Kari me olhou surpresa.

- A garota autista? – Perguntou –

- É assim que a chamam aqui? – Falei –

- Digamos que sim. Ninguém conversa muito com ela. Sophia é muito... como eu posso dizer? – Kari pensou por alguns instantes. – Acho que anti-social é a palavra certa.

Eu apenas consegui rir de Kari.

- Autistas são assim mesmo. Não gostam, não conseguem se relacionar muito bem com as pessoas. – Expliquei –

- Você é o que dela? Irmão, primo, amigo, namorado...?

- Na verdade sou vizinho dela, estou tentando conquistar a amizade dela.

- Ah, e porque você tem essa preocupação se ela é apenas sua vizinha?

- Não sei. – Olhei-a nos olhos – Eu também queria saber. Acho que é um jeito de não deixar acontecer com ela o que aconteceu comigo no passado.

- Você quer dizer o bullying?

- É. – Respondi – Na verdade, acho que eu faria isso por qualquer um que estivesse sozinho, sem amigos. Eu não gosto de ver as pessoas assim. Quando vi Sophia pela primeira vez, ela me parecia muito solitária. Então eu quis tentar ser amigo dela.

- Tentar? – Kari me perguntou enquanto guardava seus materiais. –

- Sim. Como você mesmo disse, ela não se relaciona muito bem com as pessoas. Então... É como se fosse uma missão quase impossível.

- Entendo!

Coloquei minha mochila nas costas e convidei Kari para ir comigo até Sophia, mas ela recusou. Então eu me despedi e fui até a sala onde eu havia deixado Sophia pela ultima vez. Entrei na pequena sala e a vi sentada em frente a mesa do professor. Todos me observavam surpresos, mas eu não me importava com ninguém, queria apenas estar ali. Eu queria mostrar que ela tinha ao menos um amigo, que eu estaria li para o que der e vier.

- Como foi a aula? - Perguntei –

Sophia me olhou, mas não em meus olhos. Parecia que estava em duvida se dizia alguma coisa ou não. Eu não a forcei a falar nada, apenas fiquei ali com ela. Contei como estava sendo o meu primeiro dia de aula e o que eu havia achado daquela escola. Foi quando eu fui interrompido por ela.

- Por que está fazendo isso? – Sophia falou olhando para o caderno que estava aberto em cima da mesa. Ela estava desenhando alguma coisa, consegui ver apenas um circulo perfeito.

- O que? – Perguntei –

- Porque está aqui comigo? Você... Podia estar com... Com qualquer pessoa. – Perguntou timidamente –

Fiquei tão surpreso com o que ela havia falado que fiquei sem palavras naquele momento. Mas a resposta eu já sabia.

- Eu apenas quero que não se sinta sozinha. – Falei –

- Mas é que... eu prefiro ficar sozinha. – Disse ela com uma inocência que me surpreendia. –

Eu a olhei no fundo dos olhos e percebi ela se incomodar com aquilo. Ela começou a mexer as mãos para chamar minha atenção e me fazer parar de olha-la daquele jeito. Apesar de tudo, Sophia era bem inteligente. Ela tanto mexeu as mãos que conseguiu chamar minha atenção para elas.

- Você não sente falta de amigos? – Perguntei –

Sophia acenou que não. Ela parecia envergonhada.

- Sophia eu sei que você prefere ficar sozinha, mas todos nós precisamos de amigos. – Falei enquanto sorria. – Eu vou ir, mas qualquer coisa é só me chamar. Estou na sala 1001.

Pousei um beijo em sua bochecha e me levantei. Tirei do meu bolso um chocolate que eu havia comprado para mim na banca de jornais e deixei em cima da mesa de Sophia. Eu a vi me olhar surpresa. Eu queria demonstrar que ela era importante, que existiam pessoas que gostavam dela e a queriam bem. Eu não sabia o que Sophia pensava sobre mim. Talvez na cabeça dela eu fosse apenas um garoto que a enchia a paciência. Mas isso não importava. Eu não queria vê-la assim, sozinha. Eu não queria iria abandona-la, mas fiz a vontade dela. Tentar forçar a amizade dela não daria em nada. Me despedi e fui para minha sala.

*

Eu já dava o tão famoso “Graças a Deus” quando ouvi o sinal de saída da escola tocar. Guardei meus materiais em minha mochila e fui para sala de Sophia para acompanha-la até em casa. Corri até a sala da garota autista. Ao chegar lá, meus olhos logo se direcionaram para o lugar que Sophia sentava, mas não a encontrei. Meus olhos rodeavam por toda a sala procurando-a, mas fiquei frustrado em não encontra-la.

Meu coração logo se acelerou, onde Sophia poderia estar?

- Você sabe onde está Sophia? – Perguntei a uma garota que saía da sala –

- A menina autista? – Disse ela –

- Sim! – Respondi – Você sabe onde ela está?

- Quando o sinal bateu, ela saiu correndo da sala.

- O que? – Fiquei surpreso – Por quê? Onde ela foi?

- Disso eu não sei. Eu não tenho obrigação de saber disso. – Disse ela – Com licença?

Eu me afastei da garota para que ela pudesse passar. Foi quando vi um monte de pessoas correndo para fora da escola. Eu as segui. Ao sair de lá de dentro, avistei uma roda de pessoas. Havia muitos alunos ali. Fui até lá e comecei a me infiltrar naquela multidão. Eu ouvia gritos.

- Quem você pensa que é? – Eu ouvia de uma voz masculina –

- Sua ridícula! – Dizia outra voz, só que feminina –

Infiltrei-me ainda mais na multidão e consegui ver o que acontecia. Sophia estava caída no chão. Sua roupa estava molhada de algo úmido e rosa, parecia iurgute de morango. Em sua frente havia um garoto e uma garota. Ambos também sujos com o liquido rosa.

- Ei! O que está acontecendo aqui? –Perguntei ajudando Sophia a se levantar do chão –

- Essa idiota derramou iorgute em nós. – Disse a garota que parecia estar com muita raiva. –

- Com certeza não foi de propósito. Ela não faria isso para prejudicar ninguém.

- Não? Essa idiota... – Retrucou a garota enfurecida –

- Não a chame assim. – Interrompi –

O garoto veio em minha direção, se posicionou em minha frente e cruzou os braços. Ele me encarou nos olhos e finalmente disse algo.

- Por quê? Você vai fazer o que se nós a chamarmos assim?