Já se sentiu como se estivesse totalmente desencaixado? Como uma peça presa no quebra-cabeça errado? E sempre que você sente que achou seu lugar de encaixe... ele simplesmente voa para longe e se afasta outra vez, te abandonando? Já sentiu, mesmo que por um momento, o calor de estar encaixado? Já o sentiu se dissipar lentamente, como uma vela que aos poucos se apaga por falta de ar? Já se sentiu sufocar de frio e solidão depois de respirar o calor de uma companhia? Conhece o medo de, todos os dias, ter a incontrolável certeza de que vai acontecer de novo?

Você sente que tudo ao redor está frio. Aquele frio que causa um arrepio na coluna, que faz você querer se encolher e apertar o casaco contra seu corpo. O frio que te faz colocar as mãos nos bolsos e tremer. O céu da cidade está colorido de forma quase homogênea no mais monótono tom de cinza, espalhando uma luz fraca e desagradável, que apenas contribui para o frio. Você fecha os braços com força ao redor dos joelhos, tentando manter o calor de meu corpo. Obriga seus olhos a se fecharem também, tentando manter-se no escuro completo. Às vezes se pergunta se não seria melhor se pudesse escolher não enxergar as falsidades, porque, se assim fosse, não teria medo de que isso fosse uma mentira apesar de tudo.

Sim, uma mentira. Uma farsa, às vezes eu penso. Porque, afinal de contas, é mesmo possível acreditar plenamente que eu encontrei isso depois de tanto tempo de buscas infrutíferas? É possível que minha mente assustada e meu coração solitário ousem voltar ao normal e acreditarem que eu finalmente consegui me encaixar em algum lugar? Qualquer lugar? Será que algum dia pararei de sentir esse aperto no peito só de pensar que estou feliz? Será que agora é de verdade?

Para cada vez que sua mente se enche de certezas, seu coração transborda em dúvidas e seus olhos em lágrimas.

Se tais lágrimas são esperançosas ou desesperadas, não sei responder. Se machucam ou aliviam, ainda não decidi. Quero perguntar explicitamente se é real ou não, se eu vou me machucar ou se vou ficar bem, mas a agonia da ideia de receber uma resposta negativa, ainda que tal possibilidade me pareça praticamente nula, é insuportável. Por que insisto tanto assim em não acreditar plenamente na felicidade quando ela está bem à minha frente? Por que me encho de dúvidas e medos que, no final das contas, são sempre estúpidos? Por que tudo parece se encaixar dessa forma?

Gostaria de ter uma visão geral deste pequeno quebra-cabeças ao qual sinto pertencer, apenas para ver se minha peça está perfeitamente encaixada, se não há espaços. Sei que as peças são todas da mesma cor e de formatos muito parecidos, mas são parecidos o bastante para que o encaixe não se solte novamente?

Sou a única me sentindo assim? É por isso que, por mais que haja pressão, não consigo me encaixar com as outras peças? Sou pequena demais? Grande demais? Será que o quebra-cabeças ao qual pertenço... também sentiria falta de mim? Faço alguma diferença? Sou mesmo a peça da qual eles precisam? Ou apenas uma peça restante, erroneamente encaixada para que depois percebam que estou no lugar errado e me removam? Será que sou só isso? Apenas um erro? Uma peça defeituosa que não se encaixa em lugar nenhum? Que é rejeitada em todos os quebra-cabeças?

Mas... E todo o resto? E quanto a todas as risadas, todas as palavras, todos os abraços, todas as lágrimas, toda a honestidade? Será que o calor que se forma em meu coração, que derrete todo o gelo, é realmente uma mentira? Será que minhas ilusões são capazes de chegar a esse ponto? O ponto no qual me sinto acolhida, como que deitada sob um cobertor grosso em um dia frio de inverno? Será que este calor ao lado de meu corpo é uma mentira? O mundo seria capaz de tamanha desonestidade? De tamanha crueldade? Apenas para que eu deixe de existir mais uma vez em minha vida? Não. Não é possível. Por mais que haja dor e sofrimentos passados em meu coração, prefiro acreditar cegamente que é real, mesmo que seja apenas para me desencaixar novamente depois e, mais uma vez, sentir o resto do quebra-cabeças esvair-se como folhas ao vento.

Não me importo com o quanto doerá ter meu coração esmagado desta forma outra vez, só quero sentir um pouco mais deste calor e desta honestidade.

Talvez acabe rápido, talvez dure. Ou então, talvez eu seja mesmo uma peça desse quebra-cabeças, afinal de contas. Você não acha?