Contando histórias escrita por Julieta


Capítulo 4
Cego e o amigo Gedeão á beira da estrada


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem!



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– Este que passou agora foi um Volkswagen 1962, não é, amigo Gedeão?

–Não, Cego. Foi um Simca Tufão.

–Um Simca Tufão?... Ah, sim, é verdade. Um Simca potente. E muito econômico. Conheço o Simca Tufão de longe. Conheço qualquer carro pelo barulho do máquina.

Este que passou agora não foi um Ford?

–Não, Cego. Foi um caminhão Mercedinho.

–Um caminhão Mercedinho! Quem diria! Faz tempo que não passa por aqui um caminhão Mercedinho. Grande caminhão. Forte. Estável nas curvas. Conheço o Mercedinho de longe... Conheço qualquer carro. Sabe há quanto tempo sento á beira desta estrada ouvindo os motores, amigo Gedeão? Doze anos, amigo Gedeão. Doze anos.

É um bocado de tempo, não é, amigo Gedeão? Deu para aprender muita coisa. A respeito de carros, digo. Este que passou não foi um Gordini Teimoso?

–Não, Cego. Foi uma lambreta.

–Uma lambreta... Enganam a gente, estas lambretas. Principalmente quando eles deixam a descarga aberta.

Mas como eu ia dizendo, se há coisa que eu sei fazer é reconhecer automóvel pelo barulho do motor. Também, não é para menos: anos e anos ouvindo!

Esta habilidade de muito me valeu, em certa ocasião... Este que passou não foi um Mercedinho?

–Não, Cego. Foi o ônibus.

–Eu sabia: nunca passam dois Mercedinhos seguidos. Disse só pra chatear. Mas onde é que eu estava? Ah, sim,

Minha habilidade já me foi útil. Quer que eu conte, amigo Gedeão? Pois então eu conto. Ajuda a matar o tempo, não é? Assim o dia termina mais ligeiro. Gosto maia da noite: é fresquinha, nesta época. Mas como eu ia dizendo: uns anos atrás mataram um homem a uns dois quilômetros daqui. Um fazendeiro muito rico. Mataram com quinze balaços. Este que passou não foi um Galaxie?

–Não. Foi um Volkswagen 1964.

–Ah, um Volkswagen... Bom carro. Muito econômico. E a caixa de mudanças muito boa. Mas, então, mataram o fazendeiro. Não ouviu falar? Foi um caso muito rumoroso. Quinze balaços! E levaram todo o dinheiro do fazendeiro. Eu, que naquela época já costuma ficar sentado aqui á beira da estrada, ouvi falar no crime, que tinha sido cometido num domingo. Na sexta-feira, o rádio dizia que a polícia nem sabia por onde começar. Este que passou não foi um Candango?

–Não, Cego, não foi um Candango.

–Eu estava certo de que era um Candango... Como eu ia contando: na sexta, nem sabiam por onde começar.

Eu ficava sentado aqui, nesta mesma cadeira, pensando, pensando... A gente pensa muito. De modos quem formando um raciocínio. E achei que devia ajudar a polícia. Pedi ao meu vizinho para avisar ao delegado que eu tinha uma comunicação a fazer. Mas este agora foi um Candango!

–Não, Cego. Foi um Gordini Teimoso.

–Eu seria capaz de jurar que era um Candango. O delegado demorou a falar comigo. De certo pensou: "Um cego? O que pode ter visto um cego?" Estas bobagens, sabe como é, amigo Gedeão. Mesmo assim, apareceu, porque estavam tão atrapalhados que iriam até falar com uma pedra. Veio o delegado e sentou bem aí aonde estás, amigo Gedeão. Este agora não foi o ônibus?

–Não, Cego. Foi uma camioneta Chevrolet Pavão.

–Boa, esta camioneta, antiga, mas boa. Onde é que eu estava? Ah, sim. Veio o delegado. Perguntei:

"Senhor delegado, a que horas foi cometido o crime?"

– " Mais ou menos as três da tarde, Cego" - respondeu ele. "Então" - disse eu- "o senhor terá de procurar um Oldsmobile 1927. Este carro tem a surdina furada.

Uma vela de ignição funciona mal. Na frente, viajava um homem muito gordo. Atrás, não tenho certeza, mas iam talvez duas ou três pessoas." O delegado estava assombrado. " Como sabe de tudo isto, amigo?" - era só o que ele perguntava. Este que passou não foi um DKW?

–Não, Cego. Foi um Volkswagen.

– Sim. o delegado estava assombrado. "Como sabe de tudo isto?" - "Ora, delegado" - respondi. - " Há anos que sento aqui á beira da estrada ouvindo automóveis passar. Conheço qualquer carro. Tem mais: quando o motor está mal, quando há muito peso na frente, quando há gente no banco de trás. Este carro passou para lá ás quinze para as três; e voltou para a cidade ás três e quinze." - "Como é que tu sabias das horas?" - perguntou o delegado. - "Ora, delegado" - respondi. - "Se há coisa que eu sei - além de reconhecer os carros pelo marulho do motor - é calcular as horas pela altura do sol. " Mesmo duvidando, o delegado foi... Passou um Aero Willys?

–Não, Cego. Foi um Chevrolet.

–O delegado acabou achando o Oldsmobile 1927 com toda a turma dentro. Ficaram tão assombrados que se entregaram sem resistir. O delegado recuperou todo o dinheiro do fazendeiro, e a família me deu uma boa bolada de gratificação. Este que passou foi um Toyota?

–Não, Cego. Foi um Ford 1956.


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Notas finais do capítulo

:)



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