The End Is Coming escrita por Aya Ishikawa


Capítulo 2
De Como Meti o Sam Nessa


Notas iniciais do capítulo

Esse é um capítulo meio longo e a importância dele é grande, por favor leiam! Qualquer dúvida é só comentar =)



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Já fazia uns três ou quatro meses que eu e o Sam éramos amigos, nós sentávamos juntos na aula, lanchávamos juntos, tirávamos as Xerox juntos, fazíamos trabalhos juntos, e até mesmo andávamos uma parte do caminho pra casa juntos, embora eu realmente tivesse que fazer um caminho mais longo para acompanhá-lo, isso não me incomodava, tudo o que eu queria era poder estar perto dele.

Não era como se eu estivesse apaixonada, ou será que era? Até hoje não sei responder essa pergunta. Enfim, em uma das vezes que caminhávamos para a casa juntos perguntei:

–Sam, você acredita que já tivemos outras vidas?

Ele me olhou de uma forma meio curiosa:

–Como assim?

–Bem, você sabe, tipo, acredita que quando alguém morre pode reencarnar ou aparecer como fantasma ou algo do tipo?

Ele parou de caminhar, olhou pra mim e disse:

–Olha Aya, eu já vi tantas coisas nos meus dezesseis anos de vida que realmente eu não poderia dizer que não acredito. Acho bem provável que haja espíritos entre nós e até mesmo outros seres. E você, o que acha?

Eu sabia muito bem o que eu achava, ou melhor, do que eu tinha certeza, só não sabia se poderia confiar nele para contar tudo. Eu tinha medo que acontecesse como da última vez em que contei pra alguém, tinha medo que ele risse de mim e se afastasse por eu ser louca e esquisita.

–Hum... Eu acho que pode ser possível.

Ao dizer isso senti algo dentro de mim doer, ouvi uma voz em minha cabeça: “pode ser possível?” junto com a voz vi o rosto daquela mulher que sempre estava comigo, dessa vez ela pareceu ter ficado aborrecida, mas o que eu podia fazer, parecer louca?

–Mas por que essa pergunta assim tão de repente?

Pensei comigo: “ótimo, tá vendo só, agora você vai ter que dar uma resposta!” me distraí com esses pensamentos e antes que eu pudesse notar senti algo tomar conta de mim, por um minuto vi tudo ficar escuro, o mundo sumir, e então eu já não estava mais com o Sam, eu estava dentro da minha mente, e via aquela ruiva falar com o Sam. Ele, é claro, não podia vê-la, ele ainda enxergava a mim, Aya, com meus 1,62 de altura, traços finos, e cabelos loiros até o ombro e olhos castanhos e sem graça. Mas ali, de dentro da minha mente eu a via falar com ele, ela com toda sua pose imponente, de quem é dona de si mesma, longos cabelos ruivos, olhos espantosamente azuis e um corpo de dar inveja em qualquer “poderosa”. Ela disse:

–Olá mon cher! Eu posso lhe responder essa pergunta. – Ela dizia isso com um sorrisinho travesso no rosto.

–Aya, você está bem? Como assim “olá”?

Eu via a expressão confusa no rosto de Sam, e a expressão de superioridade e sarcasmo no rosto daquela minha “amiga”:

–Não me chamo “Aya” petit chat, je suis Christinne, lady Du Clair, ao seu dispor.

Que droga! Sam deveria estar confuso, eu queria conseguir voltar ao meu corpo, comandar ele, para poder explicar tudo ao Sam, mas quando ela queria era mais forte que eu. Algumas vezes sinto falta da presença dela comigo, mas tenho certeza que um dia irei conseguir resgatá-la. Fato é que, eu estava presa, apenas como telespectadora do teatro de Christinne, naquele momento eu sentia raiva dela, se eu pudesse a estrangularia, mas tudo o que eu podia fazer era assistir até ela resolver ir embora. Sam parecia realmente assustado agora:

–Aya, melhor a gente parar com essa brincadeira.

Ela riu, um sorriso sedutoramente sarcástico como só ela sabia fazer:

–Você está com medo cavalheiro? Que tipo de guerreiro você pretende se tornar se está se assustando comigo, apenas um espírito que pretende te ajudar? C’est bien vou deixar “Aya” voltar para te explicar tudo.

Quando eu “acordei” Sam me olhava assustado e curioso ao mesmo tempo, a primeira coisa que eu disse foi:

–Temos que conversar, agora...

Continuamos o caminho de casa, andando vagarosamente, fui explicando ao Sam sobre Christinne, desde a primeira vez em que ela apareceu quando eu tinha apenas dez anos, até o dia em que ela resolveu começar a “usar” meu corpo.

–Sam, isso tudo parece meio estranho, ela se chama Christinne, embora esse não seja seu nome de batismo, é assim que ela gosta que a chamem. Ela viveu na França por volta de 1700, por acaso do destino ela teve que vender o corpo para sobreviver, ela teve uma infância terrível, o próprio pai abusava dela e foi morto pelas mãos dela, isso a fez ter que fugir de casa e começar uma vida pior ainda. Cercada de luxo, de festas e amantes que a prometiam o mundo e no dia seguinte sumiam deixando-a só em uma cama qualquer ela perdeu toda esperança na vida. Anos se passaram até que ela reencontrou seu amor de infância, ele sentia um louco ciúme dela, pela vida que ela levava. Ela, por outro lado, não podia fugir do lugar em que vivia por medo, marcas de queimadura em suas pernas a lembravam o porquê que fugir era errado. Enfim, depois de quase dois anos, tendo que estar com vários homens e sendo apenas de um, ela conseguiu se livrar daquela vida, ela achou que viveria feliz com seu amor, porém, o ciúme cego dele o fez engana-la para testar o amor que ela sentia. Até que a situação se tornou insustentável, quando ele disse que havia matado um homem por ciúme, um velho conhecido dela. Ele e Christinne brigaram e no calor da briga, com um pedaço de vidro que havia se partido, ela desferiu nele um golpe fatal. Percebendo o erro que cometeu ela mesma acabou com sua vida, deixando-se cair ao lado do que era o mundo dela.

Sam ouvia atentamente o que eu falava, eu não sabia se ele estava aceitando, achando que era brincadeira, ou tentando se lembrar do número do hospício, mas ele parecia relativamente calmo. Continuei:

–Em um dia enquanto eu estava no colégio, ainda no 5º ano, umas garotas vieram implicar comigo por causa do meu aparelho, eu me sentei num canto escondido do pátio para chorar e então ela apareceu, eu achava que ela era apenas uma amiga imaginária, mas com o tempo fui crescendo e lendo mais livros, e descobri a verdadeira situação dela: ela é um espírito que foi condenado a não ir para nenhum outro plano, apenas ficar presa a terra e por algum motivo que ainda desconheço, ela gosta de cuidar de mim. É como uma irmã, ou até mesmo como uma mãe.

Ele olhou pra mim, já havíamos chegado na rua em que ele morava:

–Aya, você deve estar imaginando que eu te acho louca. Admito que no começo, me assustei um bocado, mas ouvindo você contar toda a história, eu sinto veracidade nas suas palavras, eu apenas vou precisar de umas horas ou uns dias para conseguir assimilar tudo isso. Depois eu também gostaria de te contar algo... Você gosta de dragões?

Ao ouvir aquelas palavras me senti muito mais confortável, embora ainda estivesse um pouco desconfiada se o que ele dizia era verdade. Agora, o que ele queria dizer com dragões?

–Você diz dragões, tipo, aqueles que vigiam castelos e coisas assim?

–Isso mesmo, mas hoje não posso te contar, eu preciso de tempo pra isso. Acho que você vai gostar.

Eu sorri ansiosa para saber do que se tratava, nos despedimos como sempre, acenando a mão e dando um leve sorriso:

–Tchau Aya!

–Até amanhã Sam.


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