A História da Grand Chase escrita por Thugles


Capítulo 20
Caminho Secreto




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—Socorro! — Arme gritava em pânico — Elesis! Socorro!

Arme segurava-se com uma só mão numa saliência da rocha, no meio da parede de pedra. Estava pendurada a pelo menos dez metros; abaixo dela havia uma pilha de escombros, as pedras que tinham caído enterrando consigo os drillmons. Alguns sobreviveram, mas poucos; esses deram meia-volta e fugiram para longe. Elesis debruçou-se no parapeito.

—Elesis! Me ajude!

—Calma aí, segure firme — Elesis respondeu, sem pânico na voz, querendo que Arme mantivesse a calma. Gritou por Ryan, e quando ele não respondeu, olhou em volta. O elfo não estava em lugar nenhum. Ela se lembrou de tê-lo ouvido gritar, momentos antes... Um arrepio de horror percorreu a espinha da garota. Tudo isso foi idéia sua, Elesis. Lire estava enterrada em algum lugar lá embaixo, e Ryan não estava ali, devia ter caído também. Arme... Ela cairia também, Elesis não tinha dúvidas. A garota nunca conseguiria segurar por muito tempo.

—Você não pode subir com a magia? Criar uma prancha de terra, ou algo assim, um elevador de pedra, e subir por ele?

—Socorro! — Arme respondeu — Elesis! Elesis!

—Aguenta mais um pouco — ela pediu, tentando se sobressair aos gritos da menina — Não é uma queda muito longa — Era sim. Se Arme soltasse aquela pedra, seria arrebentada pelas rochas lá embaixo. Elesis não tinha uma corda, nem nada que pudesse estender para agarrá-la, a garota estava longe demais para que a alcançasse. Arme suplicava, aos berros, por ajuda. Elesis estendeu a mão, para que ela visse que queria ajudar, mas... o que poderia fazer?

Arme gritou quando algo agarrou o pulso dela, e soltou a mão da rocha. Ficou pendurada - uma coisa disforme a segurava, um lobo atarracado que segurava-se como um macaco. Ele jogou a garota sobre um ombro, desceu e a colocou seguramente no chão lá embaixo.

É Ryan, Elesis se deu conta. O coração dela martelava de alívio enquanto o elfo galgava a montanha, saltando de uma saliência à outra. Quando chegou lá em cima, virou-se para que Elesis subisse em suas costas e desceu com ela. Lá embaixo, Arme estava em pé, recostada a uma rocha, os grandes olhos arregalados, apavorada.

—Tudo bem? — Elesis pôs uma mão no ombro dela. Sentia-a se sacudir, e a respiração da garota ainda estava arquejante com o susto, mas conseguiu formular algumas palavras.

—Estou... Acho que sim... Conseguimos... não foi? Estou tão... nossa, acho que vou desmaiar.

—Não vai não. Vai passar, você vai ver — Elesis viu um rasgo raso na pele do rosto de Arme, onde ela raspara na montanha. Ela sentiria a dor depois, quando a situação se acalmasse. Ryan saltou habilmente para o chão. Arme respirou fundo.

—Alguém... alguém me trouxe pro chão, alguma coisa grande, parecia um... sei lá...

—Fui eu — Ryan disse — Era minha forma de lobo. Não precisa me agradecer — Elesis viu um lampejo irado quando o elfo olhou para ela. Foi idéia sua, ele parecia dizer. A garota sustentou o olhar.

—Os drillmons fugiram — Arme sorriu —Elesis, foi uma... idéia genial! Ah, não faz essa cara! Foi ótima sim! Esmagamos um montão deles, quer dizer, eu esmaguei, né, mas a idéia foi...

—E a Lire? — Elesis fechou um punho, repentinamente zangada — Esmagar ela foi uma idéia genial também?

Arme franziu o cenho. E então...

—Deusas, a Lire! — a cor sumiu do rosto dela — Ah não. Não fala isso, Elesis, ela ainda pode... pode estar aqui, em algum lugar.

—Onde? — Elesis quase gritou — Arme, tem pedra aqui pra enterrar uma multidão. Você e eu vimos a Lire correndo. Como ela pode ter escapado?

Arme se encolheu diante do tom dela, fungou, e escorregou para o chão. As lágrimas vieram numa torrente. Arme chorou tão alto que os drillmons fugitivos certamente a escutariam, mas Elesis nem sequer olhou feio pra ela. A pobre garota viveria o resto da vida sabendo que tinha enterrado uma companheira. A própria Elesis sentia-se péssima. É pior do que com as harpias. Ryan sentou-se ao lado da maga, tentando consolá-la.

Claro que Elesis não admitiu fácil que Lire havia morrido. Ela tinha lido histórias com situações como essa: quando um amigo parecia ter morrido, ele surgia milagrosamente vivo e ileso, e foi com base nessa crença que ela procurou. Procurou entre as pedras, levantou as que podia e desenterrou drillmons despedaçados, mas não viu sinal da garota. Significa que ela escapou, dizia para si mesma. Se eu não achar o corpo da Lire aqui, é porque ela está viva e conseguiu fugir. Além da parede de pedra e dos escombros, não havia mais nada, só um vazio cheio de nada. Mas, também, se a arqueira tivesse escapado, teria aparecido. Depois de duas horas de busca, foi forçada a retornar. Arme ainda estava sentada, com Ryan ao seu lado. Ambos olharam para ela, mas a menina sacudiu a cabeça - Arme tornou a baixar a dela. O coração da espadachim estava pesado. Ryan não tinha conhecido Lire por muito tempo, mas ele também não estava feliz.

Elesis era do tipo que precisava ver para crer, mas sentia-se mal, muito mal. Seria possível que a arqueira tivesse escapado? Duas horas tinham se passado. Lire teria retornado em busca deles, a menos que tivesse sido pega no desabamento.

—Vamos embora — Elesis chamou, por fim — Lire morreu como uma guerreira, lutando pela nossa missão — ao dizer isso, Arme olhou para ela. O rosto da maga parecia uma fruta podre; inchado, molhado e roxo de chorar.

—Elesis, eu enterrei ela. Foi culpa minha, eu...

—A idéia foi minha. Você só fez o que eu mandei você fazer. Cazeaje ainda está por aí, pensando em como nos destruir — seu pai a prevenira daquilo, há muito tempo. “Às vezes, Elesis, um companheiro que estimamos muito pode não voltar de numa missão. No começo, vai ser difícil continuar sem ele, mas você precisa.”. Elesis sempre dissera a si mesma que isso jamais aconteceria — Lire era uma elfa. O espírito dela ainda estará conosco, e não pode ser morto...

—Isso não é verd... sim, você está certa — Ryan se atrapalhou, compreendendo o que ela queria. Elesis não sabia se era verdade o que estava falando, mas achou que consolaria a maga. Arme franziu o nariz, ameaçando chorar mais uma vez, mas era mais forte do que parecia. Levantou-se e enxugou as lágrimas. Outras voltaram a cair, mas ela não se importou.

—Em Serdin nós enterramos os combatentes que morrem, em túmulos de honra.

—Em Canaban também — Elesis assentiu — Vamos procurar o corpo. É o mínimo que podemos fazer por ela.

Arme não podia ajudar a mover as pedras com magia, e muito menos com a força bruta, mas Elesis era forte o bastante para ambas. Em poucos minutos de busca, Arme vomitou. Os restos dos drillmons enterrados não eram bonitos de se ver, e o calor estava assando os corpos. O cheiro ficava pior a cada minuto, mas a busca não dava resultados.

—Sabe, agora que estou pensando, ela pode ter escapado — Ryan falou de cima de uma grande pedra — Um dos drillmons pode tê-la capturado antes do penhasco cair, e então levado ela quando fugiram.

Arme imediatamente levantou a cabeça.

—Será? — perguntou, esperançosa.

—Não é impossível. Sabe, eu consigo sentir o espírito dos animais e as almas dos seres da natureza. Lire é uma elfa de Eryuell, não pode haver uma criatura mais pura do que ela. E eu não sinto nada — ele afastou as mãos — Não consigo senti-la aqui.

O coração de Arme martelou no peito.

—Caramba... Eu li sobre isso! Elfos são capazes de sentir essa presença! Você tem certeza que ela não está aqui? Não sente nada?

—Com toda certeza — e ele não estava brincando. Mas...

Elesis soltou um suspiro.

—O quê? — Arme perguntou. Ela estava atrás de algumas rochas.

—Venham ver.

Ryan foi o primeiro a chegar. Arme escalou algumas pedras... e viu o primeiro pedaço da arqueira no chão.

Era o arco dela. Estava quebrado e esmagado, sem a corda e jogado no chão. Ryan o pegou delicadamente, mas a peça se desfez em suas mãos.

—Elesis...

—Por todo o pouco tempo que conheci a Lire — Elesis começou devagar — Nunca a vi ficar longe do arco, nem mesmo para dormir. Ela não teria jogado o arco fora, isso não faria ela correr mais rápido. Olhem esse lugar. É a quase cinco metros da parede — os três olharam para o penhasco. Se Lire tinha estado naquele exato local, seria impossível ela ter corrido para longe a tempo. Havia pedras em um raio de pelo menos vinte metros.

Arme andou sem dizer nada, como se estivesse em transe, obviamente chocada. Elesis agarrou o elfo pela gola.

—Aquilo que você disse sobre sentir espíritos — Elesis falava baixinho, mas forte — Não foi só pra consolar a Arme, não é? Porque me convenceu também, e eu acreditei que ela podia estar viva. É bom não ter mentido. Você poderia sentir a Lire se ela estivesse enterrada aqui?

—Há vários fatores — Ryan respondeu ainda mais baixo — Se tiver magia bloqueando o espírito, eu não conseguiria sentir, mas a Lire não é maga. As pedras poderiam estar bloqueando, se este for algum solo mágico, por exemplo.

Os olhos da garota faiscaram.

Se este for um solo mágico? Aqui é o Vale do Juramento, onde Serdin e Canaban dividiram suas fronteiras séculos atrás! Isso não parece mágico pra você?

—Se puder parar de me sufocar, talvez queira dar uma olhada na Arme...

A garota estava encarando uma pedra com seus profundos olhos escuros. Elesis se aproximou e falou com ela, mas Arme não pareceu ouvir.

—Arme — ela chamou, mais alto — O que está fazendo?

—Parece... familiar — Arme disse vagamente. Estendeu a mão sobre a pedra. A rocha estremeceu, rachou, Elesis se sobressaltou e a pedra se quebrou, virando areia.

Os escombros tinham formado ali uma pequena gruta. E agachada lá dentro, no meio de um domo de vidro roxo, segurando um cetro na mão, estava... Lire.

A arqueira estreitou os olhos por causa da luz. Ryan pulou para o chão para ver de perto. Lire saiu, confusa, piscando os olhos. Arme ficou olhando para ela, sem reação, depois a abraçou com todas as suas forças, e chorou. Lire afagou a cabeça dela, sorrindo fracamente.

Elesis estava boquiaberta.

—Mas... mas...

O nicho onde Lire tinha estado era formado pelos escombros. Era como se, ao cair, as pedras tivessem formado uma cabana bem em cima da arqueira, protegendo-a do restante. Elesis não podia entender como aquilo tinha acontecido. Quando Arme se acalmou o bastante para recuar, suspirou, como se um grande peso tivesse saído de cima dela.

—O meu cetro — Arme estava maravilhada — Mas como? Foi você que pegou?

—Eu... não sei — a arqueira ergueu as sobrancelhas, olhando a varinha na mão como se a visse pela primeira vez — Ainda não estou entendendo bem...

—Vamos ver isso depois. A Lire está viva, e isso é tudo o que importa — Elesis declarou — Vamos sair deste lugar.

Ryan voltou a subir o penhasco para pegar os equipamentos, as mochilas e o pote de Arme. Foram na direção que Lire tinha ido ao espionar as criaturas. Não encontraram nenhuma criatura, mas viram seus rastros - tinham se espalhado pelo deserto na fuga, e com sorte não tornariam a encontrá-los. A caminhada durou horas, mas com Lire de volta ao grupo ela pareceu muito mais curta. Arme estava radiante - agora sim, podia se gabar de ter destruído todos aqueles drillmons, mas ainda não era tempo de pararem pra conversar. Passaram por pedras espalhadas aleatoriamente, como os brinquedos solitários de um gigante.

—Era aqui que eles estavam — Lire disse.

Bem lá atrás, podiam ver a borda do penhasco semidestruído onde tinham ficado. À frente delas abria-se um enorme abertura na rocha, descendo em diagonal como uma rampa, circular como se tivesse sido cavada por uma cobra gigante. Os quatro pareciam minúsculos perto daquele buraco.

Pararam atrás de um grupamento de pedras, em cima de uma rocha grande que oferecia alguma proteção caso inimigos viessem correndo. Elesis precisou ajudar Arme a subir. Comeram juntos o pouco que tinham: pão, frutas e um pouco de pasta de amora que pegaram no acampamento de Ronan. Elesis e Arme acharam pouco satisfatório - comiam carne todos os dias antes da Grand Chase, principalmente a espadachim, que achava que aquela pouca comida não lhe daria as fibras que seu corpo precisava. Ficaram com a sensação de que algo estava faltando.

—Então era nisso que os drillmons estavam trabalhando — Ryan comentou.

Lire fitou o buraco.

—Pode ser que tenha algum minério secreto lá embaixo. Pra fazer armas, ou vender e conseguir dinheiro.

—Cazeaje vendendo coisas pra ficar rica? — Elesis riu — É mais provável que sejam as armas. Podem estar minerando ferro pra fazer aço.

—Mas não tem carrinhos pra eles carregarem o minério — Arme protestou — Nem... aquele pozinho metálico que fica, devia ter um monte espalhado por aí. E o buraco parece só um buraco comum. Se tivesse ferro aí, ele não deveria brilhar com o sol?

—Você não vê o ferro na borda do buraco porque eles tiraram pra fazer armas, cabeçuda — Elesis retrucou.

—Ah, sei lá. Quem se importa com o que os drillmons estavam fazendo? Matei todos — Arme sorriu presunçosa — Mas, Lire! Como foi que você conseguiu escapar? Você levou meu cetro... e eu pensando que foi a Elesis!

—Bom — Lire começou — Eu também não sei direito como foi que tudo aconteceu. Horas depois de eu partir, encontrei seu cetro preso à minha roupa. Quando fui pegar, ele caiu e chamou atenção de todos os drillmons, e eu corri. Minha intenção era escalar aquele precipício, pois as criaturas eram pesadas demais e eu achava que não iriam conseguir. Quando a montanha ruiu, eu tentei correr, mas o cetro me prendeu onde eu estava. Vi uma luz roxa em volta de mim, depois um barulho imenso, eram as rochas caindo. Então tudo ficou escuro. — ela terminou — Acho que seu cetro criou uma concha protetora à minha volta. A sua magia me salvou — ela sorriu para a maga.

—Então eu derrotei centenas de criaturas do mal, e ainda salvei você — Arme se jubilou — Embora eu não tivesse pensado nisso. Foi a Elesis quem teve a idéia, ela que salvou o dia.

A espadachim fingiu indiferença.

—Humpf. Qualquer um teria pensado naquilo.

Minutos depois, Ryan espreguiçou-se e ficou de pé.

—Vamos ver qual é a desse buraco — sugeriu.

A abertura descia sempre para baixo e para frente, na direção do Vale do Juramento. Formava uma descida íngreme demais para conseguirem andar livremente, longo como um túnel. Elesis conseguiu colocar os dois pés e entrar, mas não tinha muito equilíbrio.

—E agora? Continuamos ou vemos o que tem lá dentro?

—Acho que nossa missão nos manda seguir — Ryan falou sem convicção.

—E se esse "seguir" for nesse buraco? — Arme ajuntou — Eles estavam tramando alguma coisa aí. Como não tem carros nem provas de que estavam tirando ferro daqui, e se o ferro estiver escondido lá embaixo? Ou podem estar criando algum monstro.

—É mesmo. Em todas as outras vezes, havia um monstro maior e mais poderoso do que todos os outros: o Ente Antigo, o Lorde Oak, o Gorgos Vermelho — Elesis assentiu — Por exemplo, um drillmon gigante e... preto, com armadura, por exemplo. Não vimos nada desse tipo, só drillmons comuns. Se ele está lá dentro, precisamos matá-lo.

—Não é necessário — Lire esclareceu — Havia um drillmon diferente, maior que todos os outros. Era, com toda a certeza, o líder. Ele também veio atrás de mim e foi soterrado lá atrás, eu... não sei explicar muito bem, mas um elfo é capaz de sentir quando algo está morto. O espírito desse drillmon líder era maligno, como o do Lorde Oak, mas já se foi.

Elesis não concordava inteiramente.

—Mas ainda há os outros. Eles estão por aí, talvez pensando em se reorganizar. Precisamos caçá-los.

—Não é preciso — Lire tornou a dizer — Elesis, apenas o líder deles é importante. Você lembra dos oaks? Somente o maior foi corrompido pela Cazeaje. Acho que os drillmons nunca foram maus, só estavam seguindo ordens do maior e mais forte, o que era aliado da Cazeaje.

Arme engoliu em seco. Agora seu triunfo já não parecia tão grande assim.

—Isso é ótimo — Elesis declarou — Só falta decidir o que vamos fazer.

—Podíamos procurar o Ronan — Lire sugeriu — Ele precisa saber que cuidamos das coisas aqui.

Elesis negou com a cabeça.

—Acho muito difícil. Aqui não é a floresta onde podemos nos orientar, nunca vamos achá-lo no meio de todo esse deserto. Podemos seguir pra Canaban — ela pensou um pouco. Seria bom ver sua velha casa com os Cavaleiros Vermelhos, poderiam tomar um banho, pegar mais suprimentos e comer comida de verdade — Talvez a rainha saiba de mais algum lugar ameaçado... mas isso demoraria muito.

—Acho que estou me decidindo — Ryan falou — Se entrarmos nesse buraco, estamos protegidos do sol, o que já é um grande começo. Se não entrarmos, pra onde vamos? E se chegarmos em Canaban e a rainha não souber um lugar pra irmos? Terminamos de checar a ameaça que o Ronan tinha visto. Vamos pro Pântano Esquecido? Fica muito longe. Em contrapartida, temos um buraco novinho em folha, pronto pra ser explorado. Podemos estar diante do esconderijo da própria Cazeaje e não sabemos.

—A Rainha da Escuridão, escondida no lugar onde mais faz sol? — Arme riu, irônica.

—É um bom esconderijo. Ninguém pensaria em procurá-la ali — Elesis foi rápida em responder — Estou concordando com o Ryan. Por mim, entramos. Além do mais, estou começando a assar nessa armadura.

—Passa talco — provocou Arme.

O sol já estava alto no céu quando entraram - resolveram fazer todas as necessidades da natureza lá fora. Aquela era a parte mais difícil para Arme, que foi pra bem longe em busca de privacidade. Ronan tinha sutilmente acrescentado uns maços de folha, para higiene, dentro da mochila, o que evitou situações bem desagradáveis.

O túnel descia muito, no início elas precisavam pisar com cuidado para não escorregar, mas então se nivelava e puderam andar mais tranquilamente. Estava muito escuro lá no fundo da terra, e frio também, se comparado com o sol lá fora. Logo ficou tão escuro que não puderam enxergar nada. Os olhos de lobo de Ryan ajudaram, mas mesmo ele andava com cuidado. O grupo se deu as mãos, com o elfo na frente para guiá-los.

—Vamos descansar um pouco — Arme sugeriu. Foi só Ryan parar pra que as outras duas concordassem com a sugestão. Agora que o calor tinha ido embora, notaram o quão cansados estavam.

Dormiram em turnos - menos Arme, pois acharam melhor deixá-la dormindo enquanto recuperava a magia que tinha gasto lá em cima. Verdade seja dita, a garota estava muito cansada para caminhar, e escondera isso bem até agora. Dormiram por algumas horas, e quando voltaram a caminhar, Arme se lembrou que era uma maga e acendeu uma luz em seu cetro.

—Bem melhor — Elesis aprovou.

Era como se estivessem numa bolha de luz, no meio de um mar negro de escuridão. O túnel era tão largo e escuro que se ficassem no meio dele não era possível ver as paredes; andavam quase encostados à parede direita, para não se perderem. Depois o túnel foi ficando menor, estreitando-se até ficar do tamanho de um corredor grande. Evidentemente, os drillmons vinham trabalhando para alargar aquele túnel, e tinham parado no meio do projeto.

Encontraram uma bifurcação; o túnel virava levemente para a direita, mas havia agora uma opção de caminho que levava para a esquerda. As duas entradas pareciam idênticas, sem nada que indicasse para onde levavam.

—Estão ouvindo? — Lire aproximou-se do caminho da esquerda, escutando.

—O quê? — Arme indagou.

—Esse gotejar? — as orelhas de Ryan se levantaram — Consigo ouvir. É bem fraco, mas consigo.

—Não isso, esse... ruído. Parece pessoas, máquinas e... carroças... metal batendo. Mas está muito, muito longe. O som se propaga pelo túnel e percorre um longo caminho — ela virou-se para os outros — O que tem a noroeste do Vale do Juramento?

—Canaban — Elesis respondeu prontamente.

—Faz sentido. O que estou ouvindo combina bem com uma grande cidade, mas o som está abafado. Acho que esse túnel não chega até Canaban, ele pára um pouco antes.

—Os drillmons estavam cavando um túnel para Canaban? — Elesis fechou o punho.

—É claro! Cazeaje poderia levar um exército diretamente para a cidade, passando por guardas e pelas muralhas — Arme disse — Devemos ter interrompido o projeto bem a tempo.

—Não temos certeza disso — Lire alertou — Só estou dizendo o que estou ouvindo, não dá pra tirar essas conclusões com exatidão. Porém, não é difícil que esse seja o plano dela.

—O que tem pelo túnel da direita? — Ryan quis saber.

—Não sei — falou a arqueira — Esse deve ser bem mais longo, não consigo ouvir nada — olhou para Arme — O que tem a noroeste do Vale?

—Pântanos, montanhas... a velha cidade abandonada — Arme começpu, pensativa — Acho que estou entendendo. Os monstros vêm pelo túnel da direita, que deve levar para o esconderijo de Cazeaje. Então vão pelo da esquerda, entram em Canaban de surpresa e atacam. O Vale do Juramento é onde os drillmons vivem, e quase ninguém passa pelo deserto, por isso é que eles começaram a construir aqui!

—Covardes — Elesis trincou os dentes — Pois eles é que vão ter uma nova surpresa. Se seguirmos pelo caminho da direita, vamos topar direto com Cazeaje?

—Calma aí, devagar com a carruagem — Ryan agitou os braços — Lire diz que escutou barulhinhos vindos à distância, e vocês já ligam isso a uma trama pra invadir Canaban e ao esconderijo supremo da Cazeaje. E se essa for na verdade uma mina de ferro, por exemplo, que os drillmons roubaram? Os sons que você ouviu podem ser de uma cidade mineira.

—Não tem nenhuma cidade mineira do lado de lá do Vale — Elesis discordou — o Vale do Juramento divide Vermecia em dois territórios, Canaban de um lado e Serdin do outro. No sul há Serdin e também vilas, aldeias, vilarejos e cidades menores, mas no território de Canaban só tem Canaban.

—Podemos pegar o túnel da esquerda e avisar as pessoas da cidade — Arme falou.

—E como sairíamos pra fora? Lire disse que o túnel pode estar fechado — Elesis retrucou — Então é um beco sem saída. Acho melhor esquecermos Canaban. O melhor a fazer é seguir pelo da direita, para o que quer que esteja nos esperando no final.

—Sim — Arme assentiu — Esse pode até ser o fim da nossa jornada. Cazeaje pode estar do outro lado nos esperando!

O grupo então seguiu o caminho da direita. Mal haviam andado e o caminho se alargou, ficando maior até ficar ainda mais largo que no começo. Cinco horas se passaram; eles se ajeitaram para dormir na completa escuridão, em turnos, depois Arme iluminou com seu cetro e seguiram em frente. Pararam para comer, dormiram mais e seguiram em frente outra vez.

Dois dis inteiros se passaram. A comida estava no fim e já não tinham mais nenhuma água. O túnel, porém, seguia firme, duro e sem mostra de que estava para terminar.


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