O vazio que se instalou em meu coração
É um espaço que agora você guarda - Justin Timberlake (Mirror)

A dor ainda estava ali, mesmo enquanto corria até sentir os pulmões pedirem clemência, mesmo enquanto as lágrimas secavam com o vento, ou até mesmo quando adentrou o barco à esmo no pequeno porto de Myriades e se pôs a remar com a ajuda de RipChip de volta para Cair Paravel, a dor lhe furava como cacos de vidro atravessando a pele. Ela só queria ir mais rápido, chegar de uma vez onde tudo começara e por um fim naquela dor insuportável.
—Não posso acreditar que isso seja real. - com os olhos ainda lacrimejando, Allessadra sorria encantada para o Rei Magnífico, o loiro tinha a cópia desse sorriso nos próprios lábios.
—E por que não acreditaria? Eu lhe disse que não havia dúvidas sobre o meu sentimento por você. - ela suspirou ao ouvi-lo dizer aquilo.
—Bom, já que estamos todos em clima de declarações. - a voz de Edmundo chamou atenção de todos, Caspian e Susana viraram-se para saber o que se passava. O Rei Justo puxou Isabele consigo até o meio da sala, parando de costas para os demais todos o viram ajoelhar-se. Izzy arregalou os olhos de surpresa. - Isabele, depois de tudo isso o que passamos e vimos juntos, não poderia haver outra pessoa em minha vida, você aceita ser a minha rainha? - o silêncio perdurou por não mais que três segundos, pois a garota ajoelhou-se de frente para o moreno e o abraçou dizendo sim repetidas vezes.

Aplausos foram ouvidos e lágrimas transbordavam dos olhos, os sorrisos de felicidade contagiaram a todos. Exceto um. Faltava alguém ali.
Depois de cumprimentar os amigos, Caspian voltou sua atenção para Susana, que permanecia atônita com o que ouvira. Enfim ele se declarava, enfim ela se tornaria a Grande Rainha.

—Oh Caspian, eu sabia... Eu também...

—Não, espera. - ele a cortou antes que ela pudesse dizer aquilo que ele não queria ouvir. - Su, você é maravilhosa, incrível, bonita e eu amei você... No passado. - a expressão dela mudou de imediato.

—O que quer dizer com isso, Caspian?

—Que eu amo Mariana, é por ela que estou perdidamente apaixonado e não podia dizer isso a ela sem antes ser honesto com você. - o moreno sentia um misto de alívio e desespero, enfim havia contado aquilo a alguém. Mas e se Mariana realmente fosse embora?

A Rainha Gentil estava sem palavras, todos os planos frustrados, tudo havia ido por água abaixo. Viu seu ex- futuro noivo marchar na direção contraria de onde todos se encontravam, Lúcia se aproximou curiosa, mas antes que pudesse perguntar algo Susana se afastou praguejando para o lado oposto de onde Caspian havia acabado de sair.

Jordana, que vira a filha sair desabalada de dentro do castelo, agora corria em direção ao porto. Já havia ido até a praia e não encontrara vestígios da moça, na mata ela não havia de estar, restando apenas uma alternativa. A única que ela desejava mais do que tudo que estivesse errada. Ao parar na curta passarela de madeira notou que havia apenas dois barcos ao invés de três; Caspian chegara em seguida, com o rosto preocupado ele constatou o mesmo que a rainha de Myriades. Mariana havia ido embora.

—Não pode ser... - ele disse para si mesmo, Jornada virou-se para ele e respirou fundo, precisava dar um jeito na situação antes que tudo saísse de controle.

—Majestade, precisamos ir atrás dela agora. - disse a mulher apressadamente. - Ela vai embora, sinto isso, não posso perder minha filha mais uma vez, não antes de ao menos despedir-me. - soluçou Jordana, isso pareceu acordar o rei que rapidamente correu de volta para o castelo, avisou um dos guardas que não tardou em ir alertar os demais.

Pouco mais de cinco minutos depois todos estavam de volta a bordo do Peregrino da Alvorada, até mesmo a Rainha Gentil, que ainda resmungava coisas sem sentido e optara por ficar em um dos camarotes da embarcação. Na proa, Jordana caminhava impaciente de um lado para outro, Benson tentava acalmar Julia, que ameaçava a amiga de mil e uma formas diferentes.

—Acalme-se, Julia. - disse o soldado pela quadragésima vez. - Lhe prometo que nós a encontraremos, convenceremos ela a ficar e então nos casaremos na primavera, o que acha? - a pergunta, como de costume, pegou a garota desprevenida. Jubs voltou seus olhos, antes raivosos, para os azuis do soldado, que sorria lindamente para ela.

—O que eu acho? - ela perguntou em um tom de voz duro, que por um momento assustou o homem. - Acho uma ideia excelente, soldado. - ela sorriu e o beijou.
Ela caminhava apressada pelo corredor do castelo, precisava chegar ao quarto e pegar seu colar, apenas isso a salvaria. RipChip vinha correndo ao seu lado, já tentara de todas as formas convencê-la a ficar, mas nada adiantou. Abriu a porta do quarto em que dormira todos esses dias e correu até a cômoda, pegou a joia que agora reluza sob o Sol do crepúsculo e saíra. Deixaria tudo para trás, só precisava voltar para o meio da floresta, onde tudo tivera início.

Com os passos pequenos e apressados, o pequeno roedor tornara a guinchar. - Senhorita, por favor, não vá. - ela embrenhara-se na floresta, ele estava em seu encalço. - Pense no que está fazendo.

—Já pensei Rip, não posso atrapalhar a vida deles. - respondeu brevemente, evitando as lágrimas uma vez mais. Iria embora do mesmo modo que chegara, com a cabeça erguida e levando consigo um pouco da dignidade que ainda lhe restava. Suas pernas já doíam pelo esforço, então diminuiu o passo. Olhou ao redor uma última vez, memorizando o lugar com que sonhara por anos. Notou que as Dríades não dançavam mais, as árvores pareciam tristes e não havia o brilho que as pequenas fadas costumavam deixar. É tudo estava mudando...
Por favor que ela não tenha ido, por favor que ela tenha me esperado, por favor, por favor.— enquanto a corrida contra o tempo se desenrolava, o pensamento do Rei clamava em desespero. Ela não estava no castelo, sabia que seria o primeiro lugar ao que iriam. Não, Mary era mais inteligente do que isso, ela iria ao local onde poderia dar fim em que começou. Os músculos começavam a arder conforme a pressa lhe consumia. Preciso alcançá-la - era o que rondava sua cabeça no momento. Todos estavam na mesma busca, tentando encontrar a pequena fujona que já causara tanto burburinho.

—Adeus, Rip. - ela agachou-se para poder ficar mais próxima do rato, o pequenino a olhava com uma tristeza iminente. - Obrigada por tudo, diga aos outros que sentirei saudades. - estendeu a mão para ele, que surpreendendo a mesma pulou em seus braços e abraçou-a o melhor que pode, ela retribuiu e ao soltar-se dele as lágrimas já haviam voltado. Colocou RipChip no chão e levantou, deu as costas para tudo e caminhou até o ponto onde chegara.

—Será que ela já foi? - Pedro perguntou aflito, Lúcia que corria ao seu lado deu-lhe um cutucão. - Ai, desculpa.

Caspian ignorava a todos, seu objetivo estava perto e ele precisava alcançá-lo. Céus, como pudera ser tão estúpido em demorar tanto tempo para dizer a ela o que sentia? Que Aslam tivesse piedade dele, porque se Mariana realmente partisse ele jamais se perdoaria. -Ali não é o Rip? - Lúcia perguntou de repente, atraindo a atenção de todos. Pararam ao alcançar o pequenino, que fungava repetidamente e limpava os olhos. - Está chorando, RipChip? - Lucy indagou.

Ele rapidamente ergueu os olhos e fungou uma última vez. - Claro que não, majestade... Isso foi apenas um cisco. - desconversou, ela teria rido se a situação fosse outra.

—Onde ela está, RipChip? - Jordana perguntou desesperada, ele apontou para frente e então Caspian partiu na direção indicada com todos em seu encalço mais uma vez. Parou ao ver o lugar vazio, nenhum vestígio, nenhum sinal dela, apenas o sutil perfume de maçãs frescas indicava que ela estivera ali. -Ela...

De olhos fechados e pedindo a Aslam que isso não fosse verdade, Caspian deixou as primeiras lágrimas virem à tona. O aperto no coração havia transformando-se em um nó bem apertado, trêmulos os joelhos cederam e tocaram o solo, todos estavam quietos, respirando num mesmo ritmo. Era visível a comoção, ninguém jamais poderia colocar em palavras a tensão que se espalhava pelo ar. Um soluço alto irrompeu pelo ar, cortando a floresta e declarando enfim a derrota não admitida do Rei. Ele perdera.

Sem ela, olhar ao redor seria um martírio. A pequena garota de coração valente, que chegara junto com as três amigas malucas mudara a vida não apenas do Rei X, mas do Caspian, o homem solitário e desacreditado e de uma aldeia inteira... Céus, o que faria agora?
A mesma pergunta rondava as cabeças de Allessandra, Isabele e Júlia. Elas não haviam perdido uma amiga, elas perderam uma irmã, com quem cresceram e viveram os piores e melhores momentos da vida. Simples como um vento que passa ela havia partido, sem o doloroso adeus, porém deixando o amargo da saudade.

Quanto tempo se passara não saberiam dizer, poderiam ser segundos como dias, não faria diferença.

—Vamos, majestade. - foi a voz de Lúcia quem chamou a atenção do Rei X, pela falta de barulho os demais já haviam ido, e isso significava que ele tornara a ficar só. Lucy tocou o ombro do amigo, que fragilizado limitou-se a levantar sem dizer uma palavra, não conseguiria mesmo se quisesse.
Seguiu a jovem Pevensie pelo vale até o castelo, e quando alcançou o mesmo pediu para ficar só, precisava de paz, mesmo que essa já não fizesse parte de seu mundo a partir daquela tarde; caminhou pelo corredor extenso de seu quarto, o som de passos denunciava que Katy ou Myre deveriam estar procurando por ele, todavia não importava, ele não queria mesmo ver ninguém. Tudo o que precisava agora era por os pensamentos no lugar e...

—Caspian?