Jogos Vorazes: O Despertar escrita por FernandaC


Capítulo 6
Jogos


Notas iniciais do capítulo

Gente! Finalmente! Desculpem-me pela demora. Prometo que não demorarei tanto para postar o próximo capítulo, que por sinal já está sendo escrito. Confesso que não gostei muito desse. =( Mas o próximo será... hum... Interessante. Haha...



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Como tudo na minha vida foi movido pelo impulso, agora não foi diferente. Depois de escutar a opção de Haymitch, ver como o Peeta está sendo tratado por Delly e receber a inesperada visita de Gale, todas essas situações e outras mais me fez perceber que nem tudo está perdido, se eu não quiser que esteja. Meu antigo parceiro de caça entra sem esperar por permissão, mas pudera, visto a intensidade de flocos de neve que estão entrando em casa. Despe o casaco e aquece-se na lareira. Volta-se para mim e nos analisamos. Por mais feliz que esteja em ter meu amigo aqui, isso não desfaz o sentimento de dúvida e amargura sobre o fatídico destino de Prim. E ele sabe o que eu sinto, o que ele não sabe é se realmente tenho razão.

– Katniss, podemos passar dias discutindo sobre o que aconteceu e nunca chegaremos a uma conclusão que satisfaça ambos. – Essas são as primeiras palavras de Gale para mim depois de meses afastados e não acredito que ele esteja sendo tão estúpido. – E você, no fundo, sabe disso e eu não quero ser mais frio do que eu já estou sendo, então, por enquanto, trégua?

Ele levanta as mãos em sinal de rendição. Se eu estivesse em outra situação, teria condições suficientes em conceder a trégua. O problema nisso é o fato de eu não conseguir conter a enxurrada de lembranças das reuniões no Armamento Especial com todos aqueles projetos baseados justamente nas armadilhas de Gale. Ele e Beetee trabalhando em um modo de matar as pessoas usando a compaixão. O sentimento humano. A humanidade de Prim. Todos esses pensamentos são catalisadores que reagem em minha raiva e em meu ódio. Mas Gale voltou pedindo trégua, algum tempo de rendição por suas atitudes, ele voltou na tentativa de reconciliação, visto que a retratação é algo impossível. No íntimo, eu sei que Gale jamais intencionou que algo de ruim acontecesse com Prim e foi pretendendo manter este pensamento que, com muito esforço, dou um leve aceno com a cabeça. Seu pedido de trégua é concedido.

– Obrigado Katniss, eu sei que não está sendo fácil para você passar por isso sozinha, e tenho uma leve impressão que eu sou uma das últimas pessoas que você quer ver. Mas eu realmente me preocupo com você e quero ajudar no que for preciso. – Gale fala com sinceridade e estende os braços.

Analiso por alguns segundos se abraçá-lo é realmente uma boa opção. Contudo, diante de toda confusão que está minha vida, minha cabeça, acho que um abraço é totalmente inofensivo. Dou um passo para frente e ele me envolve em seus braços. Sinto seu calor emanando para o meu; pouso minha cabeça em seu peito. Gale alisa a pequena trança nas minhas costas e abaixa a cabeça na altura do meu ouvido direito.

– Fico muito feliz em não ter sido chutado no meio dessa nevasca. – Ele fala baixinho, fazendo-me rir um pouco.

– Não sou tão insensível quanto parece. Mas tenho a leve impressão de que realmente tenho problemas mentais, já que eu não impedi você de se instalar na minha sala. – Respondo, só que dessa vez, fazendo-o sorrir.

Ficamos em silêncio por uns instantes, aquecendo-nos um no outro. Gale pode ter agido de modo impulsivo na guerra, ter sido por inteiro um rebelde. Entretanto, ele nunca me traiu, nunca virou as costas para mim. Se tivesse, tenho certeza que ele não estaria aqui comigo. Fico contente em saber que nossa amizade continua, apesar dos pesares.

Gale continua brincando com a ponta da minha trança em seus dedos. Então, percebo que já fomos longe demais com isso. Se alguém tem que se afastar, esse alguém sou eu. Desvencilho-me do abraço e lanço um sorriso amistoso para ele. Gale tenta disfarçar, mas assim como ele, eu o conheço muito bem. Ele não queria quebrar o contato. Contudo, rapidamente Gale recompõe a postura e joga-se no sofá ao meu lado. Acho que ele entende que eu preciso de tempo e espaço. De algum modo, ele sabe que tudo está uma bagunça para eu poder afirmar alguma coisa com precisão.

O silêncio se instala novamente entre nós, mas não de modo constrangedor. Estamos muito envoltos em nossos próprios pensamentos para nos importamos com o silêncio. Esse é o benefício em ter Gale por perto, posso ser eu mesma, não que com Peeta eu não seja a mesma, só que é o Peeta e não quero que ele se preocupe com meu estado físico e mental, não quero que ele veja as minhas fraquezas, mais do que ele já vê marcado em minha pele. Ter Gale de volta é quase como voltar aos tempos de caça, agindo em sincronia.

– Esse é o livro de plantas da sua família? – Ele pergunta surpreso.

– É. Chegou um dia desses. Estava pesquisando algumas plantas para o meu tratamento.

– Você não vai mesmo tomar os remédios vindos da Capital? – Gale pergunta retoricamente.

– Já tive muitas experiências com a Capital e com o seu povo para saber que tudo que vem de lá não é bom. – Respondo enquanto ele folheia o livro.

Então, começamos a conversar descontraidamente sobre aonde encontrar as ervas na floresta. Eu mantenho o diálogo como se ainda não tivesse coletado as mesmas plantas que ele vem apontando no livro. Gale não precisa saber dos meus problemas com Peeta e sua hóspede ou com Haymitch. Infelizmente, eu sei que não vou conseguir omitir isso por muito tempo, mas até lá, vou fazer de tudo para evitar o assunto. Visto que como irei explicar para o meu antigo parceiro de caça, o que eu não consigo explicar nem para mim mesma?

– Isso é novo... Essas plantas estão muito bem descritas, quem as desenh... Ah... – Gale observa os desenhos do Peeta.

Mencioná-lo, mesmo que indiretamente, incomoda tanto a ele quanto a mim, por motivos totalmente diversos. Gale fecha o livro e põe de volta na mesinha de centro. Ele boceja e olha para a lareira.

– Nossa! Como foi que Buttercup voltou? – Gale pergunta surpreso ao ver o gato caminhando na minha direção.

– Presumo que com as próprias patas. Quando nos encontramos ele tinha a pata machucada. Procurava por Prim... – Buttercup sobe no meu colo e eu começo a alisar seus pelos.

– Onde você esteve todo esse tempo?! – Pergunto de uma vez com um tom quase que acusatório. No fundo, eu não me conformo com o fato dele não ter vindo me visitar antes.

– Eu estive no 2 por um bom tempo ajudando a... Enfim. Agora faço parte do Comando Geral, ajudo a organizar as defesas nos distritos, elaboro planos de treinamento, ajudo a manter a paz. – Gale diz um pouco desconfortável. Por que será?

– Hum... Parece ser muito importante para estar aqui nas cinzas do 12. – Digo com ironia. Ele me cutuca de leve na costela.

– Não é isso, Katniss. Eu tive que me ocupar de algum modo. E meu desempenho na guerra chamou a atenção de algumas pessoas. Elas me chamaram para ajudar a reconstruir os distritos e vi nisso uma boa oportunidade para me manter distraído. Mas agora eles não estão precisando dos meus serviços. Por enquanto, tirei um tempo para mim. – Gale me lança um olhar de esguelha, contudo mantive o olhar firme em Buttercup.

– Quer dizer que você vai embora um dia? – Pergunto mantendo a voz equilibrada.

– Não sei ao certo. Depende. – Depende? Espero que ele esteja se referindo ao clima. Eu pigarreio e procuro mudar o assunto.

– Fome?

– Pensei que você nunca fosse perguntar. – Gale responde. E tenho quase certeza que ele percebeu o desvio no assunto.

Ponho Buttercup no sofá e nos dirigimos para cozinha. Esquentamos a comida que era do almoço, fazemos um chá, cortamos algumas laranjas. Gale me conta como está a situação nos outros distritos, a vontade do povo em ter uma vida tranquila, normal depois do caos. Então, após nos alimentarmos, limpamos nossa sujeira e voltamos para a sala. Sentamos novamente no sofá e continuamos a conversa.

Encosto minha cabeça no ombro do Gale enquanto escuto ele falar sobre a nova política que está sendo implantada nos distritos. Algo baseado no sistema político dos nossos ancestrais. Ele menciona por diversas vezes alguma coisa chamada democracia, mas não tenho certeza se é isso mesmo, visto a sonolência que começa a se apoderar de mim.

–-

Desperto com o cheiro de ovos e bacon sendo fritos. Sento-me no sofá e olho ao redor a procura de Gale. Jogo o cobertor de lado e me levanto. Greasy está no fogão preparando o café. Vejo duas xícaras na mesa, provavelmente ela já sabe da presença de Gale. O que me faz perguntar aonde ele se encontra.

– Acordou cedo hoje, Katniss. – Greasy observa sorrindo.

– Velhos hábitos nunca mudam. Depois que você começa a despertar para a vida. – Respondo, mas murmurando a segunda parte apenas para mim, enquanto sento-me na usual cadeira.

– Esbarrei com Gale nas escadas. Ele está no banheiro. – Ela comenta indiferente. – Katniss, hoje vou apenas fazer o café de vocês, vou passar no Haymitch. Ele finalmente aceitou meus apelos e permitiu eu fazer a limpeza na casa dele!

– Foi mesmo? Então, nem perde tempo aqui. Se fosse eu, sabendo do estado deplorável que está aquela casa, eu não me demoraria, se eu quisesse sair antes da meia-noite de lá. – Aconselho com uma piscadela.

Greasy concorda, lava as mãos e vai embora. No instante em que ela fecha a porta, Gale sai do banheiro banhado. Os cabelos pingando na blusa cinza de costura grossa. Ele se senta a minha frente. Pergunto-me se estou certa em querer entrar nesse jogo, querer fazer Peeta sentir o que eu senti. Mas é nada mais que o merecido, Peeta me deixou de lado, agora tudo se volta para aquela sua hóspede maldita. Gale toca minha mão, espocando minha bolha. Estava tão concentrada em meus pensamentos que não percebi que ele estava conversando comigo.

– Oi?

– Perguntei se você dormiu bem. – Gale finca a testa, preocupado que eu estivesse passando por alguma crise. Antes que eu pudesse responder, alguém bate na porta de entrada.

– Quem será que teve a coragem de vir aqui debaixo dessa neve? – Ele pergunta. Dou com os ombros sem saber.

Levanto-me para abrir a porta. O choque percorre meu corpo. Esqueci completamente que o Peeta me prometeu trazer pães hoje de manhã. E assim, segurando cinco pães envoltos em papel pardo debaixo do braço e minha bolsa de caça no outro ombro, está Peeta sorrindo abertamente para mim.

– Katniss, quem é? – Gale pergunta audivelmente da cozinha.

Peeta desmancha seu sorriso e automaticamente mantem uma postura educada demais, formal ao extremo. Irritante. E apenas para piorar a situação, Gale chega à porta. Eles se encaram acenando brevemente com a cabeça. Mas a tragédia não vem com a aproximação de Gale, e sim com a estúpida da Delly e sua ideia de girino.

– Nossa gente. É melhor entrarmos. Está muito frio aqui fora. Gale! Quando você chegou aqui? – Delly pergunta com entusiasmo, enquanto entra em casa seguida de um descontente Peeta.

– Sério mesmo essa garota? – Pergunto para mim mesma. Peeta olha-me de relance. Ótimo, ele me escutou. Argh!, mas quem se importa.

Todos nós nos dirigimos para a cozinha. Gale porta-se de anfitrião, provavelmente ele percebeu, pela minha expressão, que a última coisa que eu tentaria ser é educada, principalmente com essa loira desmiolada. Peeta recusa educadamente todas as ofertas de Gale, ao contrário de Delly que logo trava um diálogo sem fim com ele.

Sentada em uma cadeira ao lado de Gale, fico calada à medida que sou permitida para tanto. Delly não se contenta apenas com as respostas de Gale e pede que eu as confirme. Ridículo. A carranca forma-se no meu rosto, a irritação subindo a cada pensamento, a cada risada irritante. Olho de relance para Peeta e observo, pela primeira vez desde a chegada da sua convidada, que ele não está bem. Assim como eu, ele se mantem muito quieto, olhando fixamente para algum ponto além da janela. Talvez seja para a neve caindo.

Delly que está bem ao seu lado, continua a rir abertamente de algum comentário idiota de Gale. Enquanto ela sorri, seu braço pousa sobre os ombros de Peeta, que por um instante troca olhares com ela e pondera a atitude. Então, ele se ajusta para deixá-la mais confortável. Esses gestos não passaram despercebidos. A descrença atravessa meu rosto. Uma coisa é quando apenas Delly me irrita, outra completamente diferente é quando Peeta coopera com ela. Gale se remexe na cadeira, lança-me um olhar muito rápido. Então, continua agindo como se nada de estranho estivesse acontecendo na nossa frente, entre os dois, e como se não estivesse sentindo o calor emanando da minha raiva.

Sinceramente, eu não sei como estou conseguindo controlar meus impulsos. Acho que o fato de eu ter me tornado uma participante nesse jogo serve de estimulante para eu conter minha fúria. Só pode. Mas me incomoda o fato do Peeta estar fazendo isso. Será que Haymitch conseguiu cumprir por completo sua promessa? Não pode ser.

Delly continua conversando, algo que não faço a mínima ideia do que seja, com Gale. Pego a meu garfo e tento continuar comendo meu café. Olho de esguelha para Peeta que continua mantendo os ombros de apoio para Delly, que beberica sua bebida. Ele voltou sua atenção para a janela. Inesperadamente vira os olhos para mim. À primeira instância, pude observar frieza, depois várias de emoções transpassam pelo seu rosto. Nenhuma identificável a tempo.

Novamente Gale conta algo extremamente engraçado (o que eu acho muito estranho, visto que ele pode ser tudo, menos engraçado) que faz Delly dobrar-se sobre pescoço do Peeta de tanto rir. Eu aperto o garfo com firmeza na minha mão direita. Olho para Peeta que me encara atentamente. Então, a partir daí as coisas perdem totalmente o sentido. Gale pega a minha mão com o garfo, forçando-me a soltá-lo disfarçadamente. Toma-a na sua própria mão e começa a traçar pequenos círculos com o polegar. Meu primeiro impulso é puxar, mas depois de ver que Peeta está olhando para Delly (que continua a rir debilmente) no seu pescoço e ainda fica arrumando os cabelos dela, o rancor me domina, entrelaço meus próprios dedos nos do Gale com força, na tentativa de deixar o gesto mais natural possível.

Peeta volta sua atenção para nós e percebe o que está acontecendo. Dessa vez é a minha chance de ver a descrença estampada não só no rosto dele, mas no dela também. O diferencial maior é que, nesse caso, sou eu quem olha com profunda frieza dentro dos olhos de Peeta. Delly muda de posição desconfortavelmente na cadeira, lança um sorriso para nós e cutuca Peeta, que a olha brevemente. Logo, ele forma um sorriso impassível para ela e depois para nós. O desagradável silêncio se instala por intermináveis minutos.

– Bem, temos que ir agora. Não posso perder o trem novamente. Todos nós sabemos que Haymitch não sobreviveria mais dois dias sem álcool. – Peeta diz se levantando.

– Não precisa se incomodar Peeta, sei que você se encarregou de buscar os suprimentos de Haymitch, mas eu insisto em pegar esse. Querendo ou não, a culpa foi minha por ele estar em abstinência, não é mesmo? – Argumento enfatizando a última parte.

– Katniss, não seja teimosa agora. Como você vai trazer uma saca de ração e dez garradas de água ardente debaixo dessa neve? – Ele pergunta apontando um detalhe consistente. Então, eu vacilo para responder.

– Eu vou com ela. – Gale se adianta para me ajudar. E põe o braço sob meus ombros.

Peeta olha para mim e Gale. Avalia a situação e por fim balança a cabeça, vencido. Baixa o rosto e passa por nós, indo em direção da porta com Delly em seu encalço. Se esse é o jogo, posso dizer que nessa jogada eu venci e amei vencer. Haymitch veio com as suas jogadas, apostou em tentar manter-me afastada, apostou na tentativa de me induzir a cooperar, ele apostou na minha ajuda em fazer Peeta feliz, mesmo que isso signifique sacrificar a minha própria.

Se há ao menos uma coisa decidida na minha vida, essa coisa é deixar de sofrer. Isso é um tópico que quero exterminar por completo. Então, que todos se preparem, porque eu irei jogar. Vou apostar não somente na minha sobrevivência, como também na conquista da minha felicidade. Para isso irei contar com todas as cartas escondidas na manga.


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Notas finais do capítulo

Espero muito que tenham gostado um pouquinho.
A única coisa que digo é: "Que os jogos comecem! Quais são as suas apostas?"

Beijos, Fernanda