Demons escrita por Ninsa Stringfield


Capítulo 14
Capítulo 13




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Ela puxou a corda do arco com precisão, e mesmo que tivesse feito todo o processo minuciosamente, não conseguiu acertar o alvo. Niah deixou o arco pender ao lado do corpo e praguejou com raiva para o ar, já estava começando a ficar com raiva daquilo. Tirando o fato, é claro, dela não poder sentir raiva.

Pegou o arco mais uma vez, o posicionando como Wes lutou tanto para ensiná-la, e mirou. Mas assim que puxou a corda pela décima vez só naquela última meia hora, ouviu um leve ruído vindo de algum ponto atrás dela, e se virou. Uma flecha passou raspando em seu rosto, passando tão rápido por ela que Niah quase não a veria, se não fosse as habilidades que adquirira por ser a Filha do Diabo. E atingiu o alvo agora atrás dela bem no meio, e ela se deparou com um par de olhos sorrindo para ela da escuridão com um arco em mãos. Ela sentiu seu rosto esquentando como se realmente estivesse sentindo raiva. Talvez estivesse mesmo.

– Acho que errou seu alvo - comentou tentando parecer que não estava prestes a matá-lo.

– Acertei exatamente onde eu pretendia.

Ele se aproximou dela, com passadas curtas até chegar no único quadrado de luz do recinto. Niah estava na sala de treinamento dos Caçadores desde que terminara de contar as notícias de Melinda para Finn e Blake. Precisava de um tempo para pensar sobre tudo aquilo, porque no final, tudo soava como uma grande brincadeira. Sabia que bem lá no fundo não se importava com o que poderia acontecer à Katherine - como poderia? Era uma Filha do Diabo. Não sentir nada fazia parte dela -, mas devia isso a ela. Niah se conhecia o suficiente para entender que era um monstro, e que já bastava uma de sua espécie nesse mundo.

A sala em que se encontrava era escura, a não ser pelos poucos raios de luz que vinham de algumas esferas luminosas que foram espalhados por toda a vastidão da sala como postes de luz espalhados em uma avenida. E era exatamente em um desses raios de luz que Chris se encontrava, próximo dela. Niah observou seu rosto, e percebeu os hematomas em seu rosto, assim como os cortes recentes em seus braços.

Ela sorriu venenosamente.

– Teve uma briga com um ralador de queijo?

Ele deu uma risada fraca e falsa, voltando sua atenção para o arco que segurava em seus mãos.

– Sabe, sempre me contaram que você não era boa com issoe. Eu nunca acreditei - ela permaneceu calada - Vejo que vim me enganando por todos esses anos.

Ela deu de ombros.

– Você não sabe de nada, Christian - ela zombou dele - Sempre se achando melhor do que seus queridos amigos Caçadores - ele contraiu a mandíbula - Me diz uma coisa. Como nenhum deles te deu um soco na cara ainda?

Chris deu mais um passo na sua direção. Mas foi esperto o suficiente para não tocá-la novamente. Isso fez com que ela não perdesse o sorriso triunfante no rosto.

– Você estava segurando com muita força - ele disse apenas. Contornando o assunto.

– O quê disse? - ela perguntou piscando, confusa.

– O arco - ele explicou - Você estava segurando o arco com muita força. Isso tenciona seu braço e faz com que seu corpo trema, mesmo que imperceptivelmente, e faz com que você erre.

– Você está mesmo me ensinando a como usar uma arma nova?

Agora foi a vez dele de dar de ombros, indo até o alvo onde sua flecha se encontrava fincada, e a retirou, voltando para o lado dela.

– Você já teve a chance de me matar, Niah - disse ele - E não só uma vez. Então presumo que esse não seja seu plano.

– Não - concordou ela - Não quero te matar - ele olhou para ela - Prefiro fazer com que você sofra eternamente.

Por um momento, pareceu que uma mancha negra passava pelos olhos dele, e havia algo mais em seu rosto. Um sentimento que ele lutava para esconder. Então ele estava sorrindo novamente e a sensação foi embora.

– Eu sei - Chris estendeu a flecha para ela - Por isso acho que está na hora de você aprender a usar um arco e flecha corretamente.

***

– Nancy?

Rose soltou a garota, que cambaleou tossindo até permanecer a uma distância segura de sua irmã mais velha.

– Rose, o que diabos você está fazendo? - Katherine perguntou ainda com o coração pulsando em seu peito, incontrolável.

– O que eu estou fazendo? - ela repetiu raivosa - Nancy, o que você está fazendo?

A garotinha ainda tossia - falsamente - e se espremia para junto de uma das rochas altas ao seu redor, fingindo que estava tentando sair de perto de sua irmã.

– Você quase me matou!

– Eu quase te matei? - gritou Rose com o rosto queimando em brasas - Você apareceu atrás de mim do nada, quando eu fui bem específica em impor que era para você ficar em casa!

– Casa? - repetiu Nancy não tentando mais fingir que estava machucada - Não sei se você percebeu, mas não temos casa - ela estava a ponto de chorar agora. Seus olhos lacrimejavam e sua voz saia cortada - Eu quero a minha casa de volta! Por que eu não posso procurar com você?

– Nan... - a raiva escorreu pelo rosto dela até se espatifar no chão aos seus pés e seu rosto pesar pela falta dela. Seus ombros caíram para a frente, tamanho era o cansaço que ela sentia - Nós não estamos procurando nossa casa, estamos tentando matar a Besta... É muito perigoso, você não deveria estar aqui.

– Mas eu estou - respondeu ela birrenta - E eu não fui pega. Assim como você. Se você pode procurar e matar a Besta, eu também posso.

– Não, você não pode.

– Por que não?

– Porque tem dez anos de idade!

Onze - chorou ela - Eu tenho onze anos, e aposto que se a mamãe estivesse aqui, ela me deixaria procurar.

Rose caiu de joelhos na frente da irmã e a segurou pelo ombro com força, a chocalhando.

– Mas ela não está - agora foi a vez de Rose de derramar suas lágrimas - A mamãe não está aqui porque ela veio atrás da Besta sem nenhuma chance de sobreviver assim como você está fazendo agora! - Nancy permaneceu calada, as lágrimas traçando uma trilha pelo seu rosto em meio a sujeira - Ela e o papai estão mortos e você agora é a única família que eu tenho - ela soluçou, incapaz de se conter, tremendo todo seu corpo - Por favor, Nancy, p-por favor... não me faça te perder também.

E ali, naquele momento, quando nem ao menos Katherine sabia o que fazer, Nancy começou a espernear e a tentar se desvencilhar das garras de sua irmã, mas ao perceber que era incapaz disso, ela abriu os braços e agarrou o pescoço da irmã, a envolvendo em um abraço forte em seus braços raquíticos.

– Eu também não quero te perder - admitiu Nancy, com a voz abafada pelo corpo da irmã - Então por favor, me deixa te ajudar.

Katherine soltou a respiração que não percebia que estava segurando. Observando aquela cena, ela lembrou de Niah e de como seu relacionamento com a irmã não era nada igual aquele. Ela ouviu passos apressados atrás dela e se virou de um pulo, mas logo viu seu corpo relaxando ao reconhecer quem era.

– N-nancy... - Jamie gaguejou se apoiando sobre suas pernas - Eu... Nancy. E-eu vi a Nancy por aí e ela... - ele viu a garotinha abraçada com a irmã, que nem ao menos se mexeram quando ele chegou - Ótimo.

Katherine sorriu para ele, mas então se lembrou de uma coisa que fez o sorriso desaparecer de seu rosto. Algo que devia ter percebido antes. Ela olhou mais uma vez para Nancy e Rose e então encarou Jamie.

– Eu vi a Besta.

Imediatamente, todos os seus companheiros levantaram a cabeça e olharam para ela, atentos. Jamie arfava.

– Você viu o quê?

– A Besta - repetiu ela, analisando a reação dele - E ele se transformou em alguém que eu conheço.

– Em um de nós? - perguntou Rose se levantando e pondo a irmã atrás de si como se assim pudesse protegê-la.

– Não - ela continuou olhando para Jamie - Em alguém lá de fora.

– E como ele conseguiu isso? - perguntou Jamie recuperando sua respiração normal - Quer dizer, pelo o que sabemos, ele só consegue se transformar em algo que já viu, ou não sei, tocou.

– Eu acho que essa teoria está errada - ela se aproximou dele - Acho que ele consegue se transformar em qualquer um que você queira. Como se ele conseguisse se transformar em qualquer um que a pessoa já viu, como se ele conseguisse entrar na sua cabeça e criar uma espécie de ilusão. Não seria a primeira vez que ey vejo alguém fazer isso.

– Sério?

– Sim - concordou ela - Mas sabe o que eu acho mais estranho? - ele parecia confuso - Ele me disse para tomar cuidado com o que eu conto para os meus amigos, então eu ouvi Rose gritar, o que eu suponho que tenha acontecido quando ela encontrou Nancy.

– Katherine - chamou Rose - Aonde você quer chegar?

– Calma - pediu ela - Já estou quase lá.

– Eu acho que eu entendi - comentou Jamie. Katherine levantou uma sobrancelha - Você acha que eu sou a Besta - ele sorriu - Garota esperta.

Então seu corpo começou a deformar-se como ela vira a Besta fazer antes, em uma camada de fumaça até que não sobrasse nada além de sujeira, areia e um corvo negro. Que alçou voou chiando para longe deles.

Rose correu até ela com Nancy em seu encalço e agarrou o braço dela.

– O que foi isso?

– Mais uma demonstração de poder - ela acompanhou todo o caminho do pássaro até que ela desaparecesse por trás de uma montanha, no meio de mais névoa - Esse lugar é um tabuleiro e nós somos as peças, ele está tentando nos jogar um contra o outro. O único problema é que parece que ele está ganhando.

– Katherine, espera - ela se virou para Rose. Percebia que seu rosto não estava mais manchado pelas lágrimas, mas transbordado de uma outra sensação. Desespero - Se aquele era a Besta, cadê o Jamie?

***

Rox abriu a porta com pressa e saiu correndo cambaleante. Peter já tinha sumido por pelo menos meia hora, mas mesmo assim ela continuou parada no mesmo local onde ele a deixara, incapaz de mover qualquer músculo. Ele a estava testando, e ela sabia disso, mas do mesmo jeito, não conseguia evitar de ficar com medo.

Tinha ficado tanto tempo parada, que praticamente se esquecera das dores em seu corpo, dos machucados que Peter provocara em seu corpo, que agora ardiam insuportavelmente. Seu corpo todo palpitava, implorando para que aquela dor fosse varrida para fora dela, aliviada. Mas mesmo assim ela continuou correndo, porque precisava contar para Gerald que suas crianças estavam em perigo, que se elas foram atrás da Besta, era muito provável que não voltassem vivas, precisava...

Ela parou.

Rox olhou ao seu redor com o queixo caído, não podendo acreditar no que via. Aquilo era simplesmente impossível. Bem que ela estranhara seus gritos não terem causado um grande alvoroço por todo o complexo, acordando cada um de seus habitantes.

Um grupo de seis refugiados permanecia parado na sua frente. Mas não simplesmente parados, congelados. Ela piscou várias vezes antes de se aproximar. Percebeu que Gerald estava no meio do grupo, e sua posição era tão estranha quanto as dos demais. Ele permanecia com os braços cruzados na linha do peito e seu semblante enrugado estava petrificado, fazendo com que ele parecesse ainda mais velho do que era. Havia uma mulher curvada para frente com o braço estendido na sua frente na direção de uma pequena faca que levitava no ar parecendo infinitamente longe do alcance de seus dedos.

– Pessoal? - chamou ela esperando uma resposta. Mesmo que sabendo que não receberia nenhuma.

E de fato o lugar todo permaneceu em um silêncio perturbador, com o leve ruído de alguns grãos de areia se levantando no ar. Alguns fios de seus cabelo voaram ao redor de seu rosto e ela virou a cabeça na direção do grande portão por onde ela e Katherine haviam entrado que agora estava entreaberto, permitindo que algumas rajadas de vento se agitassem no interior do complexo.

Seus sentidos se aguçaram e Rox quase caiu no chão quando entendeu finalmente o que estava acontecendo. Quando percebeu - tarde demais - o que devia ter percebido quando pôs os pés pela primeira vez naquele lugar.

– Ai meu Deus, Katherine... - ela sussurrou para si mesma, correndo para o quarto que dividira com ela e Rosely na noite anterior e pegando seu lobo antes de sair correndo pela imensidão desértica daquela localmente chamada Cidade Fantasma.

***

Chris a observava avidamente enquanto ela atirava flecha após flecha inutilmente numa velocidade impressionante.

– Sabe - comentou ele no tom casual que ele sempre se esforçava para usar perto dela - Você deveria ter me matado quando teve a chance.

– Sim, eu deveria - concordou Niah, não tirando os olhos do alvo - Mas qual seria a graça disso? - sorriu e soltou a corda, mas viu seu triunfo desmanchar ao constatar que errara a mira por apenas alguns milímetros.

Ela tentou não parecer incomodada preparando mais uma flecha. Ela se arrumou em sua devida posição. Chris a corrigiu mais uma vez com sua paciência irritante, ajeitando seu ombro mais para cima, depois estendeu seu outro braço na direção do arco, como se fosse ele a manejá-lo, e colocou sua mão por cima da dela. O corpo de Niah se agitou, mas ela se conteve.

– Você está mirando demais.

– Eu preciso mirar - rebateu ela, ríspida - Ou não acerto o alvo.

– Não sei se percebeu - disse ele, calmo, sem exibir nenhum traço de sarcasmo na voz - Mas não acertou alvo algum.

Pela primeira vez em sua vida, ela não disse nada. Apenas torceu seu pescoço num estalo alto que ecoou pelo recinto.

– Não segure aqui com muita força. Sua mão é apenas o apoio - instruiu ele indicando a mão dela que repousava sob a dele próprio - Do contrário você tenciona seus músculos demais, e acaba errando - Niah estava prestes a atirar quando ele voltou a falar: - E quando digo para não mirar, quero dizer para não perde tempo. O tempo que você perde mirando são segundos desperdiçados para acertar seu inimigo - Isso é relativo. E ninguém usa arco e flecha numa luta de verdade. Muito medieval.

– Mas caso usassem... - insistiu ele - Você já estaria morta. Então apenas atire, seus olhos sabem onde querem atingir.

– Você tem tanta confiança assim em si mesmo?

– Sim - Chris respondeu sem pensar duas vezes - Sou um Caçador, confiança faz parte do trabalho - ele fez uma careta - Na verdade, não. Eu já me enganei uma vez, já deixei que meus sentidos me enganassem e pago o preço por isso até hoje.

Ele se soltou do corpo dela, e Niah sentiu uma rajada de vento se atracar ao seu corpo, mesmo sabendo que estavam em um lugar fechado. Chris a observou, e pela primeira vez não havia ódio em seu olhar, apenas interesse.

– Você algum dia vai se esquecer do que eu fiz para você?

Niah sorriu. Mas nem mesmo ela conseguiu conter o leve tremor no canto de seus lábios, fazendo com que ela exibisse uma faceta sínica.

– Eu nunca esqueceria - admitiu ela - Na verdade, nosso pequeno incidente me dá... como eu posso dizer isso? Prazer - seu sorriso era mesmo doentio de tão falso - Toda vez que eu me lembro eu fico mais forte. Muito obrigada por isso aliás, acho que nunca te agradeci antes.

Ela ainda permanecia preparada com o arco em mãos, e a única coisa no pouco espaço entre seus rostos era a fina corda presa nos dedos da Filha do Diabo.

– Me matar teria sido mais fácil, você já teria se livrado de mim.

– Me livrar de você? - repetiu ela, rindo sinicamente - Por que eu faria isso? Você ao menos ouviu o que eu acabei de dizer? Me lembrar de você me deixa mais forte, mais impiedosa, monstruosa, fria... vazia. Eu não quero que você morra, Christian, pelo contrário; quero que viva no mundo desumano que vou criar. Quero te arrastar pelo corredor das minhas vítimas para que você perceba que não fui eu que as matei, mas você. Quero que se afogue na escuridão que trarei para este mundo. Quero que perceba que toda aquela desgraça vai ser sua culpa. Quero que assista o monstro que você criou destruir tudo que você já conheceu - ele engoliu em seco, mas não parecia com medo dela, apenas partido ao meio, como se as palavras dela realmente o afetassem. E ela espera que afetassem - Você vai viver, Christian. Eu vou fazer questão disso.

Então ela soltou a corda do arco, e pela primeira vez, atingiu seu alvo bem no meio.


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Notas finais do capítulo

só p/ avisar: esses lances do arco e flecha, saiu tudo da minha cabeça. Nunca nem toquei em um, mas imagino que seja algo desse tipo (mesmo q eu tenha fantasiado e poetizado a coisa td e tals), então não confiem em mim com essas dicas e não saim por aí atirando flechas, pq tipo, nao vai rolar.
Anyway, desculpe pela demora (mas acho q vcs ja tao se acostumando né? kkk), e bom, chegou as férias - finalmente - e eu espero conseguir me organizar melhor e postar os caps com mais frequência (:
bjs, ninsa



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