Herança escrita por Janus


Capítulo 52
Capítulo 52




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     - Surpresa! - disse alguém cobrindo os seus olhos.
     Anne sorriu levemente reconhecendo a voz e não acreditou que podia ser ele. Ela se virou rapidamente e lá estava ele. O sapo encantado que ela estava avaliando com cuidado e critério.
     Tony!
     - Oi.. puxa... não esperava te encontrar por aqui...
     - A Rita me convidou.. disse que.. eu.. talvez encontrasse com uma conhecida.
     - E você, com certeza, gostou disso, não foi?
     - Depende... eu não encontrei uma conhecida, mas uma bela e adorável recém conhecida...
     - Ai que fofo - ela ficou levemente corada - vem.. quero te "pagar" um pedaço de bolo...
     Ela pegou ele pela mão e o puxou para onde estava o bolo já muito mutilado pelos mortos de fome dali. Ela pegou um pedaço e deu para ele, sem nem se incomodar de perguntar se ele já tinha provado ou não. Ele pegou este e, com um sorriso, começou a come-lo lentamente.
     - Delicioso - disse ele a observando - isso satisfaz tanto meu paladar quanto sua linda visão satisfaz meus olhos cansados...
     - Você é bom com as palavras. Eu gosto disso. Gosto mesmo. E então? Será que este distinto cavalheiro irá me dar algumas alegrias extras?
     - hum...
     - Me convida para dançar? - murmurou ela com um sorriso.
     Ele se aproxima e pega delicadamente na sua mão.
     - Minha cara albina que roubou os méritos da detentora desta festa, poderia ceder-me parte do seu tempo de musa celestial para me guiar na Terra mortal os passos de uma encantadora dança?
     Sorrindo de forma encantadora, ela o acompanhou até os fundos da casa, onde os jovens improvisaram uma pista de dança, e começaram a dançar o ritmo lento que estava tocando agora.
     Ha uma certa distância, em um palanque improvisado estava a banda que tocava na festa. Um rapaz e uma moça - eram lindos - na verdade, eram cantores famosos que costumavam fazer turnê pelo mundo, e ocasionalmente passavam pela cidade para tocar no parque da canção. Allete acabou fazendo amizade - e saindo um pouco também - com o vocalista da banda e perguntou se poderiam tocar na festa da irmã. Se pudessem levar um bolo igual a da aniversariante para casa, aceitariam.
     Por isso que tinha um segundo bolo bem guardado dentro de casa.
     Mas isso não era algo que interessava a eles no momento. Ambos apenas dançavam abraçados e com calma, sentindo os movimentos um do outro, e com Anne como sempre analisando aquele sapo que estava começando mesmo a interessa-la. Quem sabe? Talvez ela acabasse encontrando seu príncipe encantado, afinal de contas. Mas ainda tinha muitos testes que ele devia passar antes disto. Muitos mesmo.
     A quem ela estava enganando? Ele estava agindo muito bem até então.
     - Anne - murmurou ele - onde aprendeu a dançar assim? Parece que andou tendo aulas...
     - E tive - ela sorriu - minha mãe as vezes gosta de dançar valsa, e como nem sempre tem um par disponível, era comum ela me pegar para ser seu par, desde que e era uma menininha...
     - Aprendeu muito bem - comentou ele a girando agora - muito bem mesmo.
     Eles continuaram a dançar de forma lenta, junto com outros casais ali. Anne mal percebeu que Rita estava por lá, e os observava sorridente. Se Anne tivesse reparado nela, perceberia que mesmo ela estando marcada pela surra do templo, ainda assim conseguia um gato para companhia facilmente.
     - Me diz o nome da pessoa que você bateu.
     - Eu apanhei, isso sim - ela riu - e feio!
     - Talvez eu possa te ensinar um pouco de defesa pessoal.
     - E você sabe lutar?
     - Um.. pouquinho. Nada assim que seja excepcional, mas sei um pouco. Pelo menos, dá para sobreviver...
     - Hum... bom, talvez outro dia. Estou mais interessada no que este galante cavaleiro planejou para conquistar esta inconquistável aqui...
     - Bom... sinceramente? Nada ainda...
     - Então, tem algumas horas para fazer um milagre - ela o abraçou forte e pousou a cabeça no seu peito - ser é que tem algum interesse, lógico!
     Claro que ele tinha interesse. Com uma moça daquelas dando sopa, ele tinha que fazer algo. Queria fazer algo e iria fazer algo.
     Só que tudo o que ele pensava era como ela dançava bem, como tinha uma voz doce e como era independente e cheia de vida. Muito, alias.
     - Que tal passearmos no parque amanhã?
     - Ainda estou de castigo Tony... Mas na segunda estou livre.
     - Nesse caso... eu gostaria de convida-la para uma noite animada na segunda... um jantar... cinema... dança... o que me diz?
     - Nada de discoteca!
     - Sem dúvida nenhuma, minha deusa celestial. Nada de discoteca para você, musa inspiradora dos poetas mais talentosos do Universo...
     Mas ele sabia mesmo como ser paquerador ao extremo. E o pior foi que ela adorou isso! Musa inspiradora... ai, ai... ela segurou firme o resto dele e o beijou na testa - na boca ela não ia beijar mesmo, antes de ser conquistada. Podiam chama-la de antiquada, mas só daria um beijo de língua em quem a conquistasse de corpo e alma.
     E ponto final!
     - Acho que você gostou...
     - Claro que gostei - ela sorriu para ele - qualquer mulher gosta de ser elogiada, sabia? Bom.. você dança muito bem... que tal agora mostrar que sabe igualmente conversar bem?
     - Tudo bem.
     Ele envolveu o braço no seu ombro e ambos seguiram para perto da entrada da casa, mais especificamente o banco preso por correntes que ficava na varanda desta.
     Assim que se sentaram, ele balançou o banco e ficaram assim, balançando lentamente e com ele com o braço nos seus ombros. Anne se sentia uma menininha que tinha acabado de receber o seu primeiro beijo.
     Um pouco mais distante, Rita observava o casal com interesse. Ela já tinha tido uma experiência com Tony antes, e sabia que ele era educado. Mas acreditava que o mesmo não iria se segurar muito com uma mulher como Anne sendo o prêmio. Não iria mesmo. Assim, observava-os atentamente, analisando o que faziam e esperando flagra-los em alguma coisa um tanto... avançada.
     Se bem que para os padrões do século XXX, coisas avançadas já seria o ato sexual em si.
     Mas ela estava curiosa. Na verdade, ela, Suzette e Marina estavam curiosas. Já tinham formado um grupinho desde que viram os dois dançando, e, desde aquele momento, os observavam de perto.
     Nenhuma delas iria perder o primeiro beijo deles. Ah... mas não iam mesmo!
     Allete também ficou interessada no começo, mas acabou se esquecendo disto e preferiu bater papo com o vocalista daquela banda de dois irmãos, o qual ela ficou muito interessada - e metade das meninas da festa também. A outra metade estava encabulada demais para demonstrarem interesse pois os namorados estavam muito próximos.
     Seja como for, o trio ali ficou do lado da mesa onde estava o grande bolo - que na verdade já estava no fim - para ter uma visão melhor dos dois. Estavam quietinhos e apenas balançando o banco levemente. Mas o braço de Tony nos ombros dela não deixavam dúvidas de que havia alguma coisa ali que podia vir a ocorrer.
     E, se ocorresse, elas queriam ver isso.
     - Anne... você... bom. Ainda tem, alguma mágoa do incidente na discoteca?
     - Não... só um medo danado de bebidas alcóolicas. Tony... - ela sorriu - isso sim foi uma história para os netinhos. Eu não tenho a menor idéia do que ocorreu naquela noite. Nenhuma mesmo. Só me lembro de acordar desesperada no chuveiro gelado.
     - Nossa! Não é a toa que ficou de castigo... quer dizer... bem...
     - Foi um acidente, não fique se culpando. Mas eu agradeço muito por não ter se aproveitado do meu estado nem um pouco consciente para me roubar um beijo.
     - Sinceramente... ia ser difícil eu conseguir beija-la com... err... - ele não devia ter começado a falar - deixa para lá...
     - Com o meu bafo? - ela sorriu - Tony, não tenha medo de falar as coisas, porque eu não tenho medo de ouvi-las. Não falo coisas pela metade e nem tento fazer os outros adivinharem o que eu estou falando. Se eu gosto de usar roupas curtas, apertadas ou sedutoras, é porque quero que olhem para mim mesma, e se podem ver a cor de minha calcinha branca, é porque eu permiti isso.
     - Não era azul não?
     - Hã... - ela olhou para ele surpresa. Mas... naquele dia ela não estava a fim de deixar ninguém ver não... puxa! - sim.
     sutilmente ela apertou ainda mais os joelhos, e dobrou as mãos acima da sua saia. Apenas por garantia.
     Felizmente, ele não percebeu como ela ficou encabulada e, de forma muito ousada, lhe roubou um beijo na face. A mesma sorriu levemente e o encarou com os olhos transmitindo o quanto o media de cima baixo.
     Isso o deixou constrangido por algum tempo, até ela se virar e encostar melhor a costas no seu corpo. Sem se fazer de rogado, ele a desviou um pouco e a mesma acabou se deitando no seu peito, com o braço dele na sua barriga. Exatamente como Joynah fazia com o Herochi. A distância, as três meninas curiosas deram alguns gritinhos, mas ninguém prestou muita atenção nelas.
     Mas Anne prestou. Ela percebeu pelo canto dos olhos algumas meninas pulando e, quando olhou melhor, viu que as três os observavam descaradamente. Mas que coisa! Será que não podia ter um pouco de sossego? Pois bem. Ia se livrar delas.
     - Tony... vamos dar uma volta?
     Sem esperar por sua resposta, ela pega na sua mão e o puxa pelo meio da festa, se misturando aos convidados e, usando seus sentidos para saber onde suas amigas escavam, ia se esquivando, virando, dando meia volta, passando ao lado delas, por trás, até que, finalmente...

 

-x-

 

     - Ei! Aonde eles foram?
     - Pensei que você estava de olho neles Rita.. puxa vida! E agora? Será que eles vão pular a corda?
     - Não seria pular a cerca? - Perguntou Marina meio encucada.
     - Que seja! Marina, vá por ali, Suzette, você vê atrás da casa. Eu vou lá fora na rua. Não podemos deixar estes dois sozinhos! Vai que ele seduz a Anne e nenhuma de nós é testemunha?
     Ela mexeu nos pauzinhos como se estes estivessem com pontas afiadas penetrando a sua pele, e praguejou mentalmente por isso. Que droga! Como é que em quatro anos ainda não conseguia dominar a arte de segurar aquele instrumento de tortura chinesa que os nativos dali usavam como talher para pegar os alimentos?
     Chegava a ser vergonhoso. Tudo bem que ela passou a maior parte de sua vida na América, e praticamente rejeitou a sua ascensão oriental. Mas quando se mudou para o Japão alguns anos antes, em vista de uma oportunidade rara de emprego, não chegou a achar que teria problemas de adaptação. Talvez a questão de cultura, de saber o que falar e como falar. Mas nunca, jamais pensou que poderia passar vergonha comendo algo. Pior! As vezes ela demonstrava um total desconhecimento de como consumir alguma coisa. Por orgulho mesmo, se recusava a perguntar como deveria agir.
     Ela usou a outra mão para posicionar os pauzinhos de plástico rugoso nas mãos e, com cuidado e até com a mão tremendo - de tanta força que ela fazia - pegou um sushi e o colocou - na verdade, ele caiu - na cumbuca com o molho de soja.
     - Algum problema Laura? Quer que eu pegue um garfo?
     - Não precisa - ela se virou e viu Allete ali do seu lado, junto com um dos mais belos rapazes que já tinha visto na vida - eu posso ser meio amadora, mas me viro muito bem. Quem é este belo representante do sexo desejado?
     - Este é o Hoshi - disse ela sorrindo - um amigo meu. Ele foi convidado para animar a festa com música.
     - Hoshi... Hoshi... você... você é o cantor que as vezes aparece no parque da canção!
     - Sim - respondeu ele numa voz doce e melodiosa - minha agente é amiga da mãe da aniversariante pediu para que eu e minha irmã animássemos a festa.
     Ele deu um sorriso tão lindo que Laura sentiu seu coração palpitar. Que homem lindo era esse. Queria desesperadamente ser tomada nos seus braços, e conhecer o que aqueles lábios sedutores podiam fazer. Mas um rápido puxão em sua consciência a fez perceber que ele já estava acompanhado. Que pena...
     - Tem certeza que não quer que eu pegue o garfo?
     - Absoluta! - respondeu ela com firmeza e determinação, apertando ainda mais o sushi pois o mesmo parecia que ia escorregar. A pressão dos "pauzinhos" era evidente considerando como o alimento era esmagado onde estes o tocavam, e o pedaço de pescado no seu interior era projetado para fora, como se fosse o recheio de algum doce que fosse espremido pelas mãos.
     Allete olhava aquilo tentando suprimir um sorriso que teimava em aparecer. Ela estava usando muita força ali. E aquele sushi não era nem de longe tão resistente quanto os ocidentais podiam supor. Laura aproxima a comida da boca quando subitamente ela começa a se desmanchar. Em pânico, ela aumenta a tensão nos dedos, o que fez com que o sushi se despedaçasse, espalhando arroz para todos os lados.
     Pelo canto dos olhos, ela notou que alguém tinha dado um pulo logo atrás dela.
     - Gostoso! - disse Diana lambendo os lábios. Ela tinha pego o pedaço de peixe voador no ar. Quanto ao arroz, ainda estão estudando onde ele poderia ter ido parar. Mas a folha que mantinha o sushi coeso ainda estava entre os pauzinhos.
     Laura ficou vermelha de vergonha, sem saber onde iria enfiar a cara. Porque foi tão teimosa?
     - Viu? Quem se exibe acaba passando fome.
     - É... percebi...
     Mais afastada daquela cena, Rita ainda olhava para todos os lados procurando por sua presa, sem nem imaginar onde ela poderia ter ido. Mas que coisa! Onde eles estavam? Não podia ficar de fora, não podia ficar sem testemunhar o que eles iam fazer.
     Simplesmente não podia!
     Mas... onde eles tinham ido? Droga! Só Anne consegue achar as pessoas. Se ela ao menos tivesse uma maneira de rastrea-la...
     Hum... rastrear... é isso! Ela bate uma mão na outra e sai correndo para o meio dos convidados, procurando pela única pessoa que pode achar qualquer um. E conhecendo ela, com certeza já devia estar comendo alguma coisa.
     Apesar de não ser muito difícil de acha-la, considerando as roupas que usava, ela demorou para isso. Demorou muito! Diferente de Joynah e Allete, ela não tinha assim algo fácil de identificar não. Mas... ora... aquela ruiva era Allete. Era melhor perguntar para ela.
     Ela se aproximou e flagrou a mesma conversando com alguém. E não era outra senão a irmã daquele gato! A Laura.
     - ...entender estes costumes. Ora... as vezes eu apanho até para usar as palavras certas. De onde foi que arrumaram isso que algumas palavras só mulheres podem usar? – questionava Laura, bem irritada, alias.
     - Pergunte aos ancestrais – respondia Allete abraçada de um lindo gato – eles que começaram com isso.
     - Allete – disse Rita se aproximando – viu Anne por ai?
     - Não – respondeu ela – porque?
     - Porque ela e Tony sumiram, e eu.. bem, estou preocupada com ela.
     - Eu estaria mais preocupada com Tony – comentou Laura sorrindo – ou é uma pequena recaída de ciúmes?
     - Gracinha – ela abriu a boca e fez pouco caso do seu comentário – eu nem cheguei mesmo a namorar com ele.
     - Bom, ele deve estar por ai. Se procurar bem, deve achar.
     - Pois eu vou fazer isso mesmo!
     Decidida, Rita saiu de lá com o nariz empinado e batendo o pé. Dez segundos depois cruzou com Diana e logo falou com ela. Allete achou curioso aquilo, especialmente por Diana ficar balançando a cabeça, como se negasse um pedido da loira. Por fim, ela acabou concordando e saíram juntas em direção a um muro do jardim da casa. Diana parecia saber exatamente para onde estava indo. Logo depois, ela e Rita sumiram atrás do muro.
     Desinteressada, ela voltou sua atenção para o gato em que ainda estava abraçada, um grande cantor, bonitão, e bem gentil. Embora as vezes fosse um pouco sincero demais. Alguns minutos depois ouviu uma gritaria e voltou a observar o muro em que Diana e Rita tinham desaparecido ao ir atrás deste. Viu Diana sair correndo de lá com Anne logo atrás dela.
     Então.. então foi isso que Diana fez. Deve ter farejado a Anne e ido até onde estava, e, no mínimo, acabou atrapalhando a paquera dela. Coitada...
     Coitada da Diana, claro!
     No fim do dia, os convidados partiram. A aniversariante se divertiu muito, mas o que ela mais apreciou foi um anel de prata dado por Herochi. Um sinal de compromisso.
     Suas irmãs ficaram com uma inveja...


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