A Invasão da Terra escrita por Goldfield


Capítulo 1
Prólogo e Capítulo Primeiro




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A Invasão da Terra

Nem tudo acabou no final de “Colombo-2035”.


Prólogo

O ano é 2040. A Aliança Estelar vive um período de relativa paz com os terráqueos após a cruzada da Terra contra a sua própria destruição, que custou duas expedições estelares e muitas vidas. Porém, o grande herói da humanidade, Gerald Grey, conseguiu deter essa ameaça. O líder russo, responsável por todo esse pandemônio, o comunista Gorsk Koskorva, após um período de cinco anos e incontáveis julgamentos, agora espera sua sentença final. A humanidade vive um período de prosperidade. Grandes reservas de Stelix, o metal indestrutível, foram encontradas na América Central e o metal está sendo negociado por recursos como água e petróleo com os aliados da Terra: Zamuria e Megatópia, que travam uma guerra entre si e precisam investir em armamentos e, como o Stelix fornece uma blindagem praticamente indestrutível, e isso é o que os aliados em guerra cobiçam, os negócios vão bem. Mas uma coisa ficou no ar no final da jornada de Grey ao temido planeta Éden: se ele veio do futuro, não seriam dois Gerald’s, duas Bárbaras e dois Pedros?

As versões originais foram congeladas e as que participaram da expedição foram mantidas. Ninguém notou a diferença, pois eram todos iguais.

Porém, algo preocupa os terráqueos: o julgamento de Gorsk. Considerado o homem mais perigoso de toda a História, querem que ele seja executado, para evitar que aja novamente contra a humanidade, que já não é mais uma espécie em extinção. Será que isso vai acontecer?

Capítulo Primeiro

A sentença de Gorsk Koskorva.

Cidade de Nova York, Estados Unidos do Norte, julho de 2040.

Uma escolta de naves de transporte ganha a antiga Baía de Nova York, transformada agora num mar de prédios de três centenas de andares. Metade da cidade era construída sobre canais acima do mar, pois a cidade antiga havia sido engolida por este.

As vias de trânsito estavam engarrafadas. Os “Shipcars” ou carros-nave haviam surgido após a Terceira Grande Guerra e já haviam substituído todos os “Hovercars”, pois davam aos motoristas o limite de “dirigir” a até cinco mil pés do chão, e isso era um privilégio. Desde a Revolução Tecnológica, que aconteceu alguns anos antes da Terceira Guerra, a tecnologia deu tamanho salto que o que só seria possível em cento e vinte anos se tornou real apenas em vinte ou trinta. Havia veículos de todo o tipo: táxis, policiais, ônibus escolares, do corpo de bombeiros, militares...

Vinte destes últimos escoltavam as naves de transporte. Na maior delas, que se encontrava no centro do comboio, estava nada mais nada menos que Gorsk Koskorva, apelidado de “A Escória da Humanidade”.

Ele seguiria para o prédio das Nações Unidas, onde receberia sua sentença, após cinco anos de audiências. Ele era acusado de crimes de guerra (algumas coisas que havia feito durante a Terceira Guerra vieram à tona), e por crimes contra a humanidade, inclusive tentar aniquilá-la por completo.

A escolta ganhou a Quinta Avenida. Nela estava localizado o maior prédio do mundo, o Empire State Building of Victory, construído após a Terceira Guerra, no mesmo lugar do antecessor, que fora completamente destruído. Era uma obra colossal de quinhentos andares.

Logo, ganharam o prédio da ONU. As naves entraram por uma ampla garagem e pararam. Dezenas de guardas armados com canhões laser se aproximaram da nave que carregava Gorsk para transportar o prisioneiro.

Ele logo desceu, agora com uma escolta de guardas, que o conduziram pelos corredores do prédio até a sala de julgamento. Havia um representante de cada país do mundo presente para assistir à condenação e, se tivesse algum protesto, poder manifestá-lo.

Gorsk sentou-se no centro da tribuna, de frente para o chefe da ONU, o presidente americano John Terrance Walker, a uns cinco metros de distância. O prisioneiro tinha expressão fria e olhava fixamente para Walker. O mundo inteiro estava assistindo. O presidente começou a falar:

–         No dia sete de julho de 2035, há exatamente cinco anos, as forças da ONU invadiram Moscou e capturaram o líder da já extinta Rússia Socialista da Segunda Revolução Russa do ano de 2017, Gorsk Koskorva, antes que ele causasse uma catástrofe global lançando um míssil da classe Apocalipse contra a cidade de Nova York. O réu é acusado de crimes de guerra exterminando dois milhões de chineses na fronteira russa com gases tóxicos, o que, até pouco tempo, pensava-se que havia sido um acidente numa fábrica de armas químicas em Vladivostok e também de crimes contra a humanidade, cujo principal foi tentar aniquilá-la por completo. Por isso e por outras razões, eu condeno, com os poderes concedidos a mim pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, o réu Gorsk Koskorva à pena de morte no complexo penitenciário Ronald Reagan em Marte, daqui a três dias. Se alguém tiver algum protesto a fazer, o faça agora, pois não terá outra oportunidade.

Toda a assembléia ficou calada. Rapidamente, a mesma escolta de guardas que trouxera Gorsk o levou de volta à nave. O prisioneiro continuava com a mesma expressão que tinha quando chegou. Nem parecia que havia ouvido a sentença de morte. A nave, com a mesma escolta, saiu da órbita da Terra e seguiu na direção do planeta Marte...

Algum lugar no deserto do Saara, numa tarde de céu azul.

Havia um acampamento de alguns pesquisadores da Stelix Corporation (companhia que mais extraía Stelix no mundo) que tentavam cavar um poço para extrair o minério. De dentro de uma barraca, sai nada mais nada menos que Gerald Grey, o herói da segunda expedição a Éden, salvador da humanidade e pior inimigo de Gorsk Koskorva.

Ele bebia água de seu cantil e tinha o corpo todo revestido de óleo especial, como todos os outros ali, porque ficar fora de um local protegido por um escudo de ozônio, como uma cidade, era suicídio, pois a camada de ozônio praticamente não existia mais.

Nisso, o celular de Gerald tocou. Ele atendeu:

–         Alô!

–         Olá, Gerald.

–         Bárbara... Que desprazer!

–         Não dê uma de engraçadinho, Gerald. Você sabe o poder que tenho em mãos. Deveria estar louca quando me apaixonei por você...

–         Posso ao menos falar com meu filho?

–         Você sabe que o juiz não deu permissão... Não pode nem ver James...

–         Essa justiça da Aliança é insana! Onde já se viu dar a guarda de um filho a uma madrasta, quando o pai não fez nada de errado? Se esse caso fosse para um tribunal convencional seria tudo completamente diferente. Tive que ser julgado no tribunal especial devido à minha posição militar...

–         Já estou quase terminando o que resta para confirmar de vez o nosso divórcio. Minha tortura vai acabar, pois nunca mais verá seu filho!

–         Sabe, às vezes, tenho vontade de descongelar a sua versão de antes da expedição para tentar de novo. Seria tudo muito diferente...

–         Vai te catar!

Bárbara desligou o telefone na cara de Gerald, que exclamou um palavrão e o guardou no bolso.

O calor era insuportável. Um dos outros pesquisadores, subordinado a Gerald, que era chefe da expedição, o brasileiro Pedro Cintra (ele ainda era grande amigo de Gerald), disse:

–         O novo chefe de pesquisas está chegando, Gerald!

–         Que chegue... A Stelix nunca vai encontrar minério neste deserto... Nem quando burros voarem!

–         Com engenharia genética, isso não seria difícil! – riu Cintra.

Gerald riu de um modo de quem não achou graça. Pedro começou a cantarolar “Estávamos perdidos no deserto do Saara, o sol estava quente e queimou a nossa cara...”.

Havia uma grande perfuratriz abrindo um poço do meio do acampamento. Era controlada por outro pesquisador, Derek Wilson. Este havia acabado de sair do Exército americano e, perito em máquinas de perfuração e no lucrativo negócio do metal, estava trabalhando para a Stelix, que não podia parar de exportar o minério de mesmo nome aos aliados da Terra em guerra.

Gerald aproximou-se do buraco e balançou a cabeça. Nunca encontrariam nada. O Stelix só era encontrado na América Latina, principalmente na Guatemala e no Panamá. Era um metal líquido prateado que, aquecido, se tornava sólido e fornecia uma couraça praticamente indestrutível. Ele era tão precioso que havia provocado a Terceira Guerra Mundial.

–         Está procurando uma agulha num palheiro! – disse Gerald a Wilson.

–         A Stelix, ao invés de procurar o metal na América, vem para o último lugar em que o encontrariam!

–         É que os governos americanos são egoístas e colocaram tudo sob o controle do Estado. Mas a Stelix também poderia procurar em lugares mais óbvios... Quem diria que eu, herói da humanidade, acabaria trabalhando num lugar como este... Pelo menos ainda tenho meu memorial em Nova York...

–         O que é aquilo? – perguntou Wilson, apontando para o alto, interrompendo as reflexões de Gerald.

Uma nave se aproximava. Ela pousou ao lado do acampamento. Gerald já sabia que seria o novo chefe e se aproximou do ponto de pouso para dar as boas-vindas.

Primeiramente, desceram dois homens altos e fortes da nave. O primeiro era negro e o outro ruivo.

–         Qual de vocês é o novo chefe de pesquisas? – perguntou Gerald.

–         Ela vem aí!

–         Ela?

Uma mulher atraente, com um chapéu de vaqueira na cabeça, desceu da nave.

–         Você é a nova “chefa” de pesquisas? – perguntou Gerald, surpreso.

–         Sim. Meu nome é Eva Tucson. Mas pode me chamar só de Eva. Por que está tão surpreso? Não esperava uma mulher?

–         É que uma mulher tão atraente como você contrasta com este tipo de trabalho...

–         Eu posso muito, senhor Grey, muito mais do que aquilo que sua mulher fez em Éden, e, aquilo, não foi nada...

–         Ele está lhe incomodando? – perguntou o homem negro.

–         Não, querido Mutumbo, está tudo bem – respondeu Eva. – Ele não está me irritando...

–         Mesmo? – perguntou o ruivo.

–         Sim, Lott.

–         Então o negro se chama Mutumbo e o ruivo se chama Lott? – perguntou Gerald.

–         Sim – respondeu Eva, sorrindo. – Um veio da tribo mais temida de todo o continente africano e, o outro, veio da tribo de tocadores de foles mais temida da Escócia. São meus guarda-costas pessoais. Mas, bem, chega de papo e vamos ao trabalho que há muito para se fazer!

–         Onde está a ficha de transferência? – perguntou Gerald.

–         Está aqui, docinho – respondeu Eva, lhe entregando uma pasta cheia de papéis. – Verifique se está tudo OK!

–         Eu vou ter que encontrá-la sozinho no meio de tudo isto?

–         O que você queria, benzinho?

Gerald entrou na sua barraca levando a pasta, bastante irritado. Pedro o seguiu, dizendo:

–         Que mulherão...

–         Não vou deixar uma mulher, ainda mais uma tão impertinente, mandar em mim! – murmurou Gerald.

–         Ela estava dando mole para você. Ela te chamou de “docinho”.

–         Será?

Nisso, Wilson entrou na barraca, enquanto Gerald procurava a ficha de transferência na pasta. O herói estava, aparentemente, bem nervoso. Pedro ria.

Súbito, um pesquisador entrou correndo na barraca, dizendo:

–         Senhor Grey! Venha ver o que Tucson está fazendo!

–         O que aquela maluca pode estar tramando agora...

Eva havia subido em cima da perfuratriz e, de pé em cima da máquina, começou a discursar para os pesquisadores e técnicos que estavam ao redor:

–         A Stelix nos mandou para cá para explorar este minério, mas não há um pingo dele aqui! Aqueles gordões só querem saber de ficar sentados em suas cadeiras na sede da empresa em Nova York, fumando seus charutos e contando os dólares que ganham, não se preocupando em mandar pesquisadores que vendem seu conhecimento sobre Stelix para viver a um lugar tão desolador e quente como este onde só encontrarão o metal líquido daqui a uns vinte milhões de anos, quando cair um outro meteoro na Terra e matar todos nós como aconteceu com os dinossauros, deixando seus resíduos prateados, pois não foi assim que dizem que surgiu o Stelix debaixo da Terra? Ou será necessário que Gorsk Koskorva use mais uma bomba Apocalipse?

–         Bravo! – exclamou Gerald, o único que bateu palmas para o discurso de Eva. – Vejo que concordamos plenamente nesse ponto!

A vaqueira sorriu e, num pulo, desceu de cima da máquina. Ela se aproximou de Gerald e o convidou para um lanche em sua barraca. Pedro mandou que fosse por ele.

Ao entrarem, Eva lhe serviu um sanduíche natural. Aquilo surpreendeu Gerald, pois a população mundial só se alimentava de pílulas, após o colapso da agricultura. A vaqueira disse que tinha suas reservas e perguntou-lhe:

–         E então? A Terra depois do Apocalipse é muito desoladora?

–         Nem a vi direito, pois minha nave caiu direto na cratera da bomba e fui transportado direto para o Egito Antigo. Você deveria conhecer a história. Ela foi tão divulgada...

–         Não sou mulher de ficar trancada num apartamento numa megalópole assistindo TV. Eu gosto de aventura, emoção.

–         Minha ex-mulher era assim...

–         Sente saudades dela?

–         Apesar de Bárbara ter se transformado completamente após nosso casamento, tomando meu filho de mim, sinto um pouco...

–         Esqueça. Viva o presente e o futuro. Não pode viver do passado!

–         Gosto do seu jeito.

–         E eu do seu.

Os dois saíram da barraca.

–         O que faremos? – perguntou Eva. – Não encontraremos Stelix aqui!

–         Eu conheço um lugar que Pedro, uma vez, me disse que havia no Brasil, grande produtor de Stelix, mas, ao menor indício do fim dos recursos, a localidade foi completamente abandonada.

–         Onde fica?

–         Cinco quilômetros ao sul da linha do Equador, no meio do que restou da floresta amazônica, uma espécie de oásis. Poderíamos ir para lá, a fim de tentar encontrar Stelix.

–         Como faríamos isso, sem uma permissão da empresa?

–         E quem disse que a empresa precisa saber? Você mesmo não disse que gosta de aventura? Vamos tentar encontrar Stelix e, se conseguirmos tal feito, estaremos ricos! A empresa não nos humilhou nos colocando neste fim de mundo? Agora vamos coletar o metal só para nós!

–         Você está certo. Vamos conversar com Pedro!

Os dois, convictos, entraram na barraca onde Pedro estava e conversaram com ele sobre a idéia.

Complexo penitenciário Ronald Reagan, em Marte.

Uma nave pousou no centro do complexo, transportando seu mais novo e breve prisioneiro: Gorsk Koskorva. Cinco guardas armados com canhões laser o escoltaram prisão adentro. Primeiramente, o russo assinou um livro na entrada, registrando que iria para o corredor da morte. De lá, desceu dois elevadores e seguiu até o subsolo número dez dos cinqüenta e nove que o complexo tinha. Ali estavam presos criminosos dos três planetas membros da Aliança Estelar.

Ainda escoltado Gorsk ganhou um corredor cheio de celas. Os poucos prisioneiros que estavam no corredor da morte começaram a vaiá-lo, gritando coisas como “Destruidor da Humanidade” ou “Carrasco dos Humanos”.

Ele foi jogado violentamente em sua cela, onde já havia um prisioneiro, e trancado.

–         Olá, Gorsk Koskorva – saudou o companheiro de cela do russo, um zamuriano. – Parece que finalmente vai começar a cumprir sua sentença...

–         Olá, meu caro amigo verde – respondeu, referindo-se à cor do extraterrestre. – Por que foi condenado à morte e como se chama?

–         Rebelião contra o Imperador Zamuriano – explicou a criatura. – E me chamo Otto.

–         Otto? Não sabia que colocavam esses nomes terráqueos em Zamuria... O que fez?

–         Formei um exército e invadi a capital. Porém, as forças do Imperador nos massacraram. Claro que tive ajuda de alguns megatopianos, liderados por um general chamado Ernest Harper e isso provocou a guerra entre os dois planetas: total desconfiança.

–         Então você é o responsável pela guerra entre Zamuria e Megatópia? Vejo que não sou o único aqui que cometeu algo muito grave...

–         Você é um louco! Onde já se viu, usar uma bomba com a capacidade de devastar todo um planeta?

–         Mas agora, vou ter o que mais temia: a morte!

–         Fazer o quê? Mas, um dia, nossos sucessores ou seguidores farão a mesma coisa que fizemos e, com certeza, terão pleno sucesso!

–         Espero que você esteja certo... Fale-me mais sobre esse tal Ernest Harper.

–         Era um general do Exército da República de Dutch, a maior potência dos cinco territórios de Megatópia. Ele, com cerca de quinhentos mil soldados subordinados a ele e cerca de mil e duzentas máquinas de guerra, ajudou minha força de mercenários a atacar a capital de Zamuria, sem o consentimento da República. Após seus superiores e o Imperador terem descoberto o fato, os primeiros o afastaram do cargo e o segundo não acreditou que Dutch não tinha envolvimento com o incidente, e declarou guerra. A Monarquia Rick veio em socorro de Dutch, e logo toda Megatópia lutava contra Zamuria. Mesmo fora do Exército, Harper ainda tem suas forças quase intactas, pois teve poucas baixas durante a invasão em meu planeta, e representam uma poderosa e eficiente força mercenária.

–         Interessante. E suas forças?

–         Estão presas em Zamuria, mas são cerca de quinhentos mil soldados e mil máquinas de guerra!

–         Muito interessante... Eu também tenho minhas forças...

–         Quais?

–         Cerca de cinco mil homens que estão escondidos em algum lugar do mundo e cerca de cinqüenta máquinas de guerra. É pouco, pois é tudo o que me restou.

–         No que está pensando?

–         E se uníssemos nossas forças? Seriam um milhão e cinco mil homens e duas mil e duzentas e cinqüenta máquinas de guerra!

–         Como? Não poderíamos conversar com Harper sem estar fora daqui, e, além disso, qual seria o motivo?

–         Vou lhe contar tudo mais detalhadamente...

Gorsk contou todos os seus planos a Otto, que ouviu tudo detalhadamente e se interessou bastante...

                                                                                     

Nesse mesmo momento, na Terra, Gerald, Eva, Pedro, Wilson e um piloto andróide estavam na nave em que Tucson havia vindo a caminho de Stelix City. Esse era o nome da cidade abandonada que ficava numa não muito extensa área coberta por vegetação equatorial em meio ao grande deserto em que se havia transformado a Amazônia. Os outros pesquisadores e os dois guarda-costas de Eva não quiseram ir e ficaram no Saara, o que deixou a vaqueira um pouco desapontada e surpresa...

A área da cidade não havia sido devastada por ser uma propriedade da Stelix. Mesmo com o abandono da exploração do metal, a empresa ainda controlava a região, que havia sido abandonada devido ao início do fim dos recursos, mas os bravos tripulantes da nave ainda tinham esperança de extrair o metal líquido.

Eles cruzavam o poluído oceano Atlântico com cautela, pois não queriam encontrar nenhuma outra nave da Stelix no caminho. Eles não tinham autorização da empresa para se dirigirem a Stelix City.

Gerald, que estava sentado ao lado de Eva na nave, percebeu que ela tinha uma feia cicatriz no braço direito, na perspectiva dele. Ele perguntou:

–         Como conseguiu essa cicatriz?

–         Servi na Terceira Guerra – respondeu Eva, tentando esconder a cicatriz com a camiseta que usava. – Lutei na batalha da Guatemala.

–         Na batalha da Guatemala? A mais dramática da Terceira Guerra, comparada até à Normandia?

–         Sim.

–         Sinto pena de você...

–         Todo o meu batalhão morreu, menos um soldado e grande amigo chamado Peter Janissary. Na época ainda era uma garota, pois só tinha dezessete anos.

–         Não sabia que o Exército americano recrutava soldados menores de dezoito...

–         É o lado negro da América!

–         Estamos ganhando o território do Brasil – informou o piloto. – É melhor pararmos no Rio de Janeiro para reabastecer!

–         Faça isso – disse Eva. – Quero parar para descansar um pouco mesmo...

A nave cruzou o escudo de ozônio que envolvia a Cidade Maravilhosa, a sexta maior do mundo e capital do Brasil. O piloto manobrou para dentro da Avenida Copacabana, que estava engarrafada de Shipcars. Lá embaixo, aos pés dos prédios, se via a água poluída do mar ser coletada por tubos para ser despoluída e perder seu sal, depois sendo distribuída para os cinqüenta milhões de habitantes.

A população mundial havia triplicado em relação ao início do século XXI: de seis bilhões passou para dezoito bilhões. A principal causa foi a Revolução Tecnológica, que, além de trazer tecnologia só disponível em um século de pesquisas, trouxe uma população que também levaria cem anos para atingir aquele número. A sociedade era dividida em Urbanizados e Eremitas. Os Urbanizados viviam nas megalópoles, cujo crescimento, na maioria das vezes, havia engolido outras cidades, como Nova York, a maior cidade do mundo, que englobava o território de Boston até Washington. Os Urbanizados formavam as três classes urbanas.

Já os Eremitas eram os que não viviam nas megalópoles. A maioria vivia em áreas protegidas com pequenos escudos de ozônio, como bases militares ou de pesquisas. Mas a grande massa Eremita era de agricultores falidos com o colapso da agricultura, que tornou quase todas as terras do planeta improdutivas. Era quase um milagre encontrar terra boa para se plantar, mas isso acontecia ainda que raramente. Porém, nesses casos, Urbanizados ricos investiam na terra. Primeiro, eles colocavam um escudo de ozônio em volta das terras e empregavam maquinário. E assim, cada vez chegavam mais e mais pessoas. Logo, uma nova megalópole se erguia na região e o Eremita, coitado, vagava pelo mundo desnorteado... Os Eremitas formavam a classe dos sem-terra, dos sem-teto, dos recentes sem-megalópole...

A nave ganhou outra avenida, menos congestionada que a Copacabana. Logo que viram um posto de gasolina com estacionamento no topo de um prédio, entraram pela garagem do local e pararam em frente ao ponto de reabastecimento.

Uma voz robótica disse:

–         Bem-vindo ao autoposto Gasoduto. O que deseja fazer?

–         Reabastecer a nave – respondeu o piloto andróide. – Vocês fazem um bom serviço?

–         Certamente que sim. Deseja reabastecer com gasolina nitrida, gasolina carbonizada, óleo nitrogenado ou com extrato comburente de Stelix?

–         Óleo nitrogenado, por favor, senhor atendente.

Dois robôs começaram a reabastecer a nave.

Depois de pronto o serviço, a voz robótica perguntou:

–         Como deseja pagar?

–         Com dólares. Essa é a moeda oficial do Brasil, não? Sou um andróide-piloto um tanto desatualizado...

–         Sim, senhor. É a moeda oficial do mundo inteiro, a não ser da União Européia...

–         Eu não preciso de uma aula de economia... Aqui está! – disse o piloto, entregando algumas notas de dólar a um robô.

–         Muito obrigado. Volte sempre! – terminou a voz robótica.

–         Estão colocando muita inteligência nesses robôs... – murmurou o piloto. – Nós, andróides, temos mais inteligência que eles, mas só falamos o que é necessário!

–         Eu não entendo... – murmurou Wilson. – Qual é a diferença entre robôs e andróides?

–         Andróides foram feitos para parecerem humanos na aparência física – respondeu Gerald. – Os robôs não.

A onda cibernética havia pegado pouco depois do ano de 2035. Já existiam robôs, mas os andróides surgiram nessa época. Eram muitos, mas a maioria era empregada com fins militares, principalmente na espionagem.

A nave saiu do local e seguiu por uma avenida. Depois de cruzar a área do centro, o piloto perguntou:

–         Querem mais alguma coisa? Vamos sair da cidade!

–         É difícil dormir neste banco duro da nave, mas não será necessário ficarmos num hotel... – murmurou Eva.

–         Pode encostar a cabeça em meu ombro ou em minha perna... – disse Gerald.

–         Eu vou adorar sonhar junto a você...

O piloto seguiu por uma via exclusiva para naves na direção da saída da cidade no sentido oeste. Eva deitou-se, com a cabeça no colo de Gerald, e adormeceu. O herói da humanidade ficou acariciando seu rosto.

–         Estão a fim de um som? – perguntou o piloto. – Nós andróides também temos gosto musical!

–         Não coloque muito alto, pois Eva está dormindo – pediu Gerald. – Não iria querer acordá-la, iria?

–         OK! – respondeu o piloto, ligando o rádio da nave, que começou a tocar um rock pacifista, tipo de música que era moda. Parecia que haviam voltado aos anos 70, durante a Guerra do Vietnã.

A nave seguiu território brasileiro adentro. Pedro perguntou a Gerald:

–         Sente saudades do seu filho?

–         Claro. É a pessoa que mais amo neste mundo.

–         Relaxe – disse o ex-militar brasileiro, colocando a mão no ombro do amigo. – Você vai conseguir a guarda dele, e, depois disso, tenho uma ótima sugestão para uma nova esposa...

–         Quem?

Pedro apontou com os olhos para Eva, que dormia graciosamente. Gerald sorriu. De fato, ele estava gostando da aventureira vaqueira...

A nave cruzava o antigo território de Minas Gerais. Não havia quase mais nenhuma cidade ali. Existiam três megalópoles no Brasil: Rio de Janeiro, Corumbá e Palmas. Estas duas últimas haviam crescido com o Stelix.

A nave tremeu. Era uma turbulência comum. Porém, logo depois, ela tremeu novamente, mas agora de forma mais violenta. Logo perceberam que era um problema na nave. O piloto gritou:

–         Droga! É o óleo nitrogenado! Está adulterado! Não devíamos ter reabastecido naquele postinho...

–         E agora? – perguntou Gerald.

–         Vamos ter que pousar em algum lugar, retirar toda essa droga do motor e reabastecer com bom combustível!

–         Mas para onde poderemos ir?

Uma voz robótica começou a dizer “Cuidado, problema no motor” sem parar. Pedro perguntou:

–         Acha que conseguiremos chegar até o antigo Distrito Federal sem esta nave explodir?

–         Acho que sim! – respondeu o piloto, tentando evitar a queda da nave.

–         Entre no computador da nave e acesse o arquivo de centros de exploração da Stelix. Programe a rota para Brasília, a antiga capital deste país. Essa localização vai estar no arquivo!

–         Vou tentar!

Com muito custo, o piloto conseguiu re-programar a rota. Tudo ainda tremia, mas Eva continuava a dormir. Gerald ria da situação. A nave tremeu ainda mais. Após um instante, ela parou de se mexer, ouviu-se um estrondo e tudo tremeu novamente.

–         Pousamos! – informou o piloto. – Não foi uma aterrissagem perfeita, mas o importante é que poderemos decolar novamente!

–         Vamos sair! – disse Pedro.

O ex-militar abriu a porta da nave. O leve ruído que ela provocou ao abrir-se fez Eva acordar. Gerald começou a rir sem ter controle. A vaqueira perguntou a Pedro:

–         O que houve? Por que Gerald ri tanto?

–         Você tem um sono um tanto pesado, Eva! – respondeu Pedro. – Passamos por uma tremenda turbulência e pousamos com problemas no motor da nave, mas você continuou dormindo sem nem se mexer!

Eva deu uma risadinha. Wilson, que até agora estava na cabine do piloto, foi o primeiro a sair da nave. Ele gritou, do lado de fora:

–         Meu Deus! Onde fomos parar?

–         Já vi este filme... – murmurou Gerald, preocupado.

–         Estamos no meio da selva! – gritou Wilson.

–         Que alívio... – murmurou Gerald, respirando fundo.

Os demais desceram da nave, menos o piloto, que, por ordens de Eva, permaneceu onde estava. Não era necessário que passassem óleo protetor, pois a selva era tão espessa que os raios solares não chegavam até ali.

–         Você está maluco? – perguntou Wilson a Pedro. – Onde vamos encontrar ajuda no meio desta selva?

–         Conheço um homem que pode nos ajudar – respondeu Pedro. – Ele provavelmente tem óleo nitrogenado.

–         E onde ele está? Posso saber?

–         Ali! – disse o ex-militar, apontando para uma espécie de igreja, onde a selva penetrava.

–         O que é isso? – perguntou Eva.

–         A antiga Catedral de Brasília – respondeu Pedro. – Obra de um brilhante arquiteto que projetou quase toda a cidade, mas a selva a engoliu toda, como fez com a catedral. O homem a quem me referia está aí dentro.

Pedro entrou catedral adentro, seguido pelos outros aventureiros, que caminhavam devagar. De fato, a selva havia tomado conta da construção: trepadeiras e plantas de proporções gigantes existiam em qualquer lugar que pisassem. Aquela região tinha vegetação de cerrado, mas depois de um projeto para transformar a região numa nova floresta Amazônica com o uso de superadubos, que falhou devido ao crescimento de apenas uma variedade de planta, ou seja, trepadeiras, toda a região havia se tornado aquela selva sem fim.

Pedro gritou “Maníaco” três vezes, sem resposta. Quando já ia gritar pela quarta vez, um homem vestido com roupa militar camuflada e com a mão esquerda de metal, mecânica, apareceu entre as plantas.

–         Olá, meu caro amigo! – saudou o “Maníaco”. – Há quanto tempo não nos vemos?

–         Acho que já faz sete anos.

–         É com certeza muito tempo...

–         Peter! É você? – perguntou Eva.

–         Eva! O que você faz aqui?

Os dois se abraçaram. A vaqueira respondeu com outra pergunta:

–         Eu é que pergunto! O que você faz aqui?

–         Desde o fim da guerra eu procuro por um lugar afastado da civilização, tranqüilo, longe do orgulho e da inveja dos homens, e aqui estou: não preciso de escudo de ozônio, pois as trepadeiras fazem o trabalho de um deles, me alimento destas plantas e sempre estou sadio, pois elas têm capacidade medicinal e bebo água de um rio que passa aqui perto!

–         Por que esse apelido?

–         É que Pedro não consegue se imaginar morando num lugar como este e acha que eu sou louco, mas nunca estive tão determinado em querer me afastar dos humanos e você sabe que sou totalmente certo das idéias!

–         Você está certo... – disse Eva, ainda o abraçando.

–         Você ainda tem aqueles tanques com óleo nitrogenado? – perguntou Pedro. – Temos um problema com óleo adulterado!

–         Claro. Para onde estão indo?

–         Stelix City.

–         Sigam-me.

Eles seguiram Peter até a raiz de uma grande trepadeira, onde havia tanques com óleo nitrogenado. Todos ajudaram a transportá-los até a nave.

Porém, ao chegarem à nave, os aventureiros presenciaram uma terrível cena: dois enormes macacos dilaceravam o corpo do piloto andróide, do lado de fora do veículo espacial.

Peter sacou uma pistola laser e atirou, matando um dos assustadores primatas. O outro fugiu desesperado para dentro da selva.

–         Eu pensei que esses macacos sanguinários haviam ido embora... – murmurou Peter. – Ainda bem que pegaram o andróide e não algum de vocês!

–         De onde vieram aquelas coisas? – perguntou Pedro, averiguando o corpo do piloto cibernético, que estava em estado lastimável, pois, sendo um andróide, tinha pele e sangue artificial e isso causava uma péssima impressão.

–         É uma espécie de macaco que só aparece nesta região. Não me perguntem como eles surgiram.

–         Coitado do meu andróide-piloto... – murmurou Eva. – A Stelix o havia me dado de presente...

–         Vocês são loucos? – perguntou Peter. – Andróides não são bons para pilotar naves. Deve ter sido por isso que tiveram problemas!

Pedro e Gerald, com uma bomba que estava guardada na nave, retiraram todo o óleo nitrogenado adulterado do motor e encheram o tanque com o óleo dado por Peter.

Pedro, após averiguar se não havia mais nenhum problema com a nave, disse:

–         Estamos prontos para partir.

–         Vocês já vão? – perguntou Peter. – Isso é o que eu chamo de visita-relâmpago!

–         Não vamos ainda! – pediu Eva. – É cedo!

–         Nós não podemos ficar num mesmo lugar por muito tempo ou a Stelix descobrirá nosso plano para enriquecermos – disse Pedro. – Se quiser vir conosco, Peter, você será de boa ajuda!

–         Sim, Peter – disse Eva, com seus olhos brilhando. – Venha conosco. Você será útil!

–         Não sei... – oscilou o Eremita, sem ter certeza.

–         Venha conosco! – disse Gerald. – Se encontrarmos Stelix, dividiremos tudo meio a meio e você poderá comprar uma casa num lugar muito mais isolado do que este, como numa das luas de Júpiter, por exemplo.

–         Está bem – disse Peter. – Eu vou com vocês.

Antes de partirem, Peter lubrificou sua mão mecânica com um pouco de óleo. Gerald estava morrendo de ciúmes, mas não queria demonstrar tal coisa.

E a nave partiu sem problemas, na direção de Stelix City, a cidade-fantasma que ficava no meio do que havia restado da floresta amazônica...

Continua... 


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