O Lamento Da Lua escrita por J S Neto


Capítulo 6
Seis - Flores e mais flores




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A Caça a Bandeira foi cancelada. Algo muito estranho, além da inexplicável aparição da minha irmã vestida e armada daquele jeito no acampamento, existia por trás da visita daquele cão de caça. Quíron, ao ver aquelas garotas se aproximando da Casa Grande juntamente a mim, Alice, Lena, Matheus e Robin, franziu a testa e se aproximou rapidamente.

–Trazemos más noticias! – disse Luana que não me dera ainda a atenção que eu precisava. Duvidas como o motivo dela estar ali... O porquê dela não estar na viagem da empresa a qual ela trabalha. E entre outras perguntas que não recebi nenhuma resposta.

–Vamos para dentro da Casa Grande. – falou Quíron dando espaço para as garotas. – Senhoritas... – disse ele abrindo a porta para que elas entrassem.

Elas entraram no compartimento e depois disso, todos nós, campistas, tivemos de esperar. Coisas importantes eram resolvidas ali, e nem tudo chegava aos nossos ouvidos, pelo que Alice tinha me dito. Porem eu queria saber. O que envolve a Luana e não me envolve? Será que ela é algum tipo de semideusa recebendo treinamento diferenciado? Luana... Semideusa... Não acredito que é realmente isso que ela seja.

***

Depois da entrada de Quíron à Casa Grande fomos dispensados do local, e recebemos atividades extras (atividades do tipo “Vocês-Não-Podem-Ficar-Tentando-Saber-O-Que-Está-Sendo-Dito-Na-Casa-Grande”).

Fui ao estábulo dos pégasos, para limpar a meleira que eles faziam. Alice e Matheus receberam atividades diferentes, e eu separado deles dois meio que me senti um pouco deslocado.

Quando cheguei ao local tive que começar a respirar pela boca. O problema é que às vezes eu sentia falta de ar e inspirava pelo nariz o fedor de bosta de cavalo-passarinho.

Alguns semideuses já haviam começado a limpeza. Trabalhando feito uns condenados e ainda tendo que ouvir algumas risadinhas de uns centauros sem o que fazer. A partir dali já percebi que não ia dar no que prestasse (pra não usar outras palavras).

Me encostei em uma dupla (um menino e uma menina), que pareciam esconder alguma coisa.

–Ei! Posso me juntar a vocês? – perguntei percebendo que assustei os dois que se desesperaram em esconder alguma coisa.

–Desculpe, mas... Er... Estamos um pouco... Como posso dizer... – começou a garota de cabelos nos ombros e negros.

–Ocupados. – completou o garoto dando um olhar para a garota que se dirigiu a mim com um sorriso engraçado que estampava que eles estavam fazendo algo fora das regras.

–Tudo bem então... – disse rindo ainda do sorriso exagerado da garota que continuava a me mostrar seus dentes.

–Tá... Tá. Nós mostramos... – disse o garoto sem eu nem precisar me esforçar muito.

–O que?! – exclamou a garota olhando para os lados, se certificando que os centauros desocupados não tinham escutado.

–O que é que tem? – falou o garoto, iniciando uma conversa paralela e esquecendo da minha presença ali.

–Nós nem conhecemos ele... – disse a garota me apontando, mas sem olhar para mim. Me senti estranho. Parecia que eu era um vira-lata, em um pet-shop, sem saber se o casal ia ou não querer me levar pra casa.

–Rafael. Rafael Dalmarco, filho de Apolo. – por mais que eu prometesse não falar desse jeito quando fosse me apresentar, não consigo evitar ter um pouco de orgulho na voz e imaginar uma trilha sonora emocionante enquanto falo “Filho de Apolo”. Mas enfim...

–Pronto. Já sabemos quem ele é. – disse o garoto – Meu nome é Gabriel Ferraz.

–Gracy Castelo Branco. – disse a garota ainda não convencida.

–Somos filhos de Deméter. – acrescentou Gabriel. Os dois pareciam ter uma energia inesgotável canalizada na fala, porque simplesmente não esperavam que um terminasse o que estava falando que o outro completava. Eles poderiam ser gêmeos, porem não possuíam nada de parecido.

–E então? O que vocês estão fazendo ai? – perguntei ouvindo uma risada estrondosa de alguns centauros que riam de uma garota que por azar caíra por completo em um aglomerado de merda. Tipo, muita bosta mesmo. – Espero que seja algo para fazer calar a boca desses idiotas vagabundos.

–É exatamente sobre isso. – disse ele dando uma risada estranha e fazendo uma expressão um pouco macabra (e de pensar que eu achava Matheus sem noção).

O plano deles era uma coisa chamada Bomba-de-Delicadeza. Bem, posso admitir que além de habilidade em jardinagem os filhos de Deméter possuem uma inteligência bastante útil.

A tal engenhoca era uma bolinha, do tamanho de uma bola de pingue-pongue. Possuía um aglomerado de raízes, folhas e flores pequenas que moldavam o seu formato esferico.

–Olha, não pode usar muitas de uma só vez. – disse Gabriel me entregando o objeto.

–É só para pregar peças, nada de mais grave que isso. – falou Gracy.

–O que acontece se eu utilizar mais de uma em uma pessoa só? – perguntei olhando a bola em minha mão.

–Bem, os efeitos são dobrados, triplicados, quadriplicados...

–Ele já entendeu. – disse Gracy interrompendo Gabriel.

–Tudo bem então. – disse guardando a bolinha com cuidado – Quando podemos testar?

***

Conhecer Gracy e Gabriel meio que me tiraram um pouco o pensamento sobre Luana dentro da Casa Grande. Imagino que mais cedo ou mais tarde saberei, talvez, o que tanto foi debatido lá dentro. E no momento, o que eu realmente queria era ver uma Bomba-de-Delicadeza sendo ativada.

Disfarçamos. Continuamos a fingir que realizávamos a atividade nojenta que foi entregue. Um centauro, que parecia se “sobressair” sobre os outros ali presentes foi a minha escolha de teste (gente que se acha de mais precisa baixar a bola um pouco).

Dei sinal de positivo para Gracy que sinalizou a Gabriel que eu estava pronto. De acordo com o plano, Gabriel seguiu “inocentemente” em frente do grupo dos centauros, que começaram a cochichar enquanto ele se aproximava.

–Lá vem mais uma faxineira... –disse o meu alvo, fazendo os outros darem um sorriso de canto de boca. Ele usava uma camisa do Chicago Bulls e um boné do Los Angeles Lakers, o que mostrava que ele não sabia nem o que usava (e que tambem não entendia de basketball) – O que tem ai nesse balde, garoto? Papel higiênico para os cavalinhos alados? Não me diga que você mesmo que vai...

Que cara desnecessário... Só me fazia ter mais vontade de entregar a ele o comprimido-de-se-tocar.

Gabriel tropeçou derramando os produtos de limpeza fazendo os centauros caírem na gargalhada. Era o meu momento de entrar. Sem condições de me perceberem, me escondi atrás de um Pégaso castanho que comia tranquilamente, me agachei e lancei a bolinha no chão, que foi rolando até o encontro do “Todo-Poderoso-Vira-Folha”.

Bem, ai vai o que uma Bomba-de-Delicadeza faz. Ao tocar o casco do centauro-alvo, instantaneamente um aglomerado de trepadeiras e flores cobriram o homem-cavalo que recebera até um cheiro bom e uma mudança de titulo para "Poderosa".

Gabriel foi o primeiro a rir, com uma risada escandalosa que logo puxou outras em seguida. Todos pararam de realizar as tarefas para observar o centauro correr de um lado para o outro fazendo brotar flores por onde galopasse. Os pégasos que ali estavam correram, fazendo um grande alvoroço e provavelmente chamando atenção de todo o acampamento.

***

Mais tarde, nos demos mal. Fomos repreendidos pelo Quíron logo depois que ele terminou a reunião (e assim perdi mais uma chance de poder conversar com minha irmã).

Recebemos um castigo. Teríamos de ajudar o centauro a se livrar dos efeitos da Bomba-de-Delicadeza até o fim, quando ele não tivesse mais nenhuma florzinha se quer brotando no seu caminho. Sei que parece um pouco humilhante ter que ajudar alguém que você pregou uma peça, mas acho que vai ser difícil eu não rir dele todos os dias que fomos de encontro ao nosso castigo.

Quíron retornou à Casa Grande, agora convocando os lideres dos chalés. Enquanto eu passava com Gabriel e Gracy, vi Alice acompanhando ele, como líder do 7.

Provavelmente o assunto da reunião com aquelas garotas será passado agora para os representantes de cada deus.

Enquanto Alice seguia para uma conversa importante, ali estava eu, seguindo em direção a um homem-cavalo, todo florido. Não posso fingir que não senti inveja. Claro que senti, e acho que por conta disso o humor que teria ao encontrar o miserável-delicado não existiu, e não consegui esconder o meu interesse sobre o assunto.

***

–Você está bem? – perguntou Gracy ao perceber que eu havia mudado desde que vi os lideres sendo convocados.

–Acho que ele não é do tipo vagabundo como agente. – disse Gabriel puxando um ramo de raízes do cabelo do centauro que reclamara franzindo a testa. – Relaxa. Fazer coisa errada às vezes é legal.

–Tem a parte chata, é claro. – disse Gracy alisando as flores que brotavam magicamente no solo fazendo-as adormecerem. – Mas o bom é que depois você tem o que falar para os seus amigos... Acaba construindo um passado, para poder contar no futuro.

Gracy encontrara uma definição tão filosófica para coisas que são definidas proibidas pelos outros... e posso dizer que gostei do modo dela ver isso.

–Era para eu sentir ardor nas pernas? – perguntou o centauro olhando para Gabriel que já se encontrava montado na parte de cavalo do homem.

–Ah, deixa de frescura. – disse Gabriel arrancando mais um aglomerado de plantas agora das costas da criatura. – Não é ardor nenhum. Você tá procurando problema onde não tem.

O nome do centauro era Heitor e sua aparencia é de uns 20 a 25 anos de idade humana (não sei como funciona a idade deles). Ele realmente ficou ofendido com a brincadeira, e nem se quer riu de nós por estarmos agora desfazendo o que tínhamos feito a ele. Simplesmente franzia a testa ou reclamava alto de algumas vezes que tirávamos os ramos com força, porém não trocava palavra alguma com agente (algo me dizia que ele não se dava bem sem os seus “amigos”).

–Vocês tem alguma ideia do que está acontecendo lá dentro? – perguntou Gabriel com um tom animado na voz.

–Não mesmo... – disse Gracy sem muita animação – Algo me diz que terá alguma missão para algum semideus...

–E a presença das caçadoras... – falou Heitor que começava a se importar menos com a dor – Acho que é algo mais serio que uma missão qualquer...

–Espera. Você falou “caçadoras”? – perguntei olhando para Heitor que levantava um dos cascos dianteiros para Gracy poder tirar o aglomerado de copos-de-leite.

–Sim... As guerreiras donzelas. As leais Caçadoras de Ártemis. Nunca ouviu falar? – perguntou ele olhando para mim com aqueles olhos de íris amareladas.

–Ele é novato... – disse Gabriel – Não sabe de muita coisa.

–As caçadoras são aliadas da deusa Ártemis. Leais por toda a eternidade. – continuou Heitor olhando o céu que já começava a escurecer – Uma garota que decide virar caçadora, sacrifica coisas que provam o seu desejo de se unir a deusa da caça.

–Sacrifícios de que tipo? – perguntei.

–Nada de garotos. – disse rapidamente Gracy – Veja só... – sussurrou ela a ultima parte balançando a cabeça.

–Elas abandonam a possibilidade de viverem romances e se dedicam apenas a servirem a deusa. Andam sempre em grupo e vivem eternamente, sem mudar a aparência. – disse Heitor.

–Então elas são imortais... – conclui.

–Não exatamente. – completou o centauro que prendeu um palavrão quando Gabriel puxou mais umas raízes das suas costas como se o estivesse depilando – A morte só chega para uma caçadora caso ela seja derrotada em batalha, tirando isso ela será a mesma garota durante todo o tempo.

***

Alice apareceu depois de um tempo, quando já tinhamos tirado boa parte das flores que cobriam Heitor, que, conhecendo melhor, parecia ser um centauro legal e que eu tive que explicar um pouco do quão errado era usar o boné do Lakers e a camisa do Bulls.

Ela franziu a testa quando nos viu. Ainda carregava seu cinto de lápis e percebi que Gabriel não parava de olhar para ele, provavelmente se perguntando como Alice devia usá-lo.

–Rafael – disse ela – Preciso falar com você.

Me levantei e me despedi dos novos amigos rapidamente. Estava esperançoso de que Alice ia me contar o que as caçadoras tinham dito a Quíron.

–O que o Quíron falou para vocês? – perguntei num sussurro.

–Você vai saber em pouco tempo... – disse ela me fazendo dar um sorriso descontrolado – Tudo vai ser explicado.


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