"Cara humana, por que nos teme? O que vê em nós de tão assustador? Te amedrontam os nossos pecados? Ora, deixe de modéstia! Somos como vocês. Seres mergulhados no vício, no hedonismo. Nascidos das trevas. Traidores, impiedosos. Movidos pela ira, pelos instintos. Pela insanidade. Somos monstros, corruptos, trapaceiros. Escravos do próprio sangue frio e da podridão. Mas veja só: antes de toda a nossa existência imortal, éramos como vocês. ÉRAMOS VOCÊS. Então me diga, criança: de onde supõe que herdamos nossa imundície? Ah! Vejo que sabe a resposta. E não adianta gritar. Nada vai mudar a realidade, minha querida. Posso ser cruel, mas no fundo você sabe que também é. Que nos merecemos. Porque minha existência apenas deixa explícito o quão repulsivo e decadente este mundo sempre foi. Não concorda, criança?"

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"Minha querida, entristece-me o fato de que meu herdeiro é a juventude, tal como a sua - mesmo que de legado eu possa fornecer apenas minha maldição. Quão tolas são as crias da Terceira Revolução Industrial; submersas em privilégios a que não dão valor; em busca de prazeres que satisfaçam seus volúveis desejos, cada vez mais absurdos; adeptas fiéis da filosofia hipócrita, da religião cujo deus é ninguém senão eles mesmos. Seu egocentrismo e hedonismo exacerbados, no entanto, são sobremaneira convenientes para aqueles como eu - que podemos lhes dar aquilo que tanto anseiam: o fim de sua mera existência, seja por meio da morte, seja por meio da eternidade maldita. Não negue, criança. Aceitar é mais fácil, ainda que doloroso."

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“Posso contar-lhe uma história? ... Considero seu silêncio um gesto de assentimento, pois presumo que está preparada para ouvi-la. Digo-te, então: é sobre uma donzela crédula e o monstro que a seduziu. Sobre a aliança a que se submeteram, embora com díspares anseios. Para um, o furto de todas as virtudes de seu objeto de desejo. Para outro, a tentativa frustrada de encontrar razão em sua existência por meio da experiência alheia. Como me disse há muitas décadas um sábio miserável cuja vida poupei da humilhação da indigência, o bem fracassa perante o mal devido a seu inconveniente hábito de advogar pelas causas perdidas. Esta é nossa história, pequena. Consegue vê-la desenrolar-se diante de seus olhos?”