O Desaparecido escrita por Coelhos do Sol


Capítulo 12
Um Filete de Mel


Notas iniciais do capítulo

Feito por: Hanna Sakamoto & Mellyne Saboia
Roteiro por: Hanna Sakamoto



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Um Filete de Mel

Tão puro quanto a loucura

O dia amanheceu muito sombrio e frio, o céu estava branco e fumaça saía dos lábios das garotas enquanto elas respiravam. Abraçando=se, caminharam em direção a casa da fazenda, tomando cuidado para que ninguém as visse. Mas não era preciso, pois o fazendeiro (e nem Sebastian) estava do lado de fora. Enquanto temia o pior, Nádia andava arrastando os pés, um atrás do outro, enquanto seu corpo inteiro esperneava involuntariamente de frio. Seu nariz estava roxo e os dentes batiam enquanto ela tremia. Victoria não estava muito melhor.

Chegaram na varanda alguns minutos depois de começarem a caminhada. O corpo estava duro o bastante para impedi-las de se sentar na escada. Nádia resolveu entrar e se arriscar. Com dificuldade, encontrou a foice no bolso e a tirou. Seus olhos encontraram os de Victoria e a menina deixou claro que estava torcendo e orando por ela. Nádia olhou em volta e, embora não tenha dito nada sobre Arthur, Victoria já deveria saber que ele não tinha voltado.

Respirando fundo, ela abaixou a cabeça e abriu a porta da casa, sentindo o súbito ar quente e abafado do lugar. Ao contrário do que imaginava, só havia um corredor depois da porta, e ele era feito de pedra. Tochas presas na rocha crepitavam enchendo o lugar de sombras deformadas e fantasmagóricas. Ela deixou de tremer, fechou a porta sem fazer ruído e então, pé frente pé, andou em direção ao final da caverna.

A respiração acelerada, o pulso correndo em disparada. Ela emanava medo. Os poros de sua pele soltavam isso no ar e foi o aviso que Roxana precisava para saber que seu plano tinha dado certo. Enquanto caía dentro da cama de gato, Nádia só podia sentir algo em sua garganta querendo sair.

Quando chegou no final da caverna e viu a figura do corpo de Sebastian pendurado pelas mãos por correntes ligadas ao teto de pedra. Somente Sebastian, mais ninguém. Cicatrizes e hematomas salpicavam sua pele, uma baba fina e brilhante escorria pelo canto de seus lábios, como um fio de mel.

– Seba... – ela disse, colocando as mãos na boca e correndo em direção ao menino, abraçando-a e tomando-o nos braços.

Sebastian arqueou o corpo, sentindo dor. Mas Nádia não percebeu isso. Ergueu o corpo para soltá-lo das correntes, e como era forte em exagero conseguiu entortar as correntes. Sebastian caiu em seus braços, pesado e semi-morto. Um deja vu lhe invadiu e ela se lembrou do dia em que teve de carregar Sebastian nas costas, e ele babava em seu ombro. Sorriu tristemente, colocando-o nas costas e guardando a foice no bolso, certa de que não teria de usá-la.

Quando saiu da caverna, Victoria lhe fez várias perguntas, mas no final ajudou a carregar Sebastian. As duas então partiram para a parte da frente da fazenda, onde o mato era alto. Então, correndo pela relva, viram um corpo deitado sobre o mato. Quando Victoria insistiu em ir ver quem era, Nádia sentiu que não deveria deixar. Mas não pôde fazer nada. Ainda mais quando Victoria viu os cabelos pretos e desgrenhados de Arthur.

Ela desabou a chorar, detectando que não tinha respiração.

Vitória começou a gritar descontrolada, xingando tudo e todos, enquanto agarrava-se ao corpo de Arthur. Nádia desviou o olhar, encarando Sebastian, que tinha os olhos embaçados, distantes.

Após alguns minutos, a filha de Iris se acalmou, permanecendo em um choro contínuo, porém baixo. Ela sussurrava para ele, como se esperasse que ele ouvisse. Nádia sentia-se cada vez pior. Sabia que não podiam ficar ali, ou seriam encontrados, tinham de resgatar Dionísio. Mas não queria atrapalhar Victoria. Sentia-se culpada.

Nádia então colocou a mão sobre o ombro de Victoria e a puxou levemente para trás, enquanto colocava Sebastian de lado na relva.

– Temos que ir, Victoria - estava lutando para não falhar.

Victoria bateu em sua mão, tirando-a do ombro e se debruçou sobre Arthur, chorando num fio de lágrimas translúcidas, quentes e pesadas.

– Eu preciso salvar Dionísio, Victoria. - Nádia disse forte, porém estava fraca por dentro. - Se você não vier, eu irei sozinha.

– Você tem razão - ela disse, com a voz abafada pela camisa de Arthur - Você tem de ir. Salve Dionísio. No fim é só um que resta, e essa pessoa será você. Arthur já se foi, eu me vou agora. Quem sabe você possa livrar Sebastian disso.

Nádia engoliu a seco. De fato, ela não podia carregar Sebastian sozinha até lá, muito menos em sua situação atual, louco. Ela encarou o corpo de Arthur, e se curvou, sussurrando um "desculpe-me" em seu ouvido. Abraçou Vitória, e tentou conforta-la em seus braços. Céus, pela primeira vez, ela iria sentir falta de alguém.

– Obrigada - disse Victoria, abrindo um sorriso fraco para ela.

A filha de Bia sorriu, e assentiu, passando o polegar pelas bochechas de Victoria, limpando as lágrimas.

Nádia foi até Sebastian. Seu coração disparou, quando seu olhar vago a encarou. Ela segurou a face dele em suas mãos, e contornou sua sobrancelha com o polegar, achando-o tão bonito quanto nunca. Embora esse olhar vago.

Tinha consciência de que Sebastian poderia nunca mais voltar ao normal. Mas então, com um aceno de mão e respirando fundo, pegou-o e o colocou sobre as costas, novamente. Olhou uma última vez para Victoria, odiando cada passo que dava para longe da fazenda.

Resolveu, então provocar uma mensagem de íris, usando o poço da fazenda, um balde e um dracma. Pediu por Hanna, no Acampamento, que era praticamente sua única fonte de forças, agora.

– Ah, oi, Nádia. - Hanna coçou os olhos - Eu só estava tirando uma soneca..

Nádia lhe mostrou um leve sorriso, fraco e doloroso.

– Hanna. - sua voz falhou. - Eu... Não sei o que fazer... Não sei para onde ir...

Hanna a encarou, tentando tirar as informações de que precisava.

– Sonhei com você, ontem. - Hanna contou. - Você estava correndo por um breu muito escuro. E então Dionísio veio e lhe acariciou o rosto, enquanto te abraçava e te confortava. Ele parecia um pai. E então você apertou a garganta, como se estivesse sendo sufocada por nada.

Nádia piscou um pouco, antes de absorver tudo. Ela então sorriu fraco e assentiu, para Hanna. A outra menina entendeu tudo na mesma hora, e passou a mão pela névoa, dissolvendo-a. Sem dizer nada, elas se comunicavam muito melhor.

Ela esboçou um sorriso, e começou a andar pelos campos, cada vez mais confiante, ate encontrar uma fortaleza. De parreiras, claro.

Era como uma torre, torcida, e com um circulo perfeito no topo. Algo lhe dizia que Dionísio só poderia estar lá.

A estrada estava vazia, e os campos da fazenda de Roxana já tinha se perdido na paisagem. Ela ponderou entre deixar Sebastian no meio da relva ou levá-lo junto. Não poderia arriscar lutar, pois estava machucada e a benção de Bia já tinha ido embora.

Sebastian, por sua vez, estava fora de cogitação de poder se virar sozinho. Ele podia sair correndo para o meio da estrada, ou então simplesmente pegar a arma do adversário e se cortar. Ele estava sem juízo, não tinha discernimento do certo ou errado.

Ela bufou, pegando-o e o colocando de todas numa árvore que estranhamente tinha crescido ao lado da estrada. Pegou a mochila de Sebastian das costas dele e então olhou lá dentro. Tinha uma camisa do Green Day, a bolsa de tiracolo que era sua aljava e uma corda. Ela piscou ao encontrar a corda, pois não tinha visto aquele objeto até agora.

Sentiu a leve brisa envolvê-la, com cheiro de tempestade, e então fazer seus cabelos flutuarem. Olhou para cima. Era como se as nuvens lhe sorrissem.

– Zeus... - sussurrou. - Obrigada.

Usou a corda para prender Sebastian contra a árvore, quando terminou, colocou a mochila dele na cabeça, para que ele pudesse se apoiar e dormir. Enquanto tentava arrumar a mochila, ele segurou seus punhos com as duas mãos e então os olhos pretos lhe encararam.

– Não me deixa. - ele pediu, de um jeito arrastado, como se estivesse tentando lembrar como se falava.

– Me desculpa, eu não posso fazer mais nada...

– Por favor, não me deixa. - agora havia desespero em sua voz. Ele então começou a se debater, enquanto arrancava as cordas e o nó bem-feito de Nádia. - Eu não quero ficar aqui! - gritou, enquanto seu rosto se tornava vermelho e ele se debatia mais, balançando as pernas incontrolavelmente.

Nisso, Nádia começava a chorar. As lágrimas brotavam, rolava, e chegavam em seus lábios, dando-lhe um gosto salgado na língua. Era tampou a boca, enquanto somente observava Sebastian se debater contra as cordas que ela tinha usado.

– Você não vai conseguir, são mágicas... - ela sussurrou. - Seu pai me deu.

– Tire isso de mim! - ele gritou, já com a voz rouca - Me tira daqui! Não em deixa aqui! Por favor!

– Me perdoe, Sebastian... - ela deu alguns passos para trás e então, retirando a foice do bolso, correu para o forte de parreiras, de onde vinha um cheiro forte de vinho.

A verdadeira guerra estava apenas começando.


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