No Other escrita por Pacheca


Capítulo 26
Capítulo 26 - Heart Of Stone


Notas iniciais do capítulo

Eu, com minhas ideias meio depressivas .q Desculpem '-' E bem, a música do capítulo é Heart of Stone, Iko. https://www.youtube.com/watch?v=W72rJZHwWQE Boa leitura < 3



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Passamos o resto do mês estudando. Bem, eu só fazia dever mesmo. O tempo de sobra fez com que eu revivesse uma ideia.

Com um jornal que comprei falando sobre o tiroteio na praça, descobri o nome da garotinha que morrera. Foi bem na semana da amnésia. E agora, depois de ter minhas memórias de volta, com a ajuda de um guia telefônico e com alguma paciência, descobri o endereço da família da garota.

Era sábado de manhã. Peguei o celular e liguei para Duran. Estava acabando de trocar de roupa, enquanto chamava. Ele me atendeu assim que acabei de calçar os coturnos.

– Bom dia, flor do dia. – Ele suspirou. – Que merda.

– Bom dia. – Ri fraco, pegando o papel. – Duran, posso te pedir um favor?

– Até dois.

– Você me acompanha até...um lugar?

– Esse lugar ainda está na Califórnia?

– Uhum. Não é nem muito longe da minha casa. – Olhei pela janela do quarto, vendo o céu nublado.

– Onde nós vamos? – Ele perguntou, provavelmente de cenho franzido.

– Você vai?

– Deixa eu ver, você quer ir em algum lugar mas está com medo de que eu não concorde e não queira ir. Certo?

– Sou um livro aberto, que surpresa. – A vozinha irônica. – Por favor.

– Uma pista, só isso.

– É sobre o tiroteio.

Ele devia estar pensando, pelo silêncio em que ficamos por alguns segundos. Até que ele suspirou.

– Vou com você. Chego em quinze minutos. – Ele falou, desligando.

Fiquei esperando sentada na escada da entrada, com as mãos escondidas nas mangas do cardigan. Ele chegou nos quinze minutos, as mãos nos bolsos do casaco.

– Quer mesmo fazer isso. – Ele não perguntou, mas concordei. Fiquei de pé, olhando o endereço mais uma vez. – Ok, você sabe o caminho?

– Obrigada por vir. – Segurei seu braço, seguindo para a praça. De lá, teríamos que virar à direita e subir a primeira à esquerda. Bem perto.

– Sabe que estou com você. Sempre. – Ele falou, passando o braço por cima dos meus ombros e os apertando de leve.

Era realmente perto. Mesmo andando devagar, não gastamos mais que quinze minutos. Olhei o número no papel que eu trouxera no bolso. 84. Estávamos bem de frente para ela.

– Ok. – Respirei fundo. – Tudo bem.

Criei coragem e toquei a campainha. A mulher era a que eu vira no parquinho. A pele escura, com os cabelos na altura dos ombros alisados. Agora ela parecia ter envelhecido 10 anos em meses.

– Posso ajudá-la?

– Hum, você provavelmente não se lembra de mim, eu sou Megan.

– Lembro. Lembro sim. – Ela falou, os olhos tristes cravados nos meus. – Bem, entrem.

Pedi licença e entrei na casa, Duran me seguindo. No sofá da sala, uma senhora idosa assistia televisão. E aos seus pés, um bebê brincava. Desviei o olhar.

– Vocês aceitam alguma coisa? Vou fazer chá. – Concordei, seguindo-a para a cozinha. Uma mesinha de quatro lugares, a pia, o fogão e os armários. Era bem menor que a minha.

Ficamos em silêncio enquanto ela preparava o chá. Duran colocou a mão dele sobre a minha em cima da mesa. Sorri, agradecida. Quando ela nos serviu, finalmente falou.

– A grande sobrevivente está na minha casa, então. Vi no jornal o que aconteceu com você, sinto muito. Você se recuperou?

– Fiquei bem. – Respondi. – Eu...eu realmente... sinto muito. Por sua filha. Eu me lembro, de ver você chorando e chamando-a e eu penso...poderia ter sido eu. Quero dizer, eu...

Chorava. A mulher afagou minha cabeça, chorando também. Como se eu fosse sua filha.

– Não é sua culpa, querida. – Ela disse. – Sabe, eu achei que você estava morta também. E, mesmo sabendo que nunca veria minha pequena Ruth sorrir de novo, eu acreditei em Deus de novo quando vi os paramédicos te socorrerem.

– Ainda assim, Ruth era só uma garotinha. Quantos anos ela tinha? – Tentei secar minhas lágrimas, mas outras logo tomavam seu lugar.

– Seria o aniversário de 7 anos dela. – Ela sorriu. – Querida, quando eu a vi no chão, sangrando e sem dizer “mais alto, mamãe”...meu mundo desmoronou. Um dos meus maiores bens tinha partido. Para sempre.

Ela tomou um pouco do chá, tentando se controlar também. Duran tinha ido até a sala, falar com a senhora.

– Eu me joguei sobre ela e perguntei: Por que ela? Eu estava bem aqui. Poderia ter sido eu, não você. – Fungou. – Megan, a dor que eu sinto, não posso, não consigo pensar em nenhuma outra mãe passando por isso. E quando te vi caindo como se empurrassem sua cabeça, foi o que imaginei. Uma mãe recebendo um policial em casa, que falasse com uma mulher que ela perdera sua filha.

– Eu não acho que alguém ali pensava em alguém além de si. Ou na filha, no caso.

– Deve ser mal de mãe. – Ela deu uma risada. – Quando eu cheguei em casa, só no dia seguinte, para pegar documentos para o funeral...Foi quando percebi porque Ele não me levou. Porque eu ainda tenho minha mãe e Michael. Eu ainda me questiono, o motivo por Ele ter levado minha pequena. Mas consigo continuo seguir. Dia após dia.

– Quando cheguei em casa, o dia em que saí do hospital...- Comecei, sorrindo por entre o choro. – Eu não podia me lembrar nem da minha família direito. Mas quando vi os balanços do parque pela minha janela, eu me lembrei dela. E eu chorei. Eu pensei, que talvez eu não tivesse o direito de estar viva enquanto uma criança estava sendo velada.

– E como eu disse, não é sua culpa. – Ela segurou minha mão. – Só daquele monstro.

– A polícia o encontrou?

– Eles o prenderam, ainda com a arma. – Ela disse, secando o rosto. – Trás uma certa paz.

– Sim. – Respirei fundo, conseguindo me acalmar. – Me perdoe por não vir antes,senhora Jackson, é só que...

– Está tudo bem. Todas passamos por tempos difíceis. – Ela suspirou. – Fique segura de que não lhe desejo mal algum. Pelo contrário, fico grata por se preocupar por uma total estranha, e lhe desejo tudo de bom.

– Obrigada. – Ela sorriu, pegando as xícaras. Fiquei de pé, me preparando para ir embora.

– Posso te pedir algo, antes que você vá embora? – Olhei-a, vendo os olhos marejados mais uma vez. – Dois favores?

– Claro.

– Primeiro, não se esqueça da minha menininha. – Ela sorriu. – E segundo, poderia me abraçar? Só para que eu consiga sentir como seria abraçá-la depois que ela crescesse.

Voltei a chorar, abrindo os braços e concordando com a cabeça. Ela passou os braços magros ao meu redor, apertando firmemente. Abracei-a de volta, vendo Duran no vão da porta. Ele sorria fracamente.

– Obrigada, meu bem. – Ela me soltou, sorrindo. – Deus te abençoe.

– Amém. – Me despedi, secando o rosto. Ela nos levou até a porta e acenou enquanto nos afastávamos.

– Melhor? – Duran perguntou, só quando chegamos na minha casa. Sorri.

– O mundo parece pesar bem menos agora. – Dei um beijo em sua bochecha. – Obrigada por ir comigo.

– Sempre que precisar.

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Depois da visita à casa da senhora Jackson, tudo voltou ao normal. Duran trabalhando todo dia, apesar do atrito cada vez mais evidente com Kyu. Aquilo me preocupava um pouco, mas não me intrometi.

Quanto ao coreano, ele cumpriu com o prometido, apesar de um pouco atrasado. Numa quarta depois da aula, enquanto eu estava fazendo absolutamente nada em casa (literalmente, deitada olhando o teto), ele chegou com uma mochila.

– Decidiu estudar?

– Você sabe que já me formei, certo? Sou adiantado. – Ele deu de ombros. – Bem, não vim pra isso. Nem para falar de Hye- In e do bandido dela.

– O que? – Fechei a porta, assustada.

– De novo, não vim para isso. – Ele deixou a mochila sobre a bancada na cozinha.

– Veio para quê, então? – Cruzei os braços, me sentando.

– Você, minha querida, vai me ajudar.

– Com o quê? – Continuava sem entender nada, olhando enquanto ele tirava uma sacola de compras da mochila.

– Bem, primeiro de tudo, vou precisar da sua casa emprestada por algumas horas. A casa do Kyle é cheia de empregados e...bem, eu sou um também, mas...

– Eu entendi, continua. – Revirei os olhos.

– Bem, é. Sua casa, já que vai ser a vazia. Sua mãe vai ficar com Kyle até mais tarde, e Elijah quase não dorme aqui, então...

– Por que a casa precisa estar vazia? O que você quer?

– Nada. Só um jantar calmo com minha namorada. Futuramente, oficial. – Continuei séria.

– Posso me esconder no meu quarto.

– Hum, ok. – Ele parecia desapontado.

– O que? Não é bom? – Apoiei meu rosto na mão, o cotovelo escorregando pela bancada.

– Não, só achei que talvez você ficasse entediada. Só isso.

– Claro. – Concordei, a cara de quem não estava levando nada que ele dizia a sério. – Ok, vou para o Duran. Tudo bem. Só isso?

– Não, você vai me ajudar na cozinha. – Ele sorriu, tentando me convencer.

– Sabe que odeio cozinha, né? – Falei, séria de novo.

– Eu sei, mas por favor. Você pode não gostar, mas pelo menos leva algum jeito. Só sei fazer lámen.

– Você é uma negação, hein? – Suspirando. – Ok, eu te ajudo com uma condição.

– Que seria?

– Vai me ensinar coreano. Incluindo hangeul. – Ergui um dedo. Ele sorriu.

– Só isso? É fácil. – Ele sorriu, me dando um abraço. – Obrigado.

– Qual o prato? – Ele sorriu mais ainda e pegou uma folha na sacola de compras.

– Sopa de macarrão coreana. Tenho a receita de cabeça, só não sei executá-la.

– Ligue o rádio. – Peguei a folha, indo lavar as mãos. Ele me agradeceu em coreano, aumentando o volume de Lonely Boy do The Black Keys.

A tal sopa de macarrão coreana se provou bem fácil. Era macarrão servido com caldo e vegetais juntos. Kyu tinha conseguido o tal de kimchi de que ele sempre falava, uma iguaria apimentada que acompanha todo prato coreano. Todo.

– Sentia mesmo falta disso? – Falei, depois de provar um pouco. – Arde mesmo.

– É, senti falta disso. É costume. – Ele comeu um tanto, experimentando a sopa também. – Oh, isso ficou muito bom.

– Sim, e agora me deve um curso gratuito. – Falei, tomando um pouco de água.

– Posso tomar banho no seu chuveiro? – Ele falou, tampando a sopa e deixando terminar de cozinhar.

– O da direita é a água quente. – Dei de ombros, arrumando a cozinha. – Pode pegar as coisas do Elijah.

– É, eu esqueci tudo, fora a roupa e minha escova de dente. – Ele riu. – Valeu.

– Vai logo.Tem toalha no armário do banheiro. – Ele subiu a escada correndo, batendo minha porta. Acho que foi sem querer, porque ele abriu a porta de novo e pediu desculpa.

Ali me mandou uma mensagem enquanto eu limpava a bancada e olhava a sopa. Cantarolava New Sensation, do INXS, enquanto lia a mensagem.

“Pq o Kyu me disse pra ir pra sua casa agora?”

“Pq sim”

“Megs, é sério.”

“Eu não sei, fofa.Ele me pediu a casa. Só vem.”

“Daqui a pouco eu descubro então.”

“Te vejo logo.”

Deixei o celular sobre a bancada e desliguei o fogão, mexendo a sopa mais um pouco. Fiquei esperando Kyu terminar de se arrumar sentada no sofá.

Subi para meu quarto, batendo na porta de entrar. Não queria correr o risco de achar Kyu de toalha ou sem nada. Ele abriu a porta para mim, afivelando o cinto. Ele se sentou na cama para calçar os sapatos.

– Ali disse que já estava vindo. – Falei, prestando atenção em suas costas. – O que é isso nas suas costas?

– O que? – Ele levou até as marcas horizontais em suas costas, sorrindo. – Isso é estria. O que sobrou da época que eu era gordo.

– Você era gordo? – Falei, surpresa.

– Por que a surpresa?

– Que você fez para ficar gos... – Quase falei gostoso, mas achei melhor não. Já tive problemas demais com Ali. – Desse jeito?

– Dieta e exercício. – Ele deu de ombros. – Mas dá pra ver pelas minhas bochechas que eu era gordo.

– Pelas coxas eu até acredito. – Falei, me deitando, atrás dele.

– Isso é muito impróprio, Megan. – Ele falou num tom de bronca, mas sorrindo.

– Acaba ai de se arrumar, anda. Deixei a sopa tampada pra não esfriar, ok? – Apertei uma bochecha dele. – Não faça nada de errado na minha casa. Pelo menos, não no meu quarto.

– Megs. – Ele ficou com vergonha. Revirei os olhos e o soltei.

– Quando terminar me avisa, vou estar no Duran.

– Ok. – Ele sorriu, vestindo a camisa. – Obrigado.

– Ei, Kyu. Vocês tem se dado bem?

– Mais ou menos. – Ele deu de ombros. – Ele me olha estranho.

– Hum. Quer que eu descubra o por quê?

– Se você quiser... – Ele deu de ombros.

– Te vejo depois. – Dei um abraço nele e peguei uma jaqueta. Desci as escadas e peguei meu celular na cozinha, colocando os fones. Assim que abri a porta para sair, Ali ia tocar a campainha.

– Aproveite a noite, Ali. – Falei, passando por ela. Ignorei os chamados dela enquanto dava play em Gotta Be You, do 2NE1.

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Toquei a campainha, cruzando os braços. Minhas costas tinham começado a doer depois que passei pelo parquinho. Lara disse que era só meu subconsciente reagindo às más memórias. Logo o trauma passaria.

Duran abriu a porta, tentando arrumar os cabelos bagunçados. Ele ficava lindo daquele jeito. Principalmente sem camisa, como estava. Sorri.

– Ei.

– Oi. – Ganhei um beijo antes de entrar na casa. – Se você tivesse avisado que vinha dava para esconder a bagunça.

– Sempre é bom ver que você trabalha duro. – A mesa da sala cheia de livros, cadernos da escola, e papéis da empresa provavam que ele estivera ocupado. Além da garrafa de coca-cola ao pé da mesa.

– Aquela coisa realmente deixa bem aceso. – Ela apontou para o refrigerante. – Vou dar uma overdose.

– Pode terminar de trabalhar. – Ele negou com a cabeça, me levando pro quarto. – Eu só não queria ficar de vela lá em casa.

– De vela?

– Kyu pediu minha casa emprestada. – Ele franziu o cenho, como se não gostasse da ideia. – Que foi?

– Não, nada. Ele te expulsou de casa?

– Não. Eu quem dei a ideia de vir pra cá. No que diz respeito a namoro, eu realmente prefiro o nosso.

– Sorte minha, não? – Ele se sentou na cama, me puxando junto. Aquilo fez minhas costas doerem. – O que foi?

– Dor nas costas. Vai passar.

– Tem remédio no banheiro, eu posso buscar. – Ele até fez menção de se levantar, mas o segurei.

– Não precisa, é psicológico. Acontece toda vez que eu passo pelo parquinho.

– Ah. – Ele voltou a ficar daquele jeito, culpando-se. Fiz ele se deitar, me deitando logo ao seu lado.

– Deitar melhora. – Sorri. – Melhor.

– Ok, se você diz... – Ele me abraçou. – Posso te perguntar uma coisa?

– Até duas.

– Por que Kyu foi pra sua casa? Quero dizer, antes. O dia em que ele chegou correndo, na semana da suspensão.

– Hum, eu não sei se eu posso te falar. Mas por que?

– É só que, desde aquele dia, parece que ele anda fugindo de alguma coisa. Sei lá, é estranho. – Ele pensou um instante. – Quase todo dia, perto do prédio, tem um Volvo preto. E eu fiquei...curioso.

– E você conseguiu se aproximar?

– Não. A gente mal conversa no escritório e...não sei, ele parece ver algo de estranho em mim.

– Ele acha que você o olha estranho. Pode ser isso.

– Eu olho estranho pra ele? – Ele pareceu chocado. – Bem, até pode ser verdade. Mas é sem querer.

– Por que faria isso?

– Sem querer. Eu começo a pensar que ele já te viu de toalha, e que você acha ele gostoso e fofo e bonito.

– Você é retardado. – Respondei, revirando os olhos. – Eu até acho a personalidade de vocês parecida. Não é igual, mas parecida. Ele é mais fofo, você é mais descontraído. E mais bonito.

– Quanto amor, gente.

– Que gay, meu Deus. – Ele riu. – Você também me ama.

A dor nas minhas costas começava a passar. Duran pegou alguns biscoitos pra gente na cozinha. Ficamos conversando, até cairmos num assunto meio constrangedor.

– Por que você deve ser o menino mais pegador do mundo, hein? – Falei, depois que ele pegou o último biscoito alegando que não precisava da ajuda da sorte para se casar.

– É, pode-se dizer que sim. – Ele deu de ombros. – Antes de começarmos a namorar, lógico.

– Sério? Quantas?

– De verdade? Hum, umas... – Ele pensou. – Meu primeiro beijo foi aos treze com uma colega de turma. Depois disso foram mais três. Sem te colocar na soma.

– Sou sua quinta?

– É. Qual a minha posição?

– Hum... – Ele me olhava, esperando a resposta. – Primeiro.

– Eu sou o mais importante? – Ele sorriu. – Porque você também é a primeira, nesse caso.

– Não, você é o único. Tipo, eu nunca fiquei com ninguém antes. – Minha voz foi diminuindo de tom, enquanto eu corava. Ele riu. – Valeu.

Fiz menção de me levantar para ir embora, mas ele correu e me segurou, ainda rindo.

– Estou rindo porque é fofo. – Fui puxada até a cama de novo. – Desculpa, não quis rir.

– Ok.

– É sério, não fica brava. Não tem motivo. – Ele me virou de frente pra ele. – Você é minha primeira namorada também.

– Super igual. – Sorri, sarcástica.

– E daí que eu sou seu primeiro cara? – Ele segurou meu rosto, me beijando. – Posso ser o segundo, o terceiro, o que você quiser.

– Agora sério, quatro?

– Ah, já disse que você é a mais importante. – Ele me deu mais um beijo. – E nenhuma delas era tão maravilhosa quanto você.

– Puxa saco. – Falei, abraçando-o.

Quase duas horas já tinham se passado desde que saí de casa. Me assustei com a voz de alguém na porta, mas Duran só riu.

– Fala, pai? – Meu professor de artes e música, ótimo.

– Arrume a sala, por favor. – Como vai, Megs?

– Tudo bem, senhor Dobscha? – Dei um sorriso sem graça.

– Aqui em casa eu sou Albert, querida. Relaxe. – Sorriu para mim. – Duran, vai.

Ele ficou de pé, passando pelo pai com pressa. O meu professor o olhava enquanto ele juntava as coisas da mesa. Fiquei olhando para o chão enquanto isso.

– Lembra que te disse sobre um festival anual de música? – Ele perguntou, escorado no portal. – Que eu falei sobre te colocar no sax?

– É sério isso? E espera, achei que fosse no fim do ano. – Comentei, ele rindo.

– Então você se lembra. E sim, é no fim do ano, mas temos que começar a ensaiar logo. – Ele colocou as mãos nos bolsos.

– Estou dentro? – Perguntei.

– É melhor começar a desenferrujar. – Ele sorriu. Duran voltou, carregando a mochila entreaberta. – Duran.

O que ele falou com o filho em seguida eu não consegui ouvir. Mas pela cara que Duran fez, não devia ser bom. Albert pediu licença e nos deixou sozinhos.

– O que foi? – Perguntei, baixinho.

– Deixa quieto. – Ele deixou a mochila num canto do quarto e deu de ombros.

– Por que você está bravo?

– Não estou. – Tentei ficar de pé, mas ele me prendeu na cama. – Quer mesmo saber? Ele disse, que era pra eu avisá-lo da próxima vez que eu trouxesse você pra cá de noite...Para fazer certas coisas...

Ele tinha me prendido debaixo dele, rindo da minha cara de pastel. Corei.

– Sempre é bom saber que seu professor acha que você sai dando por ai. – Falei, sem graça. Ele riu.

– Não é por ai, escrachada. – Ele me beijou, descendo pro meu pescoço. – E vamos chegar lá algum dia, não?

– Hum...Vamos discutir agora?

– Acho que não. – Ele riu, me soltando. – E meu pai realmente não liga. Quero dizer, ele nem pode. Ele engravidou minha mãe antes deles namorarem.

– Meu Deus. – Me sentei, Duran se deitando ao meu lado. Peguei meu celular, assustada ao ver que eu não tinha percebido que já recebera várias mensagens e ligações.

– E ai? Na sua casa ainda? – Duran perguntou, olhando o visor.

“Ali já saiu, só vou arrumar sua cozinha.”

“Megs, cadê você?” Aquelas duas já tinham mais de meia hora.

“MEGAN STONE, RETARDADA, ME RESPONDE! EU JÁ TO AQUI BERRANDO SOZINHO EM COREANO.”

– Gritando em coreano? – Duran perguntou, rindo.

– Ele sempre faz quando fica nervoso. – Respondi, digitando uma mensagem para Kyu.

“Desculpa, distraída ,q Já foi embora?”

Olhei a ligação que tinha recebido, enquanto ele não me respondia. Shaun. Tinha uma mensagem de voz dele também. Franzi o cenho.

– Que foi? – Duran perguntou, se sentando também.

– Um minuto. – Kyu respondeu.

“Não. Nem você devia vir pra cá. Megs, não vem.”

“Que foi?”

“Hye-In. Fica quietinha ai com o Duran. Por favor”

“Ok, ok”

– Megs, está me preocupando. – Duran comentou. Minha cara não devia ser das melhores.

– Kyu me pediu pra esperar mais um pouco.

– Ainda? Já são 10 da noite.

– É outra coisa. – Não conseguia prestar atenção, checando a mensagem de voz de Shaun.

“Droga, Megs, responde.” A voz dele estava trêmula. “Por favor.”

Retornei a ligação, preocupada. Duran ainda me olhava, os olhos azuis curiosos. Shaun atendeu quase imediatamente.

– Megs. Oh. Graças a Deus. – Agora parecia que ele chorava. Shaun chorando?

– O que foi, Shaun?

– Eu preciso...de ajuda. – Ele murmurou, respirando fundo. – Megs. Eu acho que acabo de matar alguém.

Não pude evitar arregalar os olhos, chocada. Fiquei de pé, mantendo-o na linha.

– Ok, onde está você? – Falei, calçando meus coturnos de novo.

– Casa. Vem rápido.

– Chego ai rapidinho. – Desliguei, me virando para Duran. – Como chego na casa do Shaun daqui.

– Até a catedral, depois vira à direita. – Ele falou, me seguindo até a saída. – O que houve?

– Te falo amanhã. – Ele me segurou. – Droga, Duran, é sério. Alguma coisa ruim.

– Não vou te deixar sozinha à essa hora.

– Talvez eu precise da sua ajuda, mas daqui. Da sua casa. – Me soltei. – Vou ficar bem. No dia que fui baleada, eu senti algo ruim antes, estranho. Se me sentir assim de novo, eu te ligo. Mas fica aqui, por favor.

– Ok. – Ele concordou, relutante. – Me liga chegando lá.

Sai correndo da casa, subindo o morro para a catedral. Quando cheguei até a construção, já estava ofegante. Olhei para a porta, esperando ver as correntes que normalmente prendiam as grades. Mas elas estavam abertas.

Senti um calafrio. Voltei a correr, depois de ter a visão de uma pequena parte da nave, iluminada pela lua cheia. Parecia aterrorizante, mesmo sendo uma igreja.

Achei a casa de Shaun. Passei direto pelo quintal, indo para os fundos. Pisquei com os faróis do carro no meu rosto. Shaun carregava alguém para fora do carro, parecendo molhado.

– Minha nossa. – Falei, correndo para seu lado. Ele largou o garoto sobre a grama. Era um dos meninos da escola, Bartle, pra ser mais exata. Ele era um grandão que conversava comigo durante as aulas de educação física.

– Megs. – Ele chorava, mesmo. Shaun estava um caco. – Megs, me ajuda.

– O que você fez? Shaun, o que houve? – Reformulei a pergunta, ainda assustada.

– Por favor, me ajuda.

– Calma. Me responde.

– Calma? Calma? Como quer que eu fique calmo? – Ele começou a gritar. – BARTLE ESTÁ MORRENDO.

– Não morreu ainda? – Com pressa e dedos trêmulos, peguei meu celular e liguei para uma ambulância. Depois de passar todos os dados, desliguei. Me ajoelhei perto do garoto, mal respirando.

– O que eu fiz? – Shaun murmurava. Aproveitei e liguei para Duran.

– O que houve? – Ele perguntou, preocupado.

– Du, ligue para a polícia, por favor.

– Polícia? – Ele perguntou, chocado.

– É, aconteceu um acidente na casa de Shaun. Faz esse favor.

– O que houve? Foi com ele? – Neguei brevemente e pedi de novo.

– Por favor. – Ele concordou. Desliguei, segurando o ombro trêmulo de Shaun.

– Meu pai ajudava esse cara e o irmão dele. Os pais deles não tinham condições para sustentar os dois. – Ele suspirou. – Estou ferrado. E chamou a polícia.

– Shaun, calma. Toda ajuda é bem vinda. Certo? – Ele concordou, tremendo. – Ele não vai morrer. Mas o que aconteceu?

– Eu tinha ido até uma cidade vizinha, falar com uma tia. – Ele começou. – Eu estava na rodovia voltando para casa e achei Bartle feito um zumbi andando no acostamento. Quando parei e fui atrás dele, ele fugiu pra dentro daquela floresta.

“Achei-o perto do rio. E, de repente, ele começou a berrar comigo e a tentar me bater. Ele estava drogado. Eu não queria brigar, mas tive que me defender. Mas ele ainda nos empurrou pra dentro do rio. E não me preocupei em salvá-lo, eu só sai. Quando percebi, ele não estava se movendo.”

– E me liga, dizendo que matou alguém? – Dei um tapa nele. – Eu imaginei que você tinha atirado em alguém ou algo assim. Seu imbecil.

Dei alguns tapas no braço dele, chorando aliviada. Mas ele continuava preocupado.

– Megs, omissão de socorro. Isso da cadeia.

– Vamos conversar com os policiais, explicar tudo. – Empurrei seu ombro mais uma vez. – Da próxima vez que você me assustar assim, quem vai sair numa ambulância vai ser você.

– A ambulância chegou, falando nisso. – Podíamos ouvir as sirenes. Shaun carregou Bartle até o gramado da frente, secando o rosto antes. Fui atrás dele, vendo os paramédicos trabalhando.

Eles foram com Bartle para o hospital. Shaun disse que tinha que fazer algumas ligações antes de acompanhá-lo. Os policias, que chegaram logo depois do socorro, disseram que estariam no hospital durante a tarde.

– Nunca pensei que Bartle fosse...quero dizer, ele me parecia tão tranquilo.

– Ele começou depois que a irmãzinha morreu. – Pensei na garotinha baleada, mas sabia que não devia ser ela. – Ela caiu de uma janela do sétimo andar, depois que ele se distraiu.

– Deus. – Falei.

– Desculpe pelo susto.

– Tudo bem. – Olhei o vulto da catedral. Sabia que tinha mentido para Shaun quando disse que Bartle não ia morrer. Não tinha certeza, mas duvidava que ele tivesse muita chance. – Tenho que ir. Te encontro amanhã no hospital.

– Vai comigo? – Ele perguntou, respirando fundo.

– Os policias vão estar lá. – Avisei.

– Te levo para casa.

– Fica. – Falei. Kyu já me avisara que eu podia ir embora. – Você não está em condição alguma de dirigir.

– Liga quando chegar. – Concordei, abraçando-o. – Valeu.

– Qualquer hora. – Deixei a casa, braços cruzados. Duran me ligou.

– E ai?

– Te conto amanhã. Obrigada pela ajuda.

– Sei que só fez isso para justificar eu não ter ido. – Sorri fraco. – Amanhã você me explica.

– Já estou indo para casa, te ligo chegando lá. – Ele concordou. Desliguei, respirando fundo. Parei de novo na frente da catedral. Dei play numa música triste, igual meu espírito. Bartle...

Fui chorando para casa, a música repetindo-se.


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Notas finais do capítulo

E bem, eu me surpreendendo com meus dons quando começo a chorar lendo o que escrevi ;-; Até mais :3



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