— Pelo visto o encontro foi bom — o comentário de tia Jane me fez pular de susto. Eu estava encostada à porta, revivendo o momento de minutos atrás, quando a voz dela chegou aos meus ouvidos.

Mudando a minha expressão para uma menos sonhadora e, possivelmente, boboca, eu disse:

— Hã, é foi.. legal.

Ela fez uma cara descrente.

— Só legal? Embry parecia um rapaz muito gentil.

Ops. Era melhor evitar dizer que eu sequer chegara a ter um encontro com o garoto que ela havia me visto sair.

— É, ele é realmente gentil — eu começava a sentir minhas mãos suando por ter de mentir. — Hmm, tia eu vou para cama agora.

Tia Jane levantou as sobrancelhas.

— Ah qual é? Você não vai me contar os detalhes.

— De jeito nenhum — respondi rindo.

Fui em direção à escada e ela me seguiu.

— Você é uma estraga prazeres, Cass — ela gritou do pé da escada.

Eu apenas ri novamente e fui para o meu quarto.

***

Cassandra Watson corria por uma floresta fechada. Seus pés escorregavam pelo chão cheio de neve. Tudo à sua volta era uma mistura de borrão branco da neve e do verde das árvores. Os galhos cortavam suas roupas e sua pele ao passar veloz pelas árvores, porém a garota continuava a correr.

Ela chorava e ofegava, devido ao esforço físico. Ela precisava chegar à campina. Precisava avisá-los do que estava por vir. O medo corria por suas veias como um veneno, que infectava os seus pensamentos com imagens assustadoras de seus amigos sendo mortos de maneiras violentas e terríveis.

Ela precisava chegar lá.

Precisava encontrar Jacob.

***

Acordei de súbito, sentindo o meu coração batendo forte. Minha respiração era rasa, e imediatamente, senti o suor ensopando a minha camiseta. A urgência e o medo que sentia no sonho ainda se faziam presentes, de modo que eu não tinha tanta certeza assim de que estava acordada.

Porém, com a ajuda de parca luz do poste de luz do lado de for, pude constatar que estava de fato em meu quarto. Mas... algo estava errado. Eu não estava em minha cama.

Olhei para cima e percebi a cama ao meu lado. Eu havia caído no chão em algum ponto da noite. Suspirando pesadamente, desenrolei-me do lençol e subi de volta na cama. Levei alguns minutos para me acalmar e me concentrar.

Havia... neve. Muita neve. E eu precisava avisar Jacob. Mas do quê? Eu não conseguia me lembrar... Era tão estranho. No sonho eu tinha certeza de algo terrível iria acontecer... Algo envolvendo os Cullen...

Passei o restante da noite tentando me lembrar do que havia visto no sonho, no entanto, não tive sucesso. Era tão frustrante! Essas visões, às vezes, mais atrapalhavam que ajudavam. De que adiantava ficar me preocupando com algo que eu nem sabia o que era?

Naquela manhã, o sonho já havia eclipsado qualquer resquício de felicidade que sentira desde o meu momento com Jacob de ontem à noite. De fato, mais pensamentos sombrios começaram a penetrar as forças de minha mente. Por exemplo, enquanto tia Jane me levava de carro para a escola, falando sobre a formatura de Lucas que aconteceria no próximo final de semana, eu comecei a pensar sobre as implicações do nosso beijo. Quer dizer, para mim havia significado muito, mas e para Jacob? Significava que ele estava disposto a esquecer Bella por mim? Ou havia sido apenas algo que acontecera no calor do momento?

Essas e outras perguntas me assolaram durante os minutos que levava para chegar até a escola. E, quando finalmente cheguei, eu apressadamente saí do carro dando tchau para tia Jane e corri para encontrar Jacob.

Tudo bem que havia um motivo extremamente importante para a minha urgência em falar com ele — o sonho estranho. Mas, também, eu não podia mentir para mim mesma e dizer que o fato de querer saber o que ele realmente sentia por mim não estava interferindo um pouquinho em minha pressa.

No entanto, eu rodei aquela escola inteira e não o achei.

Na terceira vez que fui até o pátio da frente para verificar mais uma vez se ele estava chegando — apenas para constatar que não estava — eu desisti e fui para a aula.

Aparentemente, nenhum dos garotos da matilha havia vindo hoje à aula. Falei com Kim no almoço e ela me contou que Sam, o alfa, os estava colocando para fazer patrulha à noite inteira e que provavelmente eles estavam em casa dormindo.

Isso me acalmou um pouco, porque eu não queria que Jacob se desgastasse demais. E, se ele estava em casa descansando, então eu poderia esperar algumas horas.

Mas, assim que o sinal tocou anunciando o fim das aulas daquela tarde, eu peguei minhas coisas e fui encontrar Kim no estacionamento. Ela iria me dar uma carona até a casa de Jacob, e depois iria ir atrás de Jared. Senti-me estranha, porque ela estava sentindo a mesma urgência que eu. Só que a dela era compreensível: ela estava ligada pelo imprinting ao Jared... E eu... bem, eu ainda não havia rotulado os meus sentimentos por Jacob. Eu só sabia que era forte. Muito forte.

Ela me largou em frente à casinha pintada com tinta vermelha descascada. Agradeci pela carona e ia indo até a porta da frente quando algo na janela a residência me chamou a atenção.

Aproximei-me cautelosamente, sem ter muita certeza do que estava fazendo, sentindo aquela curiosa sensação de arrepio. A sensação de saber que algo estava prestes a acontecer, mas sem saber exatamente o quê.

Havia duas sombras através da cortina da janela; aproximei-me mais e finalmente vi: Jacob e Bella estavam sentados no sofá. Próximos demais.

Beijando-se.

A visão da cena me atingiu com um baque que tirou o ar de meus pulmões. Arfei alto e, imediatamente, coloquei as mãos sobre a boca. Senti meu estômago revirar, enojada de ter visto que vi: lá estava Jacob beijando Bella, como se ontem à noite nunca tivesse acontecido.

Bem, se eu queria uma resposta, então aí estava.

Eu não significava nada para Jacob, afinal de contas.

Tudo isso se passou em menos de dez segundos. Porém, foi o suficiente para Jacob perceber que eu estava ali. Ele se afastou de Bella de súbito e olhou diretamente para mim, os olhos arregalados no que me pareceu terror. Eu vi os seus lábios se moverem pronunciando o meu nome.

E aquilo só meu deu mais nojo ainda.

A última coisa que vi foi o relance de Bella parecendo extremamente confusa, antes de dar as costas.

— Cass, por favor, espere!

Eu não olhei para trás.

Apesar da distância que eu havia conseguido colocar entre mim e a casa, Jacob me alcançou em um tempo ridiculamente curto.

— Por favor, só me escuta! — ele pegou o meu braço e me virou para encará-lo.

— Não, eu não vou escutar! — gritei olhando-o firmemente nos olhos.

Jacob se assustou com a minha agressividade e deu um passo para trás, embora continuasse segurando o meu braço.

— O que você viu... eu posso explic...

— Ah, por favor! Não me diga que você vai ser tão clichê a ponto de dizer essa frase idiota!

Eu notei que ele havia começado a tremer, mas, dessa vez, dava para perceber que não era raiva... era algo diferente. O seu rosto expressava sofrimento, quase como se ele estivesse sentindo uma dor física.

— Eu sinto muito... — ele sussurrou.

Estranhamente, eu não estava chorando, nem estava sofrendo. Bem, ainda não. Mas, agora eu só sentia raiva. Eu só queria sair dali e nunca mais olhar para a cara dele.

Desvencilhei meu braço de seu aperto e respirei fundo para falar sem tremer.

— É, eu também sinto muito. Sinto muito ter confiado em você. E sinto muito ter sequer pensando que poderia dar certo com você, Jacob. Se era ela que você queria o tempo todo, então devia ter ficado bem longe de mim.

A cada palavra que eu dizia, minha voz ficava mais alta ate o ponto de estar berrando. Finalmente, ele esboçou uma reação diferente.

— Espera um pouco, você não está me dando espaço para explicar!

— Explicar o quê? — ergui minhas mãos para o alto em frustração. — Estava bem claro. Você beijou a Bella. Beijou uma garota que está comprometida! E quer saber, esse não é o problema, porque eu sempre soube que você gostava dela. Mas, você não deveria ter me beijado!

Jacob aproximou seu rosto do meu e falou intensamente, seus olhos duros.

— Eu tive que fazer isso, eu precisava saber!

— Saber o quê? — minha voz saiu em um suspirou, dado a constatação do que ele havia dito. — Você estava fazendo um teste?

A decepção devia estar marcada em minha expressão. Então, Jacob havia feito um teste para saber de quem gostava mais?

— Não — ele discordou rapidamente. — Não, espera, não é assim. Cass, eu juro que não foi isso. É só... eu fiquei confuso, foi isso. Por favor, me perdoa. Eu errei. Errei feio, mas eu nunca quis magoar você. E eu estou tão cansado, eu não ouvi você vindo. Você não deveria ter visto aquilo.

Eu fiquei parada apenas observando-o tentar justificar aquilo que não podia ser justificado. Para mim, não havia desculpa. A raiva estava começando a se dissipar, o vazio tomando o seu lugar.

— Jacob, me deixa em paz.

Os seus olhos grandes e negros me encararam, medo e aflição refletidos neles.

— Cass, eu...

— É sério. Dessa vez é sério. Não fale mais comigo. Não me procure mais. Só... Deixe-me ir.

E, dessa vez, ele não me seguiu.