Asas das sombras escrita por Wonderwall


Capítulo 1
suspiro do escuro




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As luzes perturbavam meus olhos, as gargalhadas dentro do carro me deixavam eufórico e com medo... O barulho do vento pela janela era um zunido... O som alto me incomodava.. Pietro dirigia perigosamente mudando de faixa.. A policia já estava atrás se nós quando... tudo ficou branco, tudo iria mudar...

"alguns fazem do sol uma simples mancha amarela, mas há aqueles que fazem de uma simples mancha amarela, o próprio sol."

Eu sabia que o sol havia nascido, senti o calor que ele emanava saltando pela janela em direção ao meu corpo adormecido ali no quarto. Os sonhos com o dia do acidente estavam sendo constantes e de certa forma aquilo me irritava. Quanto mais eu pretendia esquecer, mas lembrava.

Já faziam dois anos que tudo havia acontecido mas, eu ainda não me acostumara. Pietro, meu amigo que dirigia, morreu, os outros não tiveram sequelas, apenas eu. Deve aprender a não sentar na janela quando um acidente for acontecer, isso pode te deixar cego. O problema é que você nunca sabe quando isso vai acontecer. Suspirei e passei a mão por meu rosto.

Levantei e procurei minha bengala, me sentia um velho fazendo isso. Poucos sabem mas, meu tio.de cegueira é diferente, ele me permite ver o contorno das coisas, mas não as cores, ou seja, vejo tudo branco, exatamente branco com os contornos em preto, como um desenho mal feito Isso facilita minha vida, mas é claro que me odeio a cada dia mais por ser assim, tão estupido. Minha mãe fala que é besteira, mas só eu sei como me sinto. E isso é uma droga, vai por mim.

Caminhei até o banheiro e logo fui tomar banho. Um longo banho. Eu não sabia como era meu rosto, nem meu corpo, assim como o de ninguém mais. Não sabia como era minha casa, ou como eram as ruas. Vivia apenas de lembranças e desenhos mal feitos. As vezes tenho medo de me perder, as vezes eu quero me perder.

Saí do box e me enxuguei. Fui ao guarda roupa e peguei uma roupa qualquer. Me perguntam se pré iso de baba, mas a verdade é que sou exatamente normal, não preciso que alguém fique me vigiando, só minha mãe. Mas isso por que tenho apenas dezessete anos.

Desci as escadas e encontrei com minha mãe na cozinha, quando perdi a visão, meus sentidos ficaram mais apurados, quase como superpoderes, então eu podia sentir as pessoas de longe.

Ela beijou minha testa e disse que ia trabalhar, fechou a porta e me deixou sozinho com o café da manhã. Não chalé minha mãe de idiota ou irresponsável por me deixar sozinho, eu apenas pedi a ela que fosse assim. Não queria ser tratado como um morto ou como um incapaz. Ela me compreendeu.

Terminei de comer e pus o prato na pia. Em segui fui até onde Phil estava e sai com ele. Phil era meu guarda costas, me alertava de tudo que eu não conseguia ver e me protegia. Calma, ele não era um cara e sim um cão, meu cão guia. Eu tinha o privilegio de levar o cachorro para a escola e usar óculos de sol o tempo todo, gosto de encarar tudo como tendo um lado bom, assim fica mais fácil de levar a vida.

Os amigos que estavam no dia do acidente, em sua maioria, se mudaram, os que restaram nao falam comigo. Vai ver eles não gostam de falar com cegos, idiotas.

Me dirigi a minha sala, eu sabia andar ali de cima a baixo, como no resto da cidade, e olha que Chicago não é pequena.

Assistir as aulas era chato, ainda mais quando só se ouvia, era bem pior. Mas depois do acidente, minhas notas subiram significadamente. Alguns dizem que fasso prova especial, mas a verdade é que não, sou igual a todos e me orgulho disso.

Finalmente o sinal toca para o intervalo, me dirijo ao refeitório mesmo que para não comer nada, apenas gosto de ficar lá, tem um clima bom, não é tão pesado.

Me sentei em uma mesa e fiquei olhando ao redor, pelos rabiscos que eu conseguia ver, a cantina ainda continuava igual. Senti alguém se aproximando, não um alguém conhecido, eu saberia, mas era uma garota e ela era nova na escola. Achei que iria passar direto como todos fazem, mas não.

- Posso me sentar?
- Claro, fique a vontade.
- Meu nome é Anne, mas pode me chamar de Anne. - ela riu e eu também, que piada idiota. - e você, quem é?
- Me chamo Dylan.
- Prazer Dylan. Te vi na aula hoje, sou da mesma sala que você.

Fiquei constrangido, ela sabia que eu era cego e estava conversando como se não notasse. Isso era tão reconfortante que me deixava tenso. E o melhor era que eu percebia que ela olhava para mim como se eu fosse normal, o que era raro.

- Ah, legal. - Disse menos entusiasmado do que realmente estava.
- Adorei seu cachorro, qual o nome dele?
- Ele se chama Phil, pode fazer carinho. - Sorri e senti que ela sorriu também.

Então o belo sinal da escola tocou, lembrando a mim que ainda teria mais duas aulas de tortura antes de poder ir para minha casa e fazer o que eu mais gostava todo esse tempo: Dormir.

Anne se levantou e segurou minha mão indo ate a sala em silencio. Ela não a segurou para ajudar, segurou por segurar e eu senti que todos olhavam para nós, odiava isso.

Sentei em minha cadeira, que ficava na frente, e senti ela se sentando numa das ultimas, lá no final. A hora passou tão rápido que nem percebi a diferença entre um minuto e um segundo.

Peguei minha mochila e a pus nas costas, peguei a coleira de Philip para sair da sala quando senti ela se aproximando.

- Até amanhã Dylan! Fica bem!

Senti ela sorrir e me dar um beijo na bochecha.

Quem era aquela garota e por que estava sendo tão legal comigo?

Saí da sala e fui contornando o campus até a saída. Meu pai logo veio ao meu encontro e me abraçou calorosamente. Ele e minha mãe eram separados, hoje eu ia passar a tarde com ele, espero mesmo que possa valer a pena.


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