Silence escrita por Natmed


Capítulo 2
Capítulo 1




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Eu sabia que estava sonhando. Apesar de nunca ter tido sonhos tão vividos, tão... Reais. Se não fosse pelo fato de não fazer a menor ideia de como havia chegado ali, eu nem saberia que estava sonhando. Eu estava começando a ficar preocupada pelo fato de não ter acordado ainda, quando de repente tive a sensação que estava caindo, e acordei. Eu odiava esse tipo de sensação. Essa que te faz pensar que você vai cair de um prédio quando na verdade você está deitada, no meio da cama. Fiquei imóvel por alguns segundos, esperando minha respiração normalizar. Quando olhei para o lado, levei um susto. Estava atrasada para a escola. De novo.

Isso já estava começando a virar rotina. Pulei da cama e vesti o primeiro jeans que vi pela frente, acompanhado de uma física branca, e um casaco preto que estava jogado por cima da mesinha do computador. Eu realmente precisava arrumar o meu quarto - quando até eu mesma começava a me perder no meio da minha própria bagunça, é porque estava na hora de fazer uma limpeza.

Já estava na porta quando me lembrei que não havia colocado o sapato e estava sem a mochila. Coloquei os tênis o mais depressa possível, peguei a mochila e dei uma olhada rápida no espelho da penteadeira, mexendo um pouco no cabelo. Tinha suas vantagens ter cabelo liso e curto; não era preciso penteá-lo freqüentemente. Desci as escadas correndo e encontrei a minha mãe na cozinha, fritando ovos. Passei por detrás dela e lhe dei um beijo na bochecha.

– Oi mãe!

– Está atrasada. De novo.

– É eu sei. - Disse, pegando um copo de suco de laranja que estava em cima da mesa, e tomando-o o mais rápido que pude. - Eu não ouvi o despertador.

– Você nunca ouve. - Disse ela parecendo se divertir com isso.

– Eu sei. - Disse, com um sorriso torto - Preciso ir. Tchau! - Lhe atirei um beijo e, pegando as chaves do carro, que estavam em cima do balcão, fui em direção a porta.

– Não venha tarde para casa!

– Ta, pode deixar. - Disse já do lado de fora. Correndo para chegar mais rápido até o carro.

Na metade do caminho dei uma olhada no relógio, e um pouco surpresa vi que não estava tão atrasada quanto pensava. Chegando à escola, me surpreendi ainda mais ao ver que o estacionamento estava praticamente vazio - se levasse em consideração o horário. Ao que parecia eu não era a única que havia dormido mais do que devia. O lado bom é que eu conseguiria uma ótima vaga para estacionar.

Desci do carro e fui encontrar Ashley e Gabrielle. Ashley Jensen e Gabrielle Novack, minhas únicas amigas neste inferno chamado ensino médio; e uma mais estranha que a outra.

Ashley é a pessoa mais bem humorada que eu conheço, nada consegue deixar ela mal - o que é meio chato às vezes, tanta felicidade - e é também a mais tagarela. Na maior parte do tempo eu nem presto muita atenção no que ela fala. Mas ela é uma ótima amiga, e eu gosto da companhia dela. Já Gabrielle vive no seu próprio mundo, nunca diz coisa com coisa e, constantemente desaprova o que Ashley diz. Às vezes é até engraçado ver as duas discutindo - exceto quando sobra para eu resolver o impasse.

Entrei na escola e encontrei as duas no corredor, próximas aos armários - os nossos armários eram um ao lado do outro - discutindo o lado bom, de se ter maquiagem sempre a mão. Um assunto extremamente fútil para mim. Mas era a obsessão da Ash. Maquiagem e roupas. Ela era a verdadeira Barbie. Às vezes eu me perguntava como nós podíamos ser amigas, sendo tão diferentes uma da outra. Eu não era nem um pouco adepta a esse fanatismo da Ash. O que meio que a enlouquecia - ela achava que eu não era feminina o suficiente.

– Credo, você está horrível! - Disse Gabrielle.

– Uau! Valeu. – disse com sarcasmo.

– O que aconteceu? Passou a noite acordada por causa do bicho papão? – disse Gabrielle, rindo da minha cara.

– Eu não consegui dormir muito bem à noite e, me acordei atrasada hoje de manhã. Não tive tempo de me arrumar.

– Quer alguma coisa emprestada? - Disse Ash abrindo a mochila e tirando um estojo de maquiagem, pronta para me usar como cobaia.

– Não, muito obrigada. Você sabe que eu não curto muito essas coisas.

– Não iria fazer mal algum se você usasse de vez em quando. Tenho certeza que se você se vestisse um pouco melhor, e usasse maquiagem você ficaria ótima. E teria vários garotos interessados em você. -Disse Ashley, sorrindo.

– Eu não preciso que nenhum garoto se interesse por mim. Principalmente se for para se interessar por causa do que eu estou vestindo. Ou pela falta de tecido cobrindo o corpo. Eu me sinto bem assim, e não vejo motivo nenhum para mudar só para agradar aos outros. Além do mais eu me visto para mim, e não para os garotos.

Ashley ficou furiosa com o que eu havia dito. Ela estava interessada pelo Julian, um garoto do time de futebol. E fazia de tudo para impressioná-lo. Até assistia aos treinos, apesar de saber absolutamente nada sobre futebol. Mas todos os esforços dela eram em vão. Ele nem a notava.

– Hum... Você que sabe. - Disse Ashley, furiosa.

Eu sabia que havia sido um pouco grossa, mas ela realmente sabia como me irritar às vezes, e hoje eu não estava em um bom dia. Além do mais, conhecendo a Ashley do jeito que eu conhecia, eu sabia que não levaria muito tempo para ela esquecer isso.

Acompanhei as duas até a aula de química, só como ouvinte - não quis arriscar abrir a boca e acabar xingando mais alguém. Ashley aproveitou a oportunidade e foi o caminho inteiro falando, sem nem parar para respirar. Me perguntei quanto tempo levaria para ela desmaiar por falta de oxigênio. Eu suspeitava que talvez Ashley tivesse algum tipo de transtorno psicológico, pois, às vezes parecia que ela era dividida em duas pessoas: Aquela que é agradável e que você quer ter por perto. E aquela que não cala a boca um segundo, e faz com que você queira se matar para ter um pouco de silêncio. Ao que tudo indicava, o lado falante estava predominante hoje.

Chegamos até a sala, e não demorou muito para o Sr. Charles entrar e iniciar a aula. No início, eu realmente tentei prestar atenção, mas, após 10 minutos de aula - sem fazer a mínima idéia sobre do que ela se tratava - eu desisti. Me desliguei completamente do que se passava ao meu redor, e fiquei devaneando. Se as meninas não tivessem me chamado para ir para a próxima aula eu nem teria notado que aquela havia acabado. O restante da manhã transcorreu... Bem, até. Exceto pelo incidente na aula de culinária.

Apesar de várias pessoas adorarem - na, eu achava que era a aula mais sem sentido que existia, e o maior desperdício de tempo - a não ser, é claro, que você planejasse se casar com alguém rico e viver à custa dessa pessoa, só cozinhando e colocando a fofoca em dia com as vizinhas, aí sim essa aula era essencial, como se fosse algum tipo de "ensaio geral".

Fui para o meu lugar de sempre, ao lado de Julie, que parecia ter brigado feio com a escova de cabelo. Fiquei imaginando, que bicho poderia ter dormido na cabeça dela para o cabelo ter ficado daquele jeito. Passei tanto tempo pensando nisso que, esqueci da torta no forno. Quando me lembrei, ele já estava quase que completamente queimado. Tive que ouvir um discurso de aproximadamente 10 minutos, da Sr.ª Clark falando sobre a importância da culinária, de como ela deveria ser levada a sério como qualquer outra disciplina, e que eu deveria ser mais atenta. Finalmente a aula acabou e eu pude ir para a cantina, encontrar Ashley e Gabrielle. Para meu desapontamento elas ainda estavam em aula, portanto chegariam atrasadas.

Eu não me importava em sentar sozinha - assim eu conseguia pensar, e não precisava fingir interesse em uma conversa qualquer - o que me importava... Não. Importava não, o que me incomodava, eram as pessoas me olhando com uma cara do tipo: "Essa garota só pode ser esquisita. Almoçando sozinha, sem nenhum amigo. Esquisita e anti-social." Que ótimo. Hoje definitivamente não estava sendo o meu melhor dia.

Fiquei sentada ali até a cantina estar quase vazia, e infelizmente nenhuma das duas apareceu. Por fim desisti de esperá-las e fui para a aula de literatura - a única que valia a pena assistir. Acabei esbarrando com as duas na porta da sala.

Estávamos estudando Otelo, de William Shakespeare, um dos meus livros preferidos. Deveríamos fazer uma redação sobre o livro para a próxima aula, o que eu não achava particularmente difícil, pois já o havia lido inúmeras vezes. Ao final da aula já estava com o humor um pouco melhor. O restante do tempo passou surpreendentemente rápido - ou eu fiz um ótimo trabalho me desligando de tudo e nem vi o tempo passar. Quando estava chegando ao estacionamento, vi Ashley e Gabrielle mais a frente, e corri para alcançá-las. Elas conversavam sobre o trabalho de literatura - além da aula de literatura, nós tínhamos aula de espanhol e de química juntas. Ash estava apavorada, pois não havia lido o livro ainda - sendo que havia cerca de um mês que ela estava com o meu - e o trabalho era para daqui a três dias. Ela ficou um pouco mais calma depois que eu disse a ela que ligaria à noite e lhe contaria toda a história, assim ela teria um pouco de informação para colocar no trabalho. Me despedi de ambas e fui para o carro. Eu dirigia um volvo c30 de 2009. Não era o "carro do ano", mas era confortável e eu gostava dele. Tinha estilo. E além do mais, a maioria dos carros no estacionamento não eram lá grande coisa.

Cheguei em casa e encontrei minha mãe na sala com o namorado. Ela estava de folga do trabalho hoje. O que a deixava ansiosa. Ela não gostava de ficar sem trabalhar.

Meu pai morrera em um acidente no trabalho quando eu tinha 5 anos. Ele era policial. Minha mãe ficou 10 anos sem conseguir namorar ninguém. Até que apareceu o Jack. E agora eles estão juntos, já faz dois anos.

Ele me odeia... E eu odeio ele. Particularmente acho que ela conseguiria coisa bem melhor, mas ela já passou por tanta coisa por mim, que eu só quero que ela seja feliz. Portanto, eu tento interferir o mínimo possível.

– Oi mãe.

Ela se levantou de sobressalto, como se estivesse fazendo algo errado e tivesse sido pega. Não consegui evitar um sorriso.

– Oh! Você já chegou? Que horas são? Nossa, passou rápido o tempo. Ah droga! Eu me esqueci de fazer algo para você comer.

– Não p...

Ela já estava começando a se levantar do sofá quando Jack a segurou pelo braço e disse:

– Ela sabe se virar sozinha. Você precisa descansar. Aproveitar que está de folga hoje. Ela faz algo para comer se estiver com fome.

Eu o fuzilei com os olhos. É eu concordava com ele. Ela precisava descansar, e eu sabia me virar sozinha apesar do pequeno incidente na aula de culinária. Mas o jeito como ele falou aquilo, me irritou.

– É mãe... Você precisa descansar. Você passa tempo demais trabalhando. Eu sei me virar sozinha.

Ela me olhou meio desconfiada, mas se sentou novamente. Eu até tentei dar um sorriso para disfarçar o desprezo que sentia por ele, mas não fui muito convincente. Fui para a cozinha, imaginando como seria dar uma bela surra nele. Larguei minha mochila na cadeira e fiquei parada em frente à geladeira pensando no que comer. Acabei indo para o quarto com uma caneca de café e um prato de biscoitos. Eu não estava com paciência para fazer algo mais elaborado, e nem com vontade. Larguei ambos na mesinha e liguei o computador. Enquanto esperava ele abrir a página inicial, fui juntando as minhas roupas que estavam espalhadas pelo quarto e jogando dentro do armário. No dia seguinte eu faria uma limpeza melhor. Até porque, seria fim de semana e eu teria tempo de sobra.

Devido a uma vida social completamente tediosa, as únicas coisas que eu fazia nos finais de semana eram: arrumar o meu quarto, escutar música, fazer o dever de casa e ler diversos livros. Bem agitada não?? Como eu disse completamente tediosa.

Quando o computador finalmente abriu a página inicial vi que havia vários recados da Ashley, pedindo para entrar em contato com ela assim que possível. Tomei um gole bem grande de café e comecei a escrever um breve resumo de Otelo. Enviei para Ashley e escrevi que se ela tivesse alguma dúvida poderia me perguntar. Independente de qual fosse. Achei mais fácil enviar um e-mail do que ligar para ela. Eu sabia que se eu ligasse, ela começaria a falar de coisas completamente sem nexo com o trabalho, e não me deixaria desligar o telefone depois. E acabaria que nenhuma de nós faria o trabalho. Pesquisei alguns livros na internet e depois comecei a fazer a minha redação. Não consegui ir muito longe, pois estava com muito sono e não estava conseguindo pensar direito. Peguei minha toalha e fui para o banho, me demorando mais do que o habitual, deixando que o cheiro do meu shampoo preferido - de chocolate - tomasse conta de todo o ambiente. Saí do banheiro enrolada em uma toalha e fui em direção ao armário. Coloquei o meu pijama e fui para a cama, exausta. Não demorou muito e caí em um sono pesado, sem sonhos. Só... Escuridão total.


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