O misterioso caso de Ayne Clearwater escrita por Menino das Sobrancelhas Firmes


Capítulo 8
8 - Demônio




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/450481/chapter/8

Eu estou encarando seus olhos cor do mar e eles estão me olhando de volta. Entre nós, apenas a fumaça criada pela minha respiração e grades.

–Você até que demorou bastante. –Diz a menina de longa franja, agora um pouco mais bagunçada do quê o normal.

–Porque você não foi me buscar? Ah é, você está morta. –Dou um sorriso baixo.

Eu não preciso olhar pra ela, não agora... Meus cabelos estão embaralhados sobre meus olhos, minha cabeça baixa, meus braços envolvendo as pernas junto ao corpo me mantendo colado na parede acima da pequena cama confortante na cela da prisão.

–Eu pareço morta pra você? –Agora ela está em pé do outro lado de minha cela, não ao lado como anteriormente.

Levanto os olhos.

–Porquê diabos você queria me incriminar? –Pergunto.

–Ian... Ian... –Ela dá uma pequena risada. –Eu jamais faria isso com você. Eu criaria algo pior.

–Então quem Ayne? Quem? –Meus olhos encontram os seus.

–Eu não posso contar. Eu já disse que não lembro. Talvez seja assim do outro lado... Apenas um vão branco e grande.

–Cala a boca porra. –Digo alto. Olho ao redor, não há ninguém no corredor e as outras celas estão vazias. –Olha onde você me faz parar... E agora... Lilian está morta.

–Lilian não morreu em vão, ela foi um aviso...

–Um aviso? –Pergunto.

–Um aviso de que você está perto demais... Talvez muito perto, e alguém quer te afastar. –Ayne senta ao meu lado.

–É perigoso demais para mim Ayne, eu não posso simplesmente cair fora disso... Eu cansei de você.

–Não diga isso. Eu me sinto fraca, você está me matando...

–Você vive de mim. –Digo rindo.

–Não, você vive de mim Ian... O que diabos é você sem Ayne? Nada! –Ela ri e segura minha mão. –Mas você sempre vai me ter querido.

–Talvez eu já não queira mais. –Soluço. Quanto tempo faz desde que estou chorando? –Eu gostava mais de você quando você estava morta.

Ouço o som de passos e instantaneamente viro de frente para a única porta de metal no fim do corredor, uma mulher de cabelos avermelhados e curtos vem andando enquanto masca um chiclete, ou finge mascar... Quem sabe?

–Pagaram sua fiança, você pode ir mocinho.

Olho para o lado, o calor da mão de Ayne ainda está em cima da minha, mas não há mais ninguém na cela a não ser eu.

Caminho lentamente por todas as grades vazias e quando passamos pela porta, estou em uma sala com uma bancada. Tomo minhas coisas e passo por outra porta de vidro sendo protegido por dois seguranças.

–Quem pagou minha fiança? –Questiono.

–Eu. –Uma voz rouca surge na sala seguinte. Eu não o conheço! Tenho certeza que não...

O cara loiro de olhos verdes e barba mal feita tira sua jaqueta de couro e estende pra mim.

–Você vai precisar disso. –Ele avisa.

–Quem é você?

–Vem comigo, eu te explico no caminho. –Sua voz é estranhamente familiar, mas nunca lhe vi antes.

–Que caminho?

–Pra sua casa.

Talvez ele fosse amigo de um de meus amigos, quem diabos era esse cara?

Quatro policiais andam para fora da delegacia e então eu noto que nada de bom pode estar me esperando lá fora, sem pensar duas vezes, aceito a ajuda do estranho de barba mal feita e me cubro na jaqueta escondendo o rosto.

Quando as portas são abertas, uma chuva de flashes cai sobre mim enquanto vozes soam por todos os lados, um monteiro de jornalistas começa a avançar sobre meu corpo até que o desconhecido começa a me guiar para o banco de trás de um carro.

‘Ian, Ian, você realmente matou Ayne?’ ‘Ian, onde está o corpo dela?’ ‘Ian, Ayne está viva?’ ‘Ian, você transava com ela?’ ‘Ian, o que aconteceu com Ayne Clearwater?’.

Por trás do vidro, vejo quando o cara da a volta pela frente de carro e bate a porta. Ele buzina e logo estamos acelerando o mar de pessoas, cortando caminho sobre a rua. Quando estamos longe o suficiente dos poucos carros que tentaram nos seguir, finalmente questiono.

–Quem você é?

Ele fica calado e liga o aquecedor, só agora noto meus dedos brancos de frio.

–Você não me conhece... Mas se ajuda de algo... Adam!

–Porque você veio me buscar?

–Eu precisava falar com você, e sua fiança nem era tão cara assim...

Ok, a teoria de que ele era um herói enviado por amigos foi fracassada. Talvez eu pudesse me jogar do carro em movimento, não me machucaria tanto assim.

–Eu sou o que você chama de... –Olho para ele pelo retrovisor, seus olhos estão nos meus, não na estrada. –Você!

Balanço a cabeça lentamente como se tentasse afastar algum inseto, mas na verdade, o pequeno inseto não passa de longas confusões que atravessam minha mente.

Pisco e vejo Lilian morta com as mãos na garganta tentando me contar algo...

–Eu conheci o que vocês chamam de Ayne Clearwater por aqui... Na minha época ela tinha outro nome.

–Bridget Jones. –Sussurro.

–Então você não sabe tão pouco quanto pensei... –Ele sorri. –Você realmente matou aquela vadia?

–Como você pode ser ‘eu’ e odiar Ayne? –Pergunto.

–Pelos mesmos motivos que você vai odiá-la quando ouvir o que tenho a falar.

O carro para, estamos no meio da rua. Há um poste longe de nós com a luz falha, ninguém nas janelas das casas, nem um outro carro em metros de distância.

–Eu era melhor amigo de Ayne como você foi. Até que de alguma forma, ela me cativou, me aproximou... Porque é isso que Ayne faz.

–Faz? Não fazia.

–Ela te aproxima e quando você finalmente está entrando, é quando ela fecha as portas e te afasta. Mas ela não é esse anjo todo que todos pensam.

–É? –Porque ele continuava usando os verbos no presente? Não era para ela estar morta?

–Ayne me procurou para contar um segredo algum tempo depois de seus pais morrerem... E é por isso que ela se mudou, por isso ela precisou nascer novamente.

–Do que você estava falando?

Ele remexe em alguns papeis no porta luvas e me entrega um documento, não sei o que é até ler o topo, ‘Certidão de óbito’.

–O que diabos é isso? –Pergunto.

–Ayne Clearwater morreu há sete anos Ian...

O ar foge de meus pulmões, eu consigo ler tudo escrito na pequena xerox mas meus olhos querem pensar que é mentira. Meu estomago está revirado. Eu estou afogado em um lago profundo dentro de mim mesmo, um lugar onde eu fui quem cavou.

Minha cabeça arde e eu sinto que um milhão de agulhas estão sendo enfiadas em meu peito, não consigo mover um dedo se quer... Estou em choque. Pelo canto do olho, vejo um velho espantalho enfiado na frente da casa dos Palers, talvez alguma assombração que não foi guardada após o halloween de meses atrás.

–Você continua ai?

Não, eu não estava... Eu estava perdido demais dentro de mim, mas de alguma forma minha cabeça balança confirmando.

–Ayne era a mãe de Bridget. A sua Ayne, sempre quis ser como a mãe... Sempre quis ter o que a mãe tinha... Ayne mesmo me contou isso! –Ele dá uma pausa, talvez esteja se perguntando se foi ele quem me deixou em choque. –E tem mais Ian... –Mais uma longa pausa. Olho para dentro da minha casa, há pessoas demais passando pela janela, só agora noto o carro de Phelipe e dos demais na entrada.

–Eu... –Não consigo continuar a frase.

–Bridget Jones...

–Ayne, Ayne Clearwater. –Corrijo.

–Ayne Clearwater matou os próprios pais. Ela disse isso pessoalmente á mim, fingiu que tudo era uma grande armadilha da mãe e saiu como a inocente em frente á todas as câmeras. Ela tinha sido o anjo que acabará de sair do pior dos pesadelos.

–Mas ela... Era um demônio. –As lágrimas escorrem como rios.

–Ayne matou o pai e depois cortou os pulsos da mãe, ela fugiu porque não conseguia viver consigo mesma... Então, após matar seus pais... Ela matou Bridget Jones também.

Abro a porta do carro e saio correndo, sem ver, um carro me atropela, giro. Ora céu, ora chão, ora céu, ora capô verde. Levanto de cima do amassado do carro e sinto o sangue descer frio de minha testa. O motorista grita alto e sai cantando pneu, Adam começa a correr para tentar me impedir, mas eu sou mais rápido e atravesso a sala de minha casa em um segundo. Todo mundo se assusta e perco a voz de todos quando Adam tenta explicar que me soltou e acabei de ser atropelado. Pego a velha folha em cima da minha penteadeira e estou pulando de dois em dois degraus com a mente fechada.

Vejo a boca de todos se movendo mas não ouço suas vozes, tomo algo da mão de Judas e empurro Reeser para sair de casa. Meus pés pesados chegam até a casa vizinha e é então que começo a ouvir o que estou gritando por trás dos soluços.

–AYNE DEIXOU QUE EU LHE BEIJASSE UMA VEZ, PORQUE ELA SABIA QUE EU GOSTAVA DELA. –Não consigo me conter. Grudo o papel que peguei em meu quarto na cabeça do velho espantalho na casa vizinha.

–E como isso pode soar ruim? –Ector pergunta.

–Ela não fez isso por me amar, ela queria me dar esperança, para que eu continuasse preso á ela... Ayne era o demônio, e eu acho bom o fato daquela vadia ter sido assassinada! –Risco o isqueiro que tomei das mãos de Judas um pouco antes e sorrio enquanto assisto as chamas queimarem minha própria Ayne Clearwater. –Te vejo no inferno vadia.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E AI O QUE ACHARAM?



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O misterioso caso de Ayne Clearwater" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.