―Por que você está assim tão prestativo? – Kelsey perguntou não achando razões para Ren ter ficado com ela enquanto estava inconsciente.

―Como assim?

―Não muda de assunto. – ela falou ainda mais baixo.

―Não estou mudando de assunto. Eu só não entendi sua pergunta.  – ele respondeu ainda irônico.

―Deixa quieto. – Kelsey virou o rosto para não ter que olhá-lo diretamente.

― Eu fico aqui, esperando você acordar e é assim que sou agradecido? – ele murmurou.

―Se quisesse poderia ir embora, não precisava ficar aqui. – a garota revidou com a voz um pouco mais alta, mas ainda evitando contato visual.

―Essa enfermaria deve ter algum problema – Ren colocou as mãos para cima como se tivesse amaldiçoando o local – já é a segunda vez que acontece algo com você e é a segunda que você se faz de cabeça dura.

As palavras de Ren incomodaram Kelsey, ela não era cabeça dura, não tinha caído, machucado o joelho por diversão e muito menos desmaiado por estar com sono. Sentiu que a qualquer momento gritaria com ele. A história que Nilima contara não mais importava naquele momento, o único desejo de Kells era perguntar se Dhiren conhecia o mito do guerreiro e seu tigre.

―Vamos parar de brigar. Isso é desnecessário – Ren falou aproximando sua mão da dela.

Ela assentiu e ficaram em silêncio por alguns minutos, evitando contato visual.

Dhiren estava pensando no porquê de Kelsey ter sussurrado a palavra “príncipe”, imaginar que talvez ela soubesse de algo, dava lhe vontade de sumir, entretanto estar perto da garota era o meio mais convencional de afastá-la do perigo caso saiba de alguma coisa. Tentaria se aproximar de Kells para descobrir se ela realmente conhecia o seu passado. O passado de um príncipe que fugira do seu próprio reino, por causa de uma maldição que atormentaria até o final de sua vida.

―Ren – Kelsey o chamou baixinho, pois estava sentindo os dedos formigar.

―Sim? – ele falou levantando a cabeça, pois a estava apoiando do móvel que ficava ao lado da cama.

―Poderia soltar um pouquinho a minha mão.

Dhiren olhou para baixo e percebera que estava apertando a mão de Kelsey.

―Desculpa.

―Tudo bem.  – ela sorriu para ele quando Ren diminuiu a pressão que fazia nos dedos dela.

―Kelsey. Podemos ser amigos?

―A-amigos? – respondeu pensando que tinha escutado errado

―É, essa palavra é desconhecida para você? – Ren brincou com ela – Por que se for eu te falo o significado.

―Claro que eu sei – disse sentindo seu coração acelerar, por pensar na possibilidade de ser amiga dele.

―Então. Topa? Eu sei que não é normal pedir para ser amigo, mas tenho a impressão que vamos nos encontrar mais vezes aqui na enfermaria, já que eu venho aqui para dormir e você quando se machuca.

―E – Kelsey queria perguntar sobre Ambre, se ela ficaria brava com ele.

―E o que? – Ren a encarou com os olhos azuis a intimidando.

―E a Ambre – respondeu baixo.

―Ambre? Bem, a Ambre é um caso a parte.

―Mas ela não é sua namorada?

―Minha o que? – Dhiren começou a rir quando escutou o que Kelsey falara. De onde ela tinha tirado essa ideia de que os dois eram namorados, pensou.

―Namorada, não? – perguntou confusa por ver o rapaz rindo de gargalhar.

―Não – ele respondeu depois de inspirar o ar que faltara enquanto ria – Ela não é minha namorada. Nossa, de onde tirou isso? É impossível!

―Mas... – quando ela começou a falar foi interrompida.

―Não tem, mas, você deve estar pensando isso, por que ela ia muito a minha casa, certo?

Kelsey concordou.

―Eu tinha prometido a ela, quando visitei um dia a escola no ano passado, que sairíamos. Mas não esse tipo de sair – Kelsey o olhou com a impressão de que ele estava mentindo - Tá certo que ela me atacou algumas vez, mas nada que não se posso segurar ou conversar. Mas quer se minha amiga?

―Si-sim. – Kelsey gaguejou ao responder por estar se sentindo muito feliz.

Os dois continuaram em silêncio. A garota queria que as borboletas parassem, parecia que ia desmaiar a qualquer momento por estar muito animada e ansiosa. Se ele queria ser seu amigo, então queria dizer que ela poderia se aproximar dele. Queria muito isso, saber mais sobre Ren e o porquê de que veio estudar em um colégio que era dono.

―Crianças! – a enfermeira chegou sorrindo – Desculpa a demora. O senhor Kadam estava ligando para os seus pais Kelsey. Vejo que acordou já tem um tempinho.  – ela colocou a mão na testa de Kells - Dhiren pode ir para a sala.

― Kelsey melhoras. – ele falou apertando  a mão dela.

―O-obrigada.

Dhiren saiu da enfermaria contra sua vontade, queria saber o que Kelsey tinha. Estava com medo de que fosse algo grave. E pior do que tudo isso, o motivo por ela ter murmurado príncipe o consumia por dentro. Ele foi em direção à sala do Sr. Kadam para saber se ele teria alguma ideia se Kells saberia sobre o seu trono. Bateu na porta e entrou sem permissão.

―Ren – Kadam falou levantou o rosto para olhar o rapaz – algum problema?

― Kadam, você sabe alguma coisa sobre a Kelsey Hayes?

―É aluna do colégio. Por quê? – respondeu o ancião.

―Ela passou mal e a levei para a enfermaria e enquanto ela estava desacordada falou a palavra “príncipe”. Ela sabe alguma coisa sobre mim? – Dhiren perguntou sério e viu a expressão de surpresa de Kadam.

―Ela estava desacordada e falou príncipe?

―Sim, isso é estranho não?

―Não chamaria de estranho e sim de interessante. Nilima me ligou falando que Kelsey perguntou sobre a história do príncipe guerreiro e o tigre.

―Como assim? – Ren gritava – Como ela... Tigre?

―Acalme-se. Não vamos tirar conclusões precipitadas. Você sabe que o seu passado e o do Kishan não têm nada a ver com essa história – Kadam respondeu com calma -, mas não custa ficarmos de olho nela. Quem sabe ela está pré-destinada a nos ajudar.

―Isso seria possível?

―Sim. Ontem á noite achei um documento que dizia sobre sua antecedência. Todos os príncipes estavam sendo ajudados por um viajante. E todos conseguiram voltar à verdadeira essência.

―Então, o senhor está falando que Kelsey poderia me ajudar? Mas, como?

―Isso, não sabemos. Constava no documento que somente o portador de uma parte da Deusa poderia saber como o ajudante reagiria. Você, Dhiren, é o único que tem em si uma parte de Durga. Kelsey poderá lhe ajudar.

******

―Kelsey! – Tifany gritou ao ver a amiga entrando na sala.

―Oi – ela falou se sentindo bem melhor.

―O que aconteceu? Você desmaiou do nada.

―Eu estou bem, fica calma, foi somente queda de pressão. Fiz alguns exames e estou muito bem agora.

―Nossa, foi assustador te ver desacordada. Sorte que Ren te segurou.

―E-ele fez isso? – perguntou saindo da sala para se sentar no pátio.

―Fez. Por falar nele, até agora eu não o vi.

―Ren não voltou para a sala? – Kelsey perguntou com vergonha de mostrar que estava interessada.

―É isso aí! Acertou – ela falou quando entraram no refeitório e avistaram o pessoal já sentado em todas as mesas disponíveis – Mas, ele está ali, na mesa de sempre acompanhado dos alunos populares. Kelsey aconteceu alguma coisa quando você estava na enfermaria?

―Na-nada de especial, por quê? – Kelsey sentiu as bochechas ficarem vermelha.

―Vou acreditar nisso.

As duas foram até o fila do lanche e escolheram sanduíches naturais com patê de frango e verdura. Kells estava se sentindo bem, mas pensar que Ren não voltou para a sala de aula quando saiu da enfermaria dava a impressão que ele estava com algum problema. Vê-lo sentado junto com os alunos populares fazia sentir que Dhiren voltara ao normal, que na próxima aula estaria ao lado de Ambre novamente e que a loira faria de tudo para implicar com ela quando soubesse que ele tinha pedido para Kelsey ser sua amiga.

O sentimento de amizade borbulhava em seu coração. Nunca tivera amigos homens, para falar a verdade nunca tivera um homem ao seu lado que não seja seu pai ou tios. Quando pensava na possibilidade de que teria que namorar e casar para constituir uma família arrepiava, por isso tudo parecer tão difícil no momento.

―Aonde vamos nos sentar? – Tifany perguntou olhando para todos os lugares.

―Pode ser lá de fora? – ela falou apontando para as mesinhas que estavam visíveis por causa do vidro.

―Nesse vento? Que coisa, mas vai ter que ser.

As duas andaram até o pátio e se sentaram apoiando as badejas na mesa. O vento estava realmente forte, fazendo o cabelo de Tifany ficar a todo o momento ricocheteando o seu rosto.  Kelsey comia com calma o sanduíche, Ren não saia de seus pensamentos, a expressão dele rindo quando ela perguntou sobre Ambre. Ele era realmente bonito e especial. Conseguiu conversar com ela como se os dois já fossem amigos, se Kelsey estivesse em seu lugar não saberia o que fazer. Não saberia como agir tão espontânea como ele.

―Kelsey, olha quem está vindo! Aposto que ele vai perguntar se vocês podem conversar.

―Por que ele sempre faz isso? – Kelsey murmurou quando viu Dhiren vindo em sua direção.

Segundos se passaram e ele já estava ao lado dela a encarando com os olhos azul cobalto. Tifany não parava de olhar o belo rosto de Ren, esquecera até do sanduíche e vento que a atormentava.

―Kelsey, tudo bem? – Ren perguntou com naturalidade.

―Tu-tudo. – ela falou olhando para chão.

―Tifany – ele disse a cumprimentando e a mesma sorriu em resposta – eu perguntei para a enfermeira qual era o seu problema, Kelsey, quero que se cuide para não desmaiar novamente. Pressão baixa pode ser um problema quando não é cuidada.

―Obrigada por se preocupar – ela disse ainda mais baixo e sentindo o coração se acelerar.

―Posso te acompanhar até sua casa? Não aceito um não como ontem.

Kelsey ficou em silêncio, tentava raciocinar sobre o que ele estava perguntando. Ren fizera um convite o que diria, pensou. Por que daquilo? Era estranho ter alguém se preocupando tanto, se sentia frágil toda vez quando ele chegava perto e naquele momento parecia que ia se quebrar com uma porcelana que cai de uma estante.

―Claro que ela aceita, até por que hoje eu vou embora com uma outra amiga minha. E Kelsey, nossa ela está tão frágil – Tifany falou e encarou Kelsey com o olhar de uma pessoa que está fazendo pressão.

―Kelsey? – Ren perguntou.

―Pode sim. – ela concordou.

―Então tudo bem, quero conversar com você enquanto estivermos indo para sua casa.

Ela assentiu vendo Ren entrar no refeitório. Tifany estava rindo da amiga que parecia não ter tido reação alguma. Qualquer um que visse Kelsey naquele saberia dizer que ela estava apaixonada por Ren, mas a garota estava é pensando sobre o que os dois conversariam. A imagem do tigre que estava desaparecida surgira no exato momento que Dhiren falou que queria conversar com ela e um arrepio passara por sua espinha dando lhe um mal pressentimento.