O Vizinho escrita por JJ Gleek


Capítulo 18
Uma noite tenebrosa




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Semanas se passaram, e Transvânia permaneceu sem notícias de Mörk, Mrak, e Dorcha.

A polícia, crente na hipótese de que todos haviam se esquecido do sumiço de Alexandra, desistira de procurá-la, dando suas buscas como encerradas.

Morten, ainda preso, se lembrava , a todo momento, da fatídica noite em que foi preso pela primeira vez. O frio cortante, as sirenes dos carros de polícia. As vozes dos turistas... Enfim, todas essas lembranças sombrias reverberavam em sua mente confusa e desesperada.

Vanderlucy, ainda abismada com a mudez do marido, se sentia cada vez mais solitária. Sem amigos, não tinha a quem recorrer. Estava sempre pensativa, atônita.

Num dia como outro qualquer, Morten , sempre com a cabeça baixa, foi surpreendido pela presença de um dos carcereiros, num momento incomum do dia. Ao se aproximar da cela, o oficial disse:

– Forasteiro, você foi liberado.

– Não entendi.

– O delegado liberou-lhe por falta de provas. Veja bem, há evidências de que você matou Harry Johnson, mas não provas concretas . Há suspeitas, e não certeza. Isso só seria possível caso encontrássemos provas específicas suas. As provas são muito imprecisas, generalizadas. Qualquer um que calçasse quarenta e dois, portasse um morcego e conhecesse o defunto poderia tê-lo matado. Pode sair.

– Obrigada.

– De nada. – disse o carcereiro. - Não é todo dia que vemos um detento educado, esse povo local! Bando de mal -agradecidos! - resmungou ele, baixinho.

Vanderlucy, preocupada, reservava sua atenção somente para o marido, mudo desde o dia da prisão de Morten. Desistiu de tentar reanimá-lo, ao perceber o quão fracassadas foram suas tentativas anteriores.

Somente ao dar atenção aos outros aspectos da casa, percebeu a ausência de Mörk. Chamou-o diversas vezes. Não obteve nenhuma resposta. Decidida, foi procurar notícias do amigo e ficante de sua melhor amiga.

“O lugar mais possível de obter notícias dele é falando com seu irmão, Mrak. Apesar de não gostar nem um pouquinho desse sujeitinho, é a única alternativa que me resta!”- pensou ela.

Apressada, porém relutante, a esposa de Silas seguiu rumo à casa dos odiados vizinhos. Não queria gastar muito tempo lá, pois, além de não gostar de nenhum habitante daquela residência, a chuva já se aproximava e ela tinha que recolher a roupa do varal.

Chegando lá, bateu na porta e já se preparou para esperar muito a ser atendida, pois, como bem se lembrava, os forasteiros odiavam visitas, e demoravam a atender a porta. Porém, surpreendeu-se abruptamente, quando foi prontamente atendida.

Quem a atendeu foi um homem alto que vestia roupas claras, que, ela suspeitava , tinha acabado de tomar banho, pois seus cabelos estavam molhados e cuidadosamente arrumados, além do fato de sua pele exalar um cheiro ótimo de perfume.

Seus olhos eram de um verde profundo e inebriante, e, com certeza, o combo : perfume extasiante , mais cabelos arrumados e o olhar mais penetrante que ela já vira a fizera estremecer um pouco.

Curiosa por notícias do amigo , contudo, ansiosa por uma nova amizade, Vanderlucy disse :

– Olá!

– Oi.

– Tudo bem?- disse ela. Sua voz saiu um pouco falha na última palavra, pois se assustou com um trovão. A chuva já caia fortemente , quando decidiu , a partir daí, não prolongar muito sua visita.

– Tudo.

– Posso falar com Mrak?

– Ele não está. Acho melhor você entrar, a chuva está forte, e você vai se molhar toda se continuar aí fora. – disse ele, dando passagem a amiga de Mörk.

Rapidamente, Vanderlucy entrou na casa, e se deparou com tudo perfeitamente arrumado. Perplexa, disse:

– Que furacão organizador passou por aqui?

– Você é engraçada. Os garotos são bagunceiros, e, como não tem ninguém para bagunçar meu trabalho, cansado dessa zona, e com tempo de sobra, decidi arrumar tudo. Quer chá? – disse o homem de olhos verdes.

– Sim, obrigada.

Ao servir o chá para a esposa de Silas, que agradeceu, polidamente, o homem novamente sentou – se no sofá.

Bebendo o líquido lentamente, Vanderlucy não se conteve de curiosidade e, por fim, perguntou:

– Qual é o seu nome?

– Morten. – respondeu ele. Neste momento, Vanderlucy cuspiu seu chá quase por completo.

– Acho que ouvi errado. Poderia repetir seu nome, por favor?

– Morten.

– Nossa, que azar! Você é xará de um criminoso! Um assassino que se passou por amigo de meu marido, sequestrou minha melhor amiga e matou o pai de um amigo meu.

– Não! Eu sou o mesmo Morten que foi acusado de tudo isso. Seu vizinho e de seu marido, Silas. Sei que você não gosta de mim e nem de meus amigos, exceto Mörk.

– Não mesmo, com certeza você não é ele! Aquele homem é um crápula! Nunca seria tão gentil ao ponto de me convidar para entrar em sua casa ou de me servir chá!

– Acredite, sou eu, Vanderlucy!

– Vou embora! – esbravejou ela, se dirigindo à porta.

– Por favor, me escute! – disse Morten, impedindo-a a chegar até a porta.

– Não! Eu não gosto ou acredito em você! Saia da minha frente!

– Por favor, me escute! Por Mörk! Eu sei que você veio procurar Mrak atrás de notícias dele! Do contrário, nunca viria até aqui.

– Tudo bem, eu escuto. Por Mörk e somente por ele! – disse ela, relutante.

– O que tenho a lhe contar é longo, então acho melhor você se sentar.- alertou ele.

– Não! Eu fico em pé mesmo! – disse ela, marrenta.

– Tudo bem, se prefere assim. Mörk saiu em viagem, juntamente com Mrak e Dorcha. Não sabem para onde vão ou quando voltarão. Foram procurar uma maneira de me tirar da prisão, pois sabem que não matei Harry Johnson.

– E você fugiu da cadeia novamente, pressuponho. Era só isso!? Mais uma lorota!? Vou embora!

– Espere! Eu não fugi, o delegado me liberou. Disse que há evidências, pistas, de que fui eu. Mas não há provas concretas que provam que, de fato, cometi o crime. Ou seja, o assassino ser eu é uma hipótese, e não um fato consumado. Sendo assim, isso não justifica minha prisão.

– Não acredito em nenhuma palavra que disse!

– A polícia erra. Nem sempre está certa. Até mesmo as polícias estrangeiras. Sou foragido, procurado pela Interpol, como você bem sabe. Contudo, não cometi crime algum. Foi uma fatalidade! Tudo começou num dia ensolarado, digno de filmes holliwoodianos. Eu,Hela, minha esposa, e Uklar, meu filho, morávamos na Noruega, meu país de origem. Como estávamos nas férias de Uklar, decidimos viajar para Kutná Hora, a 70 quilômetros de Praga, na República Tcheca. É uma cidade turística, famosa pelo Ossuário de Sedlec, onde há esculturas feitas de ossos. Achamos aquilo tudo fascinante, e não vimos as horas passarem. Já era noite, o ossuário tinha que fechar, e Uklar ficou com os pés presos em uma escultura. Não conseguia se mover e, desesperado, pediu ajuda.Tentei ajudá-lo de todos as formas, mas seus pés não saíam. Hela disse para eu esperar na entrada do local, pois ela mesma o ajudaria. Concordei e me dirigi para fora do salão. No momento em que me virei, escutei um grito agonizante, estarrecedor. Era como se alguém estivesse morrendo atrás de mim. Virei -me novamente e pude constatar que o grito vinha de meu filho. Ele havia sido mordido por um morcego no pescoço. Só depois pude constatar uma perfuração na artéria carótida (que leva o gás oxigênio do pulmão para o coração). Morreu quase instantaneamente. Uklar, o Trevoso. Era assim que gostava que o chamássemos. Seu nome significa obscuro em nossa língua. Apesar da morte de meu filho, ainda havia uma esperança. Eu e Hela poderíamos sair do ossuário a salvo. Com lágrimas nos olhos e carregando o corpo de meu filho, gritei o nome de minha esposa. Terrivelmente desesperada, assim como eu, ela veio ao meu encontro e nos dirigimos à fachada do ossuário. Próximos do portal, nos surpreendemos mais uma vez. Novamente, morcegos vieram em nossa direção. Hela , assim como nosso filho, teve sua artéria carótida perfurada pelos dentes de um morcego. Inconsciente, ao cair, recostou- se em mim. Morreu rapidamente. O sangue dela manchou minha roupa, e, assim como o de nosso filho, contribuiu para minha condenação pelo crime de homicídio duplo doloso. A polícia achou que armei uma emboscada para matá-los já que minha esposa era herdeira de uma fortuna, e eu era o único presente, além dos dois. Além disso, portava um canivete com uma ponta finíssima, da espessura dos dentes dos morcegos, sujo pelo sangue de meu filho e de minha mulher. Foi neste incidente que perdi meu filho, minha esposa, e minha dignidade. A única coisa que ganhei foi essa marca no pescoço, já que também fui mordido, porém superficialmente. Isso me trouxe esta cicatriz, que me lembra, a todo o momento, o quão a vida é dura e,a polícia, injusta.- disse Morten, com a cabeça baixa. A essa altura, chorava convulsivamente, todavia, não queria que Vanderlucy percebesse.

– O que espera me contando isso? Espera que acredite em você? Aposto que essa é só mais uma história inventada! Perdi o meu tempo com nada! – disse ela, a porta batendo atrás de si.


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Notas finais do capítulo

Ossuário de Sedlec: https://www.google.com.br/search?q=Ossu%C3%A1rio+de+Sedlec&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=JAfTUr7aD8XRkQeElYHwCA&ved=0CAcQ_AUoAQ&biw=1024&bih=498



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