Mantendo O Equilíbrio escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 25
Capítulo 25


Notas iniciais do capítulo

Haja coração... e ar, e pensamento coerente, e...



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Oito da manhã marcava o relógio da cantina. Sábado lindo de sol e eu na faculdade com o grupo dos materiais, contatando uma malharia para preparar um “uniforme” que identifique os organizadores. Na verdade era eu e Mariana brigando com o povo para não deixar a camisa cheia de besteiras e barateá-la. Depois de muita luta entramos em consenso e finalmente posso entrar na minha “área”, que era de contatar o convidado e confirmar horários do evento e sua chegada. Vou adorar dar a notícia ao Bruno de que vamos ter de buscar o homem no aeroporto e levá-lo para o hotel.

Falando nele, chega atrasado. E com a Daniela. Sei, atraso.

Um susto não custa nada, né?

Aceno para eles que estão chegando e finalizo a ligação. O cara é bem gentil, então não vai ser um sacrifício assim. Além do mais, é um contato e isso é bom profissionalmente. Faço então uma cara de “tem bomba” quando eles chegam perto da mesa e Dani questiona logo:

- Me mata logo de uma vez: o que foi?

- Olha, dragão que cospe fogo tá mais amigável que Fabiano... Sério, ele me assustou ontem. Peguei os materiais que ficaram prontos lá na gráfica junto com Mariana, mas de última ficou faltando os pôsteres dos patrocínios e... teve que fazer nova solicitação e... foi muita exaltação, digamos assim. Olha, melhor nem chegar perto, principalmente o Bruno que já tem advertência. Eu dei um jeito e ele não sabe que vocês saíram mais cedo, então nem falem.

Dani senta na cadeira ao meu lado e vejo que meu plano tá rolando bem.

- Caramba, nunca o vi assim. Nem quando o gênio aqui quase nos conseguiu um processo xingando a atendente. O que deu nesse homem?

Já Bruno tem uma cara mais engraçada.

- Eu num sei, nem quero saber. Vou lá na secretaria falar com a professora... eu queria ver uns detalhes das avaliações com ela que tô com dúvida. Até, meninas.

Bruno logo vai descobrir que eu estou brincando. Dani, no entanto, ainda não sabe, então aproveito pra investigar um pouco:

- E aí, o passeio ontem foi bom?

- Que-e-e passeio?

- O de vocês. Agora vocês podem aproveitar né? Não tem mais Natália e você é uma ótima pessoa para ficar com ele.

- Nam, não estamos juntos. Só...

- Só...?

- Ai, Milena, eu gosto dele, tá? Pronto, falei. E ele não sabe, não tem ideia e nem vai saber.

- Mentira! E aquela cena de ontem?

- Que cena?

- Ora, a que ele te levou com ele fugindo de Fabiano. Não poderia classificar ninguém mais como “poço de tranquilidade” ontem. Nem ficou no meu pé, conversou normal comigo e até contou umas piadas. Sem graça, mas a galera riu por educação acho. Só teve uma boa...

- Mas... mas você disse ainda pouco que... Você tava de sacanagem com a gente? Milena, eu aqui esperando o pior!

Ela pega o bloquinho da mesa e começa a me bater – sem machucar, claro – para enfatizar sua chateação. Mas eu gargalhei mesmo, daquelas de tirar o ar, quando um Bruno de cara fechada caminha até nós de braços cruzados.

- Milena, você não tem algo a dizer não?

- Na verdade...

- Putz... eu fui falar com Djane e ela riu da minha cara. Tudo bem, ela se aguentou e não riu o quanto ela queria rir. Ela só disse que não sabia do que eu tava falando sobre o diretor quando comentei o que você me disse, que ele ontem estava bem agradável e eles até deram carona pra alguns alunos.

Ponho a mão na boca pra me segurar. Ele ainda não sabe da outra parte, imaginei que Djane iria comentar e ainda bem que não falou, tô louca pra ver a cara dele quando descobrir do que se tratava a “zanga” do diretor. Levanto e fico entre ele e a mesa.

- Poxa, Bruno, você que começou ontem com a história de ele soltar fogo pelas ventas. Aí quando eu chego lá – levando os cookies preferidos dele como arma de defesa praticamente – ele tava normalzinho.

- Mas... mas... eu vi! Eu fui na secretaria pegar num-sei-o-quê e... Ele tava no telefone brigando com não sei quem...

- Era encenação.

Bruno descruza os braços e fica sem ação. Abre a boca pra falar algo e logo a fecha. Provavelmente pensando na cena que viu do diretor dando aloca no telefone. Queria eu ter visto isso!

Daniela levanta e também não se aguenta:

- Cara, eu não acredito que Djane, sendo Djane, riu da sua cara... o mundo vai acabar.

Sinto uma pontada por falar da professora assim.

- Por quê? Eu não entendi.

- Pô, Milena, desde quando você vê essa mulher sorrindo? Quando foi isso?

- Ah, Dani, não exagera. Ela é legal.

- Tá, agora a Milena tá alucinando. Bruno, me ajuda a trazê-la de volta.

- Espera, eu ainda não entendi, como aquilo que vi era encenação? Como você sabe que era encenação?

- Porque ele disse. Eu tava dizendo aqui pra Dani que ele tava normalzinho, que tava contando umas piadas e dentre elas, ele contou essa história. Imagina todo mundo na sala de reuniões no final da aula pra concluir uns trabalhos quando professor Carvalho entra gargalhando. Geral parou o que tava fazendo pra ver sobre o que era, aí que Fabiano entrou e começou a contar a história. Eu fiquei na minha, lembrando o teu desespero – pode ficar frio, não falei pra ninguém. Ele tinha gritado com um cara que ficava ligando pra ele... então simulou um estresse maluco pro cara lhe deixar em paz. E funcionou.

- Então... então... o que eu vi... não acredito.

Ele mesmo não aguentou a vergonha e bateu a mão no rosto em um digno facepalm. Dani passa o braço por meus ombros e balança a cabeça em negação.

- Eu também não acredito... Perdi um dia de monitoria, Djane deve tá me “amando” agora e tenho notas dependendo disso.

- Oxi, amiga, dei uma desculpa para os professores. Enrolei dizendo que teve um problema com tua tia e como Bruno tem carro... deixei que eles somassem 1+1. Disse que vocês não deram detalhes.

- E Djane não falou nada? Nadinha?

- Não, só disse para vocês compensarem depois.

- Tá, agora sim vai acabar o mundo.

É, era difícil competir com a fama que a professora tinha conquistado ao longo desse tempo. O fato de eu me importar com isso – e muito – é aceito por mim como algo estranho. Não imaginaria que poderia reagir assim.

- Eu concordo com a Dani. Antes de ir falar com ela, eu a encontrei sorrindo boba olhando alguma coisa no celular. Foi... coisa de outro mundo. Aí eu perguntei das avaliações das apresentações do evento e emendei a história que você falou. Ela parou, me olhou e começou a rir. Disse que não sabia do que eu falava. Me senti num mundo paralelo, serinho.

Acho que consigo imaginar o porquê dessa carinha que Bruno comenta. Queria tanto ter visto essa cena também! Uma pena mesmo.

- Olha, ela tá fazendo a mesma cara... Você sabe de alguma coisa!

- Eu? Nada, Bruno, só pensei longe aqui. Outra coisa.

- Sei.

- Enfim, gente, o papo tá ótimo, mas vamos trabalhar né? Eu quero garantir uma nota bonitinha. Depois a gente marca uma saída pra fofocar...

- Mulheres...

Separo Dani de Bruno antes que ela batesse nele. Podia deixá-la bater, mas tinha uma pra contar pra ele e precisava dele por inteiro. Abri um sorrisão bem digno rindo internamente antes de sua reação.

- Espera, eu ainda não dei a grande notícia! E essa, Bruno, eu sei que você vai amar!

- Por que eu tô achando que não?

- Pode alugar o filme O Guarda-costas, porque fomos intimados a cuidar do palestrante de fora.

- Quer saber, melhor eu não falar nada.

E ficou indignado o resto da manhã.

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Finalmente eu consegui digitar o trabalho de Legislação Social. Só faltam uns detalhes de formatação... Nessas horas que bate um cansaço. Deslizo na cadeira, abaixo a tela do notebook e afasto a papelada. Parece que um peso sai de mim... Deixo o silêncio me tomar e respiro a tranquilidade da sala. Se Murilo não tivesse ido num aniversário de um amigo do seu departamento, essa hora eu ainda estaria fazendo esse troço com a bela trilha sonora de jogo de futebol.

Ele ainda tá me devendo uma conversa, a que ele fez sinal na casa de Djane ontem antes de ir embora. Quando cheguei em casa à noite, ele dormia e quando levantei, bem cedo, ele tinha saído mais cedo ainda. Voltou no almoço só pra tomar um banho e sair para um churrasco... não me disse nada. Ele que me procure... Será que a Flávia tá em casa? Podia comprar umas besteiras e ir pra lá.

Mal penso isso e meu celular começa a tocar. Vibra na mesa que me desperta. Não era meu irmão... Será que Flávia sentiu minha telepatia? Me estico pra alcançar o celular na mesa, mas sou obrigada a deixar a preguiça de lado e levantar. Já ia atender quando dou uma olhada no visor e... número desconhecido?

- Alô?

- Milena?

- Sim. Quem é?

- Vinícius.

- Ah, oi. Eu não sabia seu número... como você conseguiu o meu?

- Minha mãe. Você estava dormindo? Tá com uma voz...

- Ah, preguiça mesmo.

- Então larga essa preguiça e vem pra cá.

- O que tá tendo aí?

- E precisa ter alguma coisa pra me ver? Ok, tá rolando aquela reuniãozinha com uns conhecidos. Falta você.

- Ah, sim. Tinha esquecido disso...

- Hum. Pois agora está sendo intimada a comparecer só por ter esquecido isso. Estou te esperando. Tchau.

Desligou. Nem me deixou responder.

Claro que não esqueci a “festinha” dele. Eu... só achei que ele precisava de um tempo para reorganizar a sua vida e aproveitei pra terminar meu trabalho. Essa reuniãozinha dele era a volta dele ao social, deve ter muitos amigos para retomar amizades perdidas e tal... o que eu vou fazer lá? Não conheço ninguém.

Ah, mas também não quero ficar em casa. Tampouco estou muito social. Se eu for pra casa da Flávia, tenho que arrumar uma desculpa pra não comparecer à festa dele, se eu for pra lá, bom, vou ter que ficar enrolando... Ah, melhor eu ir mesmo. Ver como anda o território.

Arrumo a bagunça de livros e papeladas da sala e vou tomar um banho. Coloco um vestido simples e faço um lanche rápido. Pego minha bolsa transversal e saio de casa... pra parada. Já disse que às vezes é ruim ser estudante dependente de carona? Já devo ter dito também que quando temos algo bom no fim da jornada, não nos importamos com o transporte que temos que apelar. O fato é que não sou muito certa quanto esse fim de jornada.

Desço do ônibus e ando pela avenida para chegar à rua dele. Não é tão longe assim e aproveito a caminhada para ver os vestígios do pôr-do-sol no horizonte. O céu não está mais limpo, algumas nuvens carregadas se fazem presentes, por isso apresso o passo não sabendo quando a chuva pode cair. Amanheceu tão límpido para chover à noite pelo jeito. Murilo nem pra me avisar.

Mal viro na rua da família Garra e já ouço uns barulhos. Muitos gritos de torcida vinham de sua casa e vários carros estavam estacionados próximo.

Só uma reuniãozinha ele tinha dito... Sei.

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Não devia ter vindo. Definitivamente, não devia ter vindo.

Quando cheguei, toquei a campainha e um cara qualquer abriu. Eu fiquei parada e ele também... ele era meio alto e estava com uma garrafa de cerveja na mão. Me olhou da cabeça aos pés e quando ia falar alguma coisa, Vinícius apareceu o afastando bruscamente. Me puxou para dentro quase num vulto quadriculado – que vinha de sua camisa – e me abraçou. Daqueles abraços que parecia que esperava muito tempo para conseguir um, daqueles apertados que somos capazes de identificar o shampoo da pessoa de tão próximo que se está. Sem-jeito o abracei de volta e achei que tinha algo errado... porque tinha que ter algo errado pra ele ter que chegar a esse ponto, não? Queria me convencer que sim.

Quando me soltou, disse que tinha uma galera na sala acompanhando um jogo que parece que era importante. Então me puxou até a sala e vi uma galera mesmo, todos reunidos ao redor da TV na sala. Alguns estavam encostados nas paredes com suas bebidas. Quando entrei, todos pareceram ter virado pra me ver. Não tinha somente homens, tinham algumas mulheres também e a maioria delas estavam agarradas a alguns homens. Olhei para Vinícius e ele deu de ombros...

Ele não se incomodava? Pior, ele estaria ele fazendo essa zorra todinha com Djane no quarto? Faço questão de perguntar quando chegamos à mesa da sala onde tinha uns comes e bebes:

- Onde está sua mãe?

- Ela saiu.

- Pra onde?

- Não sei, não me disse.

- Hum. E seu tio?

- Jantar de negócios. Veio aqui no começo da tarde e logo teve que ir. Ele sempre foi assim, desde quando morávamos juntos. Então... eu sei que a galera já aproveitou do que estava aqui na mesa e tal, mas eu guardei uma coisa pra você, que eu sei que você gosta. Vem, vem comigo aqui na cozinha.

Mais uma vez ele me puxou pela mão. Eu ainda estava atordoada. Ao chegarmos na cozinha, um urro de torcida se fez ouvir e me encolhi. Definitivamente não estava muito social e nem a fim de ficar com esse bando de marmanjo que num conheço assistindo futebol. Vinícius fechou a geladeira e segura minha mão novamente, abrindo-a, onde colocou embalagens pequenas de gelatina nela. Impossível não sorrir com essa.

- Acertei no sabor?

- Yeah.

Quando fui abrir a primeira um celular próximo toca, com um toque bem simples como aqueles de trim de telefone comum. Ele alcança seu bolso da calça e olha o visor.

- É a Rebecca. Vou atender rapidinho lá no quarto e logo eu volto. Sinta-se à vontade.

Saiu, me deixou sozinha na cozinha... Por um momento só abri minha gelatina e esperei sentir o sabor de morango. Nem isso me fez me sentir melhor. Deixei as outras na mesa e fui pra sala, passei por trás do povo e segui pra varanda, ficar um pouco sozinha. Estava sem coragem de ir embora e aquele céu, que podia ver da varanda, me dizia que logo uma chuva cairia. Me dizia que estava presa.

Mando uma mensagem pro meu irmão dizendo que estou na casa de Djane pro caso dele chegar em casa e não me encontrar. Ele não me responde. Me encosto no parapeito de madeira que tinha na varanda, parecendo uma bancada, e, sem nada pra fazer, entro na internet pelo celular e olho meus e-mails. Nada diferente do que estava na última vez que vi mais cedo em casa... Automaticamente entrou no chat e alguém abriu uma página para conversação. Deve ser meu pai, penso quando olho o e-mail do seu comércio. Faz tempo que não falo com ele.

Não é meu pai, é meu avô. Surto num sorriso sincero e silencioso em imaginar meu avô do outro lado escrevendo mensagens pra mim. Ele não era nada tecnológico, mas acaba me falando que teve que se adaptar se quisesse ainda trabalhar no comércio. Eles têm uma livraria, trabalho do meu pai na cidade... então, unindo seus conhecimentos de gerência e classificados do jornal, tinha que manter tudo bem registrado e organizado, que ele não queria ficar pra trás.

Pergunto da vovó e ele diz que ela tem melhorado muito com o tratamento, que tem dias que ela ainda escreve suas crônicas pelo incrível gosto que ela tem. Ele tenta tirá-la da mesa e ela bate nele. É bem mais tecnológica que ele, ela que o ensinara a mexer nessas paradas todas. Logo me pergunta sobre a ligação que viu no seu celular ontem à noite, disse que estava dormindo, era tarde, por isso não atendeu. Então lhe digo que era só saudades mesmo, eu tinha acabado de chegar da faculdade.

Me pergunta se era só isso mesmo, que estava sentindo que era algo mais. Nada, só queria saber como estavam porque tinha sonhado com eles outro dia e, com o tempo passando, as saudades e a vontade de saber como estavam cresceu. Vovô me responde que espera minhas férias para ele me mostrar quão bem todos têm estado, que quer fazer leite quente para ver o dia amanhecer comigo, como fazíamos quando eu era criança e ia passar as férias com ele.

Era um momento super nostalgia e bem íntimo, como se eu estivesse numa bolha sem me importar com o que acontecia ao meu redor. Quando me disse que descobriu o esconderijo dos biscoitos da minha avó para acompanhar nosso leite quente, não resisti e gargalhei. E nessa, sem ter sentido o tempo passar e alguém se aproximar, me assusto quando Vinícius chega de mansinho do meu lado direito.

Só que estava um pouco escuro por não ter ligado as luzes da varanda, então achei que era algum estranho e dei um pulo pra trás.

- CARA, faz isso não.

Digo com a mão no coração tentando o segurar de tantos pulos. Suspiro forte pra me estabilizar e ele, ele ri. Ele RI. Muito descarado, isso sim.

- Não resisti, desculpa. Te vi tão concentrada e rindo... quis participar também.

Volto à posição antiga, apoiando-me no encosto de madeira e digo ao meu avô que tenho que sair. Ele me abençoa e eu desligo a internet... Volto meu olhar para o lado onde Vinícius continuava encostado. Tinha uma cerveja na mão e eu não senti nenhum odor alcoólico vindo dele... olhava para o céu como eu tinha olhado minutos atrás. Deve estar pensando na chuva próxima, principalmente com o vento que começava a se fazer presente. Ao sentir que o observava, ele levanta a cerveja e pergunta:

- Quer uma?

- Não, eu não bebo.

- Nem eu.

- E o que voc...

- Só estou segurando mesmo. Tava te procurando e topei com Tilico que tava exagerando na bebida, então o enrolei e cá está na minha mão.

- Quem é Tilico?

- Ninguém importante.

- Nome estranho.

- Eu nunca descobri a origem do apelido. Acho que nunca foi importante perguntar... Mas por que você está aqui, sozinha nesse frio?

- Não está frio.

Dou de ombros e desvio seu olhar para a porta da casa logo a minha frente. Qualquer coisa menos ele. Não tendo minha resposta completa, volta a questionar:

- E por que está aqui afastada?

- Não conheço ninguém... não tava muito a fim de ficar por lá. E você, por que não está lá?

- Pela mesma razão que a sua. Não os conheço.

Encontro seu olhar de novo. No entanto ele... Ele vira mais uma vez para alcançar o céu. Não tinha como procurar estrelas, se era isso que tentava fazer, o céu estava bem coberto. Apenas a lua parecia tentar fugir das nuvens carregadas. Ou as nuvens andavam demais para dar espaço à linda lua.

- Como assim não os conhece? É algo com sua memória? Por que n...

Trilha indicada: Daughtry – Feels Like Tonight

http://www.youtube.com/watch?v=2judm5t9Qdo

- Minha memória anda bem. Lembro até das minhas senhas das contas... lembro onde deixei os back-ups para senhas em códigos e lembro desses códigos também. Lembro dessas pessoas e lembro que eles são estranhos a mim. Alguns são do meu trabalho e outros apenas penetras. Os que estavam comigo no dia do acidente também estão aqui. Falaram comigo de boa e tal... mas não são meus amigos. O aviso que deixei que haveria essa reunião vazou e quando vi já tinham dominado a TV e havia cerveja pra todo lado. Sou um anfitrião perdido na minha própria festa. Quão triste isso pode ser?

- Ah, hã... acho que assim que definimos quem são nossos amigos de verdade. Quem está disposto a, sei lá, jogar dama porque não tem mais o que fazer ou apenas jogar conversa fora.

And it feels like tonight.

I can't believe I'm broken inside.

Can't you see that there's nothing that I wanna do,

But try to make it up to you?

And it feels like tonight,

Tonight.

E parece esta noite

Eu não posso acreditar que eu estou machucado por dentro

Você não consegue ver que não há nada que eu queira fazer,

Além de tentar fazer as pazes com você?

E parece como esta noite,

Essa noite.

- Quando você me disse que tinha se esquecido dessa reunião, eu me senti mal... eu tava com a sala cheia de gente e não sabia o que fazer. Não poderia te deixar escapar assim... eu sei que você tem se esquivado. Mas agradeci tanto quando te vi na porta, você não tinha desistido de mim... Desculpa se fui grosseiro ontem, não foi minha intenção mesmo. Rebecca me disse que eu tinha te magoado falando besteira e...

Ele me pega lhe olhando e sorri. Não digo nada esperando ele continuar. Só que ele realmente me olha. Acho que do jeito que me mira, ele poderia ver a si mesmo nas minhas pupilas, iluminadas apenas pela lua cheia que não estava coberta no momento. Foram segundos, mas foram segundos que me fizeram ficar estranha, com as mãos começando a suar. Daquelas que o celular mesmo pode escorregar.

I was waiting

For the day you'd come around.

I was chasing,

And nothing was all I found.

From the moment you came into my life,

You, you showed me it was right.

Eu estava esperando

Pelo dia que você viria

Eu estava perseguindo,

E nada foi tudo que eu achei

Desde o momento que você entrou em minha vida,

Você, você me mostrou o que era certo.

- Milena, você sabe que essa história com minha mãe ainda é novidade pra mim e eu estou tentando, sério, hoje nós conversamos antes de ela sair pra aula de manhã. Nem sei por que levantei cedo, só sei que tomamos café juntos e... eu num sei, as coisas não podem se acertar assim de uma hora para outra. Eu só sei que, Milena, eu preciso de você perto de mim.

Amoleci. Amoleci. Amoleci. Cara, num me fala um negócio desses, desse jeitinho que... que eu acredito. A varanda é bem arejada, o vento da chuva começava a ficar forte e o sentia levantar meu rabo-de-cavalo. Era muito ar pra respirar e nem assim eu conseguia respirar acho.

- Eu preciso, de verdade. Você tem me dado novas perspectivas, você me faz rir e eu nunca precisei de uma... amiga tanto... quanto agora.

And it feels like tonight.

I can't believe I'm broken inside.

Can't you see that there's nothing that I wanna do,

But try to make it up to you?

And it feels like tonight.

E parece esta noite

Eu não posso acreditar que eu estou machucado por dentro

Você não consegue ver que não há nada que eu queira fazer,

Além de tentar fazer as pazes com você?

E parece como esta noite.

Tá. Agora morri, morri, morri... que rebuliço foi esse bateu agora? Foi um ótimo discurso, principalmente a parte que ele fala que precisa de mim. Ainda assim, por que não estou me sentindo satisfeita? Tinha eu outras expectativas que não sabia? Sinto os olhos começarem a encher d’água e sei que não posso deixá-las cair. Não, não agora. Abaixo a cabeça e, mais uma vez, lembro que estou presa aqui e nem tenho ideia de como voltarei pra casa, pra minha cama.

- Você não vai falar nada?

- Eu não sei, o que quer que eu diga?

- O que passa nessa sua cabeça... Seu silêncio me mata às vezes. Minha curiosidade me mata, na verdade. Como na hora que cheguei aqui e você estava rindo sozinha. Eu quis saber do que tanto você ria, ser motivo de seu sorriso... e sentir que você iria compartilhar comigo.

- Eu...

I never felt like this before.

Just when I leave, I'm back for more.

Nothing else just seems to matter.

In these ever-changing days,

You're the one thing that remains.

I could stay like this forever.

Eu nunca me senti assim antes

Quando eu vou embora, eu volto para mais

Nada mais parece importar

Nestes dias em constantes mudanças,

Você é a única coisa que importa

Eu poderia ficar assim pra sempre

Ainda parece uma declaração pra mim. Meu coração diz isso, vê um brilho no olhar dele ao falar... e minha mente diz que não, que sou apenas a amiga, a diversão, a evasão. Que ele ainda tem namorada. Ele tem namorada! Nesse momento ela deve estar num casamento, pegando o buquê... e eu aqui, nesse... nisso. Não é de desorientar?

Por que tem que ser tão difícil? Eu não deveria ter vindo... mesmo que ele se sentisse mal e eu me sentisse mal por fazê-lo se sentir assim. Mas que merda! Para de me olhar assim, para de me dizer essas coisas, caramba! Isso tem outros efeitos em mim... ele não percebe?

Pior. Acho que queria que ele me dissesse tudo isso, só não esperava que ele fosse me matar de vez em um só discurso. Foi o rebuliço que me fez ver outra coisa... querer outra coisa... Queria que ele sentisse o mesmo que eu sinto ao lhe ouvir, que ele precise de mim mais do que isso, que ele pense em mim... como eu penso nele. Eu sei, eu sei, demorei muito a notar.

Do que adianta ele me dizer todas essas coisas se... se quem se machuca sou eu? Não tem como ficar exatamente feliz com isso. Antes ficasse ignorante mesmo do que nessa situação.

- Eu... fico feliz em saber que... que... você se sinta assim. Digo, que eu lhe passe essa segurança... não imaginaria que pudesse fazer isso. Demoro a notar as coisas, você vê.

Ele vira o corpo de lado pra ficar de frente comigo e apoia sua mão na minha, no encosto de madeira. Praticamente rezo para que ele não a pegue e sinta o quanto elas estão suadas e meio trêmulas... tava quase apertando a madeira como forma de segurar tudo o que se passava, mal engolia o ar que respirava buscando por mais que me arejasse a mente. O ideal era disfarçar toda a emoção que era tê-lo tão perto...

Se ele soubesse do estado do meu estômago, deveria parar por ali.

Mas ele não para.

- Pois note, note que você é a única que prendeu meu interesse nesse lugar. Não há mais em quem eu possa me apoiar e eu sei que com você as coisas tendem a mudar. Pra melhor eu espero, resisto um pouco por teimosia eu sei, mas caramba, não desista de mim. Não se esquive de mim, não me... eu quero me sentir bem e faz muito tempo que não sentia essa confiança. Não me tire isso.

- Acho que não poderia fazer isso. Seria...

Antes que eu pudesse falar mais, que eu nem sei o que falaria por não ter o que falar diante de tudo o que ele “discursou”, as luzes da sala se apagam de vez e um urro da torcida acaba dominando o ambiente numa profunda vaia – sem falar no concurso de palavrões – que quebra nossa bolha. Era tão frágil. Acho que devia agradecer e me sentir aliviada... No entanto, uma vez espocada essa bolha não queria dizer que a situação melhorava de qualquer forma.

Deixo que vá para dentro da casa escura ver como controlar toda aquela confusão. Eu... eu precisava de ar, precisava de um tempo para me estabelecer depois de tudo isso que se passou.


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Notas finais do capítulo

Próximo cap. é TENSO.

Sente o nível:

[...]
— Não precisa, estou bem. Só me deixa aqui, quieta, é tudo que peço. Fica aí, longe.
— Eu quero te ajudar, me deixa te ajudar, Milena. Não me peça pra ficar longe... Como eu poderia fazer isso?

Logo vem mais um combo.



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