só perguntar, estou disposta a ajudar já que você quer aprender sobre o meu país. Só não sei se vou poder ajuda-lo nas aulas de espanhol. - disse rindo, ele me acompanhou.

– Obrigado.

O caminho para a casa de Lindsey foi bem tranquilo. Ficamos conversando sobre o colégio, ele me contava coisas que aconteceram nos anos anteriores. Lipe fazia parte do time de futebol, embora preferisse a natação, o time dificilmente durava um semestre todo, já que os alunos desistiam e o time acabava. Ele acabou me contando também dos anos em que ele e Ashley estudaram juntos. Não sei como, mas somente pela forma que ele falava dela, percebi que os sentimentos de Ashley eram correspondidos. Não me contive e perguntei.

– Você gosta da Ashley, não gosta? - mesmo com ele olhando fixamente para frente percebi que tinha corado levemente, os músculos de seus braços se enrijeceram.

– Por que você acha isso? - ele perguntou sem me olhar

– É como se tivesse um telão bem grande em sua testa. - disse sorrindo, ele me encarou um pouco antes de voltar sua atenção para a pista, já estávamos em um condomínio, provavelmente o que Lindsey morava.

– Está tão na cara assim? - ele perguntou enquanto parava o carro em frente a uma casa consideravelmente grande, que seguia o padrão de todas por ali. Toda branca por fora, devia ter no mínimo uns 3 andares, um jardim grande a frente e que se estendida pelas laterais e provavelmente no fundo da casa também.

– Só pra quem observa bem suas ações e expressões. - disse dando ombros e continuei enquanto pegava minha bolsa no banco de trás. - Ao falar sobre ela seus olhos brilham e você sorri com o canto da boca sem ao menos perceber. Seu tom de voz é admirado e de quem quer algo a mais do que simples amizade. Ou até mesmo de que sente algo mais do que um simples gostar. - sorri diante da expressão assustada dela. Abri a porta do carro. - Obrigada pela carona. - ele ainda me olhava incrédulo. Saí do carro e fechei a porta, mas antes de me direcionar a casa dela me abaixei a janela e terminei. - Aliás, vocês formam um belo casal.