A última primavera escrita por Valerie


Capítulo 9
Noite em claro




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Dei dois passos para trás e como ele tinha feito aquilo tão rápido nem eu poderia imaginar. Em questão de instantes ele já tinha sentado na beirada da janela. Meus olhos brilharam ao ver seu rosto. Ele provavelmente percebeu minha tolice somente ao vê-lo.

– E aí, Clara? Como vão as coisas com sua mãe? - Ele perguntou.

– Olha, não estão lá as mil maravilhas.

Ele ficou me fitando até falar:

– Você está de castigo.

Parecia para mim mais pra uma afirmação do que pra pergunta.

– Sim. - Respondi transtornada.

– Você não disse que tinha cachorro.

Ele apontava pro pestinha que puxava o cadarço de seu tênis. Dei um sorrisinho de meia boca, por essa eu não esperava.

– Tem nome? - Ele voltou a falar.

– Não consegui ainda, ele chegou na família ontem, presente de aniversário.

Ele ficou parado, olhando por um tempo o cachorro de raça desconhecida e se virou para mim dizendo:

– O que você acha de “Sean”?

– Deixe-me experimentar, para ver se funciona.

Olhei para aquela pequena bola de pêlos que mordia o cadarço do garoto (que parecia não se importar) e disse:

– Sean larga o cadarço do...

Fiz um gesto com as mãos para ele, como se perguntasse seu nome e ele respondeu num sussurro, quase imperceptível:

– Paolo.

– Sean, solta o cadarço do Paolo.

Tentei novamente e por incrível que pareça ele parou, soltou o cadarço e ainda fez um barulhinho como choro. Fitei Paolo com um sorriso, tinha dado certo a escolha do nome, mas ele não parecia feliz comigo. Não entendi porque, o que eu teria feito de errado? Sem demora ele apontou para baixo e vi que Sean havia se escondido atrás das pernas dele.

– Isso não é nada bom, ele se assustou com você.

Ele abaixou e pegou aquela coisinha no colo e disse:

– Calma rapaz, ela não queria te assustar. Clara, acho melhor você se desculpar com ele...

– Como você quer que eu me desculpe com um cachorro?

Ele chegou perto de mim e passou Sean para meu colo, me senti culpada quando o senti tremendo. Sentei na cama e observei-o. Paolo sentou ao meu lado e pediu que eu abaixasse a TV.

– Como você sabe tanto de animais? - Perguntei ainda chocada ao ver o modo que ele agiu com Sean.

– Eu leio bastante e gosto de Discovery Channel...

Deitei Sean entre minhas almofadas e levantei da cama. Paolo pegou um livro que estava em cima da TV e me fez uma pergunta (bem, não era uma pergunta).

– Você gosta de ler mais sobre aventura pelo que vejo, não é?

Fui até a estante de livros, passei a mão nos livros e contei nos dedos até responder.

– É o tema que mais leio.

Antes que eu falasse mais sobre o assunto ouvi a porta batendo. Sandra chegou.

– Paolo me faz um favor? Se pendura rápido na janela agora e fica bem quietinho. Depois te explico tudo.

Ele fez uma cara estranha e fez o que eu disse, se pendurou pelo lado de fora. Assumo que fiquei super preocupada dele cair, mas seria uma questão de pouco tempo, e ele poderia cair em pé. Naquele nervosismo esbarrei com a mão engessada na cama.

– Aí! - Dei um grito sufocado.

Mamãe entrou no quarto e ficou encarando a janela enquanto eu me contorcia de dor. Virei-me preocupada, pensando que ela tivesse vendo Paolo, mas não havia nada. Suspirei de alivio.

– Resolveu suas... Coisas? - Perguntei sem graça.

Ela fez que sim com a cabeça e antes de antes do quarto eu a segurei pela mão e disse:

– Depois nós conversamos está bem?

Novamente ele não soltou nenhuma palavra, mas assentiu com a cabeça. Fechei a porta com chave e corri para janela.

– Paolo? - Sussurrei.

– Já posso falar? - Ele perguntou levantando a cabeça como se estivesse fazendo barra.

– Na verdade não, hoje ainda é domingo, passa aqui na segunda-feira a tarde e nós conversamos melhor. Desculpa ter feito você esperar pendurado aí?

Ele fez que sim com a cabeça, escalou a arvore até chagar ao chão e eu me lembrar de devolver o casaco.

– Paolo volta aqui! Esqueceu o casaco comigo de novo.

Ele pegou e foi embora, alguma coisa me dizia que ele voltaria na segunda-feira. Saí do quarto e fui atrás de Sandra, que sentada no sofá toda encolhida vendo TV, quase cochilava. Sentei ao seu lado, respirei fundo e comecei a contar (tirando a parte que dormi com o casaco e meu sonho maluco de alguém alisando minha cabeça). Ele ficou bem impressionado com o que tinha contado.

– Clara dá um tempo pro Lorran, ele só pensou aquilo porque estava de cabeça quente. Mesmo assim você não tinha motivos para deixar todos te esperando.

– Desculpa mãe.

Deitei no colo dela e depois de uns minutos ela olhou pra mim dizendo:

– Mas você ainda está de castigo, pelo menos até se desculpar com Lorran, porque uma briguinha por crises de ciúmes...

– Tudo bem mãe, e não foi crise de ciúmes.

Vimos TV juntas até Lukas dar o ar da graça telefonando lá pra casa, avisando que dormiria na casa de Flávia aquela noite.

– Filha, como é o nome do menino da pracinha?

– Paolo, por quê?

Sua expressão desconfiada me fez estremecer.

– Nada não, estava pensando na infinidade de nomes que pode receber o tal garoto que tem a mesma doença que você...

Aquele comentário me deixou pensativa, depois de conversar com mamãe, tomei banho e fui para o quarto. Ao deitar na cama, minha cabeça pesou e não consegui dormi com a mesma facilidade do dia anterior, fui vencida pelo cansaço. Dormi pouco, passei a noite em claro e foi um tédio, bolando perguntas e curiosidades que faria a ele, pensando em mil combinações de roupa, e eu ainda pensava que não estava desesperada... Tive um pouco de medo de ele perguntar novamente uma coisa que também procuro a resposta:

– Quem teria me dado o colar?

Fiquei revoltada e ansiosa pelo dia seguinte. Então peguei um bloco para fazer anotações sobre coisas que passavam pela minha cabeça naquele momento. Quando me dei conta tinha escrito um poema. Um bonito poema até, que seria para o meu amor, que um dia chegaria.

Pequei novamente o livro na estante, mas dessa vez era um que Sandra tinha me dado de presente há algum tempo e eu nunca tinha tempo para ler. Li dessa vez todo o livro de poesias que falava sobre o amor adolescente e ao terminar passei a uma folha meu preferido e preguei no meu quadro de avisos.

O sol nasceu e com ele meu dia fantástico que estaria por vir.

Eu estava nervosa, roendo unhas e ele tranquilamente vindo em minha direção e Sandra sentada na cama ansiosa por conhecê-lo. Ele acenou de longe e eu retribuo. Em questão de minuto ele já tinha escalado a árvore, ele está cada vez melhor nisso. Foi engraçado ver a reação dele, com o rosto, mas branco que o comum, e uma expressão assustada.

– Oi, então você é o Paolo que minha filha tanto fala? Muito prazer.

Mamãe estendia a mão como boas vindas. Com a boca aberta ele apertou a mão dela e gaguejou algumas palavras:

– Desculpe-me, D. Sandra, eu ter entrado pela janela.

Nesse instante Lukas entrou no quarto com uma pêra na mão, falando que já tinha chegado em casa, até perceber nosso visitante recém chegado e perguntar na maior cara de pau:

– Qual foi a desse playboyzinho? Eu nem o vi entrando... E acabei de chegar!

Não me contive e dei uma gargalhada, aquela situação era constrangedora para o Paolo, mas para mim hilária.

“Até que ele é bonitinho, filha...”.

Os pensamentos de Sandra eram bons.

– Paolo, essa é a minha mãe Sandra, e aquele antipático na porta é o meu irmão Lukas.

Ele ainda estava em estado de choque quando comecei a apresentação.

– Como é que ele pode saber meu nome antes de me apresentar? - Indagou mamãe.

“Agora ele se ferrou legal”pensou Lukas estampando um sorriso malicioso.

– Por causa do seu colar, seu nome está escrito nele.

Era verdade, mamãe usava naquela manhã o colar que papai havia dado de presente de noivado.

– Lukas, meu filho, fecha a boca. - Disse mamãe rindo.

Lukas estava de boca aberta e a testa franzida e pelos seus pensamentos ele ainda não sabia de onde o Paolo tinha vindo. Mas ele não deixou barato a piada feita as suas custas por mamãe e acabou me magoando.

– Você troca de amigos bem rápido não é irmãzinha?

Tentar se referir subliminarmente não da certo comigo, eu sabia que ele falava de Lorran e eu ainda não estava preparada para falar dele. Paolo percebeu meu choque e puxou um papo:

– Clara, você parece muito com sua mãe.

Sandra sorriu e puxou-o pela mão, arrastando-o para sala onde geralmente ela oferece muitas coisas fazendo qualquer um se sentir sem graça.


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