Onze escrita por Manuela Besaury


Capítulo 2
Capítulo 2 - Aquele Churrasco




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Aquele churrasco para as fotos do álbum de formatura só confirmou o que eu desconfiava. Eu já tinha ido uma vez naquele parque ou fazenda, ou pedaço de merda perdido em uma cidadezinha do interior para onde o colégio nos levou. Eu já tinha pisado naquele lugar e ganhado uma das mais traumáticas experiências da minha vida, você sabe disso?

Pois bem, deixa eu te contar, Alana, o horror que eu passei naquele parque. Foi em um acampamento do colégio três anos antes. Chegamos lá sexta a tarde e tudo estava muito bem, eu tinha levado dois tênis – porque nos foi orientado assim, mas oh, destino cruel, dois não foram o suficiente – e um deles usei para atravessar um rio de pedras. Até que foi divertido ficar na água, naquela correnteza forte, com pessoas que eu não conhecia, tentando não quebrar a minha cara em uma daquelas pedras lisas.

Umas horas depois, voltamos para o salão principal e tudo estava correndo muito bem por sinal, até que começou a escurecer e o próximo programa seria um caça ao tesouro, oba! Amarramos fitinhas coloridas nos pulsos onde cada cor significava uma equipe diferente, e fomos guiados até as barracas para calçar tênis e pegar lanternas. Eu já estava de tênis e de lanterna, mas no meio do caminho ouvi um professor dizer:

– Galera da minha equipe, vamos ficar perto para a gente voltar rápido e pegar a pista do tesouro antes dos outros! – Mas qual era a equipe dele?

Tirei a luz da lanterna do chão e tentei direcioná-la para o pulso do professor, que estava bem na minha frente, mas antes que pudesse ver qual era a cor de sua fita e saber se ele era o líder da equipe roxa – equipe que eu fazia parte – tropecei e os próximos segundos foram muito rápidos. Eu caí, Alana... Mas não cai no chão, caí dentro de uma valeta.

Só senti aquela água gelada e nojenta me encharcando e o braço do professor – que era sim o líder da equipe roxa – me puxando do buraco onde eu estava.

– Tudo bem? Tudo bem? – Ele perguntou.

Peguei minha lanterna e resmunguei uns sim’s tentando conter a vontade de chorar, o resto do caminho até as barracas ele foi dizendo:

– Cuidado com o rio! Cuidado com o buraco!

E eu andando atrás dele como um pinguim, Alana, morrendo de frio, toda enlameada, deixando as lágrimas escorrerem. De todas as pessoas que podiam ter caído naquela valeta, eu tinha sido a premiada. Chegamos na barraca e o líder da equipe roxa – juro que estou tentando lembrar o nome dele, mas não consigo – me levou até a casa onde os professores ficavam. A Rô, minha professora desde o maternal, saiu da casa com o caseiro e ele perguntou, intrometido:

– Mas o que aconteceu com você? – Ele estava me acusando, senti isso em sua voz e tive mais vontade ainda de chorar – Onde você tava andando pra ter caído? – Ele achava que eu estava fazendo algo errado e isso acabou comigo.

A Rô me ajudou a pegar minha mala na barraca e levá-la até o quarto onde ela iria dormir, me mostrou o banheiro e finalmente eu pude tomar um banho... E colocar chinelos. Chinelos, meu deus! Alana, eu não uso chinelos nem em casa, mas meus dois tênis estavam molhados. Imagine depois no caça ao tesouro, eu correndo de chinelo pela grama, pelas pedras, pelo campo de vôlei de areia, mas ainda tinha como piorar... No meio da confusão para achar o maldito tesouro, que eu nem lembro o que era, eu me enrosquei no arame farpado.

Chega de viver!

Não dormi na barraca como todos, dormi no sofá ao lado da Rô e jurei a mim mesma que nunca mais voltaria naquele lugar. E ali estava eu, sentada ao seu lado no ônibus de viagem alugado pelo colégio, retornando ao meu pesadelo. Quando eu soube aonde seria esse churrasco, Alana, eu não queria ir... Mas eu fui, porque talvez... Eu já fosse apaixonada por você, só não tinha percebido ainda.

Eu lembro, Alana... De você e eu sentadas no ônibus, mandando mensagem para duas pessoas aleatórias, que sinceramente, não quero citar. Esse é um momento meu e seu e de mais ninguém. Meu celular ficou sem área e a minha mensagem não tinha sido enviada:

– Isso é um sinal de que você não deveria mandar.

E não deveria mesmo, mas não apaguei e quando o celular voltou a funcionar, a mensagem foi, Alana.

Você estava ficando com um menino naquela época, o tal de Eduardo. Quando chegamos ao lugar, você não me largou por nenhum segundo, e eu te amei por isso. Alana, você se lembra que cruzou com o Eduardo, ele estava sem camisa e te afastou alguns passos de mim, te deu um selinho e tudo o que você fez foi continuar o seu caminho comigo? Eu lembro que você me contou que quando ele terminou com você, citou isso como exemplo. Sinto muito.

Você me disse que gostava bastante dele, mas eu estou tentando entender como isso era possível, porque você era apaixonada por mim, não era?

Nós sentamos na grama, você do meu lado, naquele lugar terrível que de repente parecia agradável e me rendeu algumas lembranças boas, e você me disse que tinha um segredo. A Letícia estava de pé na nossa frente e ela sabia qual era esse segredo. Acho que você me pediu para adivinhar, porque eu lembro que disse:

– Você gosta da Mariana Versales? – Eu queria que fosse dela que você gostasse, não de mim. Se você gostasse da mesma pessoa que eu, teríamos mais assunto, afinal... Nenhuma de nós ficaria com ela, porque ela era... Hetero. – Pode me dizer, não vou ficar braba.

– Você vai ficar braba, mas não é isso. – Você respondeu. – Não gosto daquela monga.

Admita, por favor... Eu estava pensando, mas você não tinha nada para admitir. E foi assim que a nossa tarde passou. Terminou com nós duas dentro do ônibus voltando para o colégio e eu dormindo no seu colo com um pirulito na boca. Eu sei que você riu de mim, mas sei que me achou fofa. E foi por isso que eu me apaixonei por você.


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