Acordei e olhei para a janela, pelo sol desagradável devia ser meio dia. Afinal, por que acordei tão cedo? Passei a noite trabalhando, pois eu trabalho em casa. A campainha da minha casa tocou, coloquei o travesseiro no rosto fingindo não ouvir nada, então o som da campainha insistiu.

Levantei da cama e dei uma rápida olhada no espelho. Meus cabelos enrolavam o máximo que conseguiam, eu estava pálido como de costume.

Pisei em alguma coisa muito pequena, fui até a porta pulando com um dos pés apenas e abri a porta do apartamento.

Liz, a garota de minha classe do ano passado acenava para mim com um sorriso estampado no rosto. Olhei pra ela com desdém. Ela tem vindo ao meu apartamento desde que abandonei a escola, se tornou folgada. Agora se considera quase como dona do apartamento.

–Você não tem escola? – Perguntei bocejando.

–Francamente Jake, estava dormindo. – Ela comentou passando a mão nos meus cabelos. – Vá arrumar esse... – Antes que terminasse empurrei sua mão.

Delicadamente ela empurrou meu braço que estava apoiado na porta e entrou no apartamento, se virou pra mim como se eu fosse o convidado.

–Não cansa desse lugar nunca? – Indagou olhando pras minhas roupas sujas e papéis espalhados pelo chão. – Vamos jantar fora essa noite? – Ela perguntou com seu rosto ganhando uma cor avermelhada.

–Não. – Disparei cruzando os braços.

Ela jogou no chão um dos meus livros e se sentou no sofá.

–Então vou passar a noite aqui. - Nesse momento ela desabotoou o primeiro botão de sua camisa escolar. Expondo parte de seus peitos.

–Não brinque comigo. – Respondi caminhando até a cozinha.

Coloquei um pouco de aguá para ferver, a minha meta pra hoje é zerar três jogos novos, não tinha tempo pra Liz.

–Eu vou com você nesse jantar, agora saia daqui que quero trabalhar. – Falei caminhando até a porta e abrindo ela.

Liz me olhou confusa, mas depois assentiu e caminhou até o lado de fora do apartamento.

–Então até... – Antes que ela terminasse fechei a porta.

Por um momento ela não disse nada, então completou.

–Vamos ao restaurante da sua rua! – Ela gritou ríspida.

–Está bem. – Respondi.

Passei o resto do dia zerando um dos jogos, sem paciência joguei o controle no chão e olhei pro relógio. Certamente iria furar o encontro, mas pensei na possibilidade de Liz voltar pra cá, não quero aquela nanica me enchendo.

Levantei-me e arrumei ou pelo menos tentei arrumar meu cabelo, coloquei uma roupa qualquer e fui até o tal restaurante.

Na rua percebi que era mais alto que muitas pessoas que passavam, fazia tempo que eu não saia de casa. Tropecei na calçada e xinguei silenciosamente, quando atravessei a rua vi o restaurante.

O lugar era meio gótico. Com tapetes vermelhos por todos os lados, paredes decoradas e lustres antigos. Uma música clássica dava um ar tranquilo ao local. Sentei-me em uma mesa no fim do restaurante e esperei por Liz. Havia poucas pessoas no local, um casal de estudantes e uma mulher com um filho e uma filha.

–Hey! – Liz disse me assustando.

Sentou-se à mesa e riu da minha expressão como de costume. Usava um vestido branco, seus cabelos castanhos estavam presos.

–Sabia que viria. – Ela comentou sorrindo de um jeito sádico.

Levantei uma sobrancelha, antes que pudesse responder levei outro susto.

–Hey! – Disse um homem de terno, ele estava usando um saco de papel na cabeça com dois furos mostrando os olhos. Ele notou que eu estava me recuperando de um susto e riu da minha cara. – Isso só costuma assustar crianças, está com medo? – Perguntou aproximando seu rosto do meu. Seus olhos eram avermelhados, e ele parecia não dormir a dias. – Fique calmo, é só uma fantasia. – Ele comentou soltando risadas abafadas. – O que vão querer?

–Um sanduíche pra mim está bom. – Liz respondeu.

–O mesmo.

O resto do jantar foi normal, quando digo normal me referindo a Liz e eu, digo que brigamos muito, porém a comida era gostosa e o ambiente agradável.

Quando eu estava de saída, percebi que o homem com o saco na cabeça estava conversando com uma mulher de aparência idosa, eles pareciam cochichar e ela tirou algo da bancada. Uma bandeja com dois bolinhos.

Ela caminhou até mim e os colocou na mesa, eu estava me levantando, mas ela pegou no meu ombro e me empurrou pra cadeira.

–Coma sua sobremesa rapazinho. – Ela tinha uma voz animada, estava com um avental e os seus cabelos grisalhos estavam presos num coque. De um jeito estranho ela passou a mão em meu rosto. – Você tem olhos muito bonitos. Quantos anos você tem?

Qual é? Esse velho tá querendo me pegar?

–17. – Comentei afastando o rosto.

Liz comeu o bolinho dela enquanto elogiava a comida do restaurante com a velha. Olhei para o meu bolinho, de cara percebi que era meu favorito, cenoura com chocolate. Mordi metade do bolinho, mas o coloquei no prato novamente quando percebi que todos os outros fregueses estavam comendo também. Os filhos de uma mulher negaram dividir o bolinho com ela, e comeram juntos. Eles eram do mesmo tamanho, acho que eram irmãos gêmeos.

Pensei em perguntar o motivo da sobremesa grátis, mas a velha estava em outra mesa enfiando um dos bolinhos na boca de um garoto de óculos. A garota que estava sentada com ele ria dele enquanto mordia outro dos bolinhos.

–Vou ir embora. – Disse deixando o dinheiro em cima da mesa.

–Tchau. Não durma tão tarde. – Liz respondeu olhando para lado mal humorado.

Revirei os olhos e sai do local. No momento em que eu atravessava a rua um caminhão que eu não vira passou por cima de meu corpo.

Então eu morri.