Nova Terra escrita por Raposa das Bibliotecas


Capítulo 14
Sor Vitoriano




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–Tem certeza, Sor?

–Tenho sim, pequeno Lorde.

–Não sou Lorde. Para onde vai?

–Eu gostaria de dizer "para onde o Mar de Areia leva", mas sou um sulista e recebi um chamado. São mais de setecentas milhas do Oriente para o Sul.

–É mesmo muito longe. –Disse o anão. Sor sorriu e sentiu uma fisgada de dor em sua têmpora, e limitou-se a tocá-la. –Eu poderia ir com o senhor!

–Ir comigo? –O cavaleiro riu alto. –Não conseguiria me seguir. Não tem cavalo.

–Mas tenho pônei. Sei andar em pônei e já montei a cavalo.

–Quantos anos o animal tinha?

–Um.

O cavaleiro riu novamente.

–Não vai para o Sul comigo. Estou indo para a guerra, não para festejar com lindas mulheres desnudas em praias de areias brancas enquanto sereias saltam das águas.

–Existem sereias?

–É claro que não. Estamos em guerra, e mesmo se tivesse, elas jamais apareceriam em tempos assim.

–Em guerra com quem?

–Com o Norte. Recebi um pássaro do Sul há poucos dias, estou levando pólvora. A mesma que aqueles baderneiros levaram de mim, mas ainda tenho mais. Muito mais.

–Pólvora é caro. Como conseguiu comprá-la, Sor?

–Isso não cabe a vosmicê saber, seu rato do Oriente.

–Desculpe se o insultei. Mas ainda quero ir com você. Já faz tempo que quero vender esta estalagem à Ponta Velha. O bordel deles suga meus clientes, só fico com os encrenqueiros.

–Arranje prostitutas.

–Não é tão fácil assim. Se eu vender minha estalagem a eles, terei dinheiro suficiente para ir e voltar duas vezes do Sul. Como acha que chegará até lá, Sor? Você terá de passar pelo Norte. Eu sei como podemos ir velejando e ainda aproveitar para conseguirmos mulheres para esquentar nossas camas e chupar nossos paus. Então? Posso ir ao Sul com você?

–Vosmicê é engraçado, pequeno Lorde...

–Não sou Lorde. Sou apenas uma pessoa sábia com as palavras, que pode ser disfarçada de escudeiro enquanto viajamos.

–Escudeiro? Sabe o que é um escudeiro?

–Não, e estou cagando pra isso. Só quero ir para as praias brancas e com lindas mulheres desnudas.

O cavaleiro ficou quieto por um momento. Pediu para que trouxesse o almoço, mais batatas cozidas e carne de carneiro.

–Não tenho tanto dinheiro para um navio.

–E quem disse que teremos de pagar? Existem navios nestes portos que pertencem a mim.

–Quantos?

–Três. Pequeno Estaleiro, Jovem Estripador e Rainha das Putas.

–Rainha das Putas?

–Era aonde eu ia para transar. As mulheres adoram o meu pau e dizem ser grande pelo meu tamanho.

–Se eu aceitar que vosmicê vá comigo, o que ganharei em troca?

–Primeiro, terá três navios no seu encalço, ao invés de um cavalo todo machucado por causa da cota de malha e do peso pela sua armadura. Segundo, mulheres. Pode trepar com quantas quiser, comprei seis no Ponta Velha e mais duas no Puteiro das Ervas a dois quilômetros do vilarejo.

–E terceiro?

–Viagem segura. O Norte tem muitos barcos, é sabido. Mas não tem tantos homens para velejá-los. É um povo rico, os mais ricos de todos, mas não têm tantos homens. Como poderiam ter? É frio e não tem comida, morrem como se mata uma mosca, tão fácil quanto pegar resfriado.

–Mas podem comprar homens.

–Comprar? Comprar da onde? O Sul está em guerra, que é o reino com maior número de soldados. Existem mulheres chamadas de Parteiras para darem filhos. Você sabe como funciona. Centenas de mulheres de idade entre quinze e...

–Trinta e um são colocadas em uma casa onde os cavaleiros do Sul transam com elas, colocam os filhos em seus ventres para que, quando nascerem, sejam treinados para guerrear. Assim que o filho nasce, elas têm um mês de descanso e já tem outro filho na barriga.

–Aposto que elas já não têm mais controle sobre as pernas e não sentem mais nada quando um homem põe seu pau em suas bocetas molhadas. –Ironizou o anão.

–Eu sou filho de uma Parteira, pequeno Lorde. E gostaria que tivesse mais respeito.

–Eu já disse que não sou um Lorde.

–Somos o que as pessoas acreditam que somos. Vosmicê será um Lorde no Sul com certeza, se for gentil em emprestar os navios para a Guarda Real. Com certeza ganhará um castelo, terá muitas criadas e muitos criados. Cavaleiros a seu comando, e pode ter quantas estalagens quiser.

–Isso me parece tentador. Então sua resposta é sim?

Ele assentiu.

–Me dê mais três dias para vender essa pocilga, e partiremos para o Sul no meu Rainha das Putas. Vamos comemorar um bom negócio?

–Como?

–Com um caneco de cerveja.

O pequenino saltou da cadeira e foi em direção a um enorme barril rebolando. Engraçado como ele anda, fazendo força para mover seus pés e levantando-os enquanto enche dois canecos com cerveja preta que até derrama e mela sua mão.

–Se quiser uma mulher para esquentar sua cama enquanto espera.

–Não quero uma mulher.

–Prefere um homem?

–Não quero um homem.

–Então o que quer? Uma espada para espetar essa sua bunda queimada do calor?

–Quero ir embora o mais rápido possível. –E virou o caneco. –Nada como uma boa cerveja. Vou para meu quarto.

–Vai lá! –Disse o anão levantando seu caneco em saudação e virando, deixando derramar em suas roupas simplórias.

Por que este anão insistia em arranjar alguém com quem ele possa se deitar? Se quisesse se deitar com alguém, já o teria feito. Estirou-se na cama, com o corpo doído, e virou observando o teto sujo, onde uma barata correu em alguma direção. A luz da lamparina já queimava fraca e suas pálpebras estavam tão cansadas que logo dormiria sem perceber.

Quando é que percebemos que dormimos? Só quando acordamos.

O sol ardeu em seus olhos, o pequeno Lorde estava parado em frente a sua cama.

–Se apronte, já vamos partir.

–Achei que ninguém poderia entrar no meu quarto.

–Não sou mais dono da estalagem. Anda, se apronte. Senão, acabo vendendo até você.

O cavaleiro se levantou, se trocou e desceu. Comeu alguma coisa, algo que chamam de guisado, e montou em seu cavalo, mas sem a cota de malha, ou o tecido cobrindo este. Somente uma sela.

–Você vai a pé?

–Ah não. Com certeza não.

O barulho de cascos pôde ser ouvido e a de uma ponta de couro estalando no ar, logo um belo garanhão vermelho estava ao seu lado com um cavaleiro e uma carroça.

–Este é o Gandril. Ele me levará até meu navio e partiremos com ele. Ele não é de falar muito, afinal, perdeu a língua.

Então, tomaram viagem, passaram por caminhos tortuosos e por vales de gramíneas semimortas com rios quase secos. Não havia nenhum animal por ali. Continuaram a viagem e encontraram um grande rio.

–Este é chamado de Água-Viva. Os antigos acreditam que, quando nossas terras estão em perigo, um deus da água se manifesta e ajuda a proteger a aldeia e a região. O rio tem mais de vinte metros de largura.

Passaram por uma ponte de pedras, sobre o Água-Viva, e seguiram viagem. Ao anoitecer, levantaram acampamento próximo a um vilarejo. Dormiram, e quando acordaram, o cavaleiro do pequeno Lorde estava assando peixes.

–Até que ele tem certa utilidade. –Disse o anão.

Retomaram a viagem, uma viagem curta, de fato, mas chegaram ao porto e viram três navios com seus nomes em tintas brancas: Pequeno Estaleiro, Jovem Estripador e Rainha das Putas.


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