Mistérios de Frost Ville escrita por Isa Holmes


Capítulo 11
Slogan ou um símbolo de morte?


Notas iniciais do capítulo

Adivinhem? Férias! õ/



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Assim que deu 2h da madrugada ouvi o velho relógio de pêndulo do meu avô badalar no andar de baixo. Esperando até que o sossego voltasse, joguei minha mochila por sobre o ombro e peguei minha lanterna de cima da cama, a qual estava arrumada para enganar os olhos de quem me observasse de longe. Sem hesitar coloquei meu casaco por sobre a mochila, apaguei as luzes e atravessei a porta do meu quarto.

O corredor entre o meu cômodo, o do meu irmão e o do meu avô mantinha as luzes acesas, porém um silêncio sóbrio. Atravessei-o em passos leves e longos até a porta do quarto de Tyler. Apoiei o ouvido sobre a madeira e escutei acordes musicais de alguma guitarra. Isso apenas me dava a notícia de que meu irmão estava acordado. Apenas torço para que ele não vá fuçar no meu quarto. Algo nada raro.

Seguindo o mesmo procedimento anterior consegui resultados diferentes de meu avô. Este parecia estar em seu terceiro sonho, já que seu ronco ecoava alto. Bem alto.

Quando tive certeza de que estava tudo limpo, afastei-me do corredor descendo as escadas, indo para a porta da frente. Sei que avisei aos outros que não fugissem desse jeito, mas com certeza suas experiências são poucas, diferente das minhas, é claro. Girei a maçaneta cautelosamente e atravessei a soleira. Segurando a madeira com a mão que estava ocupada pela lanterna, e deixando a outra ocupada com a maçaneta, tentei fechar a porta sem faze-la ranger. Milésimos de segundos depois levei um susto com uma inesperada visita — talvez não tão inesperada assim — as minhas costas:

— Pensei que seu aviso se aplicasse a todos.

Com o coração na boca derrubei minha lanterna e soltei um xingamento, virando-me sobressaltado. Meus olhos ainda não estavam acostumados com a escuridão da noite, mas não demorou muito para que os fizesse. Primeiro encontrei olhos azuis celestes, e logo em seguida cabelos da cor de chamas em uma trança lateral bem feita. Apontei para o penteado, pronto para falar algo, porém a garota ergueu brutalmente o dedo indicador na direção do meu rosto, e disse, bufando:

— Nem. Queira. Saber — ela ajeitou algo que estava em suas costas. Estreitando os olhos percebi sua sacola preta, onde Merida mantém seu arco e flechas. Dessa vez apontei para a sacola. Meri olhou por sobre o ombro e sorriu — Eu nunca largo, lembra?

— Claro — respondi —, como eu poderia esquecer? Você ameaçou acertar a minha cabeça com uma flecha naquela manhã. — então logo sussurrei — E também tem o fato de eu ter conhecido vocês.

Merida sorriu novamente, abaixando para pegar minha lanterna do chão. Quando sua silhueta deixou de ocupar minha visão, vi que havia nevado. As calçadas estavam ocupadas por uma camada fina e branca de neve, igual as ruas. Enquanto pegadas ocupavam os gramados e pavimento, marcas de pneus desenhavam o asfalto. Os telhados das casas também estavam ocupados por um branco espesso e as árvores presentes a nossa volta pareciam artificiais.

— Sei que disse para ignorar, mas ainda estou curioso para saber como esse penteado aí surgiu.

— Surgiu com o seu atraso. — a ruiva me entregou a lanterna, logo começando a andar — Deveríamos ter nos encontrado a uma hora atrás, Frost — Meri enterrou as mãos nos bolsos do seu casaco Trench coat — A Punzie fez isso em mim enquanto todos esperávamos você. Logo depois me mandaram te buscar — ela suspirou — falei que não queria penteado nenhum, mas quando vi Rapunzel já tinha terminado.

— Hã, até que você ficou bonita assim — respondi, mostrando-me meio desentendido, parando para por o meu casaco. A temperatura abaixou durando os minutos que se passaram — Só não entendo uma coisa... achei que você era a mandona.

Merida interrompeu a própria caminha e voltou-se para mim.

— Não esqueça que eu tenho um arco — disse, com um sorriso desafiador.

— E eu uma faca — revidei, colocando minha mochila na posição anterior.

— Uma faca? — ela enrugou o cenho — É sério?

— Não. Na verdade é um canivete — respondi, fazendo com que a ruiva enrugasse mais o cenho. Assim que próximo dela senti-me obrigado a explicar o porquê da arma — Nunca se sabe quando você pode ser atacado — disse, entregando minha lanterna à ruiva e jogando minha mochila no chão. Sentindo uma pontada de calor percorrer meu corpo. Ergui a minha blusa e casaco, expondo parte da minha barriga. Gesticulei então para que a ruiva ligasse a lanterna, apontando-a para a minha cintura, revelando nada mais, nada menos, que uma cicatriz.

Segundos se passaram e Merida não tirava os olhos de mim, até que tive a iniciativa de cobrir a cicatriz novamente. A ruiva abaixou a lanterna, fazendo com que ela iluminasse a neve espalhada no pavimento e me encarou, confusa.

— Eu fui a Londres uma vez com meus pais e meus irmãos — expliquei, dando rumo a uma nova caminhada — Nós, menos Tyler que preferiu ficar no hotel, estávamos vagando de noite quando um cara chegou com uma faca na mão. Ele agarrou minha irmã e começou a falar que era um assalto. Fiquei raivoso por ver a minha irmã desesperada e avancei nele. Foi tudo bem rápido. Eu consegui afastar minha irmã chutando a virilha do homem, ele se defendeu com a faca antes de cair de dor, e meu pai pegou sua arma e apontou na direção dele.

— E seu pai... atirou no cara?

— Ele parecia querer, mas não fez — respondi —, o homem foi rápido e fugiu.

— E você, Jack? — a ruiva ainda me encarava enquanto andávamos.

— Eu tive sorte —sorri a ela, orgulhoso — foi um corte meio profundo, mas não causou nada, nem uma hemorragia.

Merida sorriu e então andamos mais alguns metros, até que a ruivinha parou novamente. Eu não tinha percebido isso no começo, então acabei parando alguns centímetros depois. Quando voltei ao seu lado vi seus olhos brilharem com a lua. Perguntei se havia acontecido alguma coisa de errado, mas ela não respondeu. Merida apenas segurou minhas mãos, fazendo com que meu coração desse cambalhotas no peito. Justo quando ela ia dizer algo, ouvi um garoto berrar do outro lado:

— Aí, ruiva e sem cor, vocês estão bem atrasados, sabia?

E então Merida bruscamente me soltou, devolvendo-me a lanterna, enterrou suas mãos no casaco e me encarou de canto, sorrindo e gesticulando para que atravessássemos a rua.

— Por que da próxima vez você não grita mais alto, Wilbur? Acho que não ouviram lá em Nova Iorque. — reclamei, ainda confuso com o que aconteceu.

— Ah, pode deixar — respondeu ele, dando alguns tapinhas em minhas costas.

O garoto moreno juntou as mãos como concha e as levou até os lábios. No começo achei que era ironia, mas logo percebi que ele ia realmente gritar mais alto. Assim que sua primeira sílaba decidiu sair, Violeta apareceu do seu lado e o calou com a mão.

— Você é idiota, Wil? — Vivi perguntou, enrugando o cenho.

— Ei, é brincadeira! — Wilbur respondeu, levantando as mãos como se estivesse se rendendo — Você sabe que eu não iria fazer isso.

A morena revirou os olhos.

— Aí, acho que existe algo mais importante do que fazer concurso de grito em uma praça no meio da madrugada. — Soluço levantou da beirada da fonte de onde estava sentando. Ele apoiou sua mão, que estava protegida por luvas, no meu ombro e disse: — Vai na frente, Jack.

E então assenti, seguindo rumo ao lado norte. Não demorou muito para chegarmos na entrada da floresta da cidade. Escolhi a praça como ponto de encontro justo por ser perto do nosso destino. Seguimos uma trilha que havia no começo da floresta e viramos ao leste. Todos seguiram o caminho encolhidos e nervosos. Alguma vez ou outra uma coruja piava ao longe ou alguma silhueta de um pássaro passava por cima de nossas cabeças. O vento gélido da madrugada parecia dar arrepio em todos. Vários dos galhos secos das árvores ali presentes roçavam uns nos outros produzindo sons desagradáveis que deixavam a loira e a morena assustadas, sendo obrigadas a se agarrarem nos outros dois garotos. A ruivinha se demonstrava tranquila, mas se ficasse um centímetro longe de alguém, tinha a impressão de ficar tensa. Assim que avistei um lampião estendi meus braços para os lados impedindo os outros de avançarem.

— É bem ali, depois do lampião — sussurrei, apontando para o chalé velho de madeira.

— E o que estamos esperando? — Wilbur sorriu, ansioso — Vamos lá! — E então correu, quase afundando em uma vastidão branca.

— Jack! Não vai impedi-lo? — Vivi segurou meu braço, apontando para a direção do garoto — Nosso professor pode não ter saído! Wil pode ser pego! Não checamos ainda!

— Olha — respondi, calmo —, se for o caso de ele ser pego nós o deixamos aí e saímos correndo — com minhas palavras recebi uma cara feia da morena — Desculpa, estou só brincando. Olha, o sr. D. não está aí. Fica tranquila. Vai atrás do Wil antes que ele caia de cara na neve — e foi o que ela fez, depois de me empurrar e quase me fazer cair de cara na neve.

Violeta se juntou à Wilbur. Soluço e Rapunzel foram logo atrás. Percebi que a ruiva havia parado na frente do lampião.

— Como ela está aguentando todo esse frio? — a ruiva perguntou assim que eu me aproximei.

— Ela... quem? — a encarei, passando a mão na nuca.

— A tulipa negra — ela apontou para o lampião, onde habitava uma flor desigual aos seus pés — ela está viva, linda... no frio? Isso é possível?

— Se a flor está aí deve ser. — respondi, agachando — Talvez tenha algo embaixo da neve que a deixei suportar o frio, ou ela deve estar viva por ter começado a nevar a pouco tempo — deduzi. A ruiva também agachou, começando a espalhar a neve que estava entre a flor e o lampião, parecia mais apegada a minha primeira teoria. Não encontramos nada, a não ser um nome gravado no pé do lampião, uma gravura de uma cruz e uma data do século XIX — Gael Foster? — li.

— Deve ser a marca do lampião — Meri argumentou —, e o ano que foi feito. Esse treco é velho! 1868?

— Mas e a cruz? — perguntei, incerto das palavras da garota ruiva.

— Deve ser o slogan do lampião — disse ela levantando, cruzando os braços e sorrindo.

— Eu não sei não — segui o seu ato — Gael Foster parece ser mais o nome e sobrenome de uma pessoa. E eu não acho que existisse slogan naquela época. Bom... eu não sei se existia.

— E então o que você sugere, Sherlock?

— Gael Foster só pode ser o nome de alguém que viveu naquele século. A cruz deve significar morte, igual nas lápides dos túmulos, e o ano deve ser de quando ela deve ter falecido. — deduzi — A flor deve ser de algum parente, o estranho é ela estar viva por tanto tempo. E o lampião, bom... deve ser o leito dessa moça morta.

— Por favor! — ela fez uma careta, zombeteira — Os mortos estão em um cemitério e não perto de um lampião. E afinal de contas, por que alguém moraria perto de um túmulo?

— Talvez o sr. Devalos não saiba.

— Ah, Jack. Isso é bobeira. Agora vamos — ela agarrou uma das minhas mãos —, temos um livro para encontrar.

Olhei para as nossas mãos entrelaçadas, nostálgico. O ato da garota acabou me lembrando de...

— O que foi aquilo mais cedo? — perguntei — Você ia dizer alguma coisa para mim?

— Eu só ia dizer que você é um herói, garoto albino — sorriu ela. — Você salvou sua irmãzinha.

— Salvei para depois perdê-la de vez — resmunguei nervoso, apertando o passo, tentando dessa vez ignorar o assunto.

Assim que chegamos próximo ao chalé, todos nos reunimos novamente. Rapunzel perguntou como iríamos entrar, e então demonstrei-me novamente o mais esperto. Isso se o Soluço não me atrapalhasse.

— Faz algum tempo que andei notando mais os habitantes daqui e percebi que uma das manias dos frostvillianos é guardar uma chave reserva embaixo do capacho — agachei, comprovando minhas palavras. Quando ergui o capacho encontrei uma chave negra e detalhada — Viram?

Posicionei o tapete de volta e levei a chave à fechadura, dando duas voltas. A porta rangeu alto assim que empurrada para dentro. Fui o primeiro a entrar, seguido do garoto viking, depois a loirinha, a morena, o desordeiro e a menina de tranças. Tirando minha mochila das costas peguei três lanternas. Dei uma ao Soluço, pedindo para que fizesse parceria com a ruiva. A outra lanterna entreguei ao Wil, deixando óbvio que ele ficaria com a Vivi. A última dei a Punzie, e eu fiquei com a minha.

— Não acha mais fácil acendermos as luzes? — perguntou a loira.

— Não. Quanto menos luzes melhor.

E então começamos nossa procura. Talvez tenha se passado meia hora, talvez uma, não sei ao certo. Todos já estávamos de saco cheio de olhar as várias estantes de livros que havia ali, de fuçar em gavetas e armários. Até que Punzie e eu fomos ao quarto do nosso professor.

— Debaixo da cama, Jack! — gritou ela, agachada enquanto apontava com a lanterna para onde indicava.

Me aproximei da loira, e quando vi ela havia sentado no chão com uma caixa na sua frente. Agachei ao seu lado enquanto ela abria a tampa. E o que havia ali dentro? Bem o que queríamos.

— Vocês acharam! — o resto da turma apareceu na soleira do quarto, de repente.

— Foi a Punzie quem achou — sorri à loira, que colocou tímida uma mecha de seus cabelos dourados atrás da orelha.

— Então é melhor irmos embora logo, não é? — Soluço sugeriu.

Assenti e levantei do chão, mas antes que eu ajudasse a loirinha a levantar uma voz masculina e rouca surgiu no corredor. Uma voz de dar arrepios a qualquer um que a ouvisse:

— Não tão cedo — disse a voz inconfundível — O que vocês estão fazendo aqui!? Isso é invasão domiciliar, posso chamar a policia, seus pivetes!

Todos se afastaram rapidamente da porta, juntando-se. Rapidamente escondi o livro em minhas costas. O Homem atravessou a soleira e acendeu a luz. Baixo, carrancudo e calvo. Ele usava um colete, uma calça social marrom e segurava um paletó em seus braços. Aparência única aquela diante dos meus olhos.

— Se chamar a policia terá que explicar o roubo que cometeu — revidei, tentando não demonstrar nenhum medo.

— Do que está falando garoto? Sou um homem honesto! Não roubei ninguém! — rugiu ele, jogando o paletó em sua cama.

— Tem certeza? E o livro da biblioteca? Aquele que deve contar sobre a história desta cidade?

— Eu devolvi para a srta. Bell hoje mais cedo — respondeu casualmente.

— Você devolveu um livro falso! — argumentei nervoso — estou com o verdadeiro nas mãos! — disse, mostrando-o.

O homem pareceu ficar tenso, mas tentou voltar ao seu lado casual, porém não conseguiu.

— Eu não roubei nada, seu pivete! — rugiu ele, aproximando-se de mim. O homem arrancou o livro bruscamente das minhas mãos. Primeiro achei que iria levar algum tabefe, mas o homem se afastou sem nem olhar em meus olhos — Este livro sempre foi meu! Sempre me pertenceu! Eu não roubei nada!

— Se ele é seu, por que apenas não conversou com a dona da biblioteca e relatou o seu caso? — insisti.

— Ora, você virou advogado, algum detetive? Deixe de me interrogar. Vá embora antes que eu chame seus pais ou mesmo a policia! — desta vez ele chegou com seu rosto quase colado ao meu. Seus olhos expressavam raiva, seus dentes estavam semicerrados, mas mesmo assim eu conseguia sentir seu bafo de álcool — e se vocês voltarem a por os pés aqui irão sofrer as consequências! Agora, desapareçam!


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Notas finais do capítulo

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