Começou com um pequenino urso de pelúcia marrom com "I Love U" tatuado na barriga. Não seria tão estranho se os olhinhos do pequenino não estivessem sangrando.
Depois, uma caixa de doces. Doces mofados. Era realmente uma pena desperdiçar tudo aquilo. Batia muito sol em seu quarto, por isso estragaram, talvez.
Um vestido rasgado. Era lindo. Amarelo, comprido e florido. Uma graça. Teve dó, costurou-o e doou-o para um brechó.
Quem lhe dava aqueles presentes? Certamente, seu pai, querendo se divertir depois da onda de tristeza que havia sentido nos últimos meses.
Mais ao longe, ele a observava.
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O dia sorria, como sempre. Como se desejasse ótimo dia diretamente à ela. Aquilo a fazia feliz, pois não tinha aquele clima pesado de casa. O diário "Bom dia, Roy!" que dava ao seu melhor amigo a alegrava ainda mais. O dia era igual o de sempre, mas a alegria sempre permanecia em seu coração, deixando cada dia com um toque especial.
Para Roy, seu melhor amigo, todo dia era especial com ela. Evitando a friendzone - também por saber que Miranda era muito ingênua e inocente- nunca falara de seus sentimentos. Prefere expressar-se de outra forma.
–Mira!- apelido único, fazia questão de apenas ele chamá-la assim.- O que o "seu pai" deixou hoje?- Sabia que aquilo era só uma suposição de Miranda, claro que sabia. Falava sem ter certeza exatamente para concordar com ela.
–Borboletas numa caixinha. Eram tão coloridas!- seus olhos brilhavam, apesar do presente esquisito.
Roy gostava disso nela, a inocência. Adorava com que ela falasse dos presentes estranhos como se fossem as melhores coisas do mundo.Adorava brincar com ela.
–Não é muito a cara do seu pai. Afinal, porque ele está te dando tudo isso?
–Bem-seu sorriso se desfez por um instante-, acho que ele está querendo fazer alguma coisa para se alegrar. Você sabe, desde que mamãe se separou dele ele está bem tristinho. Estou deixando o mistério rolar para ele se divertir.- seu sorriso se reacendeu.
–Você se sente confortável com isso?- pergunta Roy, lançando um olhar desconfiado.
–Eu gosto de ver meu pai feliz.- responde Miranda.
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Chegou em casa já esperando o que seu pai lhe reservava. Subiu as escadas correndo, largando a mochila na sala. Encontrou não um bichinho de pelúcia, mas de verdade.
Um cachorro.
Empalhado.
E mesmo empalhado, uma ferida enorme com sangue seco lhe cobria a barriga.
Era até bonitinho, mas Miranda se assustou. Ele está ferido. Não, ele está morto também. Por que meu pai resolveu me dar isso? Sentia muito, mas devia perguntar.
–Pai.-chegou no escritório dele.- Por que dessa vez o senhor me deixou um cachorrinho empalhado?
O pai pareceu confuso. Não sabia do que a filha falava.
–Que cachorro? Não te daria cachorro, sabe que sou alérgico.
–Então, porquê deixou um na minha cama? Ele está machucado e empalhado. Da última vez foram bombons ou vestido, mas um cachorro, pai?- ela estava assustada. Será que não fora o pai, ué?
–Vamos ver isso no seu quarto filha.
Seguiram em direção ao quarto da menina. Ao chegarem, o cãozinho desaparecera. Sr. Brown não parecia nada feliz. Seria verdade o que a filha falou? Dificilmente. Talvez estivesse ficando louca, coisas da idade. Já tinha 17 anos. Quem sabe, hormônios e essas coisas?
–Filha, vai deitar. Quer um remédio?
–Mas, estava aqui... E o vestido, pai? Lembra que você me deu? O amarelo, florido.
–Eu nunca comprei um vestido desses pra você. Nem bombons, como você disse antes, eu cuido da sua saúde.
Miranda estava cada vez mais confusa. Não fora o pai quem dera tudo aquilo. Quase não tinha provas, afinal, os bombons foram para o lixo, o vestido fora doado e o cachorrinho sumira. Quando se lembrou do urso. Pegou-o da gaveta.
–Olha pai! Não foi você quem me deu isso? Foi sim, não foi?- sua voz já aparentava desespero.
Sr. Brown se assustou dessa vez. Os olhos do urso sangravam. Isso não era coisa que adolescente ter no quarto, muito menos para se dar de presente à alguém. Pegou o urso e saiu de casa correndo, ligou o carro e partiu, em direção a delegacia. Deixando a filha atordoada em seus pensamentos.
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Claro, Roy percebeu no dia seguinte, quando Miranda o encarou, que nada estava bem. Alguma coisa acontecera, o que temia que acontecesse. Apenas perguntou:
–Tudo bem?
E ela apenas respondeu:
–Conto depois.
No intervalo, sentaram perto de um portão, lugar pouco frequentado pelos alunos. Roy retornou a perguntar:
–Tudo bem?
E dessa vez ela disse:
–Não era meu pai. "Ele" deixou um cachorro na minha cama. Empalhado e sangrento. Fui perguntar pro meu pai o porquê e ele não sabia de nada, nem mesmo quando mostrei o urso. Em vez de conversar, ele catou o ursinho da minha mão e saiu com o carro, sabe-se lá pra onde. Estou assustada. Não achava os presentes ruins, exceto o cachorro, eu dava um jeito neles. Mas tem alguém invandindo meu quarto e isso apavoraria qualquer um.- e dizendo essas palavras, chorou baixinho.
–Quando eu descobrir esse cara, vou acabar com ele, prometo.- sorriu Roy.
–Obrigada, eu acho. Mas tente não machucá-lo muito...
Roy sorriu de novo e a abraçou. Sua inocência era a coisa mais pura do mundo. Amava aquela menina.
Até demais.