Mantendo O Equilíbrio escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 24
Capítulo 24


Notas iniciais do capítulo

Dica de cast?

Não sei se vcs já viram um filme chamado Jumper - se não, procurem, que lá estará o Vinícius. Estava pelo meio dessa temporada quando revi o filme e... lá estavam a Milena (Rachel Bilson) e o Vinícius (Hayden Christensen).
Aqui tem umas imagens selecionadas do filme: http://www.youtube.com/watch?v=Z1ID7Lg2td4



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O espaço de tempo que fiquei com Djane no quarto foi pouco. Logo que voltei pra sala, Filipe já estava de saída de novo. Falava com Vinícius na varanda, dizendo que surgiu um compromisso de última hora e ele teria que ir imediatamente – foi isso que deu pra ouvir. E foi sem querer que ouvi. Djane voltou para a cozinha, queria dar um espaço ao filho. Por mais feliz que estivesse, sabia que não podia se jogar e restabelecer sua relação com ele de novo... Ainda teria que ter muita paciência.

Então sento no sofá de boa – mentira, quase me joguei no sofá alheio, muito macio por sinal – vendo o que tava passando na TV. Faz tempo que o canal de clipes rodava sozinho. Passa um que me leva a outro plano... My Chemical Romance e Daniela. A música é daquelas bem lentinha e que não é recente, que mostra cenas de uma guerra e soldados. Ver o vocalista quase se esgoelando me veio à cabeça bem instantaneamente Dani e suas cantorias – seria com certeza uma ótima música para incluir no seu repertório.

Enquanto Vinícius não volta, deito a cabeça no braço do sofá assistindo o final do clipe e... espera, cadê a garota? A Becca, cadê? Olho de um lado para outro sem sinal dela.

- O que foi?

- Cadê a Rebecca?

- Ah, tá lá no meu quarto numa ligação... Tinha que resolver algumas coisas.

- É, parece que tá todo mundo resolvendo suas coisas e eu aqui vagabundando...

Falo naturalmente, sem ser irônica ou coisa parecida. Vinícius coloca a sacola de DVDs sobre a mesinha da TV e se joga ao meu lado do sofá com uma cara brincalhona. Parece que nos conhecemos há mil anos ao mesmo tempo que parece que não sei bem como quem ele é.

- Você não está vagabundando. Está comigo. Não tem como perder tempo assim.

- Se você diz... depois convence minha professora de Legislação Social de me dar mais um tempinho pois tenho estado muito com você.

- Nessas condições, eu aceito. Sou ótimo em persuasão.

Sei que ele tá me olhando, sinto isso. Não o olho de volta, nem de rabo de olho, mantenho os olhos presos na TV, onde um novo clipe começa e eu nem presto atenção na identificação que aparece. Não sei por que começa um nervosismo, algo que sinto na boca do meu estômago cheio e chega a minha garganta num incômodo... essa sua voz tão calma e resolvida parece me deixar assim.

- Melhor que seja. Mas diz aí, quais os filmes que o “tio” trouxe?

- Trouxe uns três: um de comédia, ação e terror. Por qual começamos?

- Comédia ou ação. Quando eu for embora, você vê o de terror.

- Temos então alguém medrosa...

Não aguento, olhar pra TV não resolvia meu problema. A TV não se incomodava de ficarem lhe olhando, mas ele me encarando tava me dando arrelia. Levanto minimamente a cabeça do encosto, engulo meu incômodo e enrolo num risinho embromador de forma que inverta minha situação.

- Também tô percebendo... você não quer assistir esse filme sozinho, né? Podia trocar...

- Olha quem tá fugin...

- Os filmes chegaram?

Rebecca chega e me salva. Salva mesmo? Sorrateiramente me afasto de Vinícius e acho que ele percebe. Merda mesmo! Grudada com o braço do sofá, fico longe dos dois naquele sofá enorme, tentando pensar numa desculpa boa que me dispense de estar aqui nessa situação estranha. Só que não me vem nada na cabeça!

- Chegaram. Comédia, ação ou terror?

- Comédia, claro.

Vinícius se levanta pra colocar e Rebecca se senta onde ele estava. Me mexo disfarçadamente voltando a minha antiga posição, não tão grudada no braço do sofá, ainda um pouco distante dela. Pelo menos ela concordou comigo. Se fosse filme de terror aí que eu ia ter um treco nesse sofá mesmo... se morro com um simples trovão tenebroso, imagina aquelas cenas de suspense e terror. E aquelas musiquinhas aterrorizantes. Não ia dormir hoje.

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Hora de ir pra faculdade. Depois do filme – e das almofadadas que dei naquele garoto por comentar o filme todo sobre o mocinho e dizer que era muita mentira – fiz um lanche para começar bem a jornada de encontrar o diretor e ver o quanto ele vai pegar no meu pé. Ele achava que eu era sua assistente, só pode. Como não fui ontem, não sei quem pegou esse “privilegiado” lugar. Ainda tenho que me atualizar.

Meu material tinha ficado no carro da professora. Ela ficou o tempo todo no escritório, que fica num cômodo entre a cozinha e seu quarto, tratando de algumas pendências do evento. Até ela quer evitar um sermão do diretor Fabiano.

Rebecca foi embora quase na metade do filme, não podia ficar até o final. Vinícius era desesperado por qualquer companhia, contanto que não ficasse muito perto da mãe, falava com ela apenas o necessário, e Djane estava lhe dando seu espaço. Não sei quando eles poderão engatar uma coisa séria, ainda está cedo demais.

Como sou educada, me despedi de Becca e também a levei à porta. Muito gentil ela também, me deu dois beijinhos de praxe de despedida e um beijo demorado... no rosto do Vinícius. Será que interrompi o momento deles? Quase voltei à sala, me mantive um pouco distante. Ainda pude ouvi-lo comentar:

- Você vem amanhã, né?

- Não sei, Vinícius, sabe que essa semana é aquela apertada com os compromissos de família. Só se você quiser ir ao casamento da minha prima, mesmo depois do que aconteceu naquele último... Papai não foi muito bem com sua cara.

- Ah, é mesmo. Aff. Então sei lá, vou ver se chamo algumas pessoas pra uma reuniãozinha informal. Se você puder vir, estou convidando.

- Vou ver, se eu puder dar uma escapulida eu te aviso. Agora tenho que ir, tchau.

Fecha a porta e caminha até a varanda onde eu estava esperando. Passa um braço por meus ombros e me guia de volta ao sofá com um sorriso que não consegui imaginar seu porquê. Deu continuidade ao filme pausado e sentou-se comigo ainda grudada nele. Esperava que ele não sentisse meu coração batendo um pouco mais rápido e queria me convencer de que isso era por culpa, pois esse lugar não era meu. E me assusto em pensar que poderia ser meu...

- Agora estamos a sós.

- Bom, até o filme acabar, né? Tenho faculdade daqui a pouco.

- Ah, não, até você? Num deixo não.

Seu braço nos meus ombros aperta-me ao seu encontro, onde ele descansa a cabeça. Era muito fofo. Era... muito bom. Deitei a cabeça na sua, respirando seu perfume, bagunçando seus fios. O filme? Nem sabia mais do que se tratava. Queria que todas as sensações durassem, mas sabia que não durariam. E sabia que não poderia estar próxima assim com ele.

- Deixa sim, ontem faltei por sua causa. Tenho compromissos, logo você voltará aos seus. Ou pensa em ficar aqui assistindo TV para sempre? Você tem vida e perdeu 3 meses dela, não quer organizá-la?

- Eu sei, eu vou arrumar minhas coisas, acho que essa noite. Tentar voltar ao mundo... Acho que ele não sentiu minha falta. Nem parece que foram três meses.

- Quem não sentiria sua falta? Você é um cara legal.

- É, talvez seja. Mas esse cara do filme não é... olha esse cabelo. E esse sotaque, não sei como as mulheres gostam. Esse mocinho não tem nada de mocinho...

- Até os filmes querem fugir do clichê.

Eu sei que ele mudou de assunto. Ainda estava muito inseguro... Uma noite ele dormiu e acordou três meses depois, sem saber do tempo corrido. Realmente é estranho. Mais estranho ainda é ele não ter sofrido algo ademais, porque pra ele pareceu que só foi uma soneca que durou muito e que ele acordara num futuro diferente. Foi praticamente dado como desaparecido, uma vez que só seus colegas de trabalho sabiam do ocorrido por o terem colocado no meio.

Não sei como ficou tudo isso, como ele vai retomar ou como ele tem reagido a isso. Novamente, é muito cedo para tirar alguma conclusão.

O filme acaba e ainda ficamos do mesmo jeito. Os nomes da produção subiam, a música agitada tocava, eu abraçava a almofada e a cabeça dele ainda deitava no meu ombro. Aí, sem anúncio nenhum, Djane aparece e eu quase num pulo me afasto de seu filho. O porquê dessa reação ainda me questiono.

- Milena, acabei de falar com Fabiano e ele pediu para irmos mais cedo. Melhor irmos logo que o trânsito daqui a pouco vai estar daque... Ah, o filme já acabou?

Levantei às pressas disfarçando o quase flagra e acenando que sim, já havia terminado o filme. Vinícius continuou no sofá, não disse nada. Me olhava com uma expressão de que... pensava talvez sobre o ocorrido. Se eu não sei bem disso, imagine ele no vácuo. Então pra não ficar uma situação incômoda, o puxei do sofá para a mesa, onde ainda tinha um lanche para fazer. Uma despedida decente dessa vez.

A surpresa não era bem essa... a brilhante ideia me veio em coisa de segundos. Uma vez que ele estava sentado me observando, puxo Djane para nos acompanhar também. Ela fica na ponta e cada um do seu lado. Emendo uma conversa bem leve para ter um bom começo.

- Ele tá muito atarefado? Ontem falei com o Bruno de noite, mas ele não me deu nenhum detalhe.

- Não, parece que as pessoas que estavam doentes estão voltando aos seus postos. Tudo está correndo bem, apesar de uns probleminhas aqui e ali. Eu agora estou cuidando das apresentações e avaliações. Fabiano não entrou nos detalhes de sua parte, mas parece que...

- É, eu sei, deve ser algo com o palestrante de fora. Já falamos com a hotelaria e tudo. Bruno passou a noite reclamando que não quer virar babá do cara, mas se sobrar pra mim, sobra pra ele também.

- O diretor pode fazer isso?

Para o espanto de Djane e meu contentamento, Vinícius se sentiu a vontade de entrar na conversa. Isso era um avanço, não? Disfarço novamente e sigo com a conversa.

- Tanto pode como já fez. Só estamos esperando a confirmação dessa tarefa e a chegada do tal. Parece ser uma boa pessoa, a linha de trabalho dele é ótima... Falando nisso, qual é seu ramo profissional? Até hoje não sei.

- Ah, sou da arquitetura. Mas trabalho, ou trabalhava, numa firma em venda de imóveis. Tem algo a ver meio indiretamente...

É uma boa razão para se gabar da persuasão.

Terminamos assim, do lanche para o carro, onde ele foi nos deixar. Ou me deixar. A conversa fluiu bem, sem rabo de olho pra lá, hesitação de cá, apenas foi... E confortável. Isso foi a garantia de satisfação para a professora, que durante todo o caminho, da varanda de casa até a chegada ao estacionamento da faculdade, demonstrou.

No entanto, o dia ainda não acabou. É o que penso ao encontrar Dani acenando pra mim no pátio, logo ao entrar. 

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A aula de Marketing termina e posso dar uma pausa. É bom não agendarem nenhuma reunião de última hora para a monitoria porque eu tô sentindo que o diretor ainda vai me explorar um pouco mais. Ainda não o vi até agora, deve estar muito ocupado. Além disso, ainda tenho que me atualizar porque perder um dia de faculdade significa se atrasar em tudo. Vou descendo as escadas quando a doida aparece. Minha melhor amiga, Flávia.

- Sua sumida, deu agora pra matar aula direto, né? Nem me chama pra farra... onde tu tava ontem?

- Se eu te contar você não vai acreditar. Mas sério, tinha que resolver uns problemas... quem me arrastou pra fora de casa e me “obrigou” a matar aula foi meu irmão. Pra você ver o quão sério era o negócio.

- E conseguiu resolver?

Paro dramaticamente no meio da escada, as pessoas passando por mim para chegar à lanchonete. Esfomeados.

- Boa parte, acredito. Tá... hã... num nível satisfatório, acho.

Ela passa por mim e me puxa pela mão para continuar a descida. Com um balançar da cabeça, não deixa de enfatizar:

- Às vezes você fala coisa com coisa que me pergunto o que você anda tomando ou se esquecendo de tomar.

- Poxa, Flávia, assim você me acaba.

- Acabo nada, essa carinha de boba hoje durante quase toda a aula não me engana. Pode me dizer logo o nome dele.

- Dele quem? Posso nem rir mais.

- Eu disse que você está com cara de boba, não rindo. O que você viu de tão agradável na parede hoje? Por que era só pra ela que você olhava... Anda, diz, eu sei que você quer me dizer e tá querendo fazer suspense. Ele é daqui do prédio? Eu conheço?

- As paredes foram repintadas, alguém tinha que admirar, oras... e você, agora deu pra me observar na aula ou o quê?

Chegamos ao pavimento e cruzo braço com ela. Faz um tempo que não jogamos conversa fora, nem saímos. Com essas loucuras do dia-a-dia que arranjei mal tenho tempo para mim mesma. Nem pra aprontar com meu próprio irmão...

Tenho que achar um lugar para esconder aquele CD.

- Tá, não me diz. Quero ver até quando você vai curtir esse suspense. Posso ser curiosa, mas eu sobrevivo. Eu ia pedir as anotações do final da aula. Eu sei que comportamento do comprador é bem a minha cara, mas com isso de previsão de mercado já começa a parte chata...

- Você faz previsão sem perceber... você consome, você é o que o mercado quer conquistar. Só tem que fazer o encontro de interesses dar certo. Mas tudo bem, eu confesso que... tava pensando numa pessoa sim... só que não nesses termos teus. Não é daqui e...

- AH EU SABIA! Quando vou conhecê-lo?

- Deixa eu pensar... quando NUNCA está disponível na sua agenda?

- Nunca. Você me diz o dia e eu apareço. Como ele é?

- Ai, Flávia, não me ilude. O cara tem namorada...

- Ah, num acredito. E você gosta do cara, né? Que furada.

Dani acena de sua mesa, a única disponível no pátio todo durante o intervalo. Guio Flávia para lá, aproveitar e fazer as apresentações, se não ela deve achar que a abandonei pela monitoria.

- Não, eu nã-ão gosto dele assssssssim, eu só tenho que resolver umas paradas com ele, mas é teimoso, então acabo ficando próximo dele... e acho que devo dar um tempo.

- Por causa da lambisgoia?

- Que lambisgoia?

Dani pergunta interessada quando chegamos à mesa e eu fico sem-jeito de responder. Só quando nos enrolamos na mentira que pensamos que devemos parar de mentir. A história que eu lhe contei da minha avó parece que vinha me aterrorizar, era mais uma pra me complicar.

Tentava formular qualquer coisa na cabeça pra disfarçar o embaraço e Flávia acho que percebe. Diz que vai ao banheiro que estava apertada a aula toda. No entanto, não foi distração o suficiente para Dani. Eu tinha que dar um jeito. Puxo uma cadeira e sento, pois não precisava comprar nada, não tinha fome.

- Lambisgoia me lembra da Natália... Eu sei, eu sei. Não devo pensar assim das pessoas, principalmente perto do Bruno.

- Falando nele, como ele anda? Quer dizer, depois daquela enrolada?

- Se eu disser “melhor, impossível” não estaria mentindo.

- Sério? Isso é ótimo!

- Aham. Você viu como na quarta ele tava atencioso? Nem deve ter pensado mais nela...

- Atencioso não, preocupado. Cara, você nos deu um susto.

Dani mastiga rápido dando sinal que vai falar. Inconsciente, me lembro de Djane e eu na lanchonete do hospital conversando no dia que Murilo estava na emergência. Lembro ter pensado que é má educação falar de boca cheia e é falta de educação não responder quando lhe perguntam algo. Cá estou fazendo o mesmo com a Daniela.

- Eu sei, eu vi a galera comentando a minha falta e sobre o Bruno se explicando... Ficou parecendo um herói ou coisa do tipo. Muito fofo. Ele fica todo sem-jeito quando a gente fala isso pra ele.

- Ah, é? Então já sei quem eu vou perturbar hoje.

- Malvada. Ele preocupado contigo e você querendo perturbá-lo. Te dói no coração, não, hein?

- Comigo? Por quê?

- Oras, o caso com sua avó. Ontem saímos e ele comentou que te ligou e tal... que você falou que tava ocupada resolvendo justamente isso... Então, como ela está, melhor? Pela sua carinha, posso arriscar dizer que sim?

Ela tem razão, dói no coração...

Minha cara? Pense num sorriso amarelo! Como eu vou dizer isso? Como dizer que eu menti na cara-de-pau porque não saberia explicar o que me abatia? Se bem que...

Espera, como eles saíram se Bruno me disse ontem que estava morrendo de sono?

- Eu não consegui falar com ela ontem... a ligação tava horrível. Essas chuvas não podem começar na cidade que tudo que é sinal dá problema. Ao que pareceu, ela está melhor sim. Só que... bom, Bruno me disse naquela hora que estava doido pra ir pra casa com sono... Tu ainda arrastou o garoto pra sair, foi? Quem é a malvada agora?

Ela... ela enrubesceu. Mal mastigava o último pedaço do seu sanduíche. Abri a boca num “O” surpreso que me puxou um sorriso nada singelo. Pelo jeito não só foi eu que deixou uma informação escapar... Só fui mais esperta de saber usar.

- Você... e o Bruno?

Ela pigarreia. Acho que a encurralei... tão fofinha. Ela pega o suco pra tomar, acho que o sanduíche não tava querendo descer depois dessa. Ah, se ela confessar... ah eu confesso também. Mas só se ela confessar primeiro. E que confesse logo, porque tô doida pra falar com alguém e o único que sabe mais ou menos é meu irmão. Nunca que eu ia falar com ele sobre isso, nunca! Por enquanto, só comentei por alto com a Flávia. Que nunca voltou pra lanchonete.

- Hum? Co-o-omo assim, o que v-v-você quer dizer?

- O que vocês querem dizer eu não sei, mas eu quero dizer que Fabiano tá soltando fogo pelas ventas e estou aqui propondo uma fuga.

Bruno surge de repente próximo à mesa, puxando uma cadeira que vagou na mesa ao lado. Daniela não me responde com palavras, mas a sua crise de engasgo me deixa bem bem suspeita. Podia ser pela chegada surpresa de Bruno com as notícias ou por ter essa aparição quando falava justamente dele. Desculpas ela poderia arranjar aos montes, mas uma desconfiança é uma desconfiança. Ai, caramba, eu só queria confessar! Se ela não confessar primeiro, eu é que vou ficar sem-jeito!

Ri um pouco da situação e acho que o olhar que ela me joga é aquele que pensa que o que me faz rir é dela. Bruno a ajuda batendo nas suas costas e eu tento limpá-la com guardanapo e fazer com que ela beba o líquido para logo passar o efeito. Ele continuava exasperado:

- Se ela se engasgou, é melhor fugirmos logo. Não quero nem saber, não vai sobrar pra mim, não.

- Então vão vocês, é melhor eu me apresentar pra isso... tava sentindo mesmo que hoje ele ia me explorar. Se eu faltar mais um dia, aí que ele me trucida.

- Milena, a hora é agora. Vamos fugir.

- Sério. Vão. Eu acoberto vocês. Ainda tenho aula mesmo. Amanhã de manhã a gente vê como ficou. Vão logo!

Eu queria muito, mas muito, cair em gargalhada. A cara da Daniela tava muito hilária e ainda juntando com o desespero do Bruno. Ela sabe que eu sei... E fico feliz de saber, apesar de não ter conseguido empurrá-la para meu irmão. Percebo então que naquele dia do meu engasgo – diga-se de passagem, a minha vergonha e desespero na lanchonete – não era pra ele que ela olhava, era pro Bruno. Como fui besta de não ver isso bem?

Agora sim fazia algum sentido o que ela falava no carro quando ficamos de apoio moral no outro dia que ele foi falar com a ex e quando confabulava sobre mim na festinha do pijama. Provavelmente tinha muito mais sinais e eu distraída com outras coisas não vi.

Logo que eles levantam, eu também levanto. Questão de segundos e a mesa que deixo pra trás lota. É tão difícil hoje em dia sentar numa mesa pra conversar sem ter alguém te olhando e te esperando pra pegar a mesa. Tem horas que esse capitalismo e pragmatismo todo não é nada confortável ou conveniente. Enquanto caminho para a secretaria, onde provavelmente estaria Fabiano incendiando tudo, passo pela ala da biblioteca e vejo Flávia no atendimento. Um desvio não vai me atrasar.

- Hey, olha quem anda sumida agora.

- Ah, sorry. É que essa última prova de Marketing ficou na minha cabeça... vou logo pegar uns livros porque dona Amália vai explicar como vai ser a avalição no próximo horário e eu quero estar preparada. Logo a galera vai correr pra cá e vai ficar aquele vuco-vuco porque não tem material suficiente.

- Desesperada. Eu ainda nem terminei meu trabalho de Silvana pra segunda e você que já tá ficando doidinha.

- Ah, porque você ficou com apenas uma parte do trabalho dela, né? Sorte sua estar nessa monitoria porque pra você ela reduziu. Com ela, ainda tenho um estudo de caso, mas é só pra entregar na semana depois do evento. Ainda tenho que preparar minha apresentação! E você aí, só no relaxo.

- Opa, relaxo não. Tenho uma fera pra acalmar ali e tô enrolando. Adivinha quem.

- Quem? Sou péssima em adivinhações...

- Fabiano.

- Sua louca, o que ainda tá fazendo aqui então?

- Porque sou guerreira, mas adooooro uma procrastinação. Além do mais, o intervalo já vai acabar, ele se aguenta mais um pouco. Tenho que ir pra aula de Amália também, esqueceu?

- Tá, mas nada de ficar olhando pra as paredes agora. Você é minha parceira, se é pra se lascar, nos lascamos juntas, mas se é pra passar, passamos juntas. Me agradeça, estou pegando material pra nos ajudar na prova de sexta.

- Oxi, com uma proposta dessas, meu dia ótimo se completa. Deixo pra estragar meu fim de noite quando passar esse horário. O que você acha, devo pegar um chazinho na lanchonete e preparar o extintor antes de entrar na diretoria?

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Peguei o chazinho do diretor na lanchonete antes de alcançar a diretoria. Quando digo chazinho quero dizer pacote de cookies que eu sei que ele adora e posso usar como calmante. Chego de mansinho, ele na sua mesa escondido pela papelada e digo um olá ameno para ele. Sabe como é, para evitar exaltações.

- Oi, Milena. Você chegou em boa hora. Minha monitora Mariana precisa de alguém para acompanhá-la a pegar os materiais que ficaram prontos lá na gráfica.

- Tudo bem. Amanhã de manhã que horas então?

- Não, hoje. Agora mesmo.

Mal sento na cadeira e ele já quer que eu levante. Não que eu esteja reclamando. Mas cadê o fogo, o incêndio? Ele nem tá com aquela veia perigosa na testa... 

- E ainda estão abertos? Quer dizer, são quase 21h.

- Eles fecham às 22h. Pensei que você soubesse... mas ande, Mariana precisa de alguém. Os outros já estão bem atarefados. Antes me diga, você sabe do paradeiro de seus colegas Daniela e Bruno?

- Ah, eles tiveram que ir embora. A tia dela parece que teve um problema e o Bruno tava de carro... bom, eu não sei os detalhes. Eles pediram desculpas pela falta. Aproveito e peço as minhas por faltar ontem, tive uns problemas pessoais pra resolver de última hora.

- Tudo bem. Contanto que você se mexa mais para esse evento, eu evito maiores confusões ou advertências. Afinal, sua nota depende disso também, não?

- Sim, senhor. Vou me jogar nos trabalhos da monitoria. Só me dizer o que fazer e faço de prontidão.

- Então o que esperas?

- Espero como?

- A Mariana, a gráfica, o material...

- Ah, sim. Vou lá.

Levanto depressa e alcanço a menina no pátio. Fico pensando se Bruno estava realmente com algum problema pra fugir daquele jeito... Fabiano não estava nada soltando fogo pelas ventas. Estava até mais calmo que o normal, nem precisei usar o pacote de cookies – melhor, sobrou algo pra beliscar. Será que ele só queria sair com a Dani? Ah safadeenhos... Pois vou perturbá-los amanhã, jogar um verde e vê se eles caem. Eu preciso que eles confessem para eu poder confessar também.

Era a condição que minha mente se agarrava. 


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