Demons escrita por Ninsa Stringfield


Capítulo 3
Capítulo 2




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/399313/chapter/3

Suas costas doíam tanto quanto sua cabeça. Ela sabia que havia se passado apenas alguns minutos, mas Katherine estava tão dolorida que parecia ter se passado dias. Uma das vantagens de ter tido um treinamento tão rígido no último mês era que, felizmente, ela não desmaiava tanto quanto antigamente.

Katherine tentou se levantar apoiando-se em sua mão direita, já que sua esquerda sangrava loucamente, mas arrependeu-se ao sentir uma pontada no fundo de seus ossos. Ela gemeu de dor e se sentou apoiada em uma parede meio destruída. Sua mão estava virada em um ângulo estranho, que causava-lhe muito mais arrepios do que dor em si. Pelo menos ela tinha parado de prestar atenção na beleza de Finn enquanto este tentava lhe ensinar alguns truques e começou a prestar mais atenção na lição ensinada.

Seu pulso fez um estalo quando ela o forçou para seu lugar correto, e antes mesmo que Katherine pudesse desabar no chão, a dor foi passando. Ela suspirou aliviada e olhou ao seu redor.

Sua cabeça ainda girava um pouco, mas mesmo assim, ela conseguiu visualizar o lugar onde se encontrava. Ela estava sentada em um chão ao mesmo tempo rochoso e levemente molhado, mas diferentemente do que ela estava acostumada quando sentia o cheiro de terra molhada, aquele lugar fedia, como se algo morto estivesse enterrado em algum lugar. E talvez tivesse mesmo. Katherine poderia confundir aquele lugar facilmente com um cemitério, tirando o fato de que aquele lugar não possuía nenhuma lápide.

Katherine olhou para trás, esperando ver o portal negro novamente, mas ao invés disso, ela vu apenas mais daquela planície infinita coberta de terra morta. A única coisa que se destacava na superfície era um ponto preto a alguns quilômetros de distância. Ela deixou sua cabeça pender para baixo e soltou um suspiro irritado. Onde os outros estavam? Ou melhor, onde ela estava?

Ela tentou se levantar novamente e seus pernas vacilaram, fazendo com que ela cambaleasse para trás, mas alguém segurou seu corpo antes que ela caísse, e Katherine olhou para trás.

Rox a segurava co um sorriso nos lábios, mas ele era frio, falso. Ela estava com raiva. Katherine demorou alguns milésimos de segundo para digerir a situação, então seu coração deu um pulo e ela se distanciou do anjo.

– Como você...?

– Como eu consegui segurá-la? - adivinhou Rox - é complicado.

– Complicado? - perguntou a outra sarcasticamente - Não me venha com essa de "É complicado" que eu quase morri, mereço uma explicação descente.

– Não acho que você realmente queira saber... - murmurou Rox cruzando os braços.

– Onde estamos?

– Se eu te disse que é complicado novamente você vai me aleijar?

– Tente.

– Digamos que... Bom, isso é realmente muito complicado - ela riu mas Katherine não a acompanhou - No sentido literal da palavra.

– Fale logo!

– Está bem! - gritou a outra levantando as mãos para cima como se estivesse se rendendo - Estamos presas em uma armadilha feita a milhares de anos cujo propósito era nunca falhar.

– Como você sabe disso?

– O que importa - continuou Rox ignorando-a - É que do mesmo jeito que nada pode sair, nada deveria entrar. Ou seja, como chegamos aqui?

– Pensei que você tivesse as respostas aqui - Katherine disse também cruzando os braços.

– Infelizmente eu ainda não cheguei a um posto tão divino quanto o de Deus, então me perdoe se eu não sei as respostas para todas as perguntas!

– Mas você sabe porque conseguiu me tocar quando deveria estar apenas na minha mente, e principalmente sabe onde estamos, ou seja, você sabe de algo que não quer me contar.

– Não sabemos todos? - Katherine a fitou amargamente e a outra revirou os olhos - O que quis dizer, é que estamos presas na única armadilha que não pode ser quebrada.

– Que seria...?

– A mente de alguém.

– Como é que é?

– Nossos corpos, quer dizer, o seu corpo, está enterrado em algum lugar nas profundezas do que um dia foi uma cidade.

– Eu estava na capela a apenas alguns segundos atrás - argumentou ela - Meu corpo não pode estar no subterrâneo de uma cidade que nem ao menos existe mais.

– Magia, Katherine, a resposta para todas as suas perguntas.

– E como vamos sair daqui?

– A vantagem de estarmos na mente de alguém, é que quando você coloca outras ali dentro, elas também passam a dominá-la, o que faz de você uma das pessoas que pode controlar esse lugar, e como eu vivo ai dentro, você meio que meu deu vida - explicou Rox.

– E isso é permanente? - Katherine perguntou com uma careta.

– Que engraçado - Rox fez outra careta - Mas não, infelizmente, quando você sair daqui, eu vou voltar para o lugar que realmente pertenço: a sua cabeça.

– Não dá para você ir para outro lugar? Tipo infernizando a vida de qualquer outro?

– Como eu ia dizendo - ela ignorou a menina novamente - Já que eu estou aqui, em carne e osso... Deus, como eu queria falar isso! - ela sorriu depois pigarreou para continuar - ... E eu meio que conheço esse lugar, eu posso ajudá-la a sair.

– Não entendi como você conhece esse lugar.

Rox piscou, como se estivesse procurando uma resposta plausível para a pergunta.

– Eu sou, era um Anjo. Nós sabemos de tudo.

Katherine olhou para a garota a sua frente. Era difícil pensar em Rox como um anjo, com suas roupas no estilo indígena e a cabeça de lobo na cabeça, ela se parecia muita mais um uma garota de décadas atrás, antes dos colonizadores acabarem com praticamente todo a população que vivia nos continentes na época da colonização. Mas seu sorriso, seu rosto, olhar, ou seja, basicamente tudo nela, lembrava Katherine de uma menina normal do seu próprio tempo, e muito bonita aliás. Katherine conseguia imaginar os meninos de sua antiga escola babando em seu Anjo-da-Guarda.

Então ela pensou nele. Lembrou-se da verdadeira razão do monstro ter conseguido jogá-la no jardim-labirinto falso da capela. A imagem do corpo de Finn estendido imóvel no chão a fez estremecer, e ela quis rasgar o ar com as mãos tentando desesperadamente conseguir voltar para ele. Pra ter certeza de que estava bem e que se estivesse, desse um tapa na cara dele por fazê-la passar pelo o que ela estava passando naquele momento, mas pelo jeito que Rox encarava o chão incomodada, não seria tão fácil escapar daquele lugar.

– Afinal - começou Katherine - Essa prisão foi feita para aprisionar quem?

O rosto de Roz empalideceu.

– Ninguém que devamos encontrar, fique certa disso.

– Okay, tanto faz... - Katherine bagunçou seus cabelos tentando conter sua raiva - Como saímos daqui?

– Nós vamos precisar de alguém de fora.

– Alguém de fora?

– Sim - concordou ela - Alguém lá do outro lado da sua mente deve encontrar seu corpo e despertá-la, até lá você estará presa no seu próprio subconsciente que, sem querer te assustar nem nada - provavelmente está dentro do de outra pessoa, que está dentro do de outra, e de outra...

Ela não precisou continuar, Katherine entendia as reticências na voz do anjo. Mesmo que consigam encontrar o corpo dela, eles não teriam apenas que despertá-la, teriam que despertar qualquer outro ser que estivesse preso ali.

Foi quando ela ouviu. Não passava de um ruído suave que vinha de algo às suas costas, era como se algo, ou alguém, estivesse se esfregando no chão.

Katherine se virou instintivamente para trás, sua mão procurando sua adaga na bainha, que magicamente se encontrava exatamente ali, e apontando-a na direção da pedra que a pouco ela se encostara. No início ela pensou que não havia nada, então o ruído se repetiu e ela contornou a pedra, ainda empunhando sua faca na posição mais ameaçadora que ela conseguia fazer. Então ela encontrou, não era nada ameaçador, apenas uma garotinha que aparentava ter uns seis anos se espremendo em um outro buraco na pedra, como se tentasse ficar invisível ali.

Katherine abaixou-se ao seu lado, ela tenteou estender o braço mas percebeu que a menina tremia, então ela recolheu sua mão.

– Q-quem é você? - a menina perguntou com a voz tenebrosa.

– Sou Katherine - respondeu - Katherine Walker, e você?

Ela olhou para Katherine, fazendo com que ela vislumbrasse pela primeira vez seu rosto. Com certeza ela não poderia ter menos de dez anos, suas mãos ainda um pouco miúdas espremiam os joelhos dobrados na frente do rosto com força, seu cabelo era comprido, num tom de loiro meio desbotado, como se nuncas tivesse visto algo de verdade, uma suspeita que era confirmada pelo seu rosto magro e esquelético, completamente escuro graças a terra. Katherine abriu a boca mas logo a fechou, não sabendo o que fazer. A menina levantou o olhar para ela, seus olhos eram num tom de castanho claro, que se destacavam no rosto meio sem vida.

– Nancy... - apresentou-se ela em um sussurro - Você não vai me matar?

– Por que eu faria isso? - a garota olhou para a adaga na mão de Katherine e esta a guardou novamente em seu cinto - Isso será apenas necessário se você for na verdade um monstro de sete cabeças.

Nancy riu, uma risada calorosa apenas das circunstâncias. Uma risada de criança.

– Todos sabem que esse tipo de monstro não existe.

– Bom - ponderou Katherine - Eles dizem isso porque nunca viram um, e acredite em mim, eles realmente não vão querer ver.

A menina riu de novo e desencostou um pouco sua cabeça de seus pernas, permitindo que Katherine a ajudasse a se levantar. Ela olhou a sua volta e de rente paralisou-se ao visualizar a imagem de Rox. Katherine olhou para a o anjo com a cabeça um pouco virada para o lado. Se ela também fosse uma criança que aparentava estar morrendo de fome, toda suja de terra, e que tinha medo de uma pequena adaga na mão de alguém tão inexperiente quanto Katherine, ela também ficara paralisada.

Mas Roz exibiu um sorriso tão caloroso quanto o de Nancy, fazendo com a menina ficasse um pouco melhor.

– Olá! - cumprimentou ela com um sorriso - Sou Rox, prazer.

A menina assentiu com a cabeça, então Rox olhou para Katherine uma vez, que segurava a mão da menininha, e depois voltou o olhar para ela.

– Sabe onde estamos?

Nancy olhou para Katherine uma vez, como se pedisse permissão para falar, depois se virou para Rox.

– Na cidade fantasma.

– Qual cidade fantasma? - perguntou Katherine.

– Apenas cidade fantasma - ela deu de ombros - É como todos os refugiados se referem a esse lugar.

– Refugiados? - perguntou Katherine - Tem mais alguém aqui?

A menina assentiu, depois largou a mão de Katherine.

– E também tem... - ela hesitou - A Besta.

– A o quê?

– A Besta - repetiu - O m-monstro que espreita a cidade.

– Monstro? - as costas de Rox enrijeceram-se, e ela olhou para o horizonte, com os olhos vidrados.

– Sim - concordou Nancy - As vezes ele aparece, e quando isso acontece, um de nós desaparece. Segundo Gerald, eramos mais de quinhentos antes da Besta chegar, agora somos apenas quarenta.

– Quarenta? - Rox parecia horrorizada - Ninguém nunca tentou encontrar esse monstro e acabar com ele?

– É claro que tentaram - a voz da menina era dura - Mas é impossível matá-lo, ele pode mudar de forma, e cada vez que é atingido, vira algo novo.

Ótimo– resmungou o anjo para si própria.

– E vocês estão... - ela hesitou - Presos aqui desde quando?

Nancy piscou, seus olhos castanhos brilhando na escuridão.

– Bom, eu estou aqui desde sempre, mas minha irmã, Jamie, Gerald, e muitos dos outros que moravam na cidade desde a explosão estão aqui à dezessete anos.

– Quantos anos você tem?

– Onze - a menina sorriu com orgulho da própria idade - Por isso estou aqui, finalmente Rose permitiu que eu participasse das buscas.

– Buscas?

– Um grupo sai todo o dia do nosso refugio para tentar encontrar o lugar em que a Besta se esconde quando não está atacando ninguém, Gerald acha que podemos matá-lo se ele estives dormindo, ele acha que o monstro não vai conseguir mudar de forma assim tão apressadamente.

– Quem é Gerald? - perguntou Rox, mas sua voz transparecia que ela não estava interessada.

– Ele é nosso líder - explicou a menina - Na verdade ele é meu avô e o de Rose, mas para todos os outros ele é o líder.

Antes que Katherine pudesse fazer qualquer outra pergunta, seu bolso vibrou. Ela saltou com o susto e gritou, assustando tanto Nancy quanto Rox, então ela encostou em seu bolso e uma luz provinha de lá. Seu celular. Ou pelo menos o celular que fora magicamente alterado por Reed para funcionar em qualquer lugar, Katherine riu, era impossível que aquele aparelho bizarro pudesse funcionar quando ela estava dormindo.

Ela o tirou de seu bolso e enxergou na tela escura as palavras "Chamada Vídeo de Niah". A mão de Katherine tremeu de tamanha felicidade, ela clicou no botão "Aceitar" antes que sua única chance de sair dali desaparecesse.

Mas ao invés da imagem de Niah, o rosto de Finn apareceu no pequeno retângulo, Katherine reprimiu um soluço ao perceber que ele não estava apenas vivo, como também estava bem.

Onde diabos você está? - gritou ele no outro lado da linha.

Katherine olhou para Rox.

– É complicado.

Complicado? - as sobrancelhas dele se juntaram - Eu tentar preparar comida é complicado, você desparecer depois de ser arrastada por um monstro para fora da capela é muito mais que complicado. Onde você está?

– Eu estou presa - disse ela apenas.

Presa? - repetiu ele– Aonde?

Numa cidade fantasma.

Katherine se viu explicando tudo o que tinha entendido até agora. Sobre o quê o monstro falara antes de jogá-la em um portal, sobre Nancy, sobre a Besta, sobre os refugiados e sobre como sua mente estava presa em algum lugar no subterrâneo. Finn a ouvia pacientemente, apesar da expressão irritada, ele acreditava nela, e isso a deixava muito feliz.

– ...Então - concluiu ela - Todos que estão aqui, então basicamente presos dentro do subconsciente do outro até que todos nós sejamos despertados.

Ela suspirou cansada, nunca falara tanto em tão pouco tempo em sua vida.

Como eu te encontro?

Rox apareceu no lado de Katherine para conseguir aparecer na imagem também. Ela sorriu para Finn e o menino a encarou confuso.

– Sou Rox, prazer - ela se apresentou rapidamente - Todas as respostas que procuram vocês vão encontrar com Melinda, e aliás onde está Niah?

Por que quer saber?

– Alguém tem que avisá-la para não matar a coitada da bruxa, a culpa não é dela se ela consegue ver o futuro, garanto-lhes que isso não é nenhum mar de rosas, é um pesadelo na verdade.

– E como você sabe disso? - perguntou Katherine.

– Lembra-se da explicação anterior, não? - ela olhou diretamente para Katherine, como se quisesse excluir Finn do assunto, depois se virou para a tela novamente - Apenas avise a filha do diabo que Melinda é a única que pode tirar Katherine daqui, mantê-la viva é o essencial. Agora vá logo que não temos muito tempo, seja lá o que estiver preso aqui já sentiu nosso presença, somos alvos fáceis, vocês precisam agir rapidamente. Tchau.

Mas Katherine... - começou ele, mas Rox o interrompeu:

– Não - disse decididamente - Temos que guardar um pouco da bateria disso, teremos que nos falar novamente. Até mais garotão - ela piscou para ele e clicou em "Desligar".

Katherine a encarou boquiaberta, não só pelo fato de ela ter desligado antes mesmo de Katherine ter conseguido se despedir de Finn, mas principalmente pela sua frase final.

Garotão? - repetiu ela.

– Se eu o chamasse pelo o que ele realmente ele deveria ser chamado você provavelmente iria me espancar ou ter um acesso de "ele é meu vagabunda, sai de perto" - ela deu de ombros quando Katherine começou a corar - Não vai me falar que eu estou mentindo.

Katherine deu um tapa em seu anjo.

– Cale a boca - depois olhou para Nancy decidida a mudar de assunto - Então, garotinha, onde é esse seu precioso refúgio?

Nancy olhou mais adiante, na direção em que um ponto preto se estendia a distância, depois ela apontou para aquela direção, não muito feliz por ter sido chamada de "garotinha".

– Ali.

Katherine olhou para Rox atrás dela, que virou o rosto assentindo com a cabeça. Mesmo ela estando louca para estar perto de Finn, ela não tinha outra escolha senão seguir em frente. Ela e Rox seguiram Nancy quando esta começou a andar, enquanto Katherine perguntava o quê seria essa tal criatura que eles tanto chamavam de Besta, e porque o Shax fez questão de jogá-la naquele lugar. Se ele queria acabar com ela, ele poderia apenas ter jogado-a no chão com mais força, mas não, ele parecia estar se segurando para não fazer isso, por mais que Katherine o irritasse. Mas por que diabos aquele maldito monstro queria tanto que ela fosse parar naquele inferno?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Demons" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.