O Desaparecido escrita por Coelhos do Sol


Capítulo 10
Nádia Encontra o Buraco


Notas iniciais do capítulo

Feito por: Mellyne Saboia
Roteiro por: Hanna Sakamoto (Obrigada, linda)



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Nádia Encontra o Buraco

de Alice.

Eles perderam somente cinco horas procurando os cavalos e os guardando, o que tinha levado a noite para três da madrugada. Com jantar de Hécate e os banhos preparados por Sasha, perderam mais cinco horas, chegando a dormir um pouco. Ficaram na fazenda até oito e cinqüenta e dois, quando Arthur não agüentou mais ficar parado. Todos os machucados de Sebastian e Nádia tinham sido tratados e os suprimentos abastecidos. Hécate era uma pessoa muito atenciosa quando estava devendo algo para alguém.

Por fim, já quase obesos de tanta atenção, pediram que ela os ajudasse logo no destino final. E foi isso que Hécate fez, antes é claro, com um discurso final.

– Vou levar vocês para o lugar onde devem estar. Saibam ou não aquela górgona estava levando vocês para o caminho certo, porém ela era mandada por nosso inimigo, e eu estou do lado de Dionísio.

– E mesmo assim não fica irritada em ter uma filha traidora – Nádia suspira.

– O que meus filhos fazem não é do meu interesse, as escolhas são deles, não minhas. As conseqüências são deles, não minhas. Assim é que se aprende na vida. – Hécate piscou – Agora vamos para a missão!

Sasha segurou a respiração, como se Hécate fosse mostrar seu maior truque de mágica. Assim, quando a mulher balançou as mãos, o ambiente tomou um aspecto de escuro, sendo iluminado somente pelos raios que entravam da janela.

– Tchau, forasteiros! – Sasha acenou a mão, enquanto eles se viam envoltos de névoa. A mão de Nádia procurou insanamente a mão de alguém que pudesse agarrar.

Queria ter certeza de que não era algo ruim, de que estavam todos ali.

Conseguiu segurar a mão de Victoria, que devolveu o aperto, como se dissesse “Eu também estou morrendo de medo”. Compartilhar o medo era algo que Nádia nunca tinha pensando em fazer. Na verdade isso era mais uma das coisas que ela jamais tinha pensado em fazer, e que agora fazia.

Hécate e o resto da fazenda começaram a ficar invisíveis, parecendo uma hora estar ali, outra hora não. Então, finalmente, a névoa se tornou densa o suficiente para que Nádia e nenhum outro pudesse ver o que acontecia do lado de fora. E então, num piscar de olhos, conseguiram sentir a relva nos calcanhares e avistar a casa de veraneio ao longe.

Era grande e tinha três andares, e por pouco Nádia não a confundiu com a Casa Grande, mas essa casa era verde musgo, não amarela e feliz. E não tinha colina. Não tinha quadra de vôlei ou de basquete. Nada de muro de escalada ou o arsenal. Estábulos ou qualquer outra coisa assim. Somente a casa e mato. Mato alto.

A fazenda não estava nem um pouco bem cuidada. E o dono tocava uma viola sentado numa mesa de balanço. Era um rapaz de pelo menos trinta anos, com os cabelos pretos e encaracolados, olhos azuis vívidos e um sorriso com dentes pontudos. Ele usava uma camisa branca polo e uma calça cáqui com botas de cavalgar.

Os cabelos cacheados estavam escondendo as sobrancelhas.

O homem acenou de sua cadeira, chamando Nádia e os outros para perto. Eles correram até a casa e então saldaram o homem com Boa Tardes.

– Eu me chamo Roxana – diz ele com um sotaque sulista. – O que estão fazendo perdido em Luberton, na Carolina do Norte, jovens?

“Roxana é nome de mulher”, pensou Nádia, mas somente apertou a mão do homem.

– Me chamo Nádia, sou de Washington. Esses são meus amigos Victoria, Arthur e Sebastian, de Long Island.

Roxana assentiu, tirando o chapéu de caubói da cabeça. Ele afundou na cadeira de balanço mais uma vez e então continuou a cantar e tocar a viola.

– Andando – por fim o fazendeiro disse – Ninguém fica parado numa fazenda. Tem muita coisa pra fazer, preciso que coloquem as parreiras no alto das grades lá na horta.

– Mas você está parado – Nádia revirou os olhos.

– Ora, eu sou o dono da fazenda. Vamos, se quiserem ficar aqui até anoitecer, façam.

Hécate disse que eles tinham sido mandados para o lugar certo, praticamente o fim do mundo, e a Carolina do Norte era quase como a Amazônia do Brasil, perdia por pouco para Nova Jersey, que era tipo o Acre.

Então, se Hécate tinha dito que era ali que tinham de estar, eles só podiam obedecer. Mas era bem mais difícil e cansativo do que parecia. Arbustos de rosas com espinho ficavam ao lado das videiras, e era bem no alto as grades. Somente Sebastian e Arthur alcançavam. Sendo a mais baixa, Victoria tirava as parreiras do caminho. E eram pelo menos vinte metros somente de vidas.

A tarde veio e a barriga de todos começou a roncar, mas mesmo assim não pararam. Enquanto dava os ramos para Arthur, ela via com o canto do olho Sebastian pendurar as uvas mais bonitas de um lado, enquanto as mais novas ficavam do outro. Tudo muito organizado.

Arthur se empenhava, separando as videiras mortas das saudáveis. Arrancaram as que tinham pulgões e estavam mortas, colocando-as de lado. Tudo isso levou quase a tarde inteira e o começo da noite. Quando terminaram e Roxana apareceu com copos d’água, limpara o suor na surrada camiseta do Acampamento e beberam com vontade. Mas sobrou um copo. Roxana tinha levado quatro.

– Onde está Victoria – perguntou Sebastian.

– Vic? – Arthur se virou, e então para o outro lado. – Victoria! – chamou. Mas nada respondeu. Um desespero bateu seu rosto e ele começou a rodar em círculos, chamando o nome da menina.

– Ela deve ter se perdido no meio das flores – Nádia suspirou – Vou procurar por ela.

– Eu vou junto. – Sebastian se levantou – Vou procurar ente os legumes.

– E eu vou ver na frente da casa, perto do mato. Talvez ela tenha voltado para lá.

Todos combinaram, enquanto deixavam Roxana e seu último copo d’água para trás, somente desejando boa sorte.

º º º

Já era nove horas da noite quando Nádia, por fim, viu o último canteiro das orquídeas. Nossa, como aquele jardim era grande! Voltou para a casa, onde Sebastian já esperava pelos outros. Ele não tinha tido sorte, nem ela. Agora era só confiar em Arthur. Nádia sabia que Arthur não voltaria até achar Victoria.

Vamos mudar de foco.

Arthur movia o mato, enquanto gritava o nome de Victoria, já com a voz rouca. Ele suava e sua energia estava esgotada. Precisava de uma boa noite de sono, porém não iria deixar Victoria para trás. Um pânico que ele nunca tinha experimentado o dominava enquanto a noite se aproximava. Quanto mais os minutos passavam, mais tinha certeza de que perdera Victoria para sempre.

Tudo por causa daquele Roxana. Quando eu o encontrar vou estrangular e...

Seus pensamentos eram esses. Roxana tinha causado tudo, na sua opinião, pois Victoria não teria sumido por causa de eles se concentrarem em apenas uma coisa.

A noite chegava mais avassaladora do que nunca, e ele começava a temer o pior. Enquanto o frio lhe acariciava a pele e o pânico lhe contava histórias de dormir, Arthur por fim viu um vulto entre o mato e correu até lá, abraçando o próprio corpo, numa tentava falida de afastar o frio.

Quando chegou mais perto, porém, vislumbrou o chapéu de caubói, e então sua raiva o inundou, fazendo-o pular em direção ao fazendeiro. Roxana, surpreso, arregalou os olhos, sendo sufocado por Arthur em seu surto de ódio. Enquanto Arthur mantinha sua atenção em Roxana, o homem olhava sempre por cima de seu ombro. E então Arthur sentiu algo o puxar, coisas se grudavam em seu braço e após muito tempo com as uvas, percebeu que o que o segurava tinha o mesmo aspecto que as parreiras. As videiras se enrolavam e cachos de uva floresciam ao redor de seu corpo. Ele ia sendo espremido. Primeiro as pernas imobilizadas, depois a cintura, os braços, o tronco e por fim o pescoço. Quando ele tentou puxar o último fôlego de ar para a boca, as videiras se apertaram e todo o ar em seu pulmão vazou sem permissão. Sufocado e imobilizado, Arthur tentava em vão impedir que as videiras lhe cobrissem o rosto, mordendo-as com os dentes. Mas por fim, não pôde fazer muita coisa, pois ficou completamente enroscado. Não era visível nenhuma parte de seu corpo.

Após três minutos tentando controlar o ar restante dentro de seu corpo (como tinha aprendido nas aulas de mergulho do Acampamento), morreu asfixiado.

º º

º

Pela manhã, Nádia acordou. Tinha adormecido encostada na varanda, esperando Arthur voltar. Sentiu o ombro pesar e percebeu que Sebastian se apoiava nela. Novidade nenhuma. Quando tentou movê-lo, ele soltou um gemido de censura, acordando e olhando para ela com os olhos caídos de sono.

– Eu estava acordado até agora pouco – Sebastian se defendeu.

– Ok. – Nádia olhou em volta – Onde está Arthur?

– Não voltou ainda – Sebastian bocejou – Deve ter virado a noite procurando.

– Essa fazenda não é tão grande assim. – Nádia se levantou. – Temos de encontrar os dois, agora!

– Calma – Roxana sorriu – Eles logo aparecem.

Nádia se virou, assustada. Não tinha percebido que o fazendeiro estava em sua cadeira de balanço, com uma manta cobrindo os joelho e a viola em mãos.

– Aposto que os dois devem ter arrumado um jeito de sair junto. – Roxana voltou a falar, piscando dessa vez.

Nádia teve ânsia de vômito ao pensar no que Arthur e Victoria poderiam estar fazendo.

Nádia percebeu que desde o sumiço de Victoria o fazendeiro estava tranqüilo demais, e isso não era bom sinal. Quando, por fim, ele sugeriu que começassem a cantar, ela chamou Sebastian e sussurrou em seu ouvido: Ele deve estar tramando algo. Vamos fugir.

E Sebastian concordou com um sorriso animado. Era sempre legal fugir.

Quando Nádia tirou a foice do bolso e a expandiu, virou-se para o fazendeiro, que levou um susto tremendo ao ver a arma nas mãos de Nádia.

– Consegue vê-la? – perguntou ela, aproximando a foice do pescoço do homem. – Sabe o que é isso?

– Na minha o-opinião, as crianças não deveria brincar com armas... – Roxana gaguejou.

– Sabia que essa belezinha é abençoada com névoa para mortais? – Nádia sorriu, ainda fazendo seu plano – E sabe o que eu vou fazer agora?

Roxana sorriu, animado, se levantando da cadeira e já com as mãos prontas para produzir ramos e sugar e esmagar Nádia. Mas, quando ela percebeu que ele estava confiante demais para apenas um simples fazendeiro, disse com os dentes trincados:

– Eu vou fugir!

E saiu correndo entre as plantações, vendo Sebastian logo atrás dela com o canto do olho. Quando estava já na metade da horta, vislumbrou parreiras vindo em sua direção e quase alcançando seus calcanhares. Com sorte, conseguiu pular no meio de algumas macieiras, caindo nas folhas dela. Nas folhas não, num buraco. E não era um buraco qualquer, era fundo e demorou até ela escorrer para o plano. Ainda ouvindo o som das parreiras e dos gritos de Roxana, ela correu mais para dentro, tropeçando em uma mochila e caindo em cima de alguém que dormia tranquilamente.

Ouviu então o grito que lhe trouxe ao medo completo: Uma exclamação de dor de Sebastian, e então mais barulhos das parreiras. E enfim, nada.

O completo silêncio. Com o tremor em seu corpo inteiro, Nádia se odiou profundamente por não ter ido ajudar Sebastian. Ela tinha sido egoísta... Enquanto começava a fungar e ficar nauseada, sentiu os olhos arderem e o nariz pingar. De pouco a pouco as lágrimas chegaram e então desatou a derramar uma casquinada de lágrimas. Rindo como uma louca, chorando como uma depressiva. Senti ao nariz escorrer, as lágrimas entrarem em sua boca e molharem sua língua. Esperneou e chutou, deitada sobre o corpo da pessoa lá dentro. Quando começou a gritar incontrolavelmente coisas que eu mesmo não consegui decifrar (deveria ser grego antigo), sentiu os braços lhe envolverem, e então enfiou a cara entre os seios da menina.

– Calma... Tudo vai dar certo... – ela sussurrou, enquanto passava a outra mão nos cabelos d Nádia. – Tudo vai dar certo, eu prometo.

Nádia, aos poucos, se acalmou. Era meio irônico, pensando agora que já se passara meses depois desse ocorrido, afinal deveria ser Victoria a chorar e Nádia a consolar. Mas foi totalmente o contrário. Victoria às vezes tinha uma coragem de leoa. Neste momento, porém, até mesmo eu me sentei ao lado das duas, e comecei a cantar gentilmente uma canção que minha mãe costumava me cantar. Era para dormir, e era mágica, pois quem a ouvisse até o final dormia profundamente pelas próximas cinco horas. E era disso que as duas precisavam, elas tinham de dormir. E assim, pouco a pouco, caíam no sono, uma no braço da outra. Como verdadeiras irmãs.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenha gostado, beijos.



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