Os Zumbis de Baker Street escrita por Harmonie


Capítulo 1
Velejar nas águas da perda lhe revolvia as entranhas.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/440588/chapter/1

Londres, 26 de novembro de 1895

Caro Dr. John H. Watson,

É com grande pesar que, por meio desta, comunico-lhe o terrível e lamentável fim que levou seu amigo e colega de apartamento, Sherlock Holmes.

O funeral ocorrerá às seis da tarde de amanhã.

Ofereço-lhe minhas condolências.

Atenciosamente,

Martin R. G. Deane

Que ótima notícia para uma manhã de sábado, pensou Watson, enquanto seus olhos percorriam a primeira linha daquela inoportuna correspondência. Não a havia ainda lido por inteiro e, consequentemente, não notara o nome de seu companheiro, personagem principal da mórbida novidade que, de maneira tão vulgarmente usual, lhe fora apresentada.

Naquela fria manhã, não exclusivamente, sua mente parecia contrária à eficiência e adepta à ideia tão agradável que seria hibernar durante todo o inverno, como o faziam alguns sortudos mamíferos que, vez ou outra, Watson invejava. Como consequência, a velocidade de sua compreensão parecia estar comprometida e, apenas alguns bons segundos após ter o cartão em mãos, as coisas pareceram realmente fazer sentido. Dessa maneira, assim que toda a informação que lhe estava disponível fora devidamente assimilada – um momento bem longe de imediatamente -, o médico sentiu seus joelhos cederem e, durante uma fração de segundo, teve certeza de que atingiria o chão: sentiu-se fraquejar, perdeu o equilíbrio e ouviu o som de sua bengala quando esta alcançou o piso, tudo quase ao mesmo tempo. Porém, como se pleno de suas faculdades motoras, seu reflexo se mostrou mais eficiente que a velocidade de seus pensamentos e a gravidade e, com a mão livre apoiada em uma das paredes, Watson se manteve erguido até que, segundos depois, quando o choque da notícia se dissipou, sentiu-se reestabelecido de suas forças.

Mesmo já tendo lido – mais de uma vez – todas as palavras cuidadosamente gravadas à tinta, manteve seus olhos fixos no espesso papel de cor levemente rósea. Era verdade, sim, que já não via seu amigo há alguns poucos dias, mas esperava que ele estivesse confinado em seu quarto escuro e malcheiroso, após a realização de outra de suas várias experiências – as quais ultimamente não havia estado presente por tempo suficiente para testemunhar – como já era de praxe, ou por simples capricho. Então, Watson se viu ali, confuso – não acerca da informação que recebera, pois esta lhe fora apresentada de maneira bem clara, mas em relação a qual deveria ser o próximo passo – e enjoado: velejar nas águas da perda lhe revolvia as entranhas.

Sherlock saberia o que fazer antes mesmo que houvesse a necessidade de que qualquer coisa fosse feita, pensou; entretanto, ele permanecia sem reação. O pensamento lhe provocou um efêmero sorriso que se foi, assim que, finalmente, seus pensamentos e emoções pareceram ter se adaptado ao que acabara de ser lido. Sentiu suas bochechas se aquecerem e tinha a sensação de ter os olhos em brasa.

Watson permaneceu ali, de pé no hall de entrada, com a correspondência em mãos e um aperto no peito.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Os Zumbis de Baker Street" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.