Mantendo O Equilíbrio escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 33
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

A festa continua e tem mais trilha.
E explicações, e dúvidas, e confissões.
Enjoy.



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Conversa vai, conversa vem, Daniela pediu licença e foi falar com o gerente que ficava lá no salão da pizzaria certificando-se do serviço da noite. Eu já pressentia o que ela ia fazer, ela ia se jogar no microfone aberto. Não demorou muito e logo estava no palco, a galera dispersa, Flávia já tinha pulado de mesa em mesa falando com nossos amigos de turma. Dani ficou lá pelo palco falando com os caras dos instrumentos enquanto a vocalista da banda aproveitou o momento pra agradecer:

– Gente, valeu pela energia de vocês, está sendo ótimo tocar pra vocês, espero que estejam curtindo, principalmente a Flávia, mas agora, como alguns de vocês sabem, aqui o microfone é aberto e já temos uma candidata no palco para cantar. Espero que a recebam com a mesma energia, aí vai... DANIELA!

Fiquei besta. A galera vibrou quando ela segurou o microfone forte, dava pra ver de onde eu estava que ela estava sim nervosa. Ela bem gostava de uma adrenalina mesmo... A vocalista, o baterista e o baixista desceram, quem sabe numa pausa para descanso. Dani tomou a atenção de todos, acenou pra mim e logo começou os primeiros versos em acústica com o cara do violão ao lado. O povo estava nas suas respectivas mesas, só os garçons deslizavam pelo salão no ativo rodízio, e todos, assim como os outros clientes, receberam minha amiga com palmas.


Trilha indicada: VersaEmerge – E.T. (Acoustic)

http://www.youtube.com/watch?v=u-d7i7w6KDQ&ob=av2e


De começo ela ia bem contida, de olhos fechados, segurando firme o microfone a sua altura. Um coro baixo do público começou e eu era um deles, era uma música fácil e bem conhecida pelo jeito. Assovios e gritos de “uhu” parecera ser o puxão para Dani abrir os olhos e, por eles, mesmo à distância, dava pra ver como ela estava amando estar ali. Sua voz suave tomava todo o espaço, e o orgulho dela me tomava por inteira. Era uma Daniela diferente, diferente da que cantava comigo no ônibus, no karaokê, ou mesmo por aí.

Para o segundo refrão, sua voz aumentava a potência e segurança. Seus braços controlavam o coro baixo, como uma maestra, regendo o público em simples movimentos. Flashes e flashes batiam por todo o salão e foi então que vi que era o gerente que tinha uma câmera na mão. Gui tinha mencionado o pedido que tinha feito a um funcionário do estabelecimento, porém, só agora que tinha o visto. E ele estava bem animado, estava com a “casa” cheia e minha amiga estava fazendo sucesso. Não me importava se ganharia um desconto por isso, não tinha muita grana, mas lavaria prato se fosse preciso.

Para a última parte, Dani desce do palco com o microfone na mão e segue pelo salão deslizando com suas sapatilhas numa dança improvisada, faz pose pra fotos até que chega a nossa mesa e finaliza a música. Palmas surtiram de toda aquela área, gritos, assobios, flashes. Eu mesma estava maravilhada.

Quer dizer, fiquei maravilhada por uns 10 segundos desse seguimento, até que ela fala ao microfone e todo o meu corpo paralisa na cadeira. Era algo que eu queria e ao mesmo tempo, que eu temia, achava que estava conseguindo escapar. Não sei como ainda pensei nisso, afinal era a Daniela:

– Obrigada, amigos. Agora eu quero tentar uma coisa diferente e para isso chamo minha companheira de “performance” para subir ao palco comigo. Ela deve tá morrendo agora, então será que vocês podem me ajudar a convencê-la a subir ao palco?

Gelei mesmo. Minhas mãos ficaram frias e trêmulas no mesmo instante, a pizza queria voltar, acho que uma vertigem me pegou, o coração deve ter parado e nada eu respondi. Sério, eu me imaginava flutuando até o palco e pegando o microfone de boa, e não conseguia me mexer! Sabia que ia ficar nervosa, mas não desse jeito. Eu sentia todos os olhares sobre nós e mal eu tinha percebido que estava enterrada nas minhas próprias mãos, de vergonha e nervosismo. Daniela se abaixou e disse bem no meu ouvido que eu conseguiria, que eu tinha que provar disso. Bom, eu já estava sentindo, só com a bunda na cadeira e tendo em peso toda a atenção.

Não via ninguém mais na escuridão que tinha com as mãos no rosto. Acho que meu pânico ficou evidente, porque logo as vozes foram diminuindo, enquanto a expectativa ia era crescendo. Levanto o rosto e encaro a todos esperando minha resposta, Dani segura minha mão e me tenta me puxar. O tumtum do meu coração parecia me dizer “é agora ou nunca”, “é agora ou nunca”... É agora ou nunca, Senhor?

Num sei como meio que me deixei levar, mesmo com a respiração desregulada, levanto. E só, porque estanco ali mesmo. Via todos e ao mesmo tempo não os via, parecia tudo um borrão. Por mil vezes acho que imaginei isso, brinquei com isso, contudo, nunca esperaria justamente isso.

Respiro forte para arejar melhor as ideias. Consigo eu cantar o que quer que seja para todas essas pessoas, desconhecidos, conhecidos e amigos? Uma mão minha estava entre as de Daniela que me pedia um consentimento, tentando me tranquilizar, e a outra livre foi agarrada com firmeza. Vinícius chegou mais perto e me perguntou:

– É o que você quer?

– Eu não consigo...

– Só me diz, é o que você quer?

– Errr... acho que sim.

Então ele apertou minha mão nas suas, olhou-me firmemente nos olhos e disse com uma franqueza que me fez confiar, que fez meu coração e cérebro concordar de vez: é agora.

– Eu sei que consegue. E... sei que não vou comentar.

Ri de suas palavras. Não foi apenas a voz dele que ecoou no meu pensamento, foi a lembrança da minha avó e discursos parecidos que ela já fizera para me dar força. Esperava que logo pudesse rir do meu pânico e da situação toda. Porém, ainda estava ali, parada. A adrenalina ainda me corria em tremedeira pelo corpo, sem falar do quente que atingia meu estômago quase abrindo um buraco de novo. Era a minha chance, não que eu quisesse ser cantora ou algo do tipo, era minha chance de quebrar essa barreira e eu estava pronta. Assenti para minha amiga e a plateia vibrou enquanto caminhávamos para o palco, passos que eu intercalava engolindo todas as sensações que batiam, tentando arrancar um sorriso de mim mesma para aproveitar bem a experiência.

No palco, tinha dois caras, cada um com um violão e eu nem sabia que música ia cantar. Duas banquetas esperavam com o apoio de microfone, que a vocalista tinha deixado para nós. Deve ter achado que seria mais confortável assim pra mim e eu a agradeci quando ela ia descendo os degraus do palco. Chegando ao meio do salão, ela se vira novamente pra mim, sorri e acena, quase gritando:

– Divirta-se.

Divirta-se. Aproveite, Milena.

Sento na banqueta e Dani vira para os caras, falando baixinho. Eu tentava parar de me encolher, tentava parar de bater a perna nervosa. Meu Deus, como eu chegara aqui? Foi há uns 3 minutos atrás e parece que já tinha sido apagado da minha mente. Daniela então se vira pra mim:

– Respira. Eu sei, eu estava assim ainda pouco e... te garanto, logo você vai se soltar. E quando isso acontecer, você vai se sentir a dona do mundo. Escolhi uma música especial, dedicada aos tempos que passamos juntas, pela nossa amizade que cresceu e eu sei que essa música era uma de suas preferidas quando cantávamos “anônimas”... Não acreditei quando vi nas opções, e como agradeço por ela estar na playlist. “Untouched, lembra? Então, no mesmo esquema de sempre?

– E se... se eu esquecer a letra? Você sabe como os versos são rápidos, às vezes confusos... E minha voz? Vou arranhar...

– Pode enrolar se quiser. Ninguém está aqui para julgar, é microfone aberto. Deixe que a música saia de você... além do mais, cantamos ela tantas vezes que acho que ela ainda esteja impregnada na nossa cabeça. Pronta?

– Tudo bem, vamos nessa.

Com essa certeza, eu lutava pra não ficar olhando para o chão o tempo todo, massacrando uma mão na outra, deslizando pelo suor repentino, e Dani com seu microfone chama a atenção mais uma vez na noite:

– Desculpa, amigos, pela demora. Esse momento é bem difícil para nós, porque significa tanto que mal posso colocar em palavras. Essa música vai pra vocês, espero que curtam, mesmo quem não a conheça.

Conhecia pouco das cantoras, The Veronicas, e o que me vinha na cabeça era as imagens de nossas cantorias no ônibus, quando ele sacolejava de um lado para o outro, e nada parecia tirar nosso equilíbrio. Nem a inércia que nos puxava de vez e isso era que nos garantia mais risada. Lembro a primeira vez que a cantamos, o que foi bem falho porque a letra era bem rápida e isso confundia, por isso separamos com versos quase alternados. Como não sabíamos diferenciar as gêmeas, eu era a “veronica” morena, e Dani, a “veronica” loira, isso resumia o nosso esquema.

Ninguém nunca reclamou do fato de estarmos cantando e isso nos deixava tão... livres. Era simples, mas uma das melhores sensações. Também não conhecia a Dani tão bem na época, a música é significativa por esse tempo, sem relações com a letra. Era como identificação e diversão mesmo... e foi a monitoria que parece ter nos abençoado mais para nos unir.


Trilha indicada: The Veronicas – Untouched

http://www.youtube.com/watch?v=7BVTrnpdQcM


Os violões fizeram a abertura e na minha banqueta eu tentava acompanhar o ritmo com os ombros, batendo ainda o pé no chão. Queria rir, rir muito dessa loucura toda. Segurei o microfone e com os olhos fechados eu tentei me concentrar para os versos, que pareciam mesmo deslizar de mim. Verdade, pareciam impregnados no meu cérebro, apesar de ter meio que gaguejado nos primeiros versos e ter buscado fôlego para alguns que eram bem rápidos.

Para o primeiro refrão eu abri os olhos e... uau, a iluminação do espaço bateu em mim e eu via todos ali a minha frente sorrindo, acenando, tirando fotos... Putz, a energia que subia de uma batida do meu pé no chão reverberava até meus fios de cabelo, o ritmo crescia e crescia e... parecia que ia explodir. E era muito bom. Eu devia estar com um sorriso do tamanho do mundo.

Não demorou muito e vi Flávia começar com palmas ritmadas e logo o espaço foi tomado por esse acréscimo. O que sentia dentro de mim, nem ligando mais para minhas batidas fortes do coração ou a respiração forte, era algo fora do comum. Pra liberar isso levantei os braços e jogava de um lado para o outro num momento só meu que estranhamente partilhava com todos ali. Magnífico demais para realmente explicar o que sentia a cada palavra naquele microfone.

No último refrão não aguentei e levantei, Dani fez o mesmo e dançamos o finalzinho uma do lado da outra numa leve sintonia até os violões fecharem a música. Daí Flávia levantou da mesa pra aplaudir e toda a plateia a seguiu na salva de palmas. Eu ainda tremia, a sensação me dominava que nem o microfone eu largava... Dani parecia dizer um “eu te disse” só com o sorriso maluquete dela.

Desci do palco olhando bem onde pisava pra não cair de jeito nenhum. Já me bastava essa noite, não precisava de um mico desses. Vi de longe o gerente recolhendo as doações das mesas, que descobri que não só davam descontos na conta, mas parte era encaminhado pra instituições. E conseguir isso tudo numa noite de terça-feira numa pizzaria não é nada fácil. Encontrei Flávia no meio do caminho e ela perguntou como eu me sentia. Minha falta de resposta foi o bastante pra ela, que seguiu caminho e foi para o palco para falar com a banda. A cada minuto aparecia mais uma surpresa, eu ficava mais sem reação.

– Amigos, vim aqui agradecer a todos pela presença, pela noite maravilhosa que estou tendo, que é mais do inesquecível, é mais do que memorável, é... ai, nem consigo dizer. Meu melhor aniversário! E, já que tivemos duas companheiras se apresentando aqui, eu queria... cantar. Eu também quero sentir um pouco dessa adrenalina e, mesmo a música que eu escolhi sendo lenta e não retratando bem o momento, eu a amo e isso eu quero que vocês guardem na memória. Quem souber, canta junto!

Eu nem voltei pra minha mesa, fiquei ali mesmo no meio do salão, estarrecida não sei com o que mais. Flávia chamou a vocalista de volta e acho que combinaram de cantar juntas, pois logo a outra subia no palco também. Quando a guitarra começou, eu logo soube o porquê da escolha dela.


Trilha indicada: Pitty – Déjà-vu (Ao vivo)

http://www.youtube.com/watch?v=eaA3mbhLx_Y


Era uma das músicas que ela tanto assistia no youtube, do DVD que eu tinha lhe presenteado. Mais forte que eu, ela dominava o microfone que tinha levado de minhas mãos como se fizesse isso todos os dias, era tão natural que a letra saía de si e as pessoas foram se aproximando do palco novamente. Vejo ali quem vai ser a oradora na nossa formatura. Palmas ao alto ritmadas seguiam a música com várias vozes de acompanhamento. A de Flávia então, era bem melodiosa. Eu não sabia desse seu lado ou dessa sua voz, ela nunca mostrou.

Ao meu lado tinha meus amigos cantando junto. Pra mim a letra era daquelas bem profundas, de boa reflexão. No entanto, eu bem sabia que não era isso que Flávia estava atrás. Esperava pela fala pós-verso que eu sabia que ela ia dizer, que eu sabia que era o preferido dela, imitando a própria Pitty no show do DVD:


E não há razão que me governe

Nem uma lenda me guia

Eu tô exatamente onde eu queria estar

(e eu espero que vocês também essa noite)


Eu disse! Era exatamente essa parte... A galera foi ao delírio com essa última fala, gritando cada vez mais alto. A vocalista da banda se surpreendeu e logo as vozes delas se encontraram novamente.

Presente mais-que-perfeito para ser lembrado.

Definitivamente, foi uma noite de realização para muitos de nós. Falo da instituição carente também, pois ninguém quis levar desconto, resolvemos todos passar essa alegria a frente para quem precisava.



~;~



Quarta. Quinta.

Exausta. Sonolenta. Explorada.

Sexta-feira.

Flávia fecha os livros e me dá a boa notícia de que tínhamos terminado de estudar para a prova de hoje. Ou pelo menos tentado, e como tentamos. Me deixo então descansar uns cinco minutinhos em cima da pilha de livros que estava espalhada pela mesa, sentindo a moleza vir me pegar. Tenho me dedicado tanto esses últimos dias que voltara a usar meu mantra para me manter de pé. O mantra dizia “só mais um pouquinho, só mais um pouquinho”... e sempre vinha acompanhado de uma proposta para mim mesma, com algo que eu queria. Logo a semana terminaria e dormir uma noite bem dormida, com direito a muita preguiça pela manhã, estaria me esperando no domingo. E como o domingo está longe...

– E esse suspiro? É de quem eu estou pensando que seja?

– Se você pensou no meu amigo chamado “domingo” que me mima e me balança pelas manhãs, está certa. Tão perto e tão longe.

– Sei. E o Vinícius?

– Que tem?

– Ora, você que tem que me dizer... o “amigo” é seu.

Isso me dava quase um déjà-vu distante e maluco. Depois daquela noite épica, Flávia voltou comigo no carro do Vinícius. Ela mora perto da faculdade, então não pegou muito da conversa no carro no caminho de volta. O que não a impediu de criar teorias e teorias sobre ele... Eu ainda não tinha confirmado que ele era o mesmo de quem eu tinha comentado com ela na semana passada, por isso ela criava essas teorias de adivinhação, esperando uma dica aqui e acolá. Curiosidade mesmo, e como eu adorava vê-la curiosa, deixava minhas respostas bem vazias, dizendo tudo e nada ao mesmo tempo.

– Não o vejo desde o seu aniversário. Estivemos todos ocupados, ficamos nos falando só por celular mesmo, às vezes em ligações, às vezes em mensagens. Acredita que ele “narra” suas vendas no stand, como se fosse um jogo? Engraçado mesmo é que ele ainda não marcou “gol”, nenhuma mensagem com sucesso, coitado. Só não recebi mensagem ou ligação hoje, ainda.

Deito a cabeça sobre um livro debruçada na mesa, deixando a preguiça me levar um pouquinho. Não tenho tido esses luxos ultimamente, descanso tá virando algo inatingível... Fico observando Flávia arrumar as pilhas de livros do outro lado da mesa tão calma que nem parece que uns tempos atrás ela quase pirou achando que não sabia nada da avaliação.

Sabia que ela estava doida pra saber sobre Vinícius, ela tinha sacado tudo naquele estacionamento. Tava tão na cara assim? Bom, eu precisava falar de qualquer jeito, tinha que desabafar isso antes me sufocasse sozinha. Não tinha como eu falar isso abertamente com meu irmão, ele iria estragar tudo, mais do que propriamente já está.

– Humm... trocando mensagens de celular por hora, né? E quando você vai me confirmar que é dele que você tá gostando? Só pra saber até quando você vai continuar com esse suspense... aí eu não posso fazer meus comentários.

– Você me venceu pelo cansaço...

Ela para de repente com livros nos braços.

– O QUÊ?

– O que o quê?

Eu sei, me fazia de boba. Quem eu queria enganar? Era assim que me sentia. Boba por sentir, boba por me repreender, boba por pensar, boba por... enfim, era daqueles sentimentos que nos prende em um suspiro longo e conformado, que nos deixa no mundo da lua mais do que seu normal. Flávia fez logo sua carinha de consolo.

– Own, amiga, é porque ele tem namorada, né? Se você não tivesse me dito que ele tinha, acho que eu nem ia saber, porque não parece... Eu vi como vocês se comportavam, desde aquela hora que ele apareceu no estacionamento até a hora que vocês foram me deixar em casa. Eu sabia que era ele. E vocês dançando? Putz, tem certeza que ele tem namorada? Ela é real?

– É, a conheci no outro dia... e naquela noite, ele me disse que pensa em dar um tempo nesse relacionamento deles. Foi assim bem rápido que ele falou, agora que estou realmente lembrando... Sinceramente, acho que isso piora a minha situação.

Flávia se senta ao meu lado na mesa e me faz levantar a cabeça da mesa para explicar melhor. Ainda bem que estávamos sozinhas na minha casa, não estaria falando pras paredes.

– Como assim? Não deveria ser o contrário?

– É difícil explicar, sabe, porque, digamos assim, tem uma “história principal” que envolve outras pessoas, e essa minha, bom, é... é uma história paralela que não deveria estar acontecendo... Deveria ser apenas amizade, o que facilitaria a confusão que vem por aí...

– Se eu disser que eu tô mais perdida que bala atirada pra cima você explicaria melhor? Porque, olha, você falou e eu nada...

– É uma história de família dele, que eu meio que... como posso dizer?! Eu entrei de “gaiata” e já que estava por lá mesmo, resolvi ajudar... Só que a história parece aumentar a cada dia mais e fica mais complicada... E acho que eu tô falando grego de novo, né?

– Um pouco, acho que tô entendendo. Mas e sobre o caso da namorada-quase-ex? Qual o problema? Descomplica pra mim.

– Acho que eu nem sei descomplicar pra mim... e não tem como eu detalhar, porque, como eu disse, eu entrei de “gaiata” bem no meio, não poderia comentar sobre por envolver outras pessoas. O básico é que... eles passaram um tempo longe por causa de um “contratempo”... foi quando o conheci e ele nunca a mencionou nem nada. Soube de última praticamente. Já a conheci, é uma ótima pessoa, mesmo. Por isso eu só me reprimo, porque é isso o que eu tenho que fazer... eu não posso me afastar, não agora e não quando tenho que resolver outras coisas. É horrível de se pensar, mas eu queria que ele não estivesse com ela. E eles estavam estranhos um com o outro, pelo menos foi o que vi outro dia aí... agora ele me diz que tá pensando em dar um tempo. Era pra eu estar feliz, né? Não estou, porque...

– Porque...?

Tamborilava os dedos na mesa deixando as coisas saírem por si só. Os detalhes eu não poderia comentar, por respeito à professora e ao nosso envolvimento repentino, omitia o que não era momento de se comentar, mesmo com essa vontade enorme de falar tin-tin por tin-tin. Essa minha mania de guardar tudo pra mim mesma pode me matar um dia.

– Como eu poderia ficar confortável sabendo que é assim que ele trata as pessoas? Porque, putz, é a namorada dele, que respeito ele anda tendo por ela? Ele poderia fazer isso comigo, sabe? Me machucar... Tentei não ficar muito perto e ainda assim eu fico sentindo essas coisas que eu não consigo evitar, então o quê? Tenho que me acostumar com essa frustração até tudo isso passar? Porque é isso que me pega, frustração. Eu não sei mais o que pensar, as coisas andam mais embaralhadas e confusas do que eu podia imaginar. Era pra EU ajudar, não ser aquela de que precisa de ajuda.

Minha amiga me dá um tapinha na mão que tamborilava para parar. Devia estar um pouco mais inquieta que o normal e mesmo que estivesse finalmente colocando pra fora alguns dos meus anseios, ainda não sentia o alívio vir. Será que um dia próximo ainda haverei de sentir isso? No entanto, com toda a certeza ter alguém com quem falar disso já tira um pouco o peso.

– É difícil mesmo, Lena. Eu entendo o que você quer dizer com essa insegurança acho... mas, já pensou se não é você encanada com isso? Digo, você mesma disse que eles não estavam bem... vai ver é hora de eles terminarem, né? Deixa ver como fica, não fique se martirizando por aí, não é legal. Além do mais, se você está o ajudando, bem que ele poderia retribuir o favor, pois as boas relações, sejam de amizade ou não, tratam-se de trocas, não pode ser você a única via. E só ele pode ser a segunda via. Então espera mais um pouquinho, deixa mais coisas acontecerem pra você ter alguma certeza.

– Como posso eu não ver isso? Você faz parecer tão fácil. Poxa, Flávia, e você fala tão bem. Te disse, você vai ser a oradora da nossa turma, vô chorar no teu discurso.

Sempre alguém quebra o gelo quando começa a ficar muito sério e geralmente essa pessoa sou eu. Eu não consigo resistir. Flávia também relaxa, solta sua sabedoria num suspiro mais divertido. Deve pensar que sou mentalmente problemática... ou talvez a cada dia eu só lhe dê mais certeza ao abrir a minha boca.

– Não sei disso, não. Tenho a impressão que o Gui quer esse posto. E, bom, tudo parece fácil aos olhos de outras pessoas, pessoas do lado de fora. Como você bem disse, você entrou de “gaiata” na história, né? Você teve a visão de fora e agora você tem a visão de dentro, então as coisas também estão te afetando e, por consequência, seus passos parecem cada vez mais difíceis. E eu só sou uma “gaiata” aconselhando outra “gaiata”. É fácil dar conselhos aos outros, menos a nós mesmas.

Eu já vinha pensando nisso faz um tempo, porém ouvir isso de outra pessoa me reforça de que a ideia não é num todo falha. Na verdade, só lembra que acabei ficando imersa numa história que aos poucos também se tornou minha. É, acho que não queria enxergar, que eu estou ferrada. Estava antes sim, só que agora o fato é mais consciente.


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Notas finais do capítulo

Curiosidade: Fiz uma loucura ano passado numa festa e só me lembrei dessa cena da Milena tentando enfrentar o microfone. Uma baita adrenalina! Acabei sendo muito fiel à própria cena que descrevi nesse quesito - menos pela parte do microfone. E foi meio que um momento "milenístico", porque envolvia a música Good Life do One Republic, e isso marcou muito.



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