Tsuru escrita por Arqueiro


Capítulo 3
Capítulo 3




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O primeiro pensamento que surgia à Hyuuga ao pensar em Konoha era o medo. Todos os terríveis acontecimentos da noite a qual fugira da vila somavam-se em sua mente num turbilhão tão caótico, quanto aterrorizante.

Quatro anos onze meses e treze dias. Era a quantidade de tempo exata que todo o pesadelo começou. Um sorriso sem qualquer humor encheu o rosto da Hyuuga. Ela daria tudo para que isso fosse somente um pesadelo e que logo despertasse. Mas os círculos roxos debaixo de seus olhos denunciavam que ela não dormia bem há tempos. Sua vida transformada para sempre num horror caótico e desmedido. Exatos, quatro anos onze meses e treze dias.

Passou os dedos em seus cabelos amarelos mais uma vez, empurrando uma pequena quantidade para trás de sua orelha. Com a audição livre da cortina de fios, Hinata fechou os olhos verde-escuros. Do galho em que se sustentava, não tinha um ângulo de visão muito boa do caminho que levaria de volta à vila, mas tampouco precisava disso. Ela tinha o Byakugan, as veias destacadas ao redor dos olhos eram um lembrete.

Não muito longe, mas tão longe quanto sua audição podia captar, três soldados escoltavam um bando de pessoas tão inócuas quanto um cachorrinho recém abandonado, provavelmente. Muitos deles deveriam ser trabalhadores de pequenas aldeias e vilarejos nos derredores de Konoha. Alguns poderiam ser realmente bandidos ou algo parecido. Crianças também estavam entre os escoltados, alguns agarrados as mãos de seus prováveis familiares, ao passo que outras prosseguiam sozinhas pelo trajeto.

Mas isso pouco importava. Seus destinos já estavam traçados assim como o seu fora. Enquanto os deles eram servir até a morte os desejos de Danzou, o que francamente não demoraria muito tempo, o seu era viver ao lado de sua família, não realmente feliz, pois estaria cercada eternamente pelo medo e desconfiança de que alguém a acordasse no meio da noite ajudando-a a fugir, ou por algo pior, contudo o suficiente para levar os anos seguintes.

Só que sua família não estava ao seu lado. Na verdade, não houve um contato sequer após a "noite do", assim como ela apelidara a noite em que fugira. Podia colocar tantos adjetivos, a noite do desespero, do medo implacável, do começo do caos que hoje era sua vida, do enterro de seu amigo...

Balançou a cabeça. Não se distrairia com esses pensamentos, não agora. Toda sua concentração deveria estar no plano mais ousado que se permitiu planejar. Não era nada mirabolante, ao contrário, seu plano se resumia em poucos e simples passos.

Primeiro, conseguir o dispositivo que permitiria seu acesso as partes mais internas da vila. Segundo, chegar até as partes mais internas e, de algum modo que ainda não sabia encontrar sua família. E terceiro, fugir o mais rapidamente possível, porque ela era nada próximo da força que Konoha possuía. Em três passos. Era assim que planejara resgatar sua irmã e seu pai.

Não havia muito que ser feito. Muito provavelmente, se os boatos que ouvira estiverem certos, metade de seus parentes, mais especificamente os membros da Bouke, estava morto agora, inclusive seu primo Neji. E entre resgatar sua irmã e seu pai com uma pequena possibilidade de sair viva ou toda a Souke, se é que eles estavam realmente vivos, com a certeza de que morreria, bem, ela escolheu a primeira opção.

Para Hinata, os motivos que levaram Danzou a empreender um ataque à sua família ainda eram nebulosos, contudo, concluíra que a influência política e o poder ofensivo de seu clã foram as maiores razões disso. Todavia, se os boatos do extermínio da Bouke estiverem certos, os objetivos de Danzou poderiam ser muito mais obscuros que somente poder politico. Preferia não pensar nisso.

Os passos estavam mais perto agora. Sua mão, coberta pela luva que ia até o cotovelo, pegou uma bolinha negra no compartimento agarrado na parte de trás do cós de sua calça. As veias, em volta de seus olhos, saltadas. A bolinha rolava entre os dedos finos. Puxou o capuz da capa bege-acinzentada escurecida que vestia escondendo a face. Estava pronta para a primeira parte do plano. Conseguir o dispositivo.

No momento em que viu o envoltório, semelhante a um relógio, preso no pulso de um soldado de cabelos pretos, ela instantaneamente soube que era o que estava procurando. Já havia visto aquele objeto antes, em uma das vezes que rodeou a vila em busca de informações. Geralmente, os soldados aproximavam aquilo de painéis quadrados perto de portas e automaticamente uma entrada surgia. E, para ela, essa entrada representava o acesso à sua família.

Lançou a bolinha aproximadamente a 30 centímetros dos pés dos soldados. Os músculos enrijecidos, prontos para atacar.

Naruto que àquela altura já estava mais estável e com sua determinação renovada, quase não percebeu a pequena esfera rolando a centímetros de distância. No segundo que seus músculos começaram a reagir, foi o segundo em que a nuvem de fumaça roxa o cercou. Tarde demais.

Hinata já estava em posição de ataque. As mãos moldadas com chakra desciam em direção à Sakura. A cortina de fumaça não era um empecilho para seus olhos. Seus ataques alternavam entre o próprio Juuken e o taijutsu normal. Uma das coisas que aprendeu enquanto esteve fora era variar seus ataques.

Sua mão desceu ao ombro da rosada e tocou-o levemente. Tão sutil que poderia ser confundido com uma carícia, mas o grito abafado de Sakura demonstrava o contrário. Girou o corpo acertando um chute na panturrilha da kunoichi, tirando-lhe o equilibro. Estendeu o braço direito, ainda enquanto rodopiava, o punho concentrado com chakra. As costas da mão acertaram a face da Kunoichi, numa mistura de Juuken e Taijutsu, não forte o suficiente para fazê-la desmaiar, mas forte para desorientá-la.

- Fomos descobertos! - Uma voz gritou dentro da fumaça.

Hinata só pôde sorrir. O timing estava perfeito até agora. Observou o soldado loiro cambaleando em sua direção, provavelmente atraído pelo grito da companheira. O Uchiha encaminhava sua mão em direção ao lançador de kunais preso na cintura. Rapidamente, a morena pegou Sakura pelo colete e a empurrou sobre o louro. Devido à falta de visibilidade o choque, entre as costas da rosada e a parte da frente do Uzumaki, veio inesperado e o máximo que Naruto pôde fazer foi tentar não cair ao sustentar a kunoichi.

Uma coisa que agradecia às ruas, se é que realmente poderia agradecer por qualquer coisa, era o fato de tê-la ensinado a ser tão sorrateiro quanto um felino. No momento em que seus mantimentos, guardados por Kō, acabaram e estava literalmente morrendo de fome, restaram poucas opções para ela. Dentre elas estava vender seu corpo por comida ou roubar os comerciantes para sobreviver, e, claro, optou pela última opção. Logo descobriu que se tornar imperceptível para furtar objetos para trocar por comida era muito mais eficiente do que anunciar um assalto propriamente dito.

Não tardou a perceber que o soldado moreno possuía a mesma natureza que ela e isso era muito perigoso. Dava para perceber somente pelo modo que ele movimentava o corpo. Silencioso e veloz. Ela tinha que agir. Avançou em direção ao louro, que amparava a rosada desajeitadamente em frente ao seu corpo, Hinata já concentrava chakra em seu pé esquerdo. Pisou com o pé direito no abdômen de Sakura, jogando ambos, Naruto e a rosada, de encontro ao chão. Utilizou o impulso que conseguiu com o movimento e direcionou um chute com o pé esquerdo à Sasuke, que habilidosamente defendeu.

Engatilhado na mão direita do Uchiha, o lançador de kunais. Hinata havia visto esse tipo de arma antes, principalmente nas mãos dos ninjas de Konoha. Lançavam as lâminas tão rapidamente que era comum pessoas serem assassinadas mesmo que estas estivessem dezenas e dezenas de metros de distância. E, naquele momento, ele estava a poucos centímetros de seu cérebro.

Ela não sabia se Sasuke realmente conseguia vê-la, mas, mesmo com a arma apontada para seu rosto, ela sabia que não era possível, não entre a fumaça espessa do local. E mais uma vez constatou a periculosidade daquele soldado. Os olhos apurados conseguiram ver os dedos se contorcendo ao redor do gatilho. Não havia como se esquivar. Ainda estava suspensa no ar quando ouviu o clique que liberava a kunai.

Seu instinto de autodefesa agiu tão rápido, tão surpreendentemente rápido, que sequer notou quando sua mão acertou levemente o pulso do moreno, desviando a kunai milímetros da trajetória original, riscando um pequeno corte na bochecha direita. Aterrissou, arquejando precariamente em busca de ar, mas tudo que encontrou fora sua própria armadilha de fumaça. Sua garganta começava a se irritar por causa do ar podre ao seu redor. Abriu os olhos que não havia percebido que havia fechado com tanta intensidade.

Um terror começou a consumi-la, sobrepujando qualquer estratégia que poderia formular no momento. As lembranças do 'dia do' encheram sua mente. Isso sempre acontecia. Sempre que vivenciava alguma situação que causava certo medo, por menor que fosse, entrava em desespero. Era como uma represa que abria suas comportas liberando o excesso de desespero que a consumia. Suas noites se resumiam basicamente em tentar se livrar o mais rápido possível de seus pesadelos frequentes - quase diários, na verdade -, e permanecer acordada o maior tempo que sua fadiga permitia.

Mas, naquele momento, ela não estava ali lutando para falhar. Não estava ali somente por sua irmã e seu pai, porém, acima de tudo, ela estava ali por ela mesma. Ela era egoísta demais e sabia que estava ali porque não aguentava mais a solidão sufocante que a cercava, que só reunira coragem o suficiente porque queria sentir-se segura novamente.

E com esses pensamentos em mente, sacou uma kunai e atirou-a. O som do ar sendo cortado preencheu a audição de Sasuke, que se esquivou com um diminuto impulso para a direita. Contudo, Hinata já esperava por isso e, em menos de um segundo, sua mão envolvia o dispositivo agarrado no pulso do moreno.

-Hakke Kushou. - Foram quase inaudíveis, mas fora tudo que Sasuke conseguiu ouvir antes de sentir a massa repentina de ar o arremessar dezenas de metros para longe da confusão.

Estava estática por um segundo. O dispositivo descansava em sua mão que agora estava tão maleável quanto pedra. Ela realmente tinha conseguido, afinal. O fato era tão absurdo que precisava daqueles segundos para absorver aquela informação. Há quase um minuto estava escondida na vegetação próxima, e agora ela estava um passo mais próxima de resgatar sua família. Foi o barulho de movimentação ao seu lado que a despertou. Ainda não havia terminado. Viu o soldado com a máscara de raposa começar a se levantar. A fumaça dissipando-se cada vez mais. Seus pulmões queimavam mais e mais a medida os segundos passavam. Antes que pudesse pensar em uma linha de ação suficientemente boa, fez a primeira coisa que lhe veio à mente.

Fugiu.

***

Seu nariz sangrava. Ainda estava meio desorientado devido ao impacto pétreo da cabeça de Sakura contra seu nariz, quando ouviu os passos rápidos distanciando-se. Ergueu o corpo, agora desmaiado, da rosada e a depositou deitada longe da névoa perigosa, já mais rarefeita.

- Sasuke, cuida da Sakura. Eu vou atrás dele! - gritou. – Desgraçado!

O loiro não tinha a mínima certeza se seu parceiro de equipe conseguia escutá-lo - além disso ele nem sabia onde ele estava -, porém como não tinha tempo a perder esse foi o aviso mais decente que ele podia proporcionar no momento. Girou rapidamente sobre os calcanhares indo em direção ao local de onde vinha farfalhar das plantas.

Com certeza alguém havia os delatado, e agora estava sem sua chave que acabaria nas mãos do Hokage, tornando qualquer outra ofensiva muito mais difícil de ser orquestrada.

Corria como nunca havia feito antes. Cada segundo que passava, sentia sua oportunidade de acabar com Danzou escorregando pelos seus dedos. Fúria e frustração borbulhando em seu interior. Aquela vozinha dentro do seu crânio sempre clamando pela morte de dezenas de pessoas, mas que, neste momento, resumia-se no ninja que perseguia. Suas unhas alongadas cortavam a carne das suas mãos. Suas íris avermelhadas.

Seguiu os rastros mais algumas centenas de metros. As raízes das árvores atrasando-o. O suor escorrendo pelo rosto. Quem quer que fosse era mais rápido do que previra. Já vislumbrava o muro que circundava Konoha, mas só agora, tão próximo da vila, percebera que havia algo de estranho. A confusão o acertou tão violentamente que seus olhos e unhas retornaram aos seus estados normais. Mas seus pés não pararam, o levando cada vez mais perto do seu alvo.

Diferentemente do que pensara, o guarda - aquele só poderia ser mais um das centenas que Danzou possuía - que havia tomado a sua chave de entrada não corria em direção a entrada da vila, a hipótese mais provável. Pelo contrário, ambos se distanciando mais e mais e mais de lá. Naruto havia estudado tanto os arredores da vila que podia dizer que os conhecia melhor que a palma de sua mão. Ele tinha certeza que não havia outro meio de se entrar na vila a não ser pela sua única entrada. E se houvesse outra era certo que Sai já teria informado à resistência.

A respiração esbaforida parecia ser tangível devido à intensidade. Seus pulmões pinicavam pela fumaça, mas nada tão intenso como parecia acontecer com o encapuzado.

"Estranhou, ele deveria estar mais preparado já que havia planejado o assalto", pensou. O encapuzado parecia estar em uma situação pior que a dele. Sorriu. Aquela poderia ser sua oportunidade de conseguir alcançá-lo. Na realidade sua proximidade era maior a cada passo que dava.

- Eu vou te matar, seu desgraçado! – Bradou.

Hinata sentia seu ritmo diminuindo. A adrenalina inicial assentando no seu organismo, e a proximidade perigosa aumentando. O oxigênio queimava sua laringe sensível, acompanhada das náuseas que pareciam querer expelir sua última refeição e a fumaça aspirada. Teria de suportar a sensação por mais alguns metros, pelo menos até atingir a fenda. Estava preocupada, não sabia se deveria tentar um combate direto contra o capanga de Danzou para ele não saber que ela sabia sobre a fenda ou se deveria ir direto para lá. Mas nas atuais circunstâncias em que se encontrava não fazia sentido tentar esconder por onde entraria. Salvar sua família seria uma oportunidade única, e caso ela não conseguisse fazê-lo agora, não conseguiria depois.

Ao chegar nessa conclusão, Hinata começou a acumular chakra nas plantas dos pés, e começou a correr pelo muro de Konoha. O capuz escorregou de sua cabeça pela posição em que corria, revelando as mechas douradas. Naruto observou tudo, embasbacado. Ele simplesmente não poderia acreditar no que estava acontecendo, era irreal demais.

Depois de meses de preparo e treinamento e planejamento, conseguira, junto com seu time, a oportunidade de penetrar no território de seu maior inimigo. Até aí, tudo bem. Nada mais justo após tanto trabalho, pensava. Contudo, quando estava prestes a entrar na vila, uma lunática conseguiu derrotar, não, desorientar – Naruto não admitiria derrota – não só a ele como ao restante de sua equipe e roubar seu passaporte para a vila. E pelo que via agora, o objetivo dela era se suicidar. Bateria palmas pela estupidez dela se não estivesse tão preocupado em recuperar o que lhe foi roubado. E antes que pudesse perceber estava correndo muro acima atrás da loira.

Não era segredo para ninguém que o espaço aéreo da vila era protegido por um campo de força. Saindo da borda do muro e encontrando-se no alto do centro da vila, o campo tinha forma de um domo. Era tão visível quanto o ar que respirava. Houve boatos de que a tecnologia era importada do País do Trovão, e a forma de pagamento fora vários integrantes do Clã Hyuuga. No começo estava cético quanto ao funcionamento da barreira, não só ele, na verdade, alguns integrantes da resistência – o loiro não sabia dizer se eram audaciosos ou idiotas – que tentaram ultrapassar os limites dos muros transformaram-se num torrão negro e chamuscado. Não havia muito que se fazer depois que o choque ocorria. Tentar levar o corpo inteiro até a base da resistência e fazer um enterro digno, talvez.

Naruto estava perto agora. Algo em torno de duas vezes o tamanho de seu braço o separava da lunática. Mas foi então que aconteceu. Ela estava a um metro de distância do lugar onde o Uzumaki se lembrava que começava o campo. Os braços da mulher moveram-se brevemente e um clone perfeito dela surgiu. O clone saltou para cima, mas não ultrapassando a margem do paredão, ficando suspensa no ar por alguns segundos. A Hyuuga pulou logo atrás, sua mão agarrando o a mão do clone. O loiro sabia o que ela planejava, ele fazia isso às vezes. Usar um clone para conseguir impulso ou para ser lançado por ele para algum ponto que não acessaria facilmente sozinho. Isso estava prestes a ocorrer, ela se lançaria contra a barreira e morreria.

Ele não sabia se fora o desespero por saber que perderia sua chaveou por simplesmente não saber o que fazer, contudo quando percebeu ele já tinha sua mão agarrada ao tornozelo da loira, voando junto com ela em direção ao campo. Fechou os olhos esperando seu corpo entrar em combustão, os pelos de todo seu corpo eriçando-se.

Um. Dois. Três segundos se passaram. Ainda incerto, abriu os olhos. Sua boca escancarou em incompreensão. De algum modo havia superado a barreira e estava em pleno ar, à mercê da gravidade. Mas havia algo muito mais importante do que isso.

Estava dentro de Konoha.

***


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