“Está precisando de alguma coisa, Princesa?”

Tirei os olhos da janela e encarei Dara, que tinha preocupação em seus grandes olhos castanhos. Forcei um sorrido pondo uma mecha de meu cabelo atrás da orelha.

“Pode me dizer para onde estamos indo?”, pedi com a voz suave.

“Desculpe, Princesa, mas não.”, Dara se retirou.

Suspirei sabendo que poderia descobrir com facilidade. Todos estavam tentando manter seus pensamentos afastados do local onde o avião pousaria, porém em algum momento abaixariam a guarda. Só que tinha uma parte de mim que não queria saber, apenas para não planejar como voltar. Recostei no banco, encarando a janela novamente.

Do outro lado do corredor Felicity fingia ler uma revista, mas eu sentia seus olhares furtivos na minha direção. Era estranho o fato de eu nunca ter tido uma Guardiã mulher. Felicity era ruiva com os grandes olhos castanhos e como não vi nada que parecesse ligá-la a um poder físico, deduzi que ela era uma Lutadora. Isso me fascinou um pouco, já que nunca tinha conhecido esse tipo de Dark antes. 

“Você está com o meu pai há muito tempo?”, perguntei procurando puxar assunto. Felicity abaixou a revista e deu um pequeno sorriso – pelo menos me davam guardiões carismáticos. Ao perceber o tom da minha pergunta, eu corei. “Não quis dizer daquele jeito, eu só...”, passei a mão por meu rosto e de repente me dei conta de uma coisa. “Você e meu pai não estão juntos, estão?”

Por mais que tivesse conhecido os meus pais separados, não conseguia imaginá-los de outra maneira que não fosse juntos. Apostava que se não fossem as responsabilidades dos reinos, iriam ser felizes e me dar mais irmãos que eu poderia agüentar.

“Eu trabalho para o seu pai desde que me formei.”, ela respondeu educadamente. “Ele é um bom homem e um rei digno.”

Ergui uma sobrancelha.

“Você aceita que ele tenha tido um romance com uma Carmim e tenha uma filha mestiça?”, indaguei.

Todos naquele avião sabiam de mim e da história toda. Na verdade, eu sabia que alguns dias antes do meu aniversário de dezoito meus pais contariam ao reino a verdade sobre o meu nascimento. Muitos ainda não tinham me visto, outros apenas se questionavam quem era o pai ou a mãe da princesa. Ninguém tinha a resposta.

Felicity respondeu com um dar de ombros.

“Não tenho que aceitar nem deixar de aceitar.”, ela disse e se inclinou na minha direção. “Mas eu gostei de você. É bastante diferente dos esnobes com quem treinei na academia.”, voltou a se sentar direito. “Deveria dormir, Princesa. A viagem vai ser longa.”

Respirei fundo, sabendo que ela tinha razão. O problema era que, todas as vezes que eu fechava os olhos – até mesmo para piscar – a imagem de Ethan invadia a minha mente. Estava chateada com o fato de ele não ter vindo se despedir, mas uma parte de mim o compreendia. Também estava cansada de dizer adeus. Queria vê-lo mais uma vez, mas com certeza que ele ficaria de vez. Me despedir de Christina foi tão difícil quanto seria me despedir dele.

“Não acredito que está indo embora de novo”, ela disse me abraçando. Seus belos olhos verdes estavam tão marejados quanto os meus. Acariciei as suas costas e suspirei. “Seus pais só podem estar querendo quebrar o meu coração.”

Dei um sorriso triste.

“Não só o seu, Christina.”, peguei a mão dela e a guiei até a minha cama. Sentamo-nos. “Ethan e eu dormimos juntos ontem.”, confidenciei vendo seus olhos arregalados. Fiquei um pouco surpresa também por ela não ter visto isso, então recordei-me que foi uma decisão de última hora vindo das duas partes. “Eu terminei com Drake, não se preocupe.”

Ela franziu o cenho.

“Qual foi a ordem exata dos fatos: Drake ou Ethan?”

Suspirei.

“Ethan”, respondi vendo-a abrir a boca para me repreender. “Christina, eu vou embora em poucas horas. Por favor, só quero que me ajude em uma última coisa.”, botei a mão em meu peito, percebendo a aceleração de meu coração. “Preciso que você veja se vamos dar certo. Se pela primeira vez na minha vida vou estar fazendo a decisão certa e que quando voltar não encontrarei Ethan com uma mulher mais bonita e menos princesa do que eu. Ou pior, com a Nara.”, fiz uma careta.

Christina me olhou com empatia pegando em minha mão.

“Jordan, eu não ficaria preocupada com Nara se fosse você. Ela parece estar bem entretida com seu novo guarda costas.”, ela me esclareceu. Ergui uma sobrancelha, não vendo nada demais além de implicâncias entre Pierre e Nara. “Mas, o que eu queria dizer é, eu não posso saber o real futuro de você, até vocês tomarem uma decisão. Se ambos decidirem ficar juntos, verei vocês juntos. Mas se um desistir...”, ela deixou em aberto.

Abaixei os meus olhos, decepcionada.

“Nessas horas ser vidente não é tão útil.”, Christina disse com um sorriso fraco. “Se eu pudesse ter visto tudo o que sofreu, eu teria impedido.”

Encarei-a.

“E você viu seu futuro com Dimitri?”

Suas bochechas coraram e ela mexeu em seu cabelo loiro. Eu estava feliz que ele estava crescendo novamente, mas demoraria em ser tão grande quanto na época em que nos conhecemos. Ela riu sem graça dos seus pensamentos.  

“Tentei muitas vezes, Jordan, não vou ser hipócrita. Vi nós dois dançando – e depois descobri que estava vendo a sua festa de apresentação de meses atrás. Era lindo, magnífico. Mas só foi até aí. Eu o amo muito, sabe? Podem ter se passado três anos, mas Dimitri continua sendo o mesmo homem por quem me apaixonei.”

“E vocês não voltam por que...?”

“Porque somos medrosos.”, ela riu. “Nos beijamos, sabe? Muitas vezes. E tem o problema de ele ser seu guardião.”, ela ergueu as mãos. “Não me leve a mal. Só que quando você levou o tiro, ao invés de ir na sua direção, Dimitri veio até mim. E nós percebemos que se amamos você, não podemos colocar o nosso romance em primeiro lugar. Temos que amadurecer o suficiente para colocar nossas responsabilidades em primeiro lugar.”

“Sabe que estou me sentindo culpada, certo?”

Christina passou um braço ao redor de meus ombros.

“Não sei o motivo. Não foi você que mandou que nos separássemos.”, ela ficou séria e olhou no fundo dos meus olhos. “Jordan, se você quer ficar com meu irmão para de fugir. E quando ele for idiota, dê um chute no traseiro dele. Confie em mim, funciona.”

“Eu o amo, não vou chutá-lo.”, gargalhei. “Talvez eu chute um dia.”, dei-me por vencida. Abracei-a. “Eu também amo você, Christina e quero que seja feliz. Então use o tempo que vou estar fora para se resolver com Dimitri, ok? Prometa-me.”

Ela sorriu e ergueu o dedo mindinho.

“Prometido.”

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O avião pousou duas horas depois e eu estava louca para tomar um banho, comer e me jogar na cama. Não fiquei nem um pouco impressionada quando paramos em um tipo de praia tropical com uma miniatura do castelo Carmim – descobri a quem pertencia o terreno. Tobias levou as malas para dentro de casa com a ajuda de Dara enquanto eu e Felicity caminhávamos pela praia. Tirei os sapatos, sentindo a areia por meus dedos e a ponta de meu vestido roçando em meus tornozelos.

“Precisa de alguma coisa, Princesa?”, a Guardiã me perguntou com um sorriso. “Caso contrário irei entrar e ajudar o pessoal.”

Balancei a cabeça.

“Pode ir, Felicity. Vou ficar vendo o mar um pouco.”

Ela assentiu e se retirou para a entrada do mini castelo. Virei-me para o mar, sentindo o vento contra o meu rosto e respirei fundo, sentindo o cheiro da maresia. Por um segundo lembrei-me da visão que tive dias atrás quando Ethan me visitou. Que estávamos naquela praia, jogando água um no outro. Talvez Christina tivesse razão e se eu tivesse chamado Ethan para vir comigo, ele viesse.

“Estava pensando em ir embora sem falar comigo?”

Tomei um susto, virando-me para encarar os belos olhos verdes de Ethan. Ele estava com as mãos nos bolsos da calça caqui e sem camisa. Seus cabelos loiros balançavam com o vento, iguais aos meus. Pisquei, achando que estava alucinando, mas quando ele se aproximou de mim e seu cheiro tomou conta do meu olfato vi que era a mais real visão.

“O que você está fazendo aqui, Ethan?”

Ele tocou o meu rosto com a ponta dos dedos e sorriu.

“Estou cansado de dizer adeus a mulher que eu amo.”