Guinea P escrita por Gaby Molina


Capítulo 12
Capítulo 12 - Não é o que parece / Na verdade, é sim




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Jess

— Derek, a gente precisa conversar.

Derek me fitou, surpreso. Eu provavelmente o interrompera no meio de alguma frase. Sobre o que ele estava falando mesmo?

Merda.

Estamos conversando.

— Isso não está funcionando.

— O quê?

Suspirei. Ele ia me fazer dizer? Encarei seus olhos verdes. Sim, ele ia me fazer dizer.

— A gente, Derek. A gente não está funcionando. A gente deveria ser só amigos.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Está terminando comigo?

— Não éramos namorados, em primeiro lugar. Estou dizendo que preciso de um tempo.

Ele suspirou.

— Jessica, isso é por causa do Rivers?

— Não... exatamente. É só que tem uma coisa importante acontecendo e eu preciso focar nisso, não posso ficar discutindo com vocês dois e pensando só na gente.

— Então está escolhendo James?

Inspirei fundo, me levantando.

— Não, Derek. Estou escolhendo a mim mesma.

E sai dali.

James

Eu tive o que se pode considerar uma noite conturbada, e tudo começou quando Jess bateu na minha porta. Seus grandes olhos escuros me fitavam de uma maneira que eu vira pouquíssimas vezes, porém vezes que ficaram gravadas em minha memória.

— Esqueci uma coisa aqui ontem — disse ela.

— Bem, eu posso procurar, mas...

Ela me interrompeu com um beijo.

— Deixa para lá. Já encontrei.

Dessa vez, náo precisei fitá-la por um longo minuto. Apenas me inclinei e a beijei nos lábios, grudando nossos corpos tão naturalmente que parecia que eu fazia aquilo o tempo todo. Desci minhas mãos por suas costas e ela mordeu meu lábio. Parei na cintura, rindo, e aumentei a intensidade do beijo.

Ela entrou no quarto sem se soltar de mim, mas tropeçou em meus pés e caiu em cima de mim na minha cama.

— Olha só, não é maravilhoso que minha cama convenientemente estivesse aqui para amortecer a queda? — falei.

Ela abriu os olhos.

— Shhh — e me beijou.

Rolamos um pouco, o que fez com que quase caíssemos no chão. Jess parecia mais certa do que estava fazendo dessa vez, provavelmente porque fora ela quem tomara a iniciativa. Eu, por outro lado, tinha aquela voz irritante em minha cabeça gritando Afaste-a. Afaste-a.

Mas eu não queria afastá-la. Eu queria afastá-la tanto quanto queria ter câncer ou levar uma injeção na testa.

Merda de consciência.

— Jess — pedi. Ela me ignorou e continuou me beijando. Segurei seus ombros, afastando-a. — Jessica.

Ela sabia que era sério quando eu a chamava pelo primeiro nome.

— Sim?

— E o Woopert?

— Eu disse a ele que precisava de um tempo.

Eu poderia ter dançado Can Can ali mesmo de felicidade, mas em vez disso apenas ousei perguntar:

— Por quê?

Ela hesitou.

— Não importa.

Levantei-me, andando em círculos pelo quarto enquanto praguejava.

— Merda. Merda. Merda.

— Hmmm... James?

Encarei-a, sério.

— Reconcilie-se com ele. Agora. Rápido, antes que seja tarde demais.

— Está brincando, não está? — ela ergueu uma sobrancelha. Não respondi. Ela se sentou, arrumando a blusa que havia subido um pouco, e me encarou, visivelmente alterada. — Achei que fosse ficar feliz.

— Não me olhe assim — murmurei.

— Que seja, Rivers — ela resmungou, se levantando. Eu a segurei quando ela tentou passar por mim. — Me solte. Agora. Ou eu vou acertar o seu rosto de novo e não vou me arrepender.

— Pode me ouvir por um minuto?

Ela pressionou os lábios um contra o outro, e eu me esforcei mais do que nunca para não beijá-la.

— Seja rápido.

— Woopert é parte do plano de fuga. Precisamos dele para dar o fora daqui. Para controlar as câmeras, ou acessar outros andares. Você é nossa melhor chance de conseguir a ajuda dele.

Jess

James recuou no mesmo momento que disse isso, esperando que eu acertasse a cara dele novamente. Respirei fundo.

— Todo esse tempo achando que eu podia confiar em você, e você estava me manipulando para que eu ficasse com o Woopert.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Como eu manipularia você a isso?

— Com o seu jeito idiota. Quente, e depois frio. Sem se importar com nada. Fazendo idiotices por minha causa e depois agindo como se não desse a mínima para mim. Assim.

— Eu não entendo você. Num momento está comigo porque Derek não te dá bola o suficiente, no outro está com ele porque eu não te dou bola o suficiente. O que diabos você quer, Jess?!

Hesitei. Ele havia tocado em uma ferida e sabia disso.

— O que você quer, James?

Ele desviou o olhar.

— Eu quero dar o fora deste lugar.

— Repita isso olhando para mim.

Ele suspirou.

— Jess...

— Repita — encarei-o. James não disse nada. — Por um momento realmente pensei que tivesse feito tudo isso porque se importa comigo. Mas não é verdade, é? Você não consegue se importar com ninguém. Não foi para o Delta porque tinha medo de gostar de mim. Tinha medo de que eu gostasse de você. Bem, se esconda embaixo do cobertor, porque seu medo se concretizou. Parabéns, Rivers. Você venceu.

— Jessica.

Aproximei-me dele.

— Eu não sou a segunda opção de ninguém, James — falei, imitando-o, e o empurrei com toda a minha força para conseguir passar.

— E quem é a minha primeira opção, Jess? Hein?

— Você mesmo! — gritei, já me distanciando. — Sempre foi, sempre vai ser!

Ótimo, corra direto para o colo do Woopert! É o que você faz melhor!

— Vá se foder! — xinguei, e naquele momento eu realmente queria socar aquela cara imbecil dele.

Coraline

Eu soube que aquela seria uma longa noite quando ouvi a porta da frente ser esmurrada no batente.

— Jess, eu já pedi para não bater a port...

Calei a boca quando vi o estado dela. Os cabelos estavam bagunçados, o nariz estava vermelho e lágrimas escorriam de seus olhos.

— Por que está chorando? — suavizei o tom de voz, caminhando até ela.

— Porque estou brava! Estou brava pra caralho!

Abracei-a. Ela pareceu surpresa com o gesto, mas me abraçou, passando uma das mãos gentilmente pelo meu cabelo.

— James é um babaca — soltou ela.

— É, mesmo — falei, pois sabia que era o que ela queria ouvir.

— E Derek é irritante.

— Aham.

— E eu não preciso dele. De nenhum dos dois.

— Definitivamente. Que tal lavar o rosto?

Ela fez que não com a cabeça, se jogando na própria cama. Suspirei e fui até minha estante pegar lenços de papel.

— Aqui — passei o lenço na região sob seus olhos. Seus grandes olhos castanhos brilharam um pouco.

— Obrigada, Cora. — Não foi nada.

James

Querendo ou não, eu tinha que fazer as pazes com a Jess. Eu ainda não tivera a chance de conversar com ela a respeito do que Rick me dissera sobre o prédio quando eu estava no Delta.

— Bom dia — sentei-me ao lado dela no café-da-manhã, sorrindo. Ela resmungou alguma coisa e continuou comendo seu cereal. — Jess — falei mais baixo, com os olhos cravados nela.

— Eu preciso de alguém em quem possa confiar, James.

— Você pode confiar em mim.

— Posso mesmo?

— Você não tem escolha.

Vi pela expressão no rosto dela que aquela fora a pior resposta que eu poderia ter dado.

— O que aconteceu com vocês dois? — Valerie ergueu uma sobrancelha. — Estão parecendo zumbis.

— Não consegui dormir — disse Jess, sem olhar para mim.

— Eu dormi bem — menti, dando de ombros.

Jess entortou a colher de metal com a qual estava comendo e soltou um palavrão. Talvez estivesse imaginando que aquela colher era o meu pescoço.

Jess

Você não tem escolha, a voz de James retumbava em minha cabeça. Ele ia ver só quem não tinha escolha.

No almoço, peguei a comida e sentei-me sozinha em uma mesa para não ter de falar com ele. Claro que não deu certo. Menos de dez segundos depois, James puxou uma cadeira e sentou-se ao meu lado. Eu não disse nada.

— Não vai me mandar cair fora? — indagou ele. Ignorei. — Certo, não está falando comigo. Eu só queria que tudo desse certo.

Apenas revirei os olhos e continuei comendo.

—... O que quer que eu faça? Peça desculpas? Me ajoelhe? Pelo amor de Deus, Jess — ele revirou os olhos. — Eu não sou o seu cachorrinho, não vou ficar correndo atrás de você.

Aquilo foi a gota d'água.

— Não. Você é um covarde, é isso que você é! Um robô de merda, preso no próprio mundinho e magoando as pessoas porque ninguém nunca é bom o suficiente para você. Não é? — cerrei os dentes. — Você fodeu com tudo, James. Você fodeu com tudo no momento em que me beijou na sala de Muay Thai, no momento em que me fez acreditar que isso tudo não fosse só um jogo para você.

James

Eu não sabia o que dizer, então fiz o que fazia de melhor: fodi mais com as coisas.

Puxei a cadeira dela com o pé, fazendo-a cair para o lado, debruçando-se em cima de mim. Segurei-a pela cintura e selei nossos lábios. Senti suas unhas se cravarem em meu peito, tentando me afastar, mas não cedi. Não diminuí a força com a qual a segurava até que ela parou de resistir. E então aprofundei o beijo.

Eu a beijava enquanto planejava meu próprio velório. Orquídeas, talvez? Uma cerimônia pequena. Eu convidaria meus pais? Provavelmente não. Valerie e Michael fariam discursos, mas Valerie falaria tanto que o garoto ficaria sem espaço.

Jess compareceria? Não era muito comum que o assassino fosse ao enterro.

Afastamos apenas nossos lábios quando o ar acabou. Eu ainda a mantia presa a mim pela cintura.

— O que você está fazendo? — seus olhos escuros me fitaram.

Não faço ideia, pensei, mas de novo imaginei que aquela seria a pior resposta que eu poderia dar.

— Isso não é um jogo — falei, fitando-a de volta. Afastei uma mecha do cabelo dela do rosto.

— Então, o que é? — ela ergueu uma sobrancelha. Não respondi. — Isso é tudo o que eu precisava ouvir.

Ela tentou soltar-se novamente, mas eu ainda não estava pronto para deixá-la ir. Não sabia se haveria uma hora onde eu estaria pronto para deixá-la ir.

— Jess. Espere. Aonde vai?

— Não sei. Quer saber, Derek era muitas coisas, mas pelo menos eu sempre sabia o que ele ia fazer.

— E qual a graça nisso?

— Relacionamentos não foram feitos para serem engraçados, James! Não foram feitos para serem uma piada! E quer saber, pelo menos Derek sabia o que queria.

— É uma pena que não possamos dizer o mesmo de você — retruquei.

— Estou tentando lhe mostrar o que eu quero, James. Mas você não deixa.

Eu não deixo? Por favor, sinta-se à vontade.

— Viu só? Toda vez que eu me aproximo, você vira esse babaca. E não é isso que eu quero.

O jeito que ela olhou para mim me concedeu uma certeza: era hora de soltá-la. Então o fiz.

* * *

Eu já a havia chutado, ofendido, mentido para ela, tirado sarro, a enganado, deixado-a preocupada. E ela não ligou. E agora tudo o que eu tinha tentado fazer era ajudar e ela estava puta.

Aquela garota ainda ia me enlouquecer.

Jess

Tudo bem, admito que fui um pouco lerda no que aconteceu depois. Tranquei-me no dormitório, pensando em quanto tempo eu poderia ficar ali sem interrupção.

Quatro minutos e quarenta e seis segundos.

— Oi, Kristen — abri um leve sorriso.

Que não foi retribuído. Kristen parou em frente ao espelho, penteando os cabelos escuros e brilhantes com os dedos longos e finos.

— Está todo mundo falando sobre você e James.

Merda! Merda, Jess! Kristen não sabia que eu... que eu... Hum...

— Não é o que parece — foi a única coisa em que consegui pensar para dizer.

— Vocês se agarrando no refeitório não é o que parece? — havia tanto veneno em suas palavras que fiquei esperando que o espelho derretesse.

— Não estamos juntos. Eu só... — sei lá. Sei lá o que eu estava dizendo. — Estou brava com ele.

— É? Devo ter perdido essa parte.

Você perdeu um monte de partes, Kristen!, pensei.

—... Pode pegar um elástico na minha gaveta? — pediu ela.

Assenti e me levantei, caminhando até a cômoda dela. Abri a primeira gaveta. Era bem organizada, só tinha um pouco de maquiagem, um pote com elásticos e... uma foto.

A imagem retratava uma garota de dez anos ou algo do tipo abraçada a um homem que se parecia um pouco com ela. Ele parecia familiar, e depois de um minuto percebi por quê. Eu já o vira no noticiário. No verso da foto estava escrito:

Tristan e Kristen no Coliseu

23/12/2008

Arregalei os olhos, tentando entender a magnitude daquilo que tinha em minhas mãos.

— Kristen Bell — chamei-a pelo nome completo de propósito.

— Sim? — ela se virou para mim. Engasgou quando viu a foto. — Jess... Eu... Não é o que parece.

E tudo em que pude pensar foi que aquela era uma bela inversão de papéis.


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Notas finais do capítulo

... E a mente da Jess fez puf de novo.



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