O portador da lua escrita por Daughter of Apollo, AAJ


Capítulo 5
Alucinações da Branca de Neve


Notas iniciais do capítulo

Eu e a Filha de Apolo ficamos muito surpresas e felizes quando vimos que recebemos uma recomendação de uma leitora nossa. Muito obrigada Kyaaah! Você fez uma coisa incrível pra gente, nós amamos demais! Obrigada! Você é uma leitora muito diwa! E boa leitura a todos!



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Selene acordou assustada e fitou o teto do cômodo. Ela não se lembrava de ter ido dormir na noite passada, nem do que acontecera final do festival. A garota enumerou suas ações. Dançou com Stefan, com Carmem e com outros homens, e novamente com Stefan, até que...

Ela arfou e as recordações vieram em um jorro. A capa balançando no galho de árvore, o lobo, a corrida, a encruzilhada, a queda, e então... Nada. Seus olhos vasculharam o quarto parcialmente escuro e vazio.

Não era, com certeza, o quarto dela. Será que a levaram para a casa de algum curandeiro? O que aconteceu na noite anterior? Selene sentiu seu coração bater forte. Ouviu passos se aproximarem da porta. Deveria ser sua mãe, preocupada, ou Carmem, também preocupada. Mas o som que os passos produziam era pesado demais, assim, poderia ser Stefan, seu noivo, para ver se estava tudo bem.

Contudo, quando a porta foi aberta, Selene viu que não se tratava nem de Stefan, ou sua mãe, ou Carmem. Na verdade, não era ninguém que a jovem conhecia. Um estranho alto, de semblante sombrio, adentrou o cômodo. A Chapeuzinho sentou-se, ereta.

– Onde estou? Onde está minha mãe?

O homem passou a mão pelos cabelos.

– Você está aqui, comigo. Sua mãe... Olha, sei que você é bem apegada à sua mãe, mas sinto lhe dizer que não vai vê-la tão cedo, então, trate de desapegar. Até porque você já é bem crescida para essas coisas.

– O quê?

A Chapeuzinho arfou e recuou na cama. Um medo profundo se apoderou dela, um medo que ela só sentia... Bem, quando se tratava do lobo. Porém, ele não era o lobo...

– Quem é você?

– Sou Cristopher.

Na escuridão, Lene não conseguia enxergar seu rosto. Ela buscou em sua mente alguma explicação. Aquilo não parecia um sonho. Quer dizer, ela não sonhava com homens desconhecidos e estranhos. O que estava havendo ali? O que aconteceu com o lobo?

Decidiu se acalmar, ou pelo menos parecer que se acalmou, e começar a eliminar suas duvidas. Revisou as perguntas só mais uma vez e então decidiu começar pela que mais arranhava seu cérebro (com sua timidez fazendo-a gaguejar, claro):

– Onde estou?

– Não é hora para se falar disso. – Lene se assustou um pouco.

– O que houve com o lobo?

– Não é hora para se falar disso.

– Quanto tempo eu dormi?

– Não é hora para se falar disso.

– É hora de se falar de quê?

– Está com fome?

– Um pouco. – Na verdade, parecia que havia um esquilo em seu estômago e ele não parava quieto.

– Trarei comida. Tente se distrair até eu voltar, demoro menos de oito minutos. – E saiu do quarto sem deixar a garota responder.

Selene ficou encolhida na cama por um tempo, até que começou a ficar tonta. Ela estava sentindo o cheiro da relva, das árvores, e até podia sentir a folhagem em suas patas... Quer dizer, pés. Abriu seus olhos e ao invés de enxergar (ou tentar) o cômodo, viu uma bela árvore. Não conseguiu identificar o tipo de árvore no começo, mas algo, uma pequenina voz meio rosnada indicava que era uma macieira.

Andou em volta por um tempo planejando pegar alguns frutos, e logo se apoiou nas patas traseiras... quer dizer, pés, e saltou no tronco da árvore, agarrando firmemente com suas unhas e começando a escalar. Selene estremeceu quando finalmente voltou a si.

Olhou em volta duas vezes, olhou para suas mãos, seus pés, se levantou e foi até o espelho para se analisar. Tudo normal, na mais perfeita ordem. Ouviu passos atrás da porta e correu novamente para a cama e fingiu dormir.

O rangido da porta quase a fez desistir de sua atuação, mas ela conseguiu se forçar a continuar deitada, respiração uniforme, fingindo dormir. Ouviu o barulho de algo sendo deixado na cabeceira ao lado e logo mais uma espécie de rosnado sufocado, e então uma mão começou a acariciar levemente o cabelo de Selene. Apavorada, acabou estragando sua atuação quando mexeu seus pés nervosamente.

– Oh, então está acordada? – Uma voz masculina soou atrás de si, deveria ser o homem de mais cedo. Seus olhos começaram a marejar e ela novamente se sentiu infantil. Tinha medo, queria estar nos braços de sua mãe, queria estar no seu quarto, e então o soluço da menina acabou com o silêncio do ambiente. – Não, não, não. Não é hora para chorar, você é forte o suficiente para engolir seu choro.

Dizendo isso, ele se deitou do lado de nossa garotinha chorosa e a aconchegou em seus braços, fazendo carinho em seus cabelos, entoando uma canção qualquer e olhando diretamente em seus olhos. E foi aconchegada naqueles braços, com aquele carinho em seus cabelos, a voz suave como um predador entoando uma canção qualquer e olhando naqueles olhos que Selene dormiu sem dificuldade alguma.

Chapeuzinho acordou tempos depois, sozinha no quarto, que já estava mais iluminado. Era um quarto normal, com uma cama, uma cômoda, um baú e uma pequena bacia com água para lavar-se.

Selene levantou-se um tanto confusa, não havia ninguém ali com ela, nem mesmo o estranho com quem dorm... Ah. Meu. Deus. Ela dormiu ao lado de um homem desconhecido! Sua mãe a mataria se soubesse! E Stefan! Ele nunca mais iria querer se casar com ela. O que foi que deu em Lene? Por que não se comportou? Essa não é a maneira adequada de uma menina portar-se e...

Oh, o estranho deixou algumas maçãs, um pão de boa aparência e um copo com vinho em cima da cômoda. Ele falou algo sobre isso, não? Será que demorou oito minutos mesmo para buscar? Hm, confusa demais para contar. A memória da Chapeuzinho estava tão estranha.

Ela se lembrava do lobo e da capa vermelha esvoaçando... A capa, que jazia pendurada em uma cadeira. A ruiva a pegou e vestiu por sobre os ombros, sentia-se bem com ela. Assim, Selene comeu do pão e das maças com sofreguidão, mas não provou do vinho que acompanhava o alimento.

Ela queria tanto experimentar aquele líquido, descobrir qual seria o gosto, ele parecia tão bom! E a cor, atraente como a presa aos olhos de um predador, cintilante como o vinho que manchava suas mãos ao olhar o lobo cantar para ela debaixo de sua janela e logo depois matar um homem. A bebida escorria por sua roupa, manchando, manchando...

Ela desejava, entretanto, não bebeu do vinho. Após alimentar-se, nossa querida Lene tratou de se mexer, afinal, não podia ficar parada. Arrumou a cama direitinho, como sua mãe a ensinou, e abriu a porta do quarto. Encontrou em um estreito corredor que terminava em uma escada, a qual desceu, e se deparou com uma sala aconchegante, mesmo que um pouco suja e desleixada, os objetos desorganizados, – argh, devia ser coisa de homem, sua mãe comentava algo sobre isso - e com as janelas fechadas.

A Chapeuzinho procurou fazer silêncio para testar a porta e as janelas, que, para seu desespeto, estavam trancadas. Nada bom – quer dizer, nada bom mesmo. Sua mãe iria enlouquecer se soubesse que Lene estava encarcerada na casa de um homem, e pior, sem saber como foi parar lá. E, falando no homem, onde estava Cristopher?

Chapeuzinho procurou em volta, mas não o encontrou. Então, vendo a sujeira e o desleixo causado pelo típico comportamento de um macho humano, distraiu-se a limpar a casa. Era exatamente um comportamento que sua mãe aprovaria, que serviria para ter um bom casamento. Uma moça porca e preguiçosa não arranja marido, Antenodora sempre dizia. Stefan talvez gostasse disso, afinal, ele se agradou quando ela lhe trouxe aqueles doces, um pouco antes de ver...

Não, sem lembranças de mortes. Lene varreu, espanou, passou um pano, ajeitou, retocou... Bem, fez de tudo, como uma linda e encantadora Branca de Neve. Sua mãe gostaria muito de ver o trabalho que sua filha estava aprontando, toda cheia de energia, limpando a mesa, tirando o pó, polindo as facas do faqueiro, e por acaso uma delas era bem afiada... Lene, a respiração ofegante, olhou para a lâmina e ali viu seu reflexo. Mas, no reflexo, ela estava manchada de vinho, um filete do líquido escorria por sua boca. Onde estava o rosto inocente e cheio de ternura? A Chapeuzinho do reflexo sorriu. Por que sempre o vinho? Por que ela sorria? O gosto seria assim tão bom, como Lene imaginava?

De repente, um rangido na porta, o coração de Selene bateu tão rápido quanto o de um coelho, chegou até a ser doloroso. A voz de Cristopher atravessou o ambiente e alcançou os ouvidos da jovem ruiva com a faca na mão.

– Você está de pé, e parece bem. Que ótimo. – Ele então percebeu o objeto afiado e pontiagudo que Chapeuzinho tinha consigo e ergueu a sobrancelha – Tem certeza que quer isso? Não acho que facas assim sejam para garotinhas.

Lene não largou a lâmina.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por lerem, e mais uma vez, obrigada pela recomendação Kyaaah!