Herança escrita por Janus


Capítulo 72
Capítulo 72




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     - Ali – ela apontou com a mão – tem um monte indo para a saída principal.
     Poucos momentos depois sentiu um calor surgindo atrás dela, e ao olhar viu a irmã com os braços abertos e algo surgindo por detrás. Primeiro parecia fumaça, mas logo viu que eram cinzas. Cinzas incandescentes pois podia-se ver a sua coloração avermelhada a noite.
     - Fluxo piroclástico – gritou ela movendo as duas mãos para a frente.
     O jato de cinzas cobriu as centenas de criaturas que se moviam pelo agora deserto megaparque em direção a saída. Desnecessário dizer que nada sobrou das mesmas.
     - Nossa, Calisto! Quando você aprendeu a fazer isso? – perguntou ela com os olhos arregalados.
     - Ontem, durante o ataque dos generais no nosso teste – respondeu olhando ao redor procurando por mais criaturas – foi como o meu jato de lava... apenas surgiu na minha mente o que devia fazer.
     Sailor Europa acionou o seu visor e procurou por movimento ou algum outro traço das criaturas nas redondezas. Alguns minutos antes estavam apenas olhando o local onde tinha ocorrido um incidente – um buraco no chão sem duvida escavado pelos generais – semanas antes, quando os poucos que estavam ali começaram a gritar desesperados e um ou outro gritou para elas que estavam sendo invadidos novamente. Elas não perderam tempo. Ainda furiosas com o ocorrido de ontem, as irmãs jovianas simplesmente se lançaram contra as criaturas causando uma carnificina ali. Felizmente elas não eram feitas de carne, mas de algo que se dissolvia e evaporava quando eram destruídas.
     Tentaram chamar os outros, mas como daquela vez na escola não conseguiam contatar ninguém. Assim, após terminarem de examinar o megaparque e de se certificarem de que por ali estava tudo seguro, iriam voltar ao castelo para saberem o que fazer a seguir.
     Marina.
     Ela parou subitamente e olhou ao redor. Sentia que tinha ouvido um sussurro. Mas um sussurro que envolvia todo o seu corpo.
     Marina – ouviu ela novamente.
     - Quem? – ela olhava ao redor usando o visor para tentar identificar quem estava por ali. Mas este detectava apenas a sua irmã.
     - O que foi Europa?
     - Parece... vai achar que sou doida, mas ouvi alguém chamando meu nome.
     Concentre-se Marina.
     - De novo – disse ela se pondo em guarda e girando a cabeça de um lado para o outro. Sua irmã já devia estar pensando que ela estava louca.
     Mas que coisa! Abra essa mente, sou eu, Ray!
     - Hã...? Fez ela deixando os braços caírem e olhando de uma forma abobada para frente – Ray? A mãe dos gêmeos?
     - O que disse? – questionou Calisto olhando para ela preocupada.
     - A Ray... disse para abrir minha mente... quer dizer... eu ouvi isso...
     Sentia-se confusa. Totalmente. Não era a "voz" da Ray. Na verdade não era uma voz propriamente, mas era algo que estava surgindo na sua mente. E não conseguia evitar. O que queria dizer com abrir a mente?
     Ora bolas, relaxe e se concentre. Isso foi fácil com sua irmã mais velha.
     - Joynah? – murmurou ela agora claramente confusa.
     Calisto não disse nada, apenas observava sua irmã atentamente. Voltou a olhar ao redor tentando identificar algo, mas estavam sozinhas ali.
     Feche os olhos e respire devagar. E vai entender.
     Ela tentou. Demorou um pouco e era difícil com sua irmã tentando saber o que estava acontecendo. Mas depois de um minuto tentando reduzir o estado de alerta em que tinha entrado quando as criaturas apareceram, aconteceu algo.
     [[Até que enfim Marina. Seja bem vinda ao elo mental que mantenho com minhas amigas já faz vários séculos]]
     Ela abriu os olhos e olhou apavorada para a sua irmã.
     - O que foi Europa? – perguntou ela extremamente preocupada.
     [[Preste atenção. Estamos ligadas mentalmente. Não quer dizer que eu possa ler sua mente, mas quando você conscientemente formular frases na sua cabeça direcionadas a mim, eu irei receber, entendeu?]]
     - Sim.. – murmurou ela.
     [[Aposto que respondeu falando. É na sua cabeça – apesar de na verdade não estar ouvindo, ela teve a nítida impressão de que ela tinha gritado – tente de novo]]
     [[S-sim]]
     [[Perfeito. Sem tempo para explicar detalhes agora. Estamos sem comunicação e essa foi a forma de emergência que encontramos para nos falarmos. Para falar com outra pessoa do elo, pense nela e pense nas palavras que ela quer ouvir. É meio automático. Na verdade você vai estar usando minha mente para isso, mas vamos deixar a explicação técnica para depois. Joynah já esta no elo, bem como todas as inners. Agora... sua irmã Allete está perto de você?]]
     - Europa? – chamou Calisto vendo que ela permanecia muda.
     [[Sim, e ela deve pensar que estou alucinando]]
     [[Vou fazer o mesmo com ela. Me ajude para não perdermos tempo]]
     [[Ajudar? Como?]]
     [[Explique para ela. Simples]]
     Logo em seguida, foi a vez de Calisto começar a olhar ao redor.
     - Esta ouvindo vozes? – Começou ela observando a irmã assustada e confusa.
     - Sim... acho que você não está louca.
     - É a Ray. Ela é telepata... eu acho – Europa sorria malevolamente por dentro ao ver a irmã na mesma situação que estava antes. Pelo menos podia sentir uma certa vingança dela ter pensado que estava louca - Bom, você só precisa se acalmar e...
     [[Prontinho – ecoou a voz de sailor Calisto na sua mente – já estou no elo mental]]
     - Ei! Como fez isso tão rápido?
     [[Já estive no elo mental do senhor Sume uma vez quando me perdi num acampamento – respondeu ela – foi no ano passado, foi fácil lembrar como agir]]
     - Mas...
     [[Ok meninas – era Ray falando agora com ambas ao mesmo tempo – meus filhos e as mães de vocês também estão no elo. Com isso podemos nos comunicar. Apenas não percam tempo conversando frivolidades. E se eu precisar me concentrar muito, todos vamos perder contato. Anne e Suzie não esta no elo ainda]]
     [[E o que fazemos agora?]]
     [[Agora Marina, você deve perguntar isso para sailor Venus, ou melhor, para sailor Calisto caso ela aceite ser a segunda em comando das lunar senshi]]
     - Nem começa – disse ela olhando-a firmemente – não acho que levo jeito para comandar. Na falta de Anne, Venus é que vai ter de decidir o que vamos fazer.
     [[Joynah? – chamou Marina pelo elo, esperando ter aprendido como usar isso. Joynah?]]
     Ela começou a olhar de forma preocupada para nenhum ponto em especial, fato que chamou a atenção de sua irmã.
     - O que foi agora?
     - Estou tentando chamar Joynah. Ela era nossa líder e deve saber o que fazer agora. Mas ela não responde. Não devo estar fazendo direito.
     Calisto ficou algum tempo quieta, chegando mesmo a fechar os seus olhos. Quando os abriu quase um minuto depois estava com uma expressão resignada.
     - Ela não responde, e nem Venus. Falei com a sailor Marte e ela me disse que ambas devem estar bem concentradas em outras coisas agora.
     - Ela não pode forçar o contato?
     - Se ela fizer isso e elas estiverem em algum combate – disse ela de forma muito séria – isso iria lhes quebrar a concentração e as deixar vulneráveis. Mamãe estava com Joynah e não responde também.
     - Bom, e o que vamos fazer?
     - Marte disse que Anne estava indo atrás de Haruka e que Suzie tentava detê-la. Nenhuma delas esta no elo e não temos como achá-las enquanto não recuperarmos a comunicação. Mas também disse que Rita, quer dizer, que Miranda tinha atravessado o portal negro das criaturas junto com Maya e mais um youma. Agora todos estão presos na base deles.
     - Ela é prisioneira também?
     - Ainda não – ela chegou a sorrir levemente – pelo que ela soube, elas estão é destruindo tudo por lá. Parece que os generais não esperavam que alguém resolvesse usar o portal para um ataque surpresa. Se bem que conhecendo a Rita ela deve ter entrado lá por qualquer outro motivo que não fosse o de atacar. Já que não conseguimos falar com ninguém agora, podemos ou ir ao Castelo tentar obter alguma direção, ou tentar entrar em um dos portais que estão aparecendo por ai e talvez conseguir salvar elas.
     Marina sorriu levemente, sua irmã não a conhecia ainda?
     - E nem imagina o que eu quero fazer?
     - Calma ai sua caçadora de brigas – ralhou ela – vamos para o castelo. Se houver a oportunidade de entrar em um portal, vamos ver o que podemos fazer.
     Sem esperar resposta ela começou a correr em direção ao centro da cidade onde ficava o castelo, deixando Marina espumando enquanto a seguia. Durante o caminho encontraram outros pontos de ataque das criaturas, as quais eram cruelmente destruídas pela sailor Europa que procurava qualquer coisa para descarregar sua frustração. Mas em nenhum destes pontos havia um portal negro aberto.
    

-x-

 

     Seu visor chaveava constantemente todos os canais possíveis, mesmos aqueles que eram prioridade da defesa global. Mas não conseguia resposta. Da mesma forma que tinha ocorrido na escola, só conseguia estática. Imaginava se aquele general malviano tinha algo com isto. Seu visor já estava pronto para detectar qualquer coisa que se assemelhasse com ele, seja na forma felina ou humana.
     Nunca tinha explorado a fundo aquele presente inesperado do traje de sailor. Um visor mercuriano quase idêntico a de sua mamãe Amy. Diferente dos visores que as outras usavam, aquele obedecia a seus comandos mentais e era muito mais avançado. Podia efetuar funções sem necessidade de conexão a uma central – agora com as comunicações cortadas, os outros estavam muito limitados – e tinha uma base de dados toda própria, embora ainda precisasse descobrir como acessá-la. O visor simplesmente utilizava esta quando tinha necessidade. Como ela não ficava sempre em forma de sailor e não sabia como usar o visor sem se transformar, precisou se resignar a esperar um ocasião propicia para isso. Ficar muito tempo transformada em sailor tinha desvantagens, especialmente quando voltava ao normal.
     Talvez fosse um erro insistir em ir atrás de Haruka sozinha. Quando tentou avisar sua mãe percebeu que não podia contatá-la. Chegou mesmo a pensar que devia voltar, mas o medo desta se negar a permitir que ajudasse no resgate falou mais alto que o bom senso. Isso e o fato de sentir Suzette se aproximando dela deu-lhe coragem para seguir em frente sozinha. Só queria saber como Suzie sabia para onde ir. Ela parecia que podia segui-la de alguma forma, só não sabia como. Bom, quando estivesse bem próxima de seu destino iria diminuir o passo para que esta a alcançasse e então teria apoio para o que pretendia.
     Só não sabia ainda o que fazer caso aquela mulher estivesse por lá. Seu anel de defesa realmente podia segurar o poder dela, mas seria muito limitado utilizá-lo. A melhor opção que tinha seria envolver ela e Haruka em um escudo de defesa, tentar libertá-la e então fugirem.
     Observou os dados do seu visor. Este mostrava que havia uma anomalia elétrica bem acima dela, e parecia estar se movendo para o centro da cidade. Devia ser isto que estava cortando as comunicações. Hum... talvez ela pudesse contatar Suzette... seu visor não precisava de uma central para efetuar comunicações. Sozinho ele se adaptou ao sistema de comunicação que tinham na cidade e ela pôde usá-lo normalmente como um visor normal. Talvez ele pudesse agir como central e contatar Suzette diretamente, ela estava mas próxima e talvez não houvesse tanta interferência.
     Mal pensou nisso e uma imagem de Suzie surgiu do lado esquerdo do visor, bem como o texto de que tentava contato. Logo foi mostrado que havia captado o sinal de localização do visor dela, indicando que estava ha menos de dois quilômetros de distancia.
     - Suzie, pode me ouvir? – disse ela quando recebeu a informação de que havia um contato feito com o destino.
     Ela aguardou enquanto pulava por sobre algumas colinas de rocha nua. Tentava se lembrar do que tinha daquele lado da cidade alem de campos de fazendas. Lembrava-se de que haviam algumas casas abandonadas ali da época em que a rodovia fora construída. O local as vezes era utilizado para acampamentos por alguns ousados da cidade – bela ousadia, acampar a apenas dez quilômetros de casa e perto de uma rodovia.
     Ouviu uma resposta, mas estava com muita interferência de forma que não conseguiu entender. Mas tinha feito contato. Talvez pudesse enviar textos. Ela tentou comandar o visor para enviar um texto dizendo para ela seguir um pouco mais para o sul para poderem se encontrar, mas a interferência ainda era demais para o visor dela receber corretamente. Talvez devesse mesmo ir na direção dela e então juntas seguirem para encontrar Haruka.
     Mas ela sentia que se o fizesse, Suzie talvez tentasse fazê-la desistir disto. Era o que faria no lugar dela. Não, teria que continuar até não ter mais opção, até Suzie não poder fazer nada alem de auxiliá-la.
     Sentia-se uma paria por fazer isso. Por colocar sua família, seus desejos acima da sua obrigação como sailor. Mas não podia se controlar. Não queria na verdade. Provavelmente ela seria mais útil na cidade, onde algo devia estar ocorrendo – aquela interferência sem duvida era obra dos generais – mas no momento só pensava na sua mãe. A mãe com quem discutia sempre e que era noventa por cento das vezes injusta nos seus castigos.
     A mãe que ela amava mas que adorava deixá-la louca.
     Após um salto pequeno de alguns metros por sobre a ultima colina, sentiu algo diferente. Parecia que estava mais fraca. Mesmo o seu visor estava falhando. Será que estava sem energia? Procurando ignorar isso, deu um salto com força, apenas para verificar que tinha sido de meros três metros.
     Pouco antes de tocar o chão novamente seu corpo brilhou por alguns momentos, e uma Anne confusa rolava pelo chão de terra e coberto de folhas. Sua força tinha desaparecido. Na verdade, sua transformação tinha sido revertida.
     Atônita ela se levantou e observou o seu corpo. Estava suja de terra, mas estava bem. Exceto que era o seu corpo de Anne, não de sailor Titã. O que tinha acontecido? Ela se concentrou e seu pingente se materializou em sua mão normalmente. Ainda confusa com o que tinha ocorrido, tentou se transformar.
     - Pelo poder...
     O pingente escapou de sua mão e seguiu horizontalmente pelo chão até uma distancia de uns dois metros dela. Brilhava e estava parado ali, flutuando. Pensou que devia ser aquela mulher que manipulava gravidade novamente. Que idiota fora! Como podia pensar que tinha chances contra ela? Porque tinha ido contra toda a lógica que sua mente dizia? Não havia como ela salvar sua mãe daquela mulher. Não sozinha, e muito menos apenas com Suzette. No que estava pensando?
     No que uma lunar senshi sempre acredita... esperança!
     Girou o corpo observando ao redor. Aquela voz... não sabia de quem era, mas sentia que a conhecia.
     - Quem está ai? Detesto jogos, portando apareça logo e faça o que quer fazer. Estou indefesa agora.
     Indefesa apenas porque acredita nisso.
     O brilho do pingente ampliou-se, chamando a sua atenção. E quando este diminuiu ela ficou de boca aberta. Ali na sua frente estava uma mulher que nunca tinha visto antes, mas estava vestida como uma sailor. E não uma sailor qualquer. Aquela mulher estava vestida como sailor Titã!
     - Você sabe que não tem chance contra aquela mulher e mesmo assim esta indo salvar quem você ama – disse ela em uma voz tranqüila e até com um certo sorriso – e ainda ousa duvidar de si mesma? Ousa acreditar que está traindo suas obrigações?
     Ela sabia o que estava pensando?
     - Você – murmurou confusa – sabia o que eu estava... – não terminou a frase, acreditando que ela podia muito bem ler seus pensamentos.
     Ela riu um pouco antes de responder.
     - Você esta vendo uma sailor Titã na sua frente e nem quer saber como é possível? Você é mesmo incrível.
     - Você é a sailor Titã original... quer dizer, minha antecessora...
     - Bela aposta – disse ela de uma forma bem séria agora – mas não. Sou apenas a impressão de sua forma... a essência que dela ficou no pingente. De uma certa forma tenho os conhecimentos dela, mas não tenho detalhes sobre a sua vida.
     Anne ficou muda. Ela estava vendo uma personificação de uma consciência rudimentar ali, uma consciência que estava utilizando algo do pingente para se manifestar. Mas porque agora? Não podia ter feito isto antes?
     - Eu...
     - Você quer salvar sua mãe, mas não sabe se poderá fazê-lo – disse ela a interrompendo – e acredita não ter muito tempo. Vou ser direta e o mais breve possível. Você é a sailor Titã, e só perderá este titulo se morrer ou abdicar. Ele não pode ser tomado de você, ao contrário do que ocorre com as sailors planetárias.
     - Como?
     - Não importa – ela sorriu – você foi selecionada para prosseguir como a sailor Titã.
     - Mas.. porque está aqui agora? Porque tirou meus poderes?
     - Porque uma sailor que morre em combate sempre deixa algo para a sucessora – ela olhou para baixo – e Neya queria que o conhecimento dela fosse passado adiante. Conhecimento que será útil para você. Mas terá de pagar um preço para isso.
     - Preço? – seus olhos se arregalaram um pouco.
     - Terá de dispor de um tempo para aprender.
     - Mas minha mãe...
     - Esse é o preço. Pode invocar sua transformação agora e não ser capaz de fazer nada, ou pode gastar tempo agora e ser capaz de fazer algo depois.
     - Mas pode ser tarde demais...
     - Esse é o preço – repetiu ela – você é filha de uma netuniana e de uma uraniana, pode muito bem despertar essas habilidades quando transformada. Mas para isso você vai precisar me deixar ser sua guia. Há muito o que pode fazer, mas só sabe a invocação básica dos elementais. Não sabe simplesmente utilizá-los.
     Estava confusa. O que devia fazer? Percebia Suzette se aproximando, mas sentia que ela não poderia ajudá-la.
     - Não estou entendendo... – disse olhando-a fixamente – quem é você? Ou melhor, quem você representa?
     - Esta é a forma de sua antecessora, Neya, a mercuriana que liderou as últimas sailors lunares. Uma mercuriana que podia enfrentar o rei de Júpiter se quisesse. Interessada agora?
     Uma mercuriana que podia enfrentar alguém de júpiter? O que ela queria dizer com isso?
     - Eu tenho escolha?
     - Sim – respondeu ela impassível – pode escolher ser Umino Namida Anne, que quer salvar a mãe mas não sabe como, ou pode ser sailor Titã com conhecimento necessário para ter alguma chance de fazê-lo. Mas qualquer que seja sua escolha, não haverá volta. Não esquecerá o que aprendeu ou... nunca poderá aprender o que posso lhe ensinar. Agora escolha.
     Isso não podia ter acontecido ontem? Ou talvez amanhã? Tinha que acontecer agora?

 

-x-

 

     Ela iria querer saber como estava conseguindo segui-la, mas até que era fácil quando se sabia. Já tinha notado que quando ela usava o visor de sailor Titã, este emitia um sinal. Só precisava seguir este sinal. Pena não ter tido tempo de falar isso para sua mãe quando ela pediu para segurar Anne pela orelha ou no chão se fosse preciso.
     Era fácil falar... duvidava que mesmo sua mãe fosse páreo para a força de Titã, embora força não fosse tudo. Só esperava que seus irmãos não saíssem do templo.
     Alguns minutos atrás ela tinha recebido uma tentativa de comunicação, mas a interferência não permitia nenhuma conversa. Só sabia que tinha sido Titã que tinha se conectado ao seu visor. Pelo menos aumentou a força do sinal que estava captando, embora não conseguisse alcançá-la por mais rápido que tentasse.
     Duvidava que pudesse alcançá-la antes que esta chegasse onde a mãe estava. E então? O que fariam? Iriam enfrentar sozinhas alguém que tinha derrotado todas as lunares na véspera?
     Sorriu levemente. Provavelmente fariam isso. Seriam idiotas para tentar o impossível. E para que? Bom, Anne para salvar a mãe, e ela simplesmente para ajudar sua amiga.
     Começou a saltar por sobre as colinas do lado leste da cidade, quando subitamente parou e ficou em cima de uma delas. O sol já tinha se posto de forma que ali estava a completa escuridão. Não fosse seu visor ter infravermelho, não saberia para onde ir.
     O sinal do visor de Titã... tinha desaparecido!
     Isso significava que ela tinha desativado este. Talvez para lutar! Fechou os olhos e concentrou-se na direção em que o visor a tinha captado pela última vez. Logo em seguida percorreu as colinas restantes e com cautela se aproximou do local. O infravermelho não indicava nada por ali. Era um local com grama alta com alguns arbustos espalhados. Em alguns anos haveriam por ali árvores frondosas, mas por ora, apenas arbustos.
     Olhou ao redor com cuidado, estava muito escuro por ali ainda, e mesmo as luzes da rodovia relativamente próxima – coisa de uns trezentos metros – não alcançava o local pois os arbustos as ocultavam. E agora? Para onde deveria seguir? Pela trajetória que Titã estava seguindo, estava indo em direção a rodovia. Sem dúvida iria cruzar esta e ir um pouco além, mas não muito. Titã podia sentir as sailors há poucos quilômetros de distancia. Urano não podia estar muito longe dali.
     Com um meio suspiro ela começou a correr em frente, seguindo a direção aproximada de onde sua amiga estava indo. Se ela estivesse lutando iria ouvir os sons em breve. Correu por quase um minuto quando seu visor, se adequando a luminosidade cada vez maior da iluminação da rodovia identificou uma pessoa deitada há vinte metros de distancia, no alto de uma elevação daquela parte erma da cidade.
     Parou de andar e observou atentamente a imagem que captava. Estava deitada e parecia se remexer, como se estivesse dormindo no chão. Quem seria? Um exame mais amplo revelou que não havia mais ninguém por ali, assim andou devagar até onde estava a pessoa.
     Entrando por entre arbustos mais altos, piscou o os olhos com a súbita iluminação da rodovia. Estava no seu acostamento. Talvez fosse um indigente afinal – ainda se surpreendia de conseguir encontrar alguém nestas condições na sua época, mas sempre existiam os teimosos que não aceitavam ajuda em troca de uma certa perda de liberdade.
     - Ariel? – disse uma voz bem conhecida – saia daqui, agora!
     Olhou para baixo e lá estava a sailor Urano, deitada no chão de cascalho que formava o acostamento da rodovia e com um brilho fraco nos joelhos e nos tornozelos. Pareciam fios de luz. Imaginou que deviam ser dispositivos de imobilização, e que devia haver mais alguns nos seus pulsos. Mas porque ela estava simplesmente largada na rodovia, onde poderia ser relativamente fácil ser resgatada?
     - Eu disse para sair daqui! – gritou ela enfurecida.
     - Prazer em te ver também, Urano. E sim – ela estava sendo sarcástica – é claro que isto é uma armadilha, mas se considerarmos quem são os oponentes... de que adianta eu fugir? – ela colocou as mãos na cintura e olhou com certo desdém para ela. Só me diga uma coisa... Titã já esteve aqui?
     - Não – murmurou ela depois de algum tempo, com um pavor evidente no olhar.
     Ariel ficou ali parada em frente a ela, observando a imobilizada sailor se contorcendo novamente, tentando libertar o seu corpo. Se aquilo era similar as algemas de força da policia, ela não tinha nenhuma chance. Olhou para frente, para nada em especial e aguardou um pouco.
     Sua respiração estava controlada, bem como seus instintos. Seu visor não tinha captado ninguém além de Urano por ali. Mas não era apenas o visor ou seus olhos que tinha a disposição para saber como as coisas estavam ao redor.
     Durante um ano ela treinou como comandar o vento sem se transformar. Um ano aprimorando como controlar e sentir este rodopiando ao redor de folhas, papel, poeira até mesmo de seus dedos. Foi a primeira – e por enquanto talvez a única – a descobrir que a sua transformação na verdade permitia um acesso mais direto aos poderes elementais. Seu tornado era um exemplo de um poder "pronto", já definido. Mas ela podia controlar o vento de forma mais sutil ou aprimorada. Apenas precisava treinar isso.
     Transformada, aquele treinamento de meramente criar uma brisa e move-la a seu bel prazer tinha tido um efeito um tanto inesperado. Para fazer aquilo ela precisou aprender a sentir também o que o vento fazia. Agora que estava transformada ela podia sentir toda a movimentação do vento ao redor, por menor que fosse. Sabia onde estava cada folha, cada imperfeição do solo e da estrada, podia sentir onde estava a iluminação pela movimentação do ar causada pelo calor desta. Na verdade tinha um mapa em três dimensões na sua mente de tudo o que estava ao seu redor e um pouco mais além, juntamente com o mapa que já tinha dos músculos e ossos de seu corpo.
     Nunca foi a intenção dela, mas ao utilizar sua mente para mapear seus músculos – um efeito colateral de sua mania de sempre visualizar todo movimento consciente antes de fazê-lo – na verdade acabou lhe dando toda a base para poder ter aquele mapa mental, algo que só uma mente como a dos mercurianos poderia fazer. Suzette agora nunca mais poderia criar coisas como Orion ou ser uma pesquisadora com sua mãe, mas tinha tudo para ser o que poucos mercurianos tinham sido...
     Uma guerreira.
     Uma guerreira que já sabia onde estava seu oponente, como este estava se aproximando e o que poderia fazer. Ela colocou a perna direta para trás, mas manteve o peso do corpo na esquerda. Urano parou de se contorcer e parecia estar dizendo algo, mas ela simplesmente filtrou isso de seus ouvidos. Pelo menos tinha uma vantagem. Sabia que não era aquela mulher que quase a matou antes. Contra ela, pouco podia fazer referente a sua força ou poder. Mas contra esta outra pessoa que se aproximava pela sua direita oculta pelos arbustos a coisa poderia ser diferente.
     Claro, de uma coisa tinha certeza. Era um dos generais. Sua forma era humanóide – pelo que percebeu do ar movimentando-se ao redor do corpo – e parecia ter seios, portando talvez fosse a outra mulher general que Hotaru tinha comentado.
     Sem demonstrar hesitação ou surpresa, ela meramente dobra seu corpo para trás, fazendo sua cabeça escapar por milímetros de uma perna esticada para esta. Mas não foi só isso. Uma vez que passou por sua cabeça, a perna encontrou o seu braço esquerdo que a agarrou na altura do tornozelo e a puxou para trás, fazendo a cabeça de sua oponente – agora sabia que era uma mulher – girar para onde sua perna direita que já tinha se movido iria estar em alguns momentos.
     Ela atingiu a cabeça dela com o pé e seguindo o movimento ascendente o dobrou e fez o joelho atingir as costas, na altura do fígado. Ela seguiu o seu giro e deu um salto para trás pousando em pé novamente. Já a sua oponente aturdida pelo impacto na nuca e pela potente joelhada, caiu no chão de lado e rolou um pouco, antes de se erguer novamente e precisar se esquivar e bloquear em seguida, pois a jovem sailor já tinha avaliado como ela iria se erguer, de forma que já estava atacando.
     Dando um salto para tomar distancia, a general a observou com olhos demonstrando sua surpresa e sem duvida impressionada com o que houve. Agora ela tinha uma idéia do que a sailor Ariel podia fazer, e isso acabava sendo mais problemático. A general não iria subestimá-la novamente.


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