Evolution escrita por S A Malschitzky


Capítulo 5
Capítulo dois




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– O que aconteceu com ela? – Escuto uma voz de garoto, parando com os passos ressoantes.

– Shh. Vai acordá-la. – rumoreja uma garota esfregando alguma coisa nas mãos.

– É melhor que ela acorde, sua idiota. Ai ela mostra que não está morta. – Escuto uma risada baixa.

– Você sabe ler, Scott. Ela está viva – Escuto os bipes de alguma máquina. – Olhe para as máquinas. Está normal.

– Parece carne e osso... – A voz do garoto baixa um pouco, mas ainda não é um sussurro.

– Tay disse que acha que ela não come direito há anos. – a garota continua rumorejando. – Vamos embora. Ela acordará daqui a pouco.

Sinto alguém tocar meu braço fino.

– Não notaram isto? - diz o garoto.

– Vamos. – Escuto passos novamente.

– Falaremos para...

– Vamos, Scott – Escuto um zumbido e uma porta se fechando.

Tento abrir os olhos, mas enxergo apenas uma luz branca e redonda fazendo-me fechar os olhos novamente e sonhar com Alice e suas armas, assim como suas risadas malucas.

– Ei! – grita alguém, estalando os dedos e me sento, aturdida e olhando para os lados e me deparando com um garoto de cabelos lisos e olhos azuis. – Bom dia... quer dizer. Boa tarde. Bom dia para você que...

– Pare de confundir a coitada – resmunga uma garota. Viro o rosto para encará-la, no canto da sala, sentada em uma cadeira de metal, analisando as unhas curtas, com os cabelos ruivos e lisos caindo sobre os ombros.

– Não estou confundindo-a – Ele diz para ela, mas agora me encarando. – Estou confundindo você?

– Calem-se – diz uma mulher mais velha, com os cabelos escuros presos em um rabo de cavalo e os olhos grandes e azuis me observando. Ela sorri, e seu sorriso é diferente, mas até parecido com o de Carol. Pode ser apenas minha imaginação. – Como se sente?

– Bem. – digo esfregando meu rosto, com as mãos cheias de cortes limpos, apenas com uma casca de sangue seco. Encaro meu pé, agora enfaixado, mas os dedos finos com as veias aparecendo soltos entre a faixa branca. – Eu acho. Onde eu estou?

– A salvo – diz a mulher, que acho ser Tay.

– E eu vou confundir a coitada, não é? – O garoto sorri. – Em um quartel. Como ela disse, está a salvo. – Ele encolhe os ombros largos. – Não sabemos seu nome...

– Leah – digo esfregando os olhos, com o estômago roncando e a boca com gosto de papel velho. Respiro fundo, ainda esfregando meus olhos. Sinto meu cabelo – pela primeira vez em quase dois anos – limpo e escovado, batendo quase no final de minhas costas. – Leah Green.

– Tem certeza? – pergunta ele.

– Tenho – digo encarando-o com os olhos estreitos. – É o meu nome.

– Não é por nada. Apenas não parece ter muita... certeza.

– Tay, tira o Scott daqui, por favor. – diz a garota. – Deixa que eu vou junto – Ela se levanta, me encara por um momento e puxa o braço do garoto com uma blusa branca e uma calça camuflada, assim como a garota e Tay.

– Desculpe-me pelos dois – Tay ri. – Meu nome é Taylor. – Ela estende a mão. Sabemos o que aconteceu... quero dizer. Pelo seu estado, supomos o que aconteceu.

– Elvis Steve – digo encarando-a. Não a conheço, mas que se dane. Ela limpou meus ferimentos e espero que não vá me largar na rua quando me recuperar.

– Ah, foi o que imaginamos.

– Ele disse que me adotaria... quando eu ainda morava num orfanato – digo e arregalo os olhos. – Tem um telefone?

– Ah... creio que não exista mais – Ela diz, um tanto desapontada, assim como minha expressão agora. – Não sei o que aconteceu com eles, mas em Los Angeles, não existe mais nenhum. – Ela suspira. – Sim. Ele disse que lhe adotaria e...

– Me prendeu em uma jaula no porão...

Conto tudo o que aconteceu, com todos os detalhes possíveis – inclusive meus sonhos mirabolantes e o sanduíche de queijo -, sobre Kevin, as festas de aniversário, tudo o que Elvis disse e ela escutou atentamente, balançando a cabeça e franzindo o cenho às vezes.

– Que horror – diz ela piscando algumas vezes, encarando o lençol fino e branco sobre mim, mas sem observar um ponto fixo. – Não imagino o quão... – Alguém bate na porta. – Sim?

– Hudson voltou! Precisa de um quarto! – grita uma garota.

– O que tem ai dentro? – grita um garoto. – Que droga. – A porta se abre e um garoto todo sujo de sangue e lama entra no quarto, tirando a camisa branca – pelo menos costumava ser branca – e jogando no chão, pulando em cima da outra cama e tirando as botas.

Rolou no chão?

– Com licença? – pergunta Taylor. – Não vê que tem outra pessoa aqui?

– Oi – Ele acena com a mão esquerda. Percebo uma cicatriz em seu braço esquerdo, abaixo do ombro. – Preciso apenas de um pano e curativos.

Encaro seu corpo atlético e seus olhos azuis. Nossa.

Os cabelos pretos caem sobre os olhos e ele respira devagar.

– Eu quis dizer... não poderia esperar no seu quarto? – pergunta ela.

– Eu moro aqui – Ele revira os olhos erguendo as mãos ao lado do corpo. – Me deixará sangrando? É isso?

Taylor revira os olhos, andando na direção de um armário e abrindo-o, jogando uma caixa branca plástica para ele e apontando para a porta.

– Depois cuido de você – ela diz.

– Ele... eu não me importo com ele aqui – digo e os dois me encaram. – Eu já estou melhor e...

– Viu? – Ele revira os olhos.

– O problema não é sua presença e sim o modo como não respeita...

– Taylor... – Ele revira os olhos, esfregando o rosto com cortes. – Deixe o sermão para outra hora, eu estou sangrando!

– Tudo bem, senhor sangrento – Ela revira os olhos, tirando a caixa de suas mãos e abrindo-a ao seu lado. – O que você fez desta vez?

– Hã... caí. – Ele encolhe os ombros largos e eu encaro meu cabelo.

Caiu? – Ela o encara com os olhos quase fechados, como se não acreditasse nesta versão da história. – De um penhasco?

– Em cima de uma pedra – diz ele.

– Estava indo para uma festinha e não deixaram ele entrar porque não é maior de idade, ai ele brigou com o segurança que tinha uma faca – O garoto que estava aqui está agora encostado no batente da porta, com os braços cruzados e os olhos se revirando.

– Valeu, Scott – O garoto revira os olhos e Scott ri, encolhendo os ombros.

– São quatro e meia da tarde, Hudson – Taylor observa o relógio em seu pulso, encarando-o.

– Não se tem horas para festas.

– Ah, mas eu não sou sua motorista para lhe buscar na casa de sei lá quem às quatro da manhã. – Taylor revira os olhos

– Eu passava a noite na casa de sei lá quem, se este é o problema.

– O problema, Hudson...

– Jesus, quantos problemas! – Hudson arregala os olhos, mas começa a rir.

– O problema é que você tem quinze anos.

– Não foi o que a tiazinha do bar disse... – começa Scott e Hudson joga uma de suas botas nele. – É impressionante como você consegue ser gentil. É a pessoa mais gentil que você vai conhecer em toda a sua vida, Leah.

Ele anda pelo corredor branco e eu encaro Hudson, confusa.

– Porque ela está me encarando? – Ele pergunta, como se eu não estivesse ali.

– Porque você invadiu o quarto dela, menos de cinco minutos depois que ela acordou – Taylor arqueia as sobrancelhas, passando um pano molhado em sua cara, tirando a sujeira. – Vai embora.

– Estou indo – Ele revira os olhos, descendo da cama e puxando as botas pelos cadarços marrons, batendo a porta.

– Ele é... – começa ela e ri. – Não se preocupe. Ele não a incomodará mais.

Concordo com a cabeça, com os lábios apertados.

~~

É um quarto grande, embora esteja com a cama branca com colchas brancas, uma mesa de madeira pintada de tinta cinza, uma poltrona vermelha de veludo macio.

Sinto o cheiro forte de meu próprio suor. Claro. Dois dias desacordadas e fico feliz em saber que ninguém me deu banho.

Ando mancando até o banheiro, sentindo pontadas em meu pé, encarando os azulejos pelas paredes e pelo chão, uma toalha sobre a pia branca e um espelho quadrado pela parede.

Levanto o cabelo do lado esquerdo do rosto, me virando para ver o reflexo no espelho, puxando-o para o lado e vendo o começo da cicatriz na pele perto do trago – cartilagem acima do lóbulo da orelha -, continuando pela pele atrás da orelha, cortando meu pescoço na diagonal. Puxo a blusa branca pela cabeça, vendo-a até meu ombro direito, descendo pelo meio de minhas costas, na linha da espinha, sumindo debaixo da calça.

Abro o botão, puxando o zíper para baixo e puxando a calça pelas pernas, virando o tronco para trás, encarando a linha esbranquiçada descendo por minha coxa direta pela lateral até ser interrompida pela faixa branca enrolada em meu pé por causa do machucado, mas consigo ver a cicatriz terminando na junção da unha do pé com a pele.

Preciso esconder isto.

De qualquer um.

Uma faca e intermináveis horas para esta tortura.


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