Clannad - Kyou After: Facing the fear escrita por ghost of Sparta


Capítulo 2
A garota em meus sonhos




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Eu posso ver o pôr-do-sol pela janela. A sala onde estou se encontra tomada por uma coloração laranja, certamente criada pela ação do sol. Eu não conheço este lugar. Não me lembro de ter vindo aqui antes. Olha ao meu redor e vejo apenas móveis e objetos comuns. Parece uma casa normal. Próximo a janela há um piano negro.

Tomoya: Onde eu... ?

Alguém aproxima seu rosto de mim vindo de lugar algum. É uma bela mulher de cabelos curtos na cor castanho-claro. Seus olhos são tão intensos. Eles possuem uma coloração única, um azul meia-noite que estava refletindo a luz que vinha da janela. Parecia que eu estava olhando para o espaço, procurando por estrelas. Tamanha é minha perplexidade com a beleza da mulher, que demoro a notar que ela está falando comigo.

- ... você gostaria de ouvir... ?

Eu estou sem palavras, mas a mulher parece compreender isso como um “sim”. Ela se aproxima do piano num movimento suave, quase como se estivesse dançando. Seus dedos finos pairam sobre o conjunto de teclas pretas e brancas antes que ela tome assento. Uma doce melodia ressoa conforme ela começa a tocar. Uma bela canção. A mulher está de olhos fechados, concentrada. Suas mãos dançam pelas teclas enquanto ela sorri para si mesma. Isso é algo que eu nunca ouvi antes. É tão belo. Será que ela escreveu essa música? Será que ela trabalha com música? Eu a conheço?

- Tomoya...

Eu não consigo parar de admirar essa melodia. Ela, por algum motivo, me proporciona um sentimento nostálgico.

- Tomoya...

Me sinto muito feliz de estar aqui. Entretanto, não consigo parar de me perguntar: por que eu? Por que ela permitiu que eu testemunhasse tamanho talento artístico? Por que ser tão gentil com uma pessoa sem nenhuma importância?

- TOMOYA!

Eu ouço um estalo e sinto uma dor lacinante percorrer minhas costas. Abro meus olhos abruptamente. Assim que consigo focar minha visão, dou uma boa olhada ao redor. Vejo meu quarto.

“Então era um sonho...”

Olha para a janela e vejo o brilho da manhã invadir meu quarto. Não me lembro de ter deixado a cortina aberta. Tem algo apoiado em minhas costas. Uso minhas mãos para tatear o melhor que posso. Elas passam por algo suave, mas são repentinamente afastadas. Vejo uma mecha de cabelo violeta cair em meu campo de visão e sinto uma respiração pesada alcançar minha orelha.

Kyou: OHAYO!

Suspiro pesadamente. Kyou estava sentada sobre mim. Ela tinha vindo me acordar, como se acostumara a fazer nas ultimas semanas. Ser namorado de uma representante de classe significa que dificilmente você vai conseguir chegar atrasado na escola ou matar aulas. Ser namorado de Kyou Fujibayashi significa que você corre risco de vida se fizer isso.

Tomoya: De novo, Kyou?
Kyou: Hehehe.
Tomoya: Você vai acabar quebrando minha coluna qualquer dia desses...
Kyou: Ah. Pára de reclamar. Você tem que se considerar sortudo por ter uma garota tão bonita te acordando quase todos os dias.
Tomoya (olho para os lados, fingindo estar procurando alguém): Sério? E onde ela está?
Kyou (a voz ameaçadora): Sabe... é esse tipo de comportamento que faz as pessoas morrerem tão jovens...

Kyou coloca suas duas mãos em meu pescoço, fazendo uma leve pressão. Esse ataque foi apenas um aviso, mas tenho certeza que o próximo será para valer. Assim que sinto meu pescoço livre, suspiro aliviado.

Tomoya: Bem... será que posso ver o rosto da minha querida namorada e dar um bom dia de maneira apropriada?
Kyou: Claro que pode.

Aguardo alguns instantes, mas Kyou não se move. Resolvo, então, me virar embaixo das cobertas. Com um pouco de esforço, consigo girar meu corpo, ficando de barriga para cima. Kyou ainda estava sentada em cima de mim, me presenteando com seu bonito sorriso. Ergo minha mão e acaricio gentilmente o rosto de Kyou. Ela, por sua vez, começa a passar mão no meu bagunçado cabelo.

Tomoya: Ohayo, minha querida namorada.
Kyou: Ohayo, meu querido namorado.
Tomoya: Por que você está tão sorridente?
Kyou: É que eu estava me divertindo... você faz umas caretas engraçadas enquanto dorme...
Tomoya: Eu gostaria de ter a privacidade do meu sono de volta, por favor.

Kyou se deita sobre meu corpo e me dá um rápido beijo.

Tomoya: Essa sim é uma boa forma de começar o dia.

Kyou sorri. Ela parecia realmente relaxada e não párava de ficar alisando meu cabelo.

Kyou: Sabe, Tomoya...
Tomoya: O que foi?
Kyou: Meus dias ficaram muito melhores desde que eu comecei a namorar com você. Acho que nunca estive tão feliz.
Tomoya: Que bom.
Kyou: Você também parecia feliz. Estava até sorrindo enquanto estava dormindo. Devia estar tendo um sonho muito bom.
Tomoya: É... é m-mesmo?

Forço um sorriso amigável o melhor que posso.

"Não deve ser uma boa idéia contar que estava sonhando com uma outra mulher, mesmo que eu não faço idéia de quem seja. Kyou certamente ficaria com ciúmes e eu acabaria morto..."

Kyou (um sorriso maldoso no rosto): Você não estava sonhando com nenhuma outra garota, não é?

"Droga! Ela está lendo minha mente? Será que isso faz parte do sexto sentido feminino?"

Faço uma cara de indignação.

Tomoya: Mas é claro que não! Só tem vaga para uma garota nos meus sonhos e ela tem olhos e cabelos violeta...
Kyou (contando nos dedos): ... um corpo muito bonito, um sorriso único e habilidades culinárias sem igual!
Tomoya: Você esqueceu a parte da modéstia.
Kyou (sorrindo): Ah. É mesmo. Devo ter um pouco disso também.

Kyou me dá um beijo e salta da cama. Ela joga minhas cobertas no chão e começa a puxar meu braço.

Kyou: Vamos lá, preguiçoso. Já está na hora de irmos.
Tomoya: Eu vou ficar aqui mais um pouquinho enquanto espero você preparar o café-da-manhã.

Kyou coloca as mãos na cintura.

Kyou: Deixa de ser folgado. Não tem café-da-manhã hoje. Acordei um pouco tarde e acabei chegando aqui em cima da hora.

Viro a cabeça e olho para o relógio na parede. Deixo escapar um leve bocejo.

Tomoya: Já é bem tarde. Nunca chegaremos a tempo de qualquer jeito.
Kyou: Mas é claro que chegaremos. Eu tenho minha arma secreta.

Kyou me puxa com força e me joga no chão. Em seguida, ela pega meu uniforme escolar e o joga sobre mim.

Kyou: Você tem um minuto para lavar o rosto e se trocar. Depois desse tempo vou te arrastar para fora de casa do jeito que você estiver.

Kyou pega minha pasta e deixa o quarto, batendo a porta as suas costas.

"Do jeito que ela é, se eu não for rápido vou acabar andando por aí de cueca."

Suspiro pesadamente e reúno forças para começar o dia. Lavo meu rosto, escovo meus dentes e troco rapidamente de roupa. Quando estou terminando de ajeitar a gravata, o furacão Kyou invade meu quarto.

Kyou: Tempo esgotado. Vamos, vamos.

Kyou começa a me arrastar para fora do quarto.

Tomoya: Espera. Ainda estou ajeitando minha gravata.
Kyou: Hmmmm.

Kyou puxa minha gravata com força, me fazendo ficar sufocado.

Kyou: Prontinho. Vamos indo.

Afrouxo a gravata enquanto caminhamos. Ao passar pela sala, noto uma mesinha limpa e um saco de lixo abarrotado na entrada da cozinha. Não vejo meu pai em lugar nenhum.

"Tenho certeza que o velho estava apagado aqui ontem a noite. E a mesinha estava imunda, cheia de porcarias."

Kyou: Eu acordei seu pai e o coloquei para o quarto. Também fiz uma limpeza rápida na sala. Deixei o lixo na cozinha.

"Definitivamente ela está lendo minha mente."

Tomoya: Hmmm. Obrigado.

Kyou olha para mim com uma expressão de pena. Ela abre a boca, provavelmente pensando em comentar algo sobre meu pai, mas desiste no caminho. Fico grato por isso. Esse não é um assunto que eu me sinto a vontade de conversar. A própria Kyou não sabe exatamente o que acontece entre meu pai e eu, mas prometi que iria explicar tudo a ela um dia. Um dia, não hoje.

Paro um instante diante da porta entreaberta do quarto de meu pai. Ele estava jogado de qualquer jeito sobre a cama, ainda usando as roupas de ontem. Podia sentir o cheiro da bebida de longe. Por que eu tinha que ter um pai tão inútil, tão imprestável? Por que eu tinha que ter um pai que nem me trata como filho? Cerro os punhos, sentindo uma grande frustração, uma onda de raiva em meu peito. Talvez por perceber a raiva em meu olhar, Kyou volta a me puxar com urgência.

Kyou: Vamos, vamos.

Chego a porta e me sento para calçar meus sapatos. Kyou deixa a casa na frente. Assim que estou pronto, saio da casa e tranco a porta.

Tomoya: Ei, Kyou. Mesmo que a gente corra nunca chegaremos a tempo. Que tal pararmos numa padaria e...

Minha boca despenca, quase atingindo a calçada. Kyou estava na frente da minha casa, encostada em sua scooter branca e sorrindo.

Kyou: Eu disse que tinha uma arma secreta, não é?

Kyou passa a mão em sua moto, seu semblante mostrando muito orgulho.

Kyou (sorrindo): Vou te dar uma carona.
Tomoya: Huh?

Olho de Kyou para a scooter e vice-versa. Dou as costas para ambas e começo a andar.

Tomoya (aceno com a mão direita): Te vejo na escola.
Kyou: Ei!

Sinto os pêlos na minha nuca se arrepiarem. Tomado por uma sensação de perigo, meu corpo age involuntariamente e dou dois passos para o lado. Uma forte ventania faz meu cabelo balançar. Olha para o lado e vejo um capacete acertar um poste e atingir o chão com força, provocando uma rachadura. Um cão vira-lata que estava dormindo ao lado do poste leva um tremendo susto e corre em disparada. Me pergunto se eu devia fazer o mesmo.

Kyou: Não dê as costas para sua namorada!
Tomoya: Tá querendo me matar, é?
Kyou: Não faça drama. O máximo que ia acontecer era você ficar em coma. Nada de tão grave.

"No meu mundo ficar em coma é uma coisa grave!"

Recolho o capacete e o entrego a Kyou.

Kyou: Por que você está fugindo de mim?
Tomoya: Não estou fugindo de você. Estou fugindo da combinação moto + Kyou.

Kyou suspira, irritada. Parecia até um pouco ofendida.

Kyou (cruzando os braços): Você está agindo como se eu fosse uma péssima motorista...
Tomoya: Kyou...
Kyou: Sim?
Tomoya: Você é uma péssima motorista.
Kyou: Ah. Isso é um exagero. Eu posso ter cometido alguns pequenos erros, mas nunca provoquei nenhum acidente.
Tomoya: E todas as vezes que você me atropelou?
Kyou: Eu não tenho culpa se você fica andando onde não devia.
Tomoya (ergo uma de minhas sobrancelhas): Até onde eu sei a calçada é caminho para os pedestres e não para motos.
Kyou: Pode até ser, mas você devia sair do caminho quando eu buzino. A culpa é inteiramente sua.

Balanço a cabeça em desaprovação. Kyou puxa meu braço e me arrasta para perto da scooter.

Kyou: Eu não sei por que tanta preocupação. Dessa vez você vai estar seguro, pois vai estar de carona comigo.
Tomoya: Me sinto muito melhor com isso. Fui promovido de vitima para cumplice de assassinato.
Kyou: Você está começando a me irritar. Vamos logo.
Tomoya: Tá bom, tá bom.

Kyou se senta na moto e coloca seu capacete. Lentamente me sento atrás dela, ainda me sentindo inseguro em pegar essa carona.

Tomoya: Vamos então. Mas, por favor, vê se não corre muit...

Tarde demais. Kyou já havia arrancado com toda a potência de sua scooter. Sentindo meu equilibro ser perdido, me seguro com todas as forças em Kyou e consigo me manter na moto. Só consigo abrir meus olhos instantes depois, quando confirmo minha estabilidade sobre a moto. Minha vida estava salva. Por enquanto.

Tomoya: Ei! Você podia ao menos me avisar que ia disparar dessa forma. Eu podia ter caído e batido a cabeça!
Kyou: Não se preocupe. Foi só um pequeno susto. E você conseguiu se segurar bem... bem até demais...
Tomoya: Hã?

Então eu percebo que estava agarrado a Kyou e que minhas mãos estavam segurando os seios dela.

Tomoya: Opa!

Me solto de minha namorada e passo a me segurar na moto.

Tomoya: Desculpa! Foi sem querer! Juro que foi sem querer!
Kyou: Hmmmm.

Fico aliviado por Kyou não poder ver meu rosto agora. Tenho certeza que estou mais vermelho que tomate. Fiquei bastante constrangido, entretanto foi uma sensação bem interessante. É claro que eu já havia imaginado como seria tocar alguns lugares proibidos no corpo de minha namorada. Sou um homem afinal. Só não imaginava que ia acontecer desse jeito...

Kyou não fala nada durante o percurso. Fico imaginando o quanto ela está irritada comigo. Poucos minutos depois, acredite se quiser, chegamos ao nosso destino sem atropelar ninguém. Não estou falando da escola, é claro. Nosso regulamento não permite que alunos compareçam as aulas usando veículos motorizados. Kyou certamente ganharia uma suspensão se descobrissem. Nós paramos num estacionamento particular localizado duas quadras atrás da escola. Aquela era uma rota muito pouco usada por alunos, o que fazia essas viagens proibidas da Kyou um pouco mais seguras. Espero que o segredo dela continue bem guardado.

Kyou: Bem... chegamos!

Kyou desce da moto. Eu desço em seguida. Ela guarda seu capacete e recolhe sua pasta. Num ato involuntário, meus olhos acabam encontrando os seios dela. Logo desvio o olhar, temendo ser notado. Uma caixa de correio próxima se torna a coisa mais interessante do mundo.

"Foi uma sensação muito boa, apesar de eu não ter aproveitado muito. Mas será que ela ficou com raiva de mim? Ela sabe que foi sem querer, não é? Será que ela considerou um desrespeito? Droga. Por que eu tinha que pensar logo numa palavra que contém 'peito'? Acho melhor puxar algum assunto para que esse meu silêncio não pareça suspeito. Droga. De novo."

Kyou fica parada diante de mim, me encarando.

Kyou: E então? O que achou?
Tomoya (olho para minhas mãos enquanto falo): Bem... eles são bem macios, parecem bem delicados. Tocando eles tive a impressão de serem um pouco menores do que quando olho para eles e...
Kyou (me lançando um olhar gélido): Estou falando da carona.

"Ops."

Tomoya (sorrio, sem graça) : Ah. É claro que está. Eu também estou.

Kyou cruza seus braços, cobrindo seu peito.

Kyou (balançando a cabeça negativamente): Definitivamente um pervertido.

O primeiro sinal da escola soa, alertando os alunos que eles devem se dirigir as suas salas de aula.

Kyou: Temos que ir!
Tomoya: O-ok...

Kyou pega minha mão e me arrasta por todo o caminho até a escola. Chego até o corredor da minha sala de aula em tempo recorde. Nós dois colocamos as mãos nos joelhos e procuramos controlar a respiração, que estava agitada devido a correria.

Tomoya: Bem... chegamos.
Kyou: É... chegamos...
Tomoya: Nos vemos na hora do lanche então?
Kyou: Hmmm.

Kyou murmura algo e segue andando para sua sala de aula, que ficava no fim daquele corredor.

Tomoya: Acho que isso confirma que ela está chateada...

Sem ter o que fazer, entro na sala e me dirijo ao meu lugar de costume. Sunohara ainda não havia chegado, é claro. Apenas eu passo pela tortura de acordar cedo. Coloca minha pasta sobre a mesa e me jogo de qualquer jeito sobre a cadeira. O professor entra na sala de aula e cumprimenta os alunos com um tremendo entusiasmo. Aquilo me motiva a prestar atenção nas lições... por dez minutos. Logo me vejo admirando o céu e a paisagem que cerca a escola e ignorando completamente qualquer coisa que acontecia na sala de aula. Sou tão grato por meu lugar ser ao lado da janela. Pelo menos o tédio não vai ser completo.

Sunohara: Okazaki! Okazaki!

Abro meus olhos, sem ao menos ter a lembrança de tê-los fechado, e me deparo com o sorriso de um rapaz de cabelos tingidos de loiro. Bocejo profundamente antes de erguer minha cabeça.

Tomoya: Sunohara? Você já chegou? Caiu da cama?
Sunohara: Do que você está falando? Já estamos no intervalo.

Olho ao redor e noto que alguns alunos já haviam saído da classe e que o professor não estava mais presente.

Tomoya: Hmmm. A aula estava tão interessante que eu devo ter cochilado.
Sunohara: O que vamos ter para o lanche hoje?
Tomoya: Não me lembro de ter combinado nada com você...
Ryou: Com licença...

Eu e Sunohara nos viramos e nos deparamos com Ryou Fujibayashi. Sunohara se levanta de sua cadeira abruptamente.

Sunohara: Hmmm. Acho que vou dar um pulo na cafeteria. Te vejo depois, Okazaki.

Meu amigo idiota sai da sala, me deixando sozinho com Ryou. Essa é uma situação constrangedora. Estou diante de minha ex-namorada e atual cunhada. Apesar de Ryou ter dado força para meu novo relacionamento, a situação entre eu, ela e Kyou não é tão boa assim. Ryou passou vários dias sem conseguir ficar perto da gente, sem trocar muitas palavras comigo e com Kyou. Lembro como Kyou ficou feliz quando sua irmã voltou a convidá-la para sair, somente as duas, como faziam desde pequenas. Eu sei que nós nos perdoamos mutuamente pelo que aconteceu. Mas esse sentimento, essa dor não desaparece da noite para o dia. É um processo que leva tempo. É por saber disso que evito conversas com Ryou. É para evitar esse silêncio constrangedor que sempre se mistura as poucas palavras que trocamos. Eu não quero ser culpado por fazê-la sofrer mais do que já sofreu.

Ryou: Tomoya-kun...
Tomoya: O que foi, Fujibayashi?
Ryou: Eu... bem... eu...
Tomoya: ...
Ryou: ...
Tomoya: ...
Ryou: Eu só queria dizer que você devia evitar dormir durante as aulas. Isso pode afetar suas notas...
Tomoya: Entendo...
Ryou: Eu... eu estou dizendo isso para o seu bem...
Tomoya: Eu sei. Agradeço pelo conselho.
Ryou: Não foi nada...
Tomoya: ...
Ryou: ...
Tomoya: Bem... eu já vou indo. Vou aproveitar esse intervalo para comer algo.
Ryou: Ah... ok...

Por um momento penso ver um pequeno sinal de desapontamento no semblante de Ryou, mas acho que foi só impressão. Não acho que ela queria ficar perto de mim muito tempo. Me levanto de meu lugar e deixo a sala de aula. Caminho a esmo pelos corredores. De acordo com um relógio na parede, já estamos quase na metade do intervalo e Kyou não foi a minha sala me buscar para o lanche. Vou até a sala dela procurá-la.

Himeragi: Sinto muito, Okazaki. A Kyou saiu assim que o sinal do intervalo soou.
Tomoya: Ela disse para onde ia?
Himeragi: Ouvi ela dizer que tinha algo importante para resolver, mas não sei dizer o que era. Talvez vocês tenham se desencontrado...
Tomoya: É... talvez... obrigado, Himeragi.

A gentil menina me cumprimenta com um sorriso e volta a se sentar com suas colegas. Retorno a minha classe mas, conforme eu já suspeitava, Kyou não havia passado por lá.

"Provavelmente vou ser evitado pelo resto do dia. Acho que nem adianta tentar conversar agora. Vou deixar a poeira baixar."

Meu estomago ronca, me alertando que preciso comer algo urgente. Sigo pelo corredor e desço as escadas. Me deparo com uma cena curiosa. Havia um garoto loiro importunando uma menina que tentava apenas seguir seu caminho.

Sunohara: Eu faço questão de pagar um lanchar com você. Assim nós podemos nos conhecer melhor.
Menina: Eu não preciso... eu estou bem...
Sunohara: Então podemos matar a próxima aula e ir ao arcade juntos. Que tal?
Menina: Eu não acho que matar aula seja uma coisa boa... e também... não me sinto a vontade... você está me seguindo desde o andar de cima... isso é estranho...
Sunohara: Ah. Você é tímida. Não se preocupe. Meninas tímidas são as minhas preferidas. Elas possuem um charme especial. Nós podemos ficar no pátio admirando as cerejeiras juntos, aprofundando nosso amor...
Menina: E-eu tenho que ir... estão me esperando...
Sunohara: Estão te esperando?
Menina: Sim... bem... minha... meu... namorado está...
Sunohara: Namorado, é?

Sunohara analisa a menina da cabeça aos pés. Um sorriso malicioso surge em seu rosto.

Sunohara (estendendo os braços): Bem... quando você cansar dele, pode se jogar em meu peito. Estarei te esperando de braços abertos.

A garota lança um olhar de nojo e aproveita a deixa para sair correndo. Parecia um pouco assustada com o garoto que a estava importunando. Acredite se quiser, esse loiro stalker é meu amigo. Me pergunto até hoje o por quê.

Tomoya: O que você está fazendo, Sunohara?
Sunohara: Estava usando um pouco do meu charme.
Tomoya: Você estava assustando a garota, isso sim.
Sunohara: As garotas que você namorou que tomaram a iniciativa, então você não tem muita experiência na arte de paquerar. É por isso que você está estranhando minha habilidade.
Tomoya: Eu acho que sua experiência é ainda menor que a minha. De qualquer forma, por que isso agora?
Sunohara: Eu percebi que sair com você e a Kyou pode ser um pouco solitário. Mas se eu tiver uma namorada também, então podemos ter um encontro duplo.
Tomoya: Encontro duplo?
Sunohara: Isso, isso. Decidi que vou arrumar uma namorada para podermos sair mais tarde.
Tomoya: Impossivel.
Sunohara: Por que?
Tomoya: Você é muito idiota.
Sunohara: Ahhhh! Você devia me dar apoio!
Tomoya (coloco a mão no ombro de Sunohara e olho com pena para ele): Estou te dando apoio. Não se iluda. Você não vai conseguir.

Sunohara coça o nariz e dá uma risada estranha. Pela postura de meu amigo, ele provavelmente acredita que essa risada o faz parecer mais legal.

Sunohara: Vejo que tenho um descrente nas minhas habilidades paquerosisticas...
Tomoya: Não acho que exista a palavra paquerosisticas...
Sunohara: Então faremos uma pequena aposta. Se eu conseguir que a próxima garota que passar por aqui saia comigo, você vai me pagar o lanche que eu quiser na cafeteria. Se eu falhar, eu pago o lanche. Feito?

Sunohara estende sua mão para mim. Nunca foi tão fácil ganhar uma aposta. É como se eu estivesse roubando o doce de uma criança. Quase me sinto mal por isso. Quase.

Tomoya: Fechado!

Aperto a mão de Sunohara, selando o acordo.

Tomoya: Vou me afastar um pouco para te dar espaço.
Sunohara (fazendo sinal de positivo): Ok. Vou usar minhas melhores táticas, que reuni após anos de pesquisas em revistas. A garota com certeza vai cair aos meus pés implorando para sair comigo.
Tomoya: Isso vai ser interessante...

Desço as escadas e me encosto na parede, fingindo estar olhando pela janela. Sunohara sobe alguns degraus da escada e dá de cara com uma garota. Ela tinha longos cabelos verdes, presos num rabo-de-cavalo com um laço vermelho, possuía uma pintinha logo abaixo do olho esquerdo e era um pouco baixa. Analisando seu rosto, me lembro que ela era uma aluna do primeiro ano. Já havia a visto por aí, mas não sei seu nome. Sunohara começa a descer as escadas acompanhando a garota.

Sunohara: Olá. Muito prazer. Eu sou Sunohara.
Garota: Não me interessa.
Sunohara: O que?
Garota: Seja lá o que for dizer, não me interessa.
Sunohara (sorrindo sem graça): Bem... eu ia dizer que você fica muito bem nessa roupa.
Garota: Isso é o uniforme escolar. E não me lembro de ter pedido sua opinião.
Sunohara: Hã... bem... não era só isso que eu queria dizer...
Garota: ...
Sunohara: Eu também já te vi com o uniforme de educação física e você fica excelente nele.
Garota: ...
Sunohara: Apesar de ser baixinha, seu corpo é bem desenvolvido. Suas pernas, por exemplo, são muito bonitas...

Sunohara se aproxima da garota e cheira seu cabelo.

Sunohara (falando no ouvido da garota, tentando fazer uma voz sensual): ... e você possui um perfume muito bom, que nos faz ter uma sensação única. Imagino como deve ser cheirar sua roupa, seu pescoço...

A garota olha para Sunohara, uma veia saltando de sua testa. O que acontece a seguir se passa muito rápido. Minha mente quase não registra. Quando percebo, Sunohara está girando no ar e caindo no final da escadaria. Ele desliza pelo chão encerado do corredor e acaba parando aos meus pés.

Garota: Pare de importunar as garotas, seu tarado!

Me agacho para verificar Sunohara. Seus olhos estão girando nas órbitas, seu corpo posicionado de uma maneira estranha e um pouco de baba saindo de sua boca.

Tomoya: Hmmmm. Ele está respirando, então deve estar bem.
Garota: Ei! Você!

Noto que a garota está apontando para mim.

Tomoya: O que foi?
Garota: Você está com esse tarado? É amigo dele? Está pertubando as meninas que passam também?
Tomoya: Não. Estou apenas fazendo uma análise cientifica.
Garota: Análise cientifica?
Tomoya: Sim. Estou medindo o quão idiota uma pessoa pode ser. Meu amigo aqui acaba de mostrar todo um novo nível de idiotisse.
Garota: Hmmm.

A garota olha para mim, parecendo um pouco confusa.

Garota: Sua pesquisa é estranha e você também me parece ser. Fique longe de mim, cara estranho.

A garota joga seu cabelos verdes para o lado, dá meia-volta e se afasta de nós. Sunohara volta se mexer, gemendo de dor.

Tomoya: Você está bem, Sunohara?
Sunohara: Eu... eu acho que vou sobreviver...
Tomoya: Consegue andar?
Sunohara: Sim...
Tomoya: Ótimo. Vamos para a cafeteria então.

Sunohara resmunga um pouco, mas, por fim, acaba me acompanhando até a cafeteria, onde logo arrumamos um lugar após comprar nosso lanche.

Tomoya: Este bolo de limão está delicioso, Sunohara.

Me delicio com o pedaço do bolo que estava no meu prato. Sunohara estava sentado diante de mim, seu semblante mostrando o quanto ele estava insatisfeito. Ele ainda soltava alguns gemidos involuntários, gerados pelas dores que estava sentindo. Não trocamos muitas palavras nos minutos que se passam. Não que eu me importasse. Minha boca estava muito ocupada no momento.

Sunohara: Por que eu tenho que pagar esse lanche caro para você?
Tomoya: Você levou uma surra vergonhosa da garota que devia chamar para sair e eu ganhei a aposta. É por isso.
Sunohara (passando as mãos como um louco na cabeça): Ahhhh! Não é justo. Uma garota não deveria resistir ao meu charme daquele jeito! Deve ter algo errado com ela!

"Não. Tem algo errado com você."

Tomoya: Tenha um pouco de dignidade e aceite sua derrota.
Sunohara: Não desisti ainda. Com certeza vou conseguir alguém para sair mais tarde...

Inesperadamente, Kyou surge e bate suas mãos na mesa com força.

Kyou: Tomoya!
Tomoya: Ei, Kyou. Por onde você andou?
Kyou: Estava ocupada resolvendo umas coisas.

Pelo olhar de Kyou, certamente ela estava escondendo algo.

Kyou: Mais importante que isso... por que você está lanchando com esse idiota?

Kyou aponta para Sunohara.

Sunohara: Que? Eu sou idiota?
Kyou: Calado!
Sunohara: ...
Kyou: Eu sou sua namorada. Você devia ter esperado para lanchar comigo.

Analiso o olhar de Kyou e sinto um calafrio, certamente reação a aura de ódio que ela estava emanando. O que aconteceu de manhã deve ter sido somado a esse pequeno mal-entendido, deixando minha namorada irritada. Será que consigo explicar para ela que eu a procurei na sala antes de decidir vir para a cafeteria? Será que consigo mostrar que esse desencontro não é motivo para uma grande discussão? Será que consigo terminar a explicação antes de perder um membro ou dois? Respiro fundo e tomo a única decisão lógica possivel.

Tomoya: A culpa é do Sunohara.
Sunohara: Eh?
Kyou: Ora, seu...

Kyou pega um garfo e o finca com força na mesa. O braço de Sunohara se salva por milimetros, mas a manga de seu casaco acaba presa. Meu amigo começa a se mexer agitado na mesa.

Sunohara: Ahhhhh! Por que você fez isso?
Kyou: Porque a culpa disso é sua.
Tomoya: Verdade. Ele me arrastou até aqui, me ofereceu esse pedaço de bolo e não pude resistir a tentação.
Sunohara: Mas você me forçou a comprar o bolo para você!
Kyou: Você deveria ter resistido a tentação, Tomoya! Você tem que passar o tempo com a pessoa que você ama. Quem você ama mais? Sua namorada ou seu servo?
Sunohara (erguendo uma sobrancelha): Ei! Quem você está chamando de servo?

Indignado, Sunohara se levanta e começa a encarar os olhos violeta de Kyou.

Sunohara (colocando a mão em meu ombro enquanto fala): Pois saiba que você não é tão importante assim para o Tomoya! Os laços que unem ele e eu são muito profundos e fortes que qualquer outra coisa! Nós sempre estivemos juntos e ficaremos assim para sempre, superando todos os obstáculos!
Tomoya (me afastando de Sunohara): Pare de dizer coisas que as pessoas vão interpretar de maneira errada, seu idiota!
Sunohara: Nada supera o poder do melhor amigo. É a coisa mais poderosa do mundo.
Kyou: Ah, é?
Sunohara: Pode ter certeza disso!

Um sorriso maldoso surge no rosto de Kyou. Ela parecia estar se divertindo com o rumo da conversa.

Kyou: Então... qual você escolhe, Tomoya? O que é mais importante? Sua namorada ou seu melhor amigo?
Sunohara: Não se sinta mal ao ouvir a resposta...
Tomoya: É claro que é minha namorada.
Sunohara: Ahhhhh! Seu traidor!

Sunohara se afasta alguns passos, fazendo uma cara de quem está prestes a chorar.

Sunohara: Como você pode fazer isso comigo? E tudo que passamos juntos? E tudo que fizemos juntos? Eu não significo nada para você?
Tomoya (tentando ignorar os olhares dos curiosos): Eu já disse para parar de falar essas coisas estranhas!
Kyou: Ele parece uma ex-namorada que não aceita a rejeição...
Tomoya: Eu não sabia que ele tinha esse lado gay...
Kyou (os braços cruzados): Hmmm. Você devia ter mais cuidado de agora em diante.
Tomoya: Definitivamente.
Kyou: Não se preocupe. Como sua namorada, vou te proteger.
Sunohara: Você dois realmente combinam perfeitamente, não é?

Kyou e eu nos entreolhamos e sorrimos.

Kyou (me abraçando por trás): Claro que sim!
Tomoya: Somos almas gêmeas!
Sunohara: Ahhhhh!

Sunohara sai correndo como um louco. Kyou e eu começamos a gargalhar. Acho que toda aquela cena acabou por aliviar um pouco a tensão. Kyou se senta ao meu lado.

Tomoya: Ei, Kyou...
Kyou: Sim?

Coloco minha mão sobre a mão de minha namorada.

Tomoya: Me desculpe. Eu só vim para a cafeteria porque não te encontrei na sala.

Kyou olha para mim e suspira.

Kyou: Tudo bem. Foi minha culpa também.
Tomoya: Eu também queria me desculpar p...
Garota: Kyahhhhhhhhhhhh!

Sou atingido por trás por um chute e atirado para fora de minha cadeira. Logo me levanto, passando a mão nas costas, que estavam doloridas. Noto que havia uma garota puxando o braço de Kyou e tentando levá-la para longe contra a vontade dela.

Tomoya: Você! Você é a garota que deu uma surra no Sunohara!
Garota: Vamos, Kyou-sama! Você deve ficar longe desse cara. Ele é amigo do loiro pervertido.
Kyou: Pare com isso, Ayase-chan...

Me aproximo alguns passos e a garota de cabelos verdes se coloca diante de Kyou, os braços erguidos como se fosse protegê-la.

Ayase: Não se preocupe, Kyou-sama. Vou protegê-la a todo custo!
Kyou: Não encoste nele, Ayase!
Tomoya: Eh? Kyou-sama?

Olho de Kyou para Ayase, extremamente confuso.

Tomoya: O que diabos está acontecendo aqui?

Eu estava achando aquele situação confusa. Mal sabia eu que tudo estava prestes a piorar e que minha vida teria uma série de reviravoltas. Sem que eu estivesse ciente, uma pessoa que mudaria minha vida estava chegando a cidade de Hikarizaka.

Um dos trens programados para a tarde abre suas portas e diversos passageiros desembarcam. Entre os passageiros estava uma menina de 16 anos, cabelos castanho-claro que iam até a altura dos ombros e belos olhos num tom de azul meia-noite. Estava usando uma blusa larga branca que cobria uma apertada blusa preta que usava por baixo, short jeans desfiado nas pontas e uma meia-calça preta, além de uma bota marrom. Em seu pescoço pendia um pingente dourado com uma pedra vermelha e em uma das mechas de seu cabelo estava preso um enfeite de uma cruz.

A menina arrasta sua mala de rodinhas até o lado de fora da estação, olha para o céu e respira fundo. Essa cidade era mais quente do que ela estava acostumada. A menina ao olha ao seu redor e vê uma mercearia próxima.

Menina: Hmmmm.

A menina entra na mercearia e é recebida por uma simpática senhora. O lugar era pequeno e simples, mas parecia ter tudo que se precisava por ali. A menina abre um refrigerador e pega duas latas de refrigerante, levando-as até o balcão. A senhora registra os preços dos produtos.

Senhora: São 300 yenes.

A menina prontamente abre sua bolsa, junta o dinheiro e o entrega a senhora, que coloca os produtos numa sacola e os oferece a sua cliente.

Menina: Com licença, tia...
Senhora: O que foi? Precisa de mais alguma coisa?
Menina: Na verdade, sim.

A menina retira um pedaço de papel com algo escrito e o entrega a senhora.

Menina: Eu acabei de chegar na cidade e estou procurando esse endereço. Será que você pode me apontar uma direção?
Senhora: Hmmm...

A senhora analisa o endereço.

Senhora: Não tenho certeza, mas acho que essa rua fica mais ou menos na região onde vão construir o novo hospital.
Menina: Então acho que vou tentar procurar por lá. Qual o caminho?
Senhora (devolvendo o papel): Você está procurando alguém?
Menina: Estou sim, tia. Já procurei em umas duas cidades e agora vim parar aqui.
Senhora: Eu tenho alguns conhecidos naquela região. Talvez eu conheça quem você procura.
Menina: Não custa arriscar, não é?
Senhora: Quem você está procurando?
Menina: Estou procurando um garoto de cabelos azuis mais ou menos da minha idade. Não tenho muita certeza de como é a aparência dele hoje, mas talvez você o conheça pelo nome. O nome dele é Okazaki. Tomoya Okazaki...


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Notas finais do capítulo

Bem, primeira parte postada. Não sei qual vai ser o tamanho da história ainda. Depende da inspiração.

Espero que o texto tenha ficado divertido.

Até a próxima ^^



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