Na Linha Da Vida escrita por Humphrey


Capítulo 24
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Eu ainda estava um tanto tonta, e aquele cheiro doentio de hospital estava me deixando com dor de cabeça. Olhei para as minhas mãos, que estavam nas laterais do meu corpo, sobre a cama, e então vi tia Joana sentada na poltrona ao lado, com uma revista velha nas mãos, provavelmente fingindo estar interessada só para não ficar completamente no tédio. Na capa, havia carros visivelmente caros e, bem, foi aí que confirmei que minha tia estava realmente tentando afastar o clima entediante.

Ela forçou um sorriso ao ver que acordei.

– Ah, céus, fiquei tão preocupada! – Se aproximou ainda mais de mim, empurrando a poltrona um pouco mais para frente. – Seu tio não quis vir, mas, olha, ele quase morreu de susto quando viu você no chão. – Após isso, ela falou algo que eu não consegui compreender, mas tinha algo a ver com comprimidos e a respeito de eu ter desmaiado.

Ainda forçando a vista para focar em algo, apenas assenti lenta e hesitantemente, torcendo para que aquilo não tivesse sido uma pergunta.

– Anne? – me chamou.

– Oi... – Finalmente a tontura diminuiu.

– Eu vi alguns comprimidos no chão e alguns que não conseguiram chegar até o ralo da pia. Foi por isso que você desmaiou e está fraca. Você não está tomando os remédios, não é? – ela alterou um pouco a voz.

Engoli em seco.

– Sim, eu... eu os jogo fora, tia. Se eu sei que isso não vai dar certo, então pra que tentar? É perda de tempo. – Bufei, assoprando uma mecha de cabelo que estava no meu rosto.

– Vai dar certo, sim! Como você acha que os remédios vão funcionar se você não os toma? Isso é ridículo, Anne.

– Ridículo é você não entender o que eu estou querendo dizer. Minha mãe, tia, ela se esforçou tanto para tratar a doença, e olha no que deu! Eu não estou reclamando, só não quero decepcionar vocês. Não quero “sumir” do nada.

– E você não vai.

– Quem sabe? – dei de ombros.

– Anne, para! Eu não quero brigar com você. Vai tomar os remédios e vai fazer os exames, porque eu sou sua tia e só quero o seu bem.

Não respondi, e sua expressão dizia que não precisava de uma resposta. Fiquei encarando aquela parede branca, cujo objetivo era, certamente, dar esperanças aos pacientes ou algo do tipo. Era inútil, pois a maioria dos doentes ali sabia que não escaparia. Mas é claro que ninguém escaparia.

Minutos depois, Dr. Fletcher entrou no quarto e pediu com que eu me sentasse. Então, começou a me examinar, a expressão facial séria e com um ar preocupado e cansado, como de um homem que chegaria em casa, jantaria com a esposa exausta – talvez filhos –, dormiria de costas para a esposa exausta, acordaria no outro dia e viria ao hospital para fazer as mesmas coisas de sempre.

Reparamos demais nas pessoas cujas vidas estão desmoronando quando a nossa vida igualmente está desmoronando.

Chegamos em casa. Tia Joana jogou a bolsa em uma das poltronas na sala de estar e foi até à cozinha, o silêncio sendo preservado. Ainda cansada, tentei subir as escadas sem precisar olhar para os degraus; aquilo só me daria mais ânsia. Antes de entrar no meu quarto, por uma fresta pude ver tio Philip organizando alguns pequenos papéis em cima da cama. Ele observava o papel acima, segundos depois o colocava abaixo de todos os outros, e assim consecutivamente. Contudo, deixei isso pra lá e abri a porta do meu quarto.

Sentei atravessada à beira da janela, recostando a cabeça e fechando os olhos. Eu não acreditava que estivesse passando por tudo aquilo. Antes de me tornar amiga do Brandon, eu era um pouco mais feliz. Ou talvez não. Isso era estranho, pois eu amava Brandon mesmo com tudo o que tinha acontecido; mesmo com tudo o que ele tinha feito para mim. Ter me apaixonado por ele parecia ter sido completamente errado, como se eu devesse ter me apaixonado por outro garoto, não por ele, mas que eu havia mudado o destino, e estava pagando por isso.

Que pensamento ridículo.

~~~~ ♣ ~~~~

Eu havia recebido um telefonema do colégio, dizendo que eu seria transferido; decerto, Anne tinha dito ao tio que a culpa dos cartazes era toda minha. Maravilha. Além de ser expulso da escola, eu seria expulso da minha própria casa.

Minha mãe e eu tínhamos brigado muito durante a tarde toda, enquanto Deisy estava na escola.

– Por que você fez uma coisa dessas comigo, Martin? – exaltada, perguntou minha mãe, chorando e passeando pela cozinha. – Eu te avisei que teria consequências se alguma coisa dessas acontecesse. Eu te avisei!

– Devia ter me dito que meu pai tinha algo a ver com isso. Aliás, por que me meti nisso? Eu não fiz nada! Porra, não sou vidente!

– Quatro escolas, Martin, quatro! Você me prometeu que isso nunca mais se repetiria!

– Eu nunca fui bom em cumprir promessas – sussurrei, mais para mim do que para ela.

De costas para mim, ela tentava engolir o choro e pousava as mãos sobre um dos balcões, evitando contato visual.

– Daqui a algumas semanas, seu pai vai te levar pra Vermont.

– Não sou obrigado – resmunguei.

– Você ainda não é maior de idade, e eu falei a ele que, caso você se metesse em mais alguma confusão dessas, iria morar com ele. – Ela finalmente se virou para mim. – Vai ser melhor para todo mundo.

– É, acho que sim.

Fui para o meu quarto e, em cima da escrivaninha, vi uma ligação perdida do David no meu celular, só que não retornei. Eu não precisava daquilo, naquele momento. Mas, sim, de conversar com... Bailey.

De repente, vi uma aba aberta na tela do computador. Era uma mensagem offline, com as seguintes palavras em negrito:

“Eu aceito a proposta.”

Na madrugada da mesma noite, esperei minha mãe e Deisy irem dormir para poder ter um momento de sossego. Então, peguei o carro e saí de casa, passeando pelo bairro, quando me vi indeciso se iria ao bar, que estava logo na esquina, ou continuaria meu percurso sem rumo. Mas eu havia jurado à Anne que nunca mais faria isso.

E ela, tinha me traído.

Eu bebi, mas não o suficiente para ficar bêbado. E insatisfeito com a minha covardia de não beber mais por peso na consciência, paguei ao caixa e saí do bar.

Caminhando até o carro, vi algo inesperado. Ou, pelo menos, vi o que achava ter visto. Deveria ter sido algo a ver com a bebida, mas, ao chegar razoavelmente perto – o suficiente para uma pessoa sem problemas visuais conseguir interpretar uma figura no escuro –, lamentei em não ter sido apenas mera ilusão.

Jogada e recostada a uma parede, Anne segurava uma garrafa de vodca e parecia completamente fora de si, nem notando que havia alguém presente.

Me agachei perto dela e então Anne olhou para mim; pude ver o lápis borrado sob os olhos, ambos quase se fechando. A levantei, e pude ver que ela mal tinha equilíbrio.

– Saia... daqui – sussurrou, como se precisasse usar todos os músculos para dizer isso. E só então percebi que ela sabia quem estava carregando-a.

Abri uma das portas traseiras do carro e a fiz se sentar. Ela tentava sair do carro inutilmente, tentando me impedir de sentar ao seu lado.

– Anne, calma, tá bom? – disse a ela, finalmente conseguindo me sentar.

Logo ela começou a chorar, me abraçando. Não perguntei o porquê nem falei sequer outra coisa, apenas retribuí instantes depois. Notei o quanto o cabelo espalhado ficava impressionantemente bonito nela, mesmo naquele estado.

Quando vi que estava demorando a me soltar, percebi que havia dormido, portanto a deitei no banco traseiro e passei para o do motorista. Entretanto, antes de ligar o carro, a ouvi sussurrar:

– Eu amo você, Brandon Cooper.


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Notas finais do capítulo

Oe! Eu demorei um pouquinho, né? :-v Tô muito ocupada ultimamente, e tal; amanhã tenho duas provas, até. Mas espero que tenham gostado *u* Kissu!