A última primavera escrita por Valerie


Capítulo 11
Velha Amiga




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– Você poderia me acompanhar até o consultório? É que eu preciso tirar o gesso.

Olhei-o entre os dedos, porque simplesmente tapei o rosto para que ele não pudesse ver meu rosto vermelho. O sorriso dele era tão lindo que tive que tirar as mãos do rosto para olhá-lo mais facilmente.

– Claro. Que horas é a consulta?

– Pra falar a verdade, se nós não sairmos nesse exato momento, estamos perdidos.

Apontei para o relógio e mostrei a ele que teríamos quinze minutos para chegar ao consultório.

– Você tem carro?

Mas que pergunta besta que eu fiz.

– Eu? Ainda não, bem que eu queria.

Ficamos em silencio pensando em quem poderia nos levar. Até ele ter uma idéia e me segurar pela mão querendo que eu descesse pela janela. Apontei para minha chave de casa e ele suspirou.

– Calma, eu tenho que trancar a porta.

– Tinha esquecido desse detalhe, mas você pode trancá-la e sair pela janela comigo.

Eu ri, sou totalmente desastrada não consigo nem andar em linha reta no meio fio.

– Mas eu não consigo... Quando sobrar tempo vou te contar como foi um desastre quando Flávia tentou me lavar na aula experimental de balé.

Ele pegou a chave da minha mão e apelou fazendo a carinha de pidão e dizendo:
– Eu te seguro, juro.

Acabei cedendo novamente, não era fácil me controlar. Fechei a porta e cheguei no quarto certa de que me esborracharia no chão. Paolo brincava com Sean quando cheguei, eles se entendiam muito bem, diferente de Sean com Lukas se mordiam na medida do possível. Coloquei um casaco e tentei fazer minha carinha de pidona, mas não adiantou.

– Tenha piedade de mim, Paolo...

Ele não me respondeu simplesmente me puxou pela cintura até a janela.

– Estou com medo, tenho medo de altura!

– Calma Clara, assim você esta me enforcando, presta atenção onde você coloca o pé, se não você pode escorregar ou me machucar.

Aproveitando da situação, me agarrei a ele como um filhote de macaco na mãe, e quando chagamos ao chão ele fez uma piadinha:

– Você precisa praticar mais.

– E você precisa aprender a passar pela porta.

Rimos juntos e corremos por um caminho que rapidamente reconheci, o da casa dele. Ao chegarmos ao prédio, não subimos no elevador, ao invés disso descemos de escadas até chegarmos a garagem me senti confusa e perguntei:

– O que estamos fazendo aqui?

– Podemos chegar no consultório atrasados, mas chegaremos sem esforço. Com a ajuda de uma velha amiga.

Não gostei dessa historia de velha amiga, quem era? Foi bem estranho ele entrar num lugar escuro e sair falando:

– Te apresento minha velha amiga.

Eu ri de mim mesma por ter sentido ciúmes de uma bicicleta.

– Pronto sobe aí, acho que o atraso não será tão vergonhoso.

Ele já estava em cima dela, me propondo uma viagem ao consultório, como não teria outro modo de chegar lá em cinco minutos subi e me segurei nele para não perder o equilíbrio. A porta da garagem se abriu e ele pedalou o mais rápido que conseguia para chegar ao nosso destino.

Meu cabelo voava bagunçado, mas isso não me importava naquele momento. Sentir o perfume que saia se sua roupa era anestesiante. Bem, pra quem nunca tinha tido certeza de que estava gostando de um garoto esse era um bom começo. Chegando lá senti uma tontura ao descer da bicicleta, olhei o relógio e vi que estávamos pouco tempo atrasados comparado ao que calculamos. Entrei na salinha e o Dr.João olhou espantado pra mim, me segurou pelo braço e implorou que eu sentasse.

– Por que está tão abatida, Clara?

– Eu só preciso beber um pouco de água.

– Vamos tirar o gesso então?

Fiz uma cara de desânimo junto com um biquinho e me levantei, peguei o braço de Paolo pedindo que ele viesse comigo.

– Eu sou um pouco fraco com essas coisas, me deixe ficar aqui na sala de espera mesmo.

Acenei com a cabeça e fui em direção a sala que tirei o gesso. Depois de me sentir livre e leve o Dr. João pediu para nós conversássemos a sós. Para mim não teria problema então ouvi tudo que ele tinha pra falar.

– Clara, o que aconteceu com você? Você parece tão abatida.

– Eu não dormi direito essa noite. – Menti.

– Não minta pra mim, você não pode estar assim só por isso.

– Então, Dr., pesquise e me informe o mais rápido possível.

Agora mais do que nunca eu queria estar bem para conhecer mais profundamente meu novo amigo. Eu não queria perder tempo lá, então saí da sala e vi Paolo sentado na cadeira olhando pra baixo.

Voltamos para casa, mas ninguém havia chegado. Achei melhor ficar na portaria do prédio conversando, lá também não tinha ninguém, mas ao menos não quebraria a regra numero um da casa. No meio da conversa ele me surpreendeu com uma pergunta:

– E a sua amiga Lívia? Não vai fazer as pazes com ela?

Aquele assunto me deixou pensativa.

– É melhor eu ligar pra ela.

Lembrei do recado que Lorran havia me dito algumas semanas atrás.

– Então liga logo, porque amanhã é o primeiro dia de aula do semestre.

– É o quê? Nossa! Eu tinha me esquecido completamente. Falando nisso onde você estuda?

Eu morria de curiosidade e aproveitei o assunto pra engatar nas perguntas.

– Já acabei o colegial, faço faculdade de veterinária.

“Ele deve ser genial”pensei.

Senti-me uma anãzinha perto dele, ainda teria que tomar coragem de perguntar a idade. Ficamos conversando sobre muitas coisas, uma delas era o meu colégio, que por um acaso ele conhecia. A conversa durou até Sandra chegar a tarde e convida-lo para um lanche, o qual ele negou agradecido.

– Então você me liga? - Ele me perguntou.

– Claro que sim! - Respondi como se fosse uma resposta para uma pergunta besta, e era (ao meu ponto de vista).

O mês de julho tinha acabado e aquelas foram as melhores férias que já tive. Conhecer o Paolo foi maravilhoso, em apenas um mês eu poderia dizer que o conhecia desde a infância, ou quase isso. Na maior parte que passamos juntos ele me contornava quando o assunto era ele e me fazia falar de mim todo o tempo. Mas eu vou descobrir.

Primeiro dia de aula do semestre se resume em: fofoca de como foram as férias e viagens do povão, geral de ressaca e professores fazendo piadinha. Arrependi-me amargamente de não ter fingido uma dor de barriga e ter ficado em casa, o remorso cresceu ainda mais quando vi Lorran sentado no longe de mim, logo atrás de Lívia que não parava de me encarar.

No intervalo resolvi ficar em sala, resolvendo problemas de química que tinham ficado pra casa. Concentrei-me nas quatro primeiras questões, depois deixei a tabela periódica de lado e fiquei me perguntando o que Paolo estaria fazendo naquele momento. Não demorou muito pra Lívia aparecer na sala, fechando meus cadernos e livros, fazendo uma cara bem feia de braços cruzados me encarando.

– Por que você não me ligou?

Sua voz não parecia estar baixa nem em volume alterado, era direto.

Não respondi, mas ela insistiu:

– Não consegui, Lívia.

Naquela hora era tudo que conseguia falar, tinha metido Lívia na briga sem ter motivos, por mais que eu quisesse admitir eu estava envergonhada.

– Você agora tem um novo amiguinho e está nos trocando por ele, não é?

Ela não me deu tempo pra responder e veio com sete pedras na mão.

– O Paolo para sua informação, foi uma das pessoas que me incentivaram a fazer as pazes com você, sabia?

Eu não quis incluir Lorran nessa história, porque Paolo não havia dito nada sobre ele. Ela ficou perplexa por uns instantes, mas voltou a rebater:

– Eu duvido muito, ele não conhece você, muito menos a mim.

Não queria brigar com ela (de novo) então resolvi não aumentar a voz.

– Ele me conhece bem mais do que você possa imaginar.

Naquele momento ela entendeu que tudo que eu não queria era mais um motivo para brigar. Lívia sentou na cadeira, na minha frente e segurou com carinho a mão que eu tinha tirado o gesso no dia anterior e disse:

– O Lorran pode estar fazendo essa pose de durão, mas sente sua falta assim como eu.

– Eu também.

Aquela foi uma ótima oportunidade de fazer as pazes e eu aproveitei bem. Sorrimos uma para outra e o restinho de tempo que sobrou do recreio conversamos sobre o que tínhamos feito nas férias, demos boas gargalhadas. O sinal tocou e Lorran entrou na sala com uma cara bem feia, fez sinal com a cabeça para Lívia sentar lá, ao seu lado. Ela se virou para mim e pensou:

“Eu vou falar com ele para aliviar a situação”

Em seguida ela piscou para mim e eu entendi o recado. O resto da aula eu observei-a e vi que ela se esforçava em convencê-lo a falar comigo, mas eu ainda me sentia magoada. Acabou a aula e ele não desgrudou dela um minuto. Resolvi ler a mente dela para saber de alguma coisa, me esforcei e ouvi dentre muitos pensamentos na multidão de alunos:

“Ele é muito cabeça dura, mas acho que vou conseguir convence-lo. Não hoje... Clara vira pra trás e olha aquele bofe do outro lado da rua!”

Para ela me mandar olhar, devia valer a pena, me virei para agradá-la porque eu tenho certeza de que nenhum garoto é mais bonito que...


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